AUN – USP – O que a USP pode fazer para melhorar a vida dos índios xavantes no Estado do Mato Grosso? A ligação parece distante, mas o Projeto de Adensamento do Cerrado, realizado pelo Laboratório de Geografia Agrária da USP e que faz parte da campanha “Salve o Cerrado”, tem tornado a porção do Araguaia do Mato Grosso cada vez mais próxima da universidade.
Apoiado pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão e coordenado pelo professor Ariovaldo Umbelino de Oliveira, o projeto nasceu de um “pedido de socorro” de um xavante, estudante de Ciências Sociais, que veio em busca de alguma maneira de impedir o desmatamento que fazendeiros da região leste de Mato Grosso – onde se encontram os territórios xavantes – estavam promovendo dentro da reserva indígena. A reserva, que já se caracterizava em ser uma “ilha de cerrado” numa área cuja vegetação já havia sido quase totalmente devastada para o plantio de soja, além de vivenciar a destruição de “rö” (que na língua a’úwê significa o mundo e é uma metáfora para a razão de viver da população indígena) ainda passava por um período de fome, provocado pela diminuição da caça na região.
Desenvolveram-se, a partir daí, duas frentes para combater os problemas da região. A primeira foi elaborar um laudo técnico sobre o desmatamento na área, encaminhado ao Ministério Público, comparando, através de fotos de satélite, a situação da vegetação em 1988 e 1999 e cobrando uma maior fiscalização dos órgãos públicos. A segunda consiste na implementação de medidas para conter a fome na região – de maneira diferente do que fez a FUNAI, que tentou fazer com que os índios cultivassem arroz em uma lavoura mecanizada e mais tarde passou a distribuir cestas básicas nas aldeias – com sugestões que partissem muito mais dos próprios índios do que dos pesquisadores da universidade. Esse objetivo de que a saída para a fome surgisse mesmo da cultura indígena veio, além do sentido de preservar suas tradições, da tentativa de tornar os povos da região independentes, a médio prazo, de qualquer ajuda externa.
A melhoria da alimentação na região está sendo conquistada através do plantio de frutas típicas no cerrado e da formação de pequenas criações de animais nativos. Assim, fez-se um levantamento entre os índios de quais mudas e quais animais típicos de sua alimentação deveriam ser adquiridos e quais alimentos da cultura não-índia – que eles haviam assimilado e estavam acostumados a comer – deveriam integrar o seu roçado e seu rebanho. A universidade providencia os meios para começar esses cultivos, pensa junto com os xavantes a melhor maneira de montar a infra-estrutura necessária para mantê-los, e promove intercâmbios entre os índios e pequenos agricultores para que possam aprender as técnicas de cultivo das variadas culturas que passam a desenvolver nas aldeias. Mas é o índio quem fica responsável – com certa ajuda de custo – por levar o projeto adiante.
Essa iniciativa, que de início foi implantada em apenas três das 13 aldeias da região, carrega a responsabilidade de trazer, como define o professor Ariovaldo o “efeito-demonstração”. Nesse momento, mais quatro aldeias estão sendo contempladas em uma segunda leva do projeto, que tem seus meios materiais providos pela USP, mas cujos “agentes implantadores” são os xavantes das três primeiras tribos em que o projeto foi implementado.
Para dar ainda mais esperança aos índios na recuperação do cerrado e na garantia de soberania de seu território, o Ministério do Meio Ambiente encomendou um relatório etno-ambiental da terra xavante em Mato Grosso, realizado pelo Laboratório de Geografia Agrária da USP, que acaba de ser concluído detalhando todos os problemas de divisas e de zoneamento, com especificação de áreas que precisam ser incorporadas ao território indígena. Segundo o coordenador do projeto “ele só vem a cumprir um dos papéis da universidade que é a extensão, a atuação em várias frentes. Trazer para o debate na universidade a questão da geografia dos povos indígenas é enriquecer a própria geografia.”
Por Thais Gurgel
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