ISA – Decreto que institui o Grupo Permanente de Trabalho Interministerial responsável por propor em 30 dias um plano de ação para prevenção e controle do desmatamento na região foi reeditado no dia 07/07, excluindo o estabelecimento de uma zona especial de gestão territorial na área de influência da BR-163. A medida atende as expectativas dos produtores de soja, principal vetor do aumento do desmatamento da Amazônia entre 2001 e 2002, e coloca em dúvida a perspectiva de suspensão do desflorestamento em uma das principais áreas críticas.
Pela primeira vez, o governo disponibilizou a base de dados do desmatamento na Amazônia do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para diversas organizações governamentais e não-governamentais com experiência em geoprocessamento, entre a quais o Instituto Socioambiental, convidadas a analisar e elaborar recomendações em relação a questões metodológicas, vetores de desmatamento, tendência e cenários de ocupação, entre outros, dos dados referentes ao período de 1997 a 2001.
A elaboração de um plano de ação para a prevenção e o controle do desmatamento foi outro desdobramento da recente divulgação da projeção de que foram deflorestados 25.400 km2 na Amazônia entre agosto de 2001 e agosto de 2002, segundo maior índice já registrado nos 14 anos de monitoramento da região.
O plano de ação deverá ser anunciado no início de agosto por um Grupo de Trabalho (GT) Permanente Interministerial formado por integrantes da Casa Civil e dos Ministérios do Meio Ambiente, Agricultura, Ciência e Tecnologia, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Integração Nacional, Justiça, Minas e Energia, Trabalho e Emprego e dos Transportes, segundo decreto publicado no Diário Oficial no dia 04/07.
Entre os instrumentos previstos para a definição das medidas e ações estão o ordenamento fundiário dos municípios que compõem o Arco do Desmatamento; geração de emprego e renda em atividades de recuperação em áreas alteradas; incorporação ao processo produtivo de áreas abertas e abandonadas e manejo de áreas florestais; o estabelecimento de uma zona especial de gestão territorial na área de influência da BR-163, entre outros.
Entretanto, o decreto que institui o GT Interministerial foi reeditado na segunda-feira (07/07), excluindo a zona especial de gestão territorial na área de influência da BR-163. A rodovia e seu entorno, que já foram foco da exploração madeireira, representam agora uma das principais rotas de migração de produtores de soja, que é apontada como o principal vetor para o aumento do índice de desmatamento no último ano.
No dia 03/07, o secretário de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente, Gilney Viana, declarou à Agência Estado que a soja avança ao longo da BR-163 em direção a Santarém em cidades que eram pólos madeireiros. Alguns dias antes, Ane Alencar, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), informou que, em decorrência de estudos realizados pela instituição na região, poderia atribuir parte do desmatamento à abertura de áreas de monocultura de soja, sobretudo no Mato Grosso e em algumas localidades de florestas secundárias na região de Santarém (PA).
As medidas emergenciais de fiscalização já iniciadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) nas áreas mais críticas do Arco do Desflorestamento, 54 municípios do Mato Grosso, Pará e Rondônia, incluem, por exemplo, Sinop, Cláudia e Peixoto de Azevedo, localizados na área de influência da BR-163.
Além disso, dados do satélite NOAA-12, processados pelo Inpe e pela Embrapa Monitoramento por Satélite, revelam que dos 10.585 focos de queimada registrados em junho último, 7.775 focos estão localizados em Mato Grosso, sendo a Rodovia Cuiabá-Santarém uma de suas principais áreas críticas.
Para facilitar o escoamento da “soja modelo exportação” do Centro-Oeste e da Amazônia pelo porto de Santarém, os produtores reivindicam o término do asfaltamento da BR-163, cerca de 1 mil quilômetros em território paraense. Em maio deste ano, representantes de multinacionais do agribusiness, como Bunge, Cargill e ADM, manifestaram interesse em participar de um consórcio privado para financiar o asfaltamento da estrada. Segundo declarações à imprensa local do governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, o projeto recebeu apoio do presidente Lula e do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes.
Vislumbrando a finalização do corredor viário, a Cargill inaugurou em abril deste ano um complexo graneleiro em Santarém com capacidade de movimentar até um milhão de toneladas anuais para destinar o grão produzido na região para mercados externos. Um investimento de US$ 20 milhões.
Entretanto, estudo realizado pelo Ipam e pelo ISA em 2000 sobre os impactos provocados pela pavimentação de quatro estradas na Amazônia previstas pelo Avança Brasil, entre as quais a BR-163, apontava que de 80 a 180 mil km² de florestas praticamente virgens e riquíssimas em biodiversidade seriam desmatadas entre 25 e 35 anos.
A necessidade do estabelecimento de uma zona especial de gestão territorial na área de influência da BR-163, portanto, é evidente. O item, entretanto, foi descrito na reedição do decreto como uma incorreção.
E fica a pergunta: o governo está mesmo disposto a construir um novo modelo de desenvolvimento para Amazônia?
Cristiane Fontes