CNPq – A crescente organização dos povos indígenas em torno das reivindicações de seus direitos, da luta pela preservação de suas culturas e da defesa de seus territórios vem provocando mudanças conceituais na etnologia indígena e nas políticas indigenistas. A observação é do doutor em antropologia e professor da Universidade de Brasília (UnB), Stephen Baines. Segundo ele, o trabalho realizado no Brasil a partir do começo da década de 1970 pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), promovendo Assembléias Indígenas marcou um início do processo de conscientização e crescente politização dos índios, o que acelerou a consolidação dos movimentos indígenas.
Além disso, a realidade vivida pelos índios recém contatados pelas frentes da sociedade nacional mostra que a melhor política é a de preservar os territórios dessas comunidades indígenas sem uma interferência direta por indigenistas. “A política indigenista do Estado foi orientada primeiro pelo conceito de assimilação, passando pela tentativa de integrar os índios à sociedade nacional e hoje aceitamos, a partir da Constituição de 1988, o reconhecimento das diferenças, tratando o índio como índio e não como sujeito a ser integrado à sociedade nacional”, explicou Baines.
As idéias defendidas pelo professor são resultantes de anos estudando não só os índios, mas, principalmente, o trabalho de pesquisadores e funcionários do governo federal que atuam junto às sociedades indígenas. Nascido na Inglaterra, Baines começou a estudar os índios brasileiros em 79, em seu mestrado sobre a política indigenista do Brasil na Universidade de Cambridge. Em 80, mudou-se para Brasília, onde fez o doutorado, dando continuidade às pesquisas na área de etnologia.
Desde 1990, com o apoio do CNPq, Baines faz uma análise sobre os estilos de etnologia indígena feitos no Brasil, na Austrália e no Canadá, comparando as políticas indigenistas e indígenas nos três países. Neste estudo, que ainda está em andamento, ele entrevistou antropólogos, lideranças indígenas e visitou aldeias de nativos dos três países. São eles: os Índios, os Inuit (esquimós) e os Métis, no Canadá; os Aborígenes e os Ilheus do Estreito de Torres na Austrália e os índios brasileiros.
Foi nestas visitas que Baines observou as contradições inerentes a políticas de integração dos povos nativos às sociedades nacionais ditas “civilizadas”. Em todos os três países, a maioria dos índios que mora nas cidades é marginalizada, pobre, e sofre com o desemprego e o preconceito, que piora onde o convívio com “brancos” é mais direto. Além disso, este contato vem trazendo, historicamente, uma série de problemas como alcoolismo, doenças, violência doméstica e altos índices de suicídio.
Também nos três países estudados, o professor detectou o crescimento do movimento indígena a partir da participação dos próprios índios na discussão de uma política para a questão. “Até os anos 70 os povos indígenas eram freqüentemente representados por antropólogos e agora os índios, politicamente organizados, já exercem o papel de líderes”, disse Baines. Em alguns aspectos, a Austrália aparece à frente dos outros, pela incorporação de aborígines em cargos do órgão federal responsável pelas políticas indigenistas. Isso, segundo o professor, contribui em parte para a elaboração de ações que efetivamente atendem às necessidades destas comunidades.
As diferenças aparecem quanto aos recursos destinados à questão indígena. A Austrália e principalmente o Canadá, países com mais recursos que o Brasil, adotaram políticas de destinar mais verba para os projetos indígenas. No entanto, isto em si não é suficiente para sanar as deficiências historicamente constituídas.
A pesquisa, que ainda contará com trabalhos de campo no Canadá e na Austrália numa futura licença de pós-doutorado, terá como resultado final uma análise em vários pontos: a história da disciplina em cada Estado nacional, o papel do antropólogo e seu envolvimento político, políticas indigenistas de Estados e ONGs, movimentos indígenas e a atuação de antropólogos indígenas.
Partes desta pesquisa podem ser conferidas em livros como “As Ciências Sociais: desafios do milênio. 1”, da Ed. Natal EDUFRN e “Estilos de Antropologia 1”, Ed. Campinas UNICAMP.
Mariana Galiza