Seminário causa revolta em defensores das causas indígenas

Estação Vida – Realizado na última sexta-feira [26] em Cuiabá/MT, o seminário “As questões indígenas e o direito à propriedade”, foi visto como “suspeito” por membros de defesa das causas indígenas. Promovido pela Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso [Famato], o evento reuniu representantes da Comissão Nacional de Assuntos Indígenas, Ministério Público, Ministério da Agricultura, deputados, senadores, produtores rurais e índios. Para o coordenador técnico da Operação Amazônia Nativa – OPAN, Elton Rivas, faltaram representantes indígenas na mesa de abertura. “Acho estranho em um seminário que se dizia ser para discutir os conflitos e chegar em uma solução harmoniosa, só houvesse representantes dos produtores rurais. Apenas um ponto de vista foi colocado em discussão, faltou ouvir os índios. Precisamos inserir os índios nesses debates”, explica. Durante o seminário o senador Jonas Pinheiro apresentou o projeto de lei.166, de sua autoria, que legalizaria o arrendamento das terras indígenas para os agricultores, se mostrando contrário à expansão das áreas de reservas indígenas no Brasil. O projeto foi defendido pelo diretor da Famato, Edson Andrade.

Segundo Andrade, o projeto apresentado pelo senador proporcionará melhor condição de vida para os índios. “Os índios necessitam de renda e, ao contrário do que pensam os indigenistas, antropólogos e ongs, eles querem trabalhar nas suas terras. Um exemplo disso acontece em Primavera do Leste, onde os índios Xavantes não podem mais viver apenas da caça. A reserva encontra-se no meio do setor produtivo, e, em contrapartida, nada produz. A verba anual da Funai é de R$ 25 milhões, apenas. O que se pode fazer com essa quantia?”, argumenta. Segundo ele, a partir do momento que os índios tiveram contato com a civilização deixaram de ser “silvícolas”, e passaram a ter os mesmos direitos de qualquer cidadão. “Eles querem arrendar as terras, não querem mais permanecer como antes. Precisamos mudar essa política indigenista”, declara Andrade. Elton Rivas, da Opan, rebate essa crítica explicando que a afirmação de que os índios vivem em estado de miséria é um forma de olhar a causa por um único lado, que neste caso seria o dos latifundiários, sojicultores e demais produtores rurais. “Os índios precisam de alternativas econômicas, sim, mas, que venham como solução e não exploração. Eles podem se desenvolver dentro de sua própria cultura, sem precisar reduzir as diferenças, como propõe os empresários”, esclarece Elton. “Os índios possuem uma maneira diferente de utilizar a terra e seus recursos naturais. Se o agricultor derruba a mata de uma reserva, ele não está apenas tornando aquela terra produtiva, mas sim, devastando o estado, minimizando a diversidade, e degradando uma área que antes estava preservada”, afirma.

Para o advogado e coordenador de políticas institucionais do Instituto Trópicos, e do projeto Saúde Indígena, Villi Fritz Seilert, o seminário atingiu o patamar de “agressão” aos povos e aos poderes. “Aquilo se transformou em caso de polícia”, declara. Villi avalia o projeto de lei de Jonas Pinheiro, como um discurso antigo e perigoso. “Os índios estão realmente vulneráveis. Faltam propostas, parcerias, bases de processamentos de alimentos, produtos naturais e cooperativas. Isso é pensar no futuro das populações indígenas, a não em uma solução a curto prazo”, afirma. A questão de arrendamento das terras indígenas, segundo Villi, não pode ser realizada por ser ilegal. O que acontece em algumas reservas, e que possui base legal, é a parceria agrária, onde se definem as condições e tudo é dividido tanto o ônus, quanto o bônus. “Não é essa rapina que estão propondo, onde os proprietários tomariam conta das terras e ainda usariam o índio como mão-de-obra”, esclarece o advogado. Para Villi o seminário pecou em três itens. “Por não possuir base legal para tanta agressão, por não ouvir os índios sem assédio e dissimulação, eles precisam se manifestar publicamente e não em setor privado, e ainda, por não criar caminhos mais saudáveis para todos, e não para um único setor como ocorreu”, conclui. A saída para que ocorra a sustentabilidade indígena, segundo Villi, seria a elaboração de propostas que envolvam uma parceria com as universidades, agroindústrias, em torno de pesquisas da exploração de recursos naturais e alimentares. “Ao invés da soja, por que não cultivar o pequi, por exemplo, que comprovadamente é uma boa opção econômica? As reservas estão repletas de recursos naturais fitoterápicos e frutos silvestres. Falta criatividade para o governo”, observa. 

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Bianca Arruda

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