Índios devoradores de gente, montanhas de ouro e diamante, feras selvagens. Essas e outras lendas herdadas dos bandeirantes eram quase tudo o que se conhecia sobre o interior do Brasil há 60 anos. No início da década de 40, praticamente todos os 43 milhões de habitantes do país estavam concentrados no litoral e viam o interior do próprio país como algo exótico. A região não passava de uma enorme e inexplorada mancha na geografia brasileira.
A Expedição Roncador-Xingu foi planejada para conquistar e desbravar o coração deste Brasil lendário e misterioso. Iniciada em 1943, o movimento adentrou o Brasil-Central, desvendou o sul da Amazônia e travou contato com diversas etnias indígenas ainda desconhecidas. Uma epopéia sensacional, que entrou para a História como das maiores aventuras do século 20 em todo o mundo. Na liderança, três irmãos que marcaram este período da história nacional: Leonardo, Cláudio e Orlando Villas Bôas.
No início dos anos 40, o Araguaia e seus afluentes eram a ultima barreira natural ao progresso “civilizatório” que massacrava índios desde o descobrimento. As margens, que dividem também cerrado e floresta amazônica, escondiam mais de uma dezena de povos numa região vasta e desocupada. Eram os últimos refúgios para dezenas de nações indígenas até então desconhecidas. Apesar disso, a região era classificada como um “vazio demográfico que precisava ser ocupado” e despertava o interesse de autoridades internacionais, além de garimpeiros, fazendeiros, políticos e, em especial, tirava o sono dos militares brasileiros.
Longe das veredas do cerrado e das águas límpidas do rio Kuluene, eclodia na Europa o auge da Segunda Guerra, um conflito que teve como uma de suas razões a noção de “Espaço Vital”. A idéia, simplificadamente, defendia o direito de que nações “mais desenvolvidas” ocupassem áreas pouco exploradas em países “menos desenvolvidos”. Esta teoria colocava a região incógnita no Centro-oeste brasileiro como alvo potencial para a cobiça de outros países.
Neste contexto, o então presidente, Getúlio Vargas, fez um longo sobrevôo na região do Araguaia, a convite do então governador de Goiás, Pedro Ludovico. Ao ver uma vastidão de florestas cortadas por rios imensos, concluiu abismado: “É o branco do Brasil Central”. Para mudar essa realidade, o presidente encarregou o ministro da Coordenação de Mobilização Econômica, João Alberto Lins de Barros, de promover a interiorização do Brasil. Assim nasceu a Fundação Brasil Central, FBC. Em seguida, foi anunciada a criação da Expedição Roncador-Xingu, cujo objetivo era ser ponta de lança do avanço progressista, com a função de mapear o centro do país e abrir caminhos que ligassem a região ao resto do país.
O ministro João Alberto foi um dos maiores incentivadores da colonização do Centro-Oeste, principalmente por ter conhecido toda a região como revolucionário da Coluna Prestes. Ele vislumbrava o futuro econômico do Vale do Araguaia, apontando a terra como ideal para pecuária. Além disso, o ministro sonhava em ver uma urbanização planejada e ordenada que, ao seu entender, traria assistência, riquezas e qualidade de vida ao interior do país. Em boa parte, o sonho progressista do militar se concretizou. Transcorrida por cerca de quarenta anos, a Marcha Para o Oeste fundou cerca de 43 vilas e cidades, construiu 19 campos de pouso, contatou mais de cinco mil índios e percorreu 1,5 mil quilômetros de picadas abertas e rios.
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