A idéia de reservar terras para a reforma agrária dentro do projeto de transposição do Rio São Francisco é antiga, e surgiu na década de 60 com a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O economista Celso Furtado, que presidiu o órgão entre 1959 e 1964, defendia publicamente a idéia, mas não conseguiu colocá-la em prática.
O ex-presidente Juscelino Kubistchek também tentou vincular a reforma agrária ao projeto de transposição do rio. Ele enviou ao Congresso Nacional em 1959 projeto de lei, conhecido como a "Lei da Irrigação", que determinava a desapropriação de terras para assentamentos antes da implantação de qualquer projeto de irrigação nas margens dos São Francisco. O projeto foi derrotado pelo Congresso Nacional e, com o golpe militar de 1964, acabou sem ser reformulado para nova tentativa de votação pelo Legislativo.
Em entrevista à Agência Brasil em julho de 2003, o economista Celso Furtado criticou o que chamou de "bloqueio das forças reacionárias" à idéia inicial de vincular a reforma agrária à irrigação no Nordeste. Segundo o economista, que morreu em novembro do ano passado, o plano original da Sudene era baseado na "ilusão" de que havia um governo popular chefiado por Juscelino que, com forte apoio popular, conseguiria garantir um processo de transformações da estrutura agrária.
"Por isso, quando nós começamos, a primeira coisa que fizemos na Sudene foi um projeto de lei de reforma agrária disfarçado de uma lei de irrigação. Era preciso aproveitar melhor as terras irrigadas, e nós começamos a reforma agrária por aí. Isso foi levado a sério. Só que as forças reacionárias bloquearam tudo isso. Não foi possível tocar no problema agrário, que é o mais grave no Nordeste, sem dúvida nenhuma", ressaltou.
Na entrevista, realizada no primeiro ano de governo do presidente Lula, Celso Furtado disse estar otimista diante da nova proposta de transposição do São Francisco então em estudo pelo Grupo de Trabalho Interministerial criado em junho de 2003. "Hoje em dia, se há mais recursos para abordar o problema, como eu estou vendo que há muito mais recursos – e mais coragem dos políticos, que já não são mais tão subordinados aos interesses dos latifundiários – isso é um avanço", disse.
O projeto de integração que está em discussão pelo Executivo prevê não apenas a utilização das águas do São Francisco para perenizar os rios e açudes do Nordeste brasileiro no período de estiagem. A prioridade, segundo o governo federal, é melhorar as condições de vida da população que vive às margens do rio ou tem no São Francisco o seu meio de sobrevivência. O Orçamento aprovado no Congresso prevê R$ 600 milhões para a execução do projeto neste ano.
Os estados mais beneficiados seriam a Paraíba, o Rio Grande do Norte e o Ceará. O rio São Francisco possui 2,8 mil km de extensão, nasce em Minas Gerais, na Serra da Canastra, e desemboca no Oceano Atlântico, entre Sergipe e Alagoas.