O carvão vegetal está na ponta inicial da cadeia produtiva do ferro-gusa, que é utilizado principalmente na fabricação de peças automotivas. Trata-se de um mercado que movimenta US$ 400 milhões por ano, somente na região norte do Brasil, e que tem como principal comprador a indústria siderúrgica dos Estados Unidos. Essas afirmações, inclusive o valor da movimentação, constam da reportagem Escravos do Aço, publicada em julho deste ano no Observatório Social em Revista.
Assinada pelos jornalistas Dauro Veras e Marques Casara, a reportagem teve repercussão no exterior. Nela, os jornalistas afirmam que gigantes industriais, como Queiroz Galvão e Gerdau, utilizam carvão produzido por trabalho considerado degradante ou escravo em carvoarias da Amazônia e que empresas, como a Companhia Vale do Rio Doce e a maior produtora de aço dos Estados Unidos, a Nucor Corporation, relacionam-se comercialmente com essas empresas. As denúncias estão sendo apuradas pelo Ministério Público Federal.
“Calculando bem, custará muito menos para as siderúrgicas se prevenirem com medidas como as que estão sendo anunciadas do que continuarem a negar sua responsabilidade”, afirma frei Xavier Plassat, coordenador da Campanha de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Ele conta que, quando o Ministério do Trabalho chega às carvoarias para fiscalizar, as siderúrgicas rapidamente se prontificam a pagar melhores salários. “Ou para evitar o escândalo, ou por terem clareza, nesse momento de pressão fiscal, de sua real responsabilidade”, disse.
Segundo ele, as siderúrgicas se escondem atrás do argumento de que quem contratou o trabalhador foi o dono da carvoaria. “Isso é uma falsa terceirização, considerada fraudulenta pelo Ministério do Trabalho, porque, na maioria dos casos observados, todos os equipamentos utilizados pelo intermediário, e a terra onde é explorada a madeira, são de propriedade da siderúrgica. Essa terceirização é uma ficção jurídica que visa a eximir o utilizador final do produto de toda a responsabilidade de empregador”, afirmou.
“Gostaríamos de que as empresas assumissem a responsabilidade de empregadoras e de responsáveis pela cadeia produtiva desde o ponto de partida, ao invés de se esconderem atrás de terceiros que normalmente não têm a capacidade empresarial, nem a idoneidade para assumir essa tarefa”, resumiu o coordenador da campanha contra o trabalho escravo.
Plassat ressaltou que a exploração que ocorre nas fazendas chama a atenção pelos números alarmantes e, por isso, recebe mais destaque. “Apenas neste ano, já recebemos 15 denúncias de trabalho escravo ou superexplorado em carvoarias do Maranhão, Tocantins, Pará e Minas Gerais. Foram fiscalizadas oito carvoarias e 323 escravos libertados – quase 20% do total dos trabalhadores tirados da escravidão no país neste período”, informou.
Existem diferentes conceitos envolvidos na avaliação das condições de trabalho, para caracterizá-lo como degradante ou escravo, pelo Ministério e delegacias regionais do trabalho, da Organização Internacional do Trabalho, organizações não-governamentais e a Comissão Pastoral da Terra. São levadas em consideração as condições de proteção do trabalhador e seus equipamentos, a insalubridade local, alojamentos, alimentação, remuneração, carga horária de trabalho, documentação e pagamento de direitos trabalhistas, privação de liberdade, entre outros.