Vistos através das revistas turísticas o Jalapão é um paraíso perdido, uma espécie de Parque Krüeger brasileiro no qual é possível pegar um avião de São Paulo, Rio de Janeiro ou Brasília para fazer safáris fotográficos e divertir-se nas inusitadas dunas em meio ao cerrado, sempre no conforto do ar condicionado. A maior parte da viagem de carro – onze horas de Brasília, DF, até Ponte Alta do Tocantins, TO – parecem comprovar o que se publica: asfalto bom, cidades pequenas e paisagens maravilhosas. As coisas começam a mudar depois que o asfalto novo acaba, cerca de 40km antes da cidade.
Ponte Alta nos recebe por volta das nove da noite com poucas luzes, céu ameaçador e uma festa no clube da cidade que nos ia alentar o sono com "Éguinha Pocotó" e afins.
Depois de instalados na hospitaleira Pousada Planalto – única da cidade – fomos direto saciar a fome de um dia inteiro na carrocinha de cachorro-quente da praça central:
– Num dá para comer cachorro-quente, não, senhor, afirmou o dono do quiosque.
– Por quê?
– É que não encomendei o pão ao padeiro hoje de manhã e a farinha tem que chegar de Porto (Nacional, localizada a 136km de distância).
Assim fomos percebendo que os desafios locais estão muito além da imagem tranqüila de santuário ecológico. Ponte Alta, por exemplo, é conhecida como "Portal do Jalapão" e está cercada pelas atrações que transformaram a região num dos mais conhecidos destinos do turismo de aventura do Centro-Oeste brasileiro: dunas avermelhadas, veredas, cachoeiras, rios de impressionante força e beleza, trilhas para offroad, cenários selvagens.
A imensidão das dunas, principal cartão-postal do Jalapão, atrai visitantes de todo o Brasil. Foto: Fábio Pili
No entanto, poucas vezes as lentes dos visitantes focam outro lado da vida regional. Enquanto pacotes turísticos de três dias custam muito mais de R$ 1 mil, no Jalapão existem lavradores como Manuel Bomfim, que alimenta a família de dez pessoas com agricultura de subsistência e uma renda mensal que varia entre R$ 30,00 a R$ 50,00 – resultado de empreitadas em fazendas vizinhas.
Enquanto pacotes turísticos de três dias chegam a custar mais de mil reais, a família Santos ainda sobrevive da agricultura de subsistência. Foto: Fernando Zarur.
Do alto do caminhão, raros são os turistas que lembram o fato da região ser composta por remanescentes de quilombos ou que os moradores, pouco mais de quatro décadas atrás, precisavam andar até quatro dias a cavalo para comprar sal. Em geral, chegam já empacotados em tours inflexíveis, preocupados em registrar apenas araras e cachoeiras. Assim, o auxílio do turismo à economia local ainda é pouco, quase limitado à compra de artesanato.