Uma das principais ações do governo federal para 2005 ainda está no papel. Mas, se aprovada em todas as instâncias previstas por lei, promete ser uma das maiores obras de infra-estrutura realizadas na gestão do presidente Lula. Os números impressionam, e ainda são discutidos os possíveis benefícios que pode trazer a integração da bacia do rio São Francisco com outras seis bacias do norte nordestino.
No início do mês, durante a inauguração da nova área do aeroporto internacional de Petrolina (PE), o presidente afirmou que levar água para o Nordeste "não é um compromisso de presidente, mas de retirante nordestino", que em 1952, por falta de oportunidade, foi obrigado a deixar a região. Para cumprir esse "compromisso", o governo federal já reservou R$ 1,07 bilhão no orçamento de 2005 para o projeto de integração das bacias.
Na avaliação do governo, caso o projeto de integração seja aprovado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e obtido o aval do Congresso Nacional para o orçamento, as obras começam a partir de fevereiro. Ao todo, a construção de dois canais que, somados chegam a 720 km, com estações de bombeamento e mini-hidrelétricas no caminho, custará cerca de R$ 4,5 bilhões.
A primeira etapa do projeto tem conclusão prevista para 2006. Até lá, o ministério da Integração Nacional pretende convencer os brasileiros que o termo mais usado para transferência das águas, transposição, deve ser substituído por integração.
"Transposição significa que você está pegando uma parte importante do rio e levando para outro lugar. Na transposição do rio Tejo, em Portugal, 50% da vazão do rio foi retirada e transferida para a Espanha. No Colorado (EUA), retiraram 80% da vazão do rio para irrigação", conta o coordenador-geral do projeto de integração do São Francisco, Pedro Brito, ex-secretário de Fazenda do Ceará.
"No nosso caso, a palavra correta é integração, porque vamos retirar entre 1% e 3,5% da vazão regularizada a partir da Barragem de Sobradinho (porcentagem calculada com base na vazão 1.850 m³, ou seja, a vazão firme da foz, número importante para avaliar a interação entre rio e mar)."
Pelos cálculos do ministério da Integração Nacional, cerca de 15 milhões de pessoas devem ser beneficiadas pela integração. A água, levada por canais de concreto nos eixos norte e leste, deverá ser usada, prioritariamente, para consumo humano. Norma cumprida, o gestor do sistema deve avaliar a possibilidade de liberação da água para agricultores e industriais.
Visão Rota Brasil Oeste
A transposição do São Francisco é criticada por muitos especialistas como mais uma obra faraônica sem tanta repercussão social. O formato da transposição é apontado como centralizador e de pouco alcance social.
Segundo o secretário executivo do Movimento Organização Comunitária, organização não-governamental que trabalha no semi-árido, Nadilson Quintela, a transposição é um mito. "É um projeto velho, cheio de politicagem que não promove o uso difuso da água, reproduz uma idéia de crescimento, mas não de desenvolvimento social. Está centrada na grande irrigação e não na agricultura familiar, alimenta a concentração de riquezas", afirma.
Um proposta mais interessante e barata, por exemplo, seria a construção de cisternas de capitação de água da chuva. Uma cisterna, ao custo de R$1.470,00, garante o abastecimento de uma família de cinco pessoas durante 11 meses. Além de estimular a indústria de construção local, esta solução tem alcance maior no sertão e descentraliza a propriedade da água.