Brasília – O geógrafo Aziz Ab’Saber contribuiu para o conhecimento da história geoecológica do país ao buscar a relação do homem com o meio ambiente. Foi pioneiro também ao propor a empresários que colaborassem para reflorestar áreas de acordo com suas características. Hoje, suas idéias inovadoras, que antes causavam resistência quando Ab’Saber era jovem, são modelo para a geografia brasileira.
Em entrevista à Agência Brasil, o professor Aziz, presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e professor emérito do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), diz que "existe no sul do Pará um estado paralelo em que fazendeiros e madeireiros ditam as próprias regras", desmatando sem qualquer medo de serem repreendidos.
Ab’Saber avalia que o Ministério do Meio Ambiente está "enfraquecido" na defesa da Amazônia, ainda que tenha o poderoso instrumento tecnológico de observar a Terra a partir de satélites. "O mais importante é a capacidade de desenvolver ações em relação ao que está sendo observado", comenta ao analisar os índices de desmatamento da Amazônia.
Segundo levantamentos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados na semana passada, a Amazônia perdeu uma área de mais de 26 mil quilômetros quadrados de agosto de 2003 a agosto de 2004: um território quase do tamanho do estado de Alagoas.
Agência Brasil: Além de ser o segundo maior desmatamento já verificado na Amazônia, como o senhor avalia esse problema?
Aziz Ab’Saber: Não é só o problema do desmatamento da Amazônia que me preocupa. Uma série de fatos recentes demonstra uma espécie de estado paralelo formado por fazendeiros e madeireiros. Os fazendeiros fazem o que querem, desafiando o poder público. Dão um atestado de que eles estão tentando se isolar de qualquer presença do Estado. Além deles, tem também os madeireiros, que confabulam com os fazendeiros e compram as árvores que sobram à medida que as atividades dos primeiros avançam. Então, a situação é muito mais grave do que se pensa.
ABr: Tem ainda a questão das populações tradicionais, como os povos indígenas…
Ab’Saber: Quanto às populações tradicionais, o problema é muito sério. Enquanto os fazendeiros dominam tudo e causam medo nas populações tradicionais, como índios, eles vão fazendo tudo o que querem. Eu, pessoalmente, julgo que, no momento, está havendo um governo paralelo no centro-sul do Pará, sem que haja nenhuma atitude dos diversos níveis do governo Lula para traçar uma estratégia que evite isso.
ABr: E como o senhor vê a ação do governo diante desse quadro?
Ab’Saber: O Ministério do Meio Ambiente está totalmente enfraquecido e não tem condições de tomar atitudes corretas para defender a Amazônia. Poderia, por meio de um plano, programa ou projeto, organizar-se melhor no centro-sul do Pará e em outras áreas onde o desmatamento ainda tem esses outros fatores. O que, para nós, significa um problema muito sério, do ponto de vista da observação internacional. Lá nos Estados Unidos houve tempo em que eles diziam: "Os brasileiros não têm competência para gerenciar a Amazônia."E o problema é esse no momento.
ABr: O que imediatamente essa falta de gerenciamento provoca?
Ab’Saber: Essas dificuldades de gerenciamento dão então abertura para aqueles que estão de olho na Amazônia, não só pela floresta, mas pela água doce, pelos recursos minerais, pelas florestas que têm fármacos, uma série de produtos de importância econômica e social. E ainda pelo petróleo que foi descoberto no oeste da Amazônia, na Amazônia Ocidental. Ela, com seus 4,2 milhões de quilômetros quadrados de zona equatorial, é uma reserva de biodiversidade máxima do planeta Terra. E não pode ser colocada nas mãos de especuladores em função de uma invasão complicada do capitalismo.
Colaborou Lana Cristina