Brasília – Neste segundo trecho da entrevista à Agência Brasil, o geógrafo Aziz Ab‘Saber fala de experiências de uso racional da floresta e lamenta que o ministério do Meio Ambiente não as estimule. Ele afirma que o governo não ouve os especialistas antes de executar ações ou propor projetos.
Agência Brasil: Há alguma experiência internacional que poderia de servir como exemplo ao Brasil?
Ab’Saber: Não. É preciso usar as experiências que apareceram aqui e ali, da própria Amazônia. Por exemplo, na fronteira de Rondônia com o Acre, surgiu, em função da iniciativa de um ex-padre francês de origem rural, um novo projeto de uso das porções periféricas desmatadas, mas a partir do bordo não-desmatado da floresta. O bordo da floresta funciona como se fossem nossos cabelos, tem uma umidade que não se esgota com a rapidez das outras partes da floresta. Em função disso, esse ex-padre começou a executar um projeto de plantações no bordo da floresta, em direção ao lado já devastado. Ao mesmo tempo, ele tentou fazer uma espécie de corredores radiais, na área de sub-bosque da floresta para plantar açaí, castanheiras, abacaxis. Com essa gente da terra, plantaram-se espécies locais como pupunha, açaí e cupuaçu, e também mandioca, hortaliças e frutas para o consumo próprio. Eles usaram os métodos tradicionais de entrar na floresta para coletar ouriços de castanheiras, caídos no chão da floresta, o que não prejudica em nada. Não havia ação predatória. Eles entravam na mata por meio de trilhas pequenas, nas estradas das seringueiras e castanheiras. Esse esquema foi desenvolvido de forma cooperativa com a população local, tudo discutido numa igreja da cidadezinha de Nova Califórnia. O resultado é que em todos os bordos de florestas, que sofreram uma devastação grande, hoje têm um muro florestal.
ABr: Mas essas propostas não podem ser discutidas com o governo?
Ab’Saber: Mas quem do governo está preocupado com isso? O senhor Capobianco (João Paulo Capobianco, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente), a dona Marina Silva (ministra do Meio Ambiente) não adianta nem falar, eles não querem ouvir ninguém. Soube que um dia desses, fizeram uma reunião, para mandar para o Lula os sub-projetos (de gestão de florestas), e alguém disse: "Precisaríamos conversar um pouco com o professor Aziz Ab’Saber". Eu não sou vaidoso, mas achei interessante alguém dizer isso. E a resposta foi essa da dona Marina Silva, segundo me contaram: "Não dá tempo para convencer o professor Aziz."Então, eu paro aqui.
ABr: Então não há debate?
Ab’Saber: Sempre dizem que os projetos estão sendo baseados em vários debates com pessoas que conhecem as regiões. Não houve um projeto correto com cientistas, com gente que conhece o Nordeste Seco, Vale do São Francisco ou Amazônia. Não está havendo em relação às Flonas (Florestas Nacionais) nenhuma preocupação de ouvir terceiros.
Colaborou Lana Cristina