Agência UnB – Pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) estão à frente de um dos maiores estudos já feitos sobre o cerrado. Professores do Departamento de Ecologia da UnB, os doutores Mercedes Bustamente, Carlos Klink e Heloísa Miranda, além do doutor Roberto Ventura Santos, do Departamento de Geoquímica, estão analisando as transformações nesse tipo de vegetação (que cobre cerca de 22% do território nacional). As alterações decorrem principalmente do uso da terra, como queimadas e conversão de áreas nativas em pastagens ou em áreas agrícolas.
Um dos objetivos das pesquisas – realizadas em áreas ecológicas no Distrito Federal – é determinar a influência dessas mudanças no comportamento do gás carbônico (CO2) e de gases nitrogenados, como o óxido nitroso (N2O) e o óxido nítrico (NO). Esses gases estão presentes em grandes concentrações em solos de cerrado e, se liberados para a atmosfera, podem contribuir para o aumento do efeito estufa, que provoca o aquecimento global. Além disso, os professores esperam fornecer embasamento científico para a elaboração de políticas públicas e projetos de governo que visem à conservação ou a um melhor uso dos recursos naturais existentes.
Os estudos da UnB – que envolvem mais de 150 participantes entre alunos da graduação, mestrado e doutorado, além de mestres de várias disciplinas – concentram-se em três frentes: Heloísa Miranda trabalha desde 1989 com a ecologia do fogo e com os efeitos das queimadas sobre o cerrado. Segundo a professora, o fogo é uma realidade para o cerrado há pelos 32 mil anos, e cada fisionomia da vegetação tem uma resposta diferente a ele. Os pesquisadores realizam queimadas controladas nas três fisionomias básicas do ecossistema (campo sujo, sensu stricto e cerrado denso) em diferentes épocas do ano – no início da seca, durante a estiagem e no início do período de chuvas. Com isso a equipe coordenada por Heloísa Miranda busca levantar dados consistentes para um melhor manejo das queimadas na região.
Os professores Mercedes Bustamante e Roberto Ventura Santos enfocam o impacto das mudanças no uso da terra sobre os ciclos de carbono, de gases nitrogenados e de nutrientes em solos de cerrado. Abordam o comportamento desses gases no solo, bem como as reações das populações microbianas, que, assim como pequenos insetos, são bons indicadores para o entendimento de ecossistemas.
Já o professor Carlos Klink estuda os efeitos da seca no cerrado. Segundo Klink, estudos indicam que a região central do Brasil, daqui a algumas décadas, será mais seca do que é atualmente. Por isso, o professor pretende avaliar a reação do ecossistema atual a essa futura realidade. Para tanto, serão analisadas duas áreas de cerrado, cada uma com 400 metros quadrados. Em uma delas, serão mantidas todas as condições naturais, enquanto na outra será simulada uma seca, restringindo-se a quantidade de chuvas. Já foram instalados sensores de água e de dióxido de carbono (CO2), e foi construída uma estrutura de suporte à lona que cobrirá uma das áreas, simulando a seca. O projeto abrangerá estudos sobre plantas, flores, frutos, crescimento das árvores e raízes, gases no solo, absorção de água e fotossíntese, dentre outros fatores. Além disso o professor desenvolve ainda Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (Peld) no cerrado.
Os estudos dos professores da UnB ocorrem na Reserva Ecológica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nas áreas experimentais da Embrapa-Cerrados e na Estação Ecológica de Águas Emendadas.
As pesquisas sobre as alterações na flora microbianas e a simulação de seca ganham ainda maior relevância por estarem incluídas no Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA, na sigla em inglês), atualmente o maior programa de pesquisas científicas integradas sobre a região amazônica. O LBA conta com a participação de cerca de 40 organizações brasileiras, dentre universidades e institutos de pesquisa, 25 organizações de diversos países amazônicos, instituições dos Estados Unidos, como a Agência Espacial Norte-americana (Nasa), e de mais oito países europeus. O objetivo do programa é compreender o funcionamento dos ecossistemas naturais da Amazônia, além das mudanças ambientais e climáticas que vêm ocorrendo na região.
A inserção do cerrado no LBA justifica-se pelo fato de estar localizado em regiões fronteiriças da floresta amazônica, como uma área de transição entre ecossistemas. Além disso, essa vegetação tem sofrido, nas últimas décadas, grandes transformações relacionadas ao uso da terra e à ação humana. Estima-se que nos últimos 30 anos, 37% do cerrado original foram convertidos em áreas de pastagens, cultivo, assentamentos urbanos ou áreas devastadas.