ISA – Reunião sobre o relato do deputado federal Lindberg Farias (PT/RJ) que propõe a retalhação da TI Raposa Serra do Sol, cuja votação foi adiada para o dia 27/4, foi espaço de ofensa aos índios, chamados de “fedorentos e não educados” pelo parlamentar Jair Bolsonaro (PTB/RJ).
Alegando a necessidade de realizar novos debates sobre seu parecer, o deputado federal Lindberg Farias (PT/RJ), relator da comissão externa da Câmara dos Deputados instalada em fevereiro deste ano “para avaliar a demarcação da TI Raposa Serra do Sol (RR)” , iniciou a sessão realizada na quarta-feira (14/4) solicitando o adiamento da votação para o dia 27/4. O relatório do parlamentar propõe a exclusão de 12 mil hectares de terras griladas por arrozeiros; Uiramutã, base de apoio do garimpo transformada em município em 1997 ainda sub júdice; e uma faixa de terra de 15 quilômetros ao longo da faixa de fronteira com a Venezuela e Guiana da área a ser homologada.
Na seqüência, manifestou indignação em relação à morte de garimpeiros por índios Cinta Larga em Rondônia e, por conta do conflito e das declarações do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Gomes, (que nominou o relatório de Farias de “ET”), o deputado afirmou sua intenção de realizar uma investigação sobre as atividades da Funai, propondo, até mesmo, a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).
Farias reforçou ainda suas críticas à atitude da advogada indígena do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Joênia Wapichana, presente no plenário, por ter apresentado petição à Organização dos Estados da América (OEA) , denunciando o Estado brasileiro pelo descumprimento dos direitos indígenas. O deputado acusou a advogada do CIR, e a própria instituição, de não possuir “sentimento de brasilidade”. E, que por essa razão havia uma “falta de confiança em entregar ao CIR a Terra Indígena Raposa Serra do Sol”.
Com exceção de Eduardo Valverde (PT/RO), os parlamentares presentes à sessão manifestaram apoio ao relatório e às observações de Lindberg Farias, repetindo discursos relacionados à segurança nacional, aos interesses externos sobre a Amazônia e aos riscos de auto-determinação dos povos indígenas. Em defesa dos índios, Valverde enfatizou que, durante séculos, eles foram os responsáveis pela defesa das fronteiras do território brasileiro. Chamou a atenção ainda para a pluralidade cultural do país, principalmente, na Amazônia, ressaltando que ela deve ser tratada de maneira correta.
A grande ofensa aos povos indígenas aconteceu quando o deputado Jair Bolsonaro (PTB/RJ) mostrou repulsa em relação ao fato de que o Movimento dos Sem Terra (MST), “apesar de abonado e constituído por pessoas que falam a nossa língua e são educadas”, não consegue fazer a reforma agrária, enquanto “índios fedorentos, não educados e não falantes de nossa língua” conseguem possuir, hoje, 12% das terras brasileiras e fazer lobby no Congresso Nacional. Essa manifestação causou indignação em todo o plenário, principalmente entre os índios. Bolsonaro foi repreendido por Lindberg Farias e Moacir Micheletto (PMDB/PR), presidente da comissão externa.
Como o regimento interno da Câmara dos Deputados impede que o público se pronuncie em situações como essas, Joênia Wapichana solicitou ao deputado Valverde que fizesse a leitura de sua carta de repúdio à manifestação de Bolsonaro. “Sou brasileira, assim como os demais indígenas aqui presentes, descendentes dos primeiros habitantes do Brasil, os quais definiram o território brasileiro no Norte. Interesses particulares não poderão se sobrepor aos direitos coletivos! As comunidade indígenas têm o direito de buscar o que for de direito, porque o Brasil fez o compromisso de respeitar os direitos humanos. Trabalho para as comunidades indígenas porque elas possuem, ao seu favor, a Constituição Federal Brasileira e, infelizmente, nem todos a respeitam. Cumpram a Constituição Federal de 1988! Os povos indígenas têm sim muita educação, tanto que estão fazendo uma manifestação pacífica. Eles têm cheiro de terra, porque da terra é que vivem”, escreveu a advogada no documento.
Marília Oliveira
Instituto Sócio Ambiental