Estudo faz levantamento de espécies de palmeiras da Mata Atlântica

Ambiente Brasil – A promoção do desenvolvimento econômico sustentável em matas e florestas no país passa antes, obrigatoriamente, pela análise adequada dos recursos naturais existentes nelas. A realização de projetos que possibilitam levantar e dar subsídios para que isso aconteça é uma das mais importantes iniciativas para garantir a proteção ao meio ambiente.

Exemplo prático disso é a pesquisa realizada por professores e alunos da Universidade de Taubaté (Unitau). O grupo estuda há quase dois anos espécies de palmeiras existentes na encosta da Mata Atlântica, no município de Ubatuba, litoral norte paulista. O projeto integra o programa Biota, da Fapesp, que tem como característica inventariar a biodiversidade de São Paulo.

Além do levantamento da diversidade e da quantidade de espécies de palmeiras encontradas em diversas altitudes da encosta naquela região, o trabalho ainda estuda o solo e a umidade em que estas plantas vivem, além da característica e a morfologia de algumas espécies.

“São dados que depois de devidamente analisados poderão ser de grande relevância econômica para aqueles que aplicam em iniciativas de manejo de recursos florestais”, explica a coordenadora do projeto, Simey Thury Vieira Fisch.

Ela acrescenta que há poucos trabalhos no país voltados à pesquisa básica de espécies de plantas, como as palmeiras. “Pelo fato de termos ainda uma rica e extensa área verde remanescente, os estudos nesse campo são de extrema importância para definição de políticas de conservação e de uso desse potencial econômico baseados nos princípios da sustentabilidade”.

Para a população que habita em localidades com rica biodiversidade (no caso deste projeto do Biota, Ubatuba e cidades vizinhas), projetos de caracterização da floresta podem ser determinantes no envolvimento social, ambiental e econômico da comunidade. A conclusão de uma pesquisa pode decretar até a inviabilização econômica de uma espécie de planta. As palmeiras da Mata Atlântica, por exemplo, objeto de estudo de Simey, já tem sérias restrições porque boa parte está com a ocorrência restrita ao Parque Estadual da Serra do Mar, área de proteção ambiental.

Composto tóxico altera características de espécies marinhas

Agência Brasil – Nem sempre a população da região costeira do país pode aproveitar os ensolarados fins de semana no litoral, principalmente durante o verão. Isso porque é crescente a quantidade de praias consideradas impróprias para o banho devido à poluição de suas águas. O esgoto e o vazamento de combustíveis de embarcações não são, porém, os únicos responsáveis pela poluição oceânica.

Mesmo não sendo considerado um composto perigoso para os seres humanos, o tributilestanho (TBT), biocida usado em tintas antiincrustantes para cascos de navios e outras embarcações, é responsável por seqüelas em animais como golfinhos e moluscos. Os efeitos destas tintas venenosas em moluscos, especialmente os gastrópodos (caramujos, que no Nordeste são conhecidos como cambretas) são o foco da pesquisa realizada pelo oceanógrafo e professor adjunto da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Marcos Antônio Fernandez.

Segundo ele, por mais que o TBT seja eficiente como protetor de casco de embarcações, o seu grau de toxicidade em organismos marinhos é consideravelmente alto. “Devido a esta toxicidade, o uso do produto é restrito há 20 anos nos países do primeiro mundo. Além disso, o TBT deve ser banido do casco de navios até 2010 pela Imo (Organização Marítima Internacional)”, informa.

Contudo, destaca Fernandez, as novas tintas que substituirão o TBT também são tóxicas, e este problema ainda não foi devidamente pesquisado no país. A legislação nacional só agora deve restringir o uso de TBT (que é um antiincrustante de segunda geração), enquanto no exterior a de terceira geração já é restringida. “Temos, então, uns 15 anos, ou mais, de atraso”, alega o pesquisador.

Em invertebrados, como os gastrópodos, o TBT age como desregulador endócrino. Ou seja, este composto modifica o funcionamento das glândulas destes animais. A principal conseqüência da intoxicação em gastrópodos é o fenômeno conhecido como imposex (imposição sexual). “O imposex consiste no aparecimento de características sexuais masculinas, como pênis, em indivíduos do sexo feminino”, explica Fernandez. Este mau funcionamento do sistema endócrino faz com que fêmeas possam se tornar inférteis. “Logo, é muito possível que o número de indivíduos das populações atingidas comece a declinar”, acrescenta. De acordo com ele, há mais de 100 espécies de gastrópodos atingidas pelo imposex no mundo. No Brasil, até o momento, já foram encontradas seis espécies que apresentam a alteração, entre elas Leucozonia nassa, Olivaucillaria vesica e Snononita harinsona.

Informa o pesquisador que as regiões mais afetadas pelo TBT estão localizadas no Hemisfério Norte devido ao grande exercício da navegação nestes locais. “Podemos perceber esta relação inclusive no Brasil, pois as áreas mais atingidas estão entre o Sul e o Sudeste, onde há mais atividade marítima”, aponta. Em sua pesquisa, Fernandez focalizou a concentração do composto na Baía de Guanabara e a ocorrência de imposex em indivíduos da espécie Stramonita haemastoma, bastante comum em suas águas.

O professor expõe em sua tese de Doutorado que em todas as estações de observação estudadas onde houve a presença destes animais, “o fenômeno imposex foi detectado em maior ou menor grau”. Fernandez acrescenta que em estudos posteriores, com a participação de profissionais de outras universidades, foram encontrados casos de imposex na Baía de Sepetiba e em Arraial do Cabo. Além disso, diz que no Nordeste verificou-se casos de imposex em Fortaleza, Natal e Maceió.

Por se tratar de um composto bastante persistente em determinadas condições, e com capacidade de ser transferido para cadeias tróficas, o TBT também pode ser, em determinada escala, prejudicial à saúde humana. Algumas espécies de gastrópodos, inclusive, podem ser aproveitadas na nossa alimentação. Segundo Fernandez, nas décadas de 80 e 90, em vários países européus e nos Estados Unidos, foram realizadas várias pesquisas sobre os possíveis efeitos da intoxicação do TBT no homem.

Entretanto, só foram analisados indivíduos expostos ocupacionalmente ao composto, como os trabalhadores de estaleiros e portos. Para o professor, todavia, a pesquisa poderia ser mais abrangente. “Como o TBT atua como desregulador endócrino, as mulheres estão mais propensas aos seus efeitos, pois elas têm – além dos hormônios progesterona e estrogênio – a testosterona, que é um hormônio masculino. Logo, as modificações hormonais no corpo feminino, mesmo que ocorram em pequena escala, podem ser mais presentes do que nos masculinos. E estes estudos não foram realizados até hoje”, informa.

Plantas fossilizadas mostram a existência de geleiras no interior paulista

Agência Brasil – Numa tarde de setembro de 1999, a chilena Fresia Ricardi Branco encontrou uma pedra. Era sábado, dia de folga de suas aulas na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e a especialista em plantas fósseis, moradora da cidade de São Paulo, resolvera fazer uma incursão num território bastante familiar: a rodovia dos Bandeirantes, que liga a capital a Campinas, por onde passava três vezes por semana. Ao lado do marido, Fábio Branco, geólogo, decidiu vistoriar o afloramento acinzentado que, alguns dias antes, avistara rapidamente, mas não tivera tempo de explorar: uma formação rochosa de uns 50 metros de largura por 20 metros de altura que brotara das obras em curso no quilômetro 96 da estrada.

Formado por mais de 20 camadas de siltito, rocha sedimentar de fina granulação, o afloramento abrigava fartos vestígios de pequenos vegetais que se acumularam cerca de 310 milhões de anos atrás, talvez até antes. “Os fósseis eram tantos que não dava para não vê-los”, relembra Fresia. “Eram de uma vegetação rasteira, de um ambiente próximo a um glacial, semelhante à atual tundra do norte do Canadá e da Sibéria.” Foram provavelmente parte de um tapete verde, composto por musgos (briófitas) e licófitas de porte arbustivo (plantas eretas, de folhas sempre verdes dispostas de forma helicoidal sobre o caule), que revestia as porções de terra do interior paulista situadas entre as geleiras e o braço de mar que penetrava continente adentro.

Sim, havia glaciares a leste do estado de São Paulo e um mar interior a oeste ou sudoeste. A tundra primitiva diferia da atual em pelo menos um aspecto importante: não tinha grama. As angiospermas, plantas com flores, entre as quais se incluem as gramíneas,ainda não haviam surgido na Terra.

Nesse momento da história do planeta, por volta de 300 milhões de anos atrás, entre o final do período Carbonífero e início do Permiano, a geografia e o clima da Terra – e não, obviamente, apenas o de São Paulo – eram muito diferentes das condições atuais. A América do Sul, a África, a Antártica, a Índia e a Austrália estavam unidas num supercontinente austral, o Gondwana, e suas porções mais meridionais, tomadas por geleiras em grande medida, roçavam as latitudes polares.

Enquanto a América do Norte e a Europa estavam mais próximas do Equador e apresentavam um clima mais quente, o Hemisfério Sul vivia, entre 330 e 285 milhões de anos atrás, a sua penúltima grande Era do Gelo. A mais recente glaciação de grande porte, cujos efeitos mais diretos se concentraram no Hemisfério Norte, começou há 2 milhões de anos e terminou há apenas 10 ou 15 mil anos. Mas isso já é outra história.

A descoberta de remanescentes de um bioma semelhante à tundra contemporânea, em Campinas, ilustra bem os esforços feitos (e os resultados obtidos) por um grupo de pesquisadores de São Paulo que, durante quatro anos, saiu a campo em busca de fósseis de vegetais aprisionados em sedimentos oriundos da derradeira megaglaciação ocorrida em terras do Gondwana. Em sua procura por mais espécimes de plantas primitivas, os cientistas revisitaram localidades do interior em que já haviam sido exumados fósseis do período glacial, como Monte Mor, Itapeva e Cerquilho, e também identificaram outros afloramentos rochosos com vestígios de plantas da Idade do Gelo em outras cidades – casos de Salto, Tietê e Campinas.

O trabalho objetivava reconstituir a sucessão de floras, de formações vegetais, que prosperaram em São Paulo em meio às temperaturas freqüentemente negativas vigentes há aproximadamente 300 milhões de anos. “Além de fornecer informações sobre os tipos de plantas que um dia existiram, os fósseis de vegetais ajudam a entender as mudanças climáticas do passado”, diz a paleobotânica Mary Elizabeth Bernardes de Oliveira, da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Guarulhos (UnG), coordenadora do projeto financiado pela Fapesp.

Por que realizar o levantamento, do qual a chilena Fresia foi uma das executoras, apenas em São Paulo? A principal razão é de ordem científica. Em solo nacional, essa unidade da federação é a que tem o mais espesso – e temporalmente extenso – registro de sedimentos e fósseis da antiga Era do Gelo austral. Com idade estimada entre 310 e 285 milhões de anos, essas camadas de origem glacial pertencem à bacia do Paraná e receberam o nome de Subgrupo Itararé.

Dentro desse intervalo de tempo, a antiga tundra campineira parece representar a forma de vegetação mais antiga conservada pelos sedimentos glaciais do Itararé. Em outras três cidades, Monte Mor, Itapeva e Buri – cujos sítios paleobotânicos, conhecidos há décadas, foram novamente estudados -, os fósseis encontrados pela equipe de Mary Elizabeth indicam a existência de uma flora diferente e ligeiramente mais nova que a de Campinas. Sua idade é estimada entre 315 e 305 milhões de anos. Entre os vestígios petrificados recuperados pelos pesquisadores, havia sementes e frondes de pteridospermas (vegetais extintos aparentados das atuais samambaias), alguns pinheiros primitivos, folhas e ramos de licófitas e de esfenófitas (plantas que lembram bambus finos) e algumas pro-gimnospermas.

Quase tudo de porte arbustivo. Essas plantas fósseis devem ter constituído a flora de um clima mais para o frio ou temperado do que propriamente glacial, típica de uma fase em que as geleiras recuaram um pouco devido à elevação das temperaturas. “Nessas localidades, o Itararé fornece indícios de que houve uma fase interglacial”, comenta Mary Elizabeth.

Interglacial é o breve momento de clima mais quente que interrompe o frio quase polar reinante durante uma glaciação. É o fugaz “verão” de uma Idade do Gelo. Pode durar muitos milhares de anos, ou uns poucos milhões. Já a glaciação se prolonga por dezenas de milhões de anos, às vezes até mais de uma centena, sendo de tempos em tempos amenizada por fases interglaciais. Em Monte Mor, Itapeva e Buri, os sedimentos do Itararé incluem finas camadas de carvão resultantes de turfeiras – áreas pantanosas, de transbordamento de rios ou lagos, caracterizadas por intenso acúmulo de restos de vegetais em decomposição. Essa paisagem sedimentare seus fósseis vegetais são compatíveis com a ocorrência de um interglacial.

De acordo com as evidências levantadas pelo projeto, depois da vegetação temperada aprisionada na turfa, ressurge uma formação similar à tundra – um indício de que o frio deve ter se tornado agudo novamente e as geleiras voltaram a avançar sobre o continente. Era o retorno da Idade do Gelo. Esse tipo de registro foi encontrado no município de Salto, num afloramento que, a exemplo do sítio descoberto em Campinas, também veio à tona durante obras em uma estrada.

Nesse lugar, a hipótese de que ali um dia prosperou uma vegetação quase polar, composta fundamentalmente de musgos, ganhou mais força depois que os pesquisadores encontraram seixos de origem glacial associados aos finos sedimentos fossilíferos, acumulados num provável lago ou mar glacial. Os seixos foram liberados por icebergs, originados de geleiras, que flutuaram e se derreteram nesse corpo dágua. “A existência dos seixos junto aos finos sedimentos sugere que as briófitas não viveram muito longe das geleiras”, explica a paleobotânica Rosemarie Rohn Davies, do departamento de Geologia Aplicada da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Rio Claro, que descobriu o afloramento saltense com a aluna Márcia E. Longhim.

São raros os registros fósseis de vegetação do tipo tundra e os resgatados em Campinas e Salto estão, possivelmente, entre os mais antigos do Gondwana. Sem árvores e com seu subsolo permanentemente congelado, a monótona paisagem horizontal da tundra é o bioma mais frio que existe na Terra. Sua frágil vegetação, em geral musgos, com menos de 10 centímetros de altura e escassos caules anões lenhosos, raramente se conserva nas camadas de rocha. Isso explica a grande dificuldade em localizar musgos primitivos preservados em sedimentos glaciais. A identificação dos afloramentos nessas duas cidades, que possibilitou o resgate e o estudo científico das ocorrências de tundras primitivas, só aconteceu porque havia as pessoas certas nos lugares certos.

Explica-se: as obras nas rodovias fizeram aparecer apenas durante um breve período, algumas semanas, as rochas sedimentares com os vegetais fósseis. Se os pesquisadores não as tivessem visto, os restos de plantas do passado estariam, agora, de novo, soterrados. Os afloramentos acabaram sendo gramados ao término dos trabalhos de engenharia nas estradas.

Se a primitiva tundra fóssil de Salto lembra a de Campinas, até porque os sedimentos de ambos os locais parecem ser provenientes de períodos claramente glaciais, pelo menos uma das formas de plantas encontradas em Cerquilho e Tietê é bem diferente dos vegetais descobertos em outros sítios do Subgrupo Itararé. Nesses dois lugares, em meio a esfenófitas e pro-gimnospermas similares às de Monte Mor e Itapeva, aparecem restos de Glossopteridales, uma ordem extinta de plantas de porte arbóreo, com folhas em formato de espátula,que surgiu no início do período Permiano em terras do Gondwana. A presença dessa forma de vegetal, que se desenvolve em climas mais quentes, permite algumas ilações. Os sedimentos de Cerquilho e Tietê devem ser oriundos de uma fase em que as temperaturas se elevaram de novo. “Nesse momento, possivelmente houve um outro interglacial”, afirma Mary Elizabeth. Os pesquisadores estimam que as rochas desses afloramentos tenham uma idade aproximada de 290 milhões de anos.

Para Rosemarie, da Unesp, os exemplares de Glossopteridales resgatados às margens do rio Capivari, em Tietê, podem ser os mais antigos de todo o Gondwana. “Suas folhas apresentam indícios de serem mais primitivas do que as ocorrências desse tipo de vegetação descobertas no exterior e mesmo em Cerquilho”, diz Rosemarie. Sua teoria se apóia numa característica dos veios foliares das Glossopteridales achadas em Tietê. As folhas não têm um feixe vascular mediano muito desenvolvido, traço normalmente presente em espécimes mais “avançados” desse tipo de vegetal. As Glossopteridales são alvo de intenso debate científico porque seus descendentes, plantas do gênero Glossopteris , formaram a flora dominante em todo o Gondwana por 40 milhões de anos.

Tundra em Campinas há 310 milhões de anos. Depois, turfeiras (pântanos) em Monte Mor e Itapeva. Em seguida, tundra, de novo, em Salto. E, por fim, Glossopteridales em Tietê e Cerquilho, 290 milhões de anos atrás. Falando assim, parece que foi simples determinar a sucessão de floras ocorridas em São Paulo durante a Era do Gelo gonduânica. Na verdade, essa ordem é esquemática, didática, e não tem a pretensão de ser um retrato absolutamente fiel do passado. Algumas dessas floras podem ter coexistido no tempo. A tundra campineira, por exemplo, parece ser mais velha do que o pântano de Monte Mor. Mas isso não que dizer, necessariamente, que a segunda forma de vegetação é a sucessora direta da primeira. “Pode ter havido outros tipos de flora que não ficaram preservados nos sedimentos estudados ou que simplesmente ainda não conseguimos encontrar”, pondera Mary Elizabeth.

Para determinar, ainda que de forma relativamente incerta, a idade de cada afloramento do Itararé e enriquecer as informações sobre a sua respectiva flora, os cientistas se valeram muitas vezes da palinologia. Trata-se do estudo de fósseis de grãos de pólen, esporos e microalgas preservados nos sedimentos rochosos. Às vezes, tudo o que sobra num sítio paleontológico são esses três elementos, visto que, não raro, as partes maiores dos vegetais não resistem à ação do tempo. Seu tamanho é ínfimo: varia de 10 a 250 micra (0,01 a 0,25 milímetros). “Com os chamados fósseis-índices, que estão associados a períodos geológicos específicos, conseguimos estimar a idade de um pacote de sedimentos”, afirma o pesquisador Paulo Alves de Souza, que coordenou os estudos palinológicos do projeto e hoje leciona na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Uma das contribuições mais importantes das análises de Souza foi descobrir que a maior parte das camadas rochosas do subgrupo Itararé era mais velha do que se pensava. “Antes do projeto, pensávamos que a maioria de seus sedimentos era do período Permiano, com uma participação pequena de rochas do Carbonífero. Mas vimos que é justamente o contrário”, diz Souza. Isso quer dizer que a flora fóssil preservada em São Paulo no Itararé é mais velha do que se acreditava, sendo uma das mais antigas do Gondwana, o paleocontinente austral.

Educação ambiental é prioridade nos municípios mato-grossenses

Estação Vida – A Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM) estabeleceu o incentivo ao desenvolvimento da educação ambiental e à elaboração de políticas de meio ambiente nos municípios como uma das principais metas para este ano.

A parceria na elaboração do projeto “Amigos da Natureza” é uma das primeiras ações da entidade em 2004 para fomentar a educação ambiental nos municípios. O projeto tem como objetivo capacitar 1.200 ambientalistas dos 139 municípios de Mato Grosso, para que atuem como multiplicadores de informações sobre preservação ambiental e valorização de bens naturais.

A coordenação geral do projeto é do Instituto de Proteção do Meio Ambiente e dos Ecossistemas da Floresta, Cerrado e Pantanal. A execução da proposta está orçada em cerca de R$ 1 milhão e prevê a realização dos treinamentos nos principais pólos de Mato Grosso.

Procuradora defende homologação de Raposa-Serra do Sol

Agência Senado – Durante audiência pública realizada na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) nesta quinta-feira (05/02) a procuradora da república Débora Duprat afirmou que falta apenas a homologação do presidente da República para finalizar o processo de criação da reserva indígena Raposa-Serra do Sol, que ocupa quase dois milhões de hectares em Roraima. Na opinião de Débora Duprat, não cabe portanto mais discussão sobre a extensão das terras da reserva. A senadora Fátima Cleide (PT-RO) afirmou que a homologação da reserva deve ser feita neste fim de semana.

A procuradora Débora Duprat afirmou ainda que, diferente do que o governador de Roraima, Flamarion Portela, havia dito, não há aumento no território a ser demarcado, apenas o território voltou a ser o do projeto original, que havia sido diminuído pelo então ministro da Justiça Nelson Jobim. A Raposa-Serra do Sol abrigará as tribos macuxi, wapichana, ingarikó, taurepang e patamona e localiza-se na fronteira com a Venezuela e a Guiana.

– Há equívoco em imaginar que o momento da homologação é de discussão política. O território indígena é indisponível constitucionalmente e sua definição é antropológica – afirmou Débora Duprat.

A procuradora afirmou que existe um discurso sendo feito contra a homologação pleno de preconceito e discriminação, apontando os índios e as reservas como empecilho ao processo produtivo nacional. Na opinião da procuradora, quem faz esse discurso não conta com os índios como parte do estado e do processo de desenvolvimento.

– Temos um estereótipo arraigado do índio, condenando-o a uma selvageria que existe em poucas comunidades. É grande a incapacidade de ver o índio como brasileiro, participando do projeto nacional – afirmou.

Esse tipo de visão, disse a procuradora, é que gerou um grande movimento migratório em direção a Roraima. A senadora Fátima Cleide afirmou que muitas vezes a Amazônia é vista como um “deserto verde”, essas pessoas não percebem a riqueza que é a floresta em si nem dão valor a seus habitantes. O senador João Capiberibe (PSB-AP) lembrou que os índios solucionaram o problema de uso dos recursos naturais na Amazônia e que as tentativas de monocultura na região fracassaram, uma vez que o solo local não resiste a esse tipo de uso. A procuradora Débora Duprat afirmou ainda que não há ninguém melhor para defender as fronteiras do que as populações indígenas, porque vivem lá historicamente. “Desde a demarcação de território inanomami em área contínua nunca mais houve problemas nas fronteiras da região”, destacou.

Relatório sobre Raposa Serra do Sol fica pronto no dia 09/02

ISA – No que depender do relatório que o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) formado para analisar a situação fundiária de Roraima está elaborando, a homologação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol aguardará ainda pelo menos mais uma semana. A versão final, que tinha como prazo a última sexta-feira (30/1), sofreu um atraso devido à complexidade do tema, e deverá ser entregue apenas no final desta semana ou no começo da próxima. O documento norteará as decisões do Comitê de Viabilização Econômica de Roraima, criado para cuidar das questões mais práticas com relação à homologação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, como indenização, retirada e reassentamento de não-índios.

O GTI foi criado em julho e oficializado em setembro de 2003, com o objetivo de elaborar um diagnóstico e apresentar propostas em relação às terras da União situadas no estado, o que inclui a questão da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol. Em 24/1, a equipe esteve em Boa Vista (RR), ouvindo os diversos atores locais sobre a homologação (entidades indígenas e indigenistas, órgãos do governo, políticos e empresários, entre outros), e se encarregando de repassar suas demandas aos órgãos responsáveis.

“O texto do relatório está praticamente finalizado, faltam apenas alguns ajustes na redação”, diz o coordenador da equipe, o subchefe de coordenação e ação governamental da Casa Civil, Johaness Eck. Uma vez pronto, ele terá de passar pela aprovação dos ministérios que compõem o Grupo, para então ser liberado ao público e encaminhado ao Comitê de Viabilização Econômica de Roraima.

Esta segunda equipe foi criada em 9/1 pelo ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos depois dos conflitos que se instalaram na região no início de janeiro envolvendo índios e agricultores contrários à homologação contínua para analisar questões mais práticas com relação à homologação da Terra Indígena, como as que envolvem indenização e remoção de não-índios. Para isso, conta com representantes de seis ministérios (Justiça, Desenvolvimento Agrário, Integração Nacional, Planejamento, Casa Civil e Meio Ambiente), representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), do governo do Estado de Roraima e da Subchefia de Assuntos Federativos da Presidência da República.

De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério da Justiça, o relatório do Grupo Interministerial é importante, pois praticamente norteará as ações do Comitê de Viabilização Econômica. No ministério, o clima continua sendo de trabalhar “com o prazo até janeiro”, ou seja, a questão está sendo tratada como prioridade – embora se evite falar em prazos fixos. A homologação da Raposa/Serra do Sol em terras contínuas já está decidida desde o final do ano passado, tendo sido reiterada no começo do ano pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Em outras palavras: não está mais em discussão.

Flávio Soares de Freitas

Pernambuco reclama ausência de política regional para o biodiesel no Nordeste

Jornal da Ciência – O tema, segundo ele, é um assunto a ser discutido na reunião do Fórum dos Secretários de C&T do Nordeste, que será realizada no próximo dia 4, em Maceió.

Cláudio Marinho avalia que o cultivo de mamona para produção de biodiesel no Nordeste tem duplo benefício como um programa regional estratégico para o semi-árido. Além de reestruturar a economia sertaneja dando renda ao agricultor, o biodiesel tem contribuição a dar na definição de uma matriz energética de custo mais racional e sem danos ambientais.

Na crise energética, o país fez investimento em usinas termoelétricas a partir do diesel, que são extremamente poluidoras, disse o secretário.

Para ele, a política de desconcentração do ministério da C&T, que está sendo continuada, é meritória mas deve ser associada a um programa estratégico regional.

Como exemplo de política com articulação regional, Cláudio Marinho cita o programa da Rede Nordeste de Biotecnologia com R$ 2,7 milhões em edital lançado pelo Banco do Nordeste, propostos pelo secretário da C&T do Ceará, Hélio Barros. Os recursos seriam destinados ao Instituto do Semi-Árido. Por que não fazer a mesma coisa no caso do biodiesel?, indagou.

Segundo Cláudio Marinho, desconcentração sem uma discussão de política regional é um contra-senso. É uma esquizofrenia da política, afirmou.

O secretário de Pernambuco observa que a comunidade foi pega no contra-pé com a nova ilusão da Sudene desenhada por Tânia Barcelar com uma política de desenvolvimento regional moderna que levava em conta os espaços micro-regionais e visualizava os arranjos produtivos locais.

O secretário assinala que sabe do impacto da reforma fiscal na discussão sobre a nova Sudene, mas argumenta que a temática do desenvolvimento regional não pode ser tirada de pauta.

Diante de entraves institucionais, a desistência de Tânia Barcelar jogou um balde de água fria na esperança de ter uma nova política de desenvolvimento regional que chegasse perto da política de desenvolvimento de C&T, dos arranjos produtivos como foram propostos pelo ex-ministro, Ronaldo Sardenberg.

Marinho avalia que a desconcentração e os arranjos produtivos já fazem parte da agenda nacional. Todavia, argumenta que é necessário dar consistência na coordenação dos 11 arranjos produtivos numa estratégia de fortalecimento regional. Para ele, o MCT fez de forma competente os arranjos mas no lugar errado.

O secretário defende a condução dos arranjos pelo conjunto do governo, em especial do ministério com ação de Desenvolvimento.

É preciso dar consistência ao esforço dos estados e articular a política regional com a política nacional, afirma Marinho. Segundo ele, o Fórum dos secretários de C&T é uma instituição importante neste aspecto, mas acha que os estados se ressentem da ausência de uma agência concebida para dar um tratamento mais amplo para o tema.

Projeto visa produção de biodiesel de mamona para inclusão social em 10 estados

Está sendo pleiteado junto a cinco ministérios um projeto para incremento da produção de mamona, unidades de extração de óleo de mamona e de produção de biodiesel com este vegetal em todos os Estados do Nordeste e Espírito Santo.

Orçado em R$ 10 milhões – R$ 1 milhão para financiamento em cada Estado – o projeto foi entregue em cinco ministérios pelo deputado Ariosto Holanda (PSDB-CE), relator do programa Biodiesel do Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica da Câmara dos Deputados e pelo diretor-geral do Depto. Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), Eudoro Santana.

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, coordenador do grupo interministerial de 11 ministérios que elaborou o Programa Nacional de Biodiesel, recebeu o projeto de Ariosto Holanda, do deputado Roberto Pessoa (PL-CE), coordenador da bancada do Nordeste e do diretor-geral do Dnocs.

Na primeira semana de fevereiro, em dia a ser fixado, Ariosto fará uma exposição sobre o projeto O Biodiesel e a Inclusão Social no Semi-Árido Nordestino para o ministro Miguel Rosseto, da Reforma Agrária, que ao receber uma cópia resolveu discutir o assunto com sua equipe no Ministério, com ênfase no benefício social.

O projeto foi entregue também aos ministérios das Minas e Energia, Ministério da Integração Nacional, MCT e Ministério da Agricultura.

A autoria do projeto é do Dnocs, Fundação Núcleo de Tecnologia Industrial do Ceará (Nutec), Instituto Centro de Ensino Tecnológico (Centec), ambos vinculados à Secretaria da C&T do Ceará e pela Tecnologias Bioenergéticas (TecBio).

O programa Biodiesel e a Inclusão Social no Semi-Árido Nordestino deverá ser implementado pelo Ministério da Integração Nacional, via Dnocs, Ministério da Agricultura e Pecuária, MCT, Ministério da Reforma Agrária e Ministério das Minas e Energia com a Petrobras.

De acordo com o projeto, cada estado nordestino receberá incentivos para desenvolver uma área experimental de produção de sementes selecionadas de mamona com 450 hectares na altitude de 300 metros acima do nível do mar.

No Ceará, o cultivo será realizado na região da Chapada do Apodi, em Limoeiro do Norte e municípios vizinhos. Em cada área será feito o plantio com sementes e tubetes de mudas para estudo da produtividade. A produção em consórcio com o feijão será difundida como opção de renda, com objetivo de suprir a carência de sustentação da agricultura familiar.

Um dos membros da equipe que elaborou o projeto, Arquimedes Bastos, do Nutec, disse que será formalizado um convênio do Dnocs, vinculado ao Ministério da Integração Nacional, com os ministérios da Agricultura, da Ciência e Tecnologia e da Reforma Agrária para implementar a implantação das áreas de produção de mamona. Segundo ele, o plantio será realizado em áreas de sequeiro dos assentamentos do Dnocs.

Ariosto Holanda disse que cada unidade de produção de biodiesel terá capacidade para produção de 100 litros por hora.

O Instituto Centec vai entrar no programa na parte de capacitação e assistência técnica no interior, enquanto o Nutec com a Tecbio entram com a tecnologia de transformação do óleo de mamona em biodiesel, disse Arquimedes Bastos.

O projeto envolve toda a cadeia produtiva da mamona, do plantio de mudas à produção de combustível vegetal, e envolve todos os ministérios interessados na inclusão social com geração de renda, afirmou.

Flamínio Araripe

Governo lança novo Programa Nacional de Florestas nesta quinta

Ministério do Meio Ambiente – O presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva, e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, anunciam nesta quinta-feira (5), a partir das 10h30min, no Palácio do Planalto, uma série de medidas para estimular o setor florestal. O objetivo é incentivar o plantio de florestas e a recuperação de áreas degradadas. O presidente irá, ainda, instalar a Comissão Coordenadora do Programa Nacional de florestas (Conaflor), que tem como finalidade propor e avaliar medidas para o cumprimento dos princípios e diretrizes das políticas públicas do Setor Florestal.

A política florestal para o período 2004/2007 tem como fundamentos o estímulo ao manejo sustentável, o investimento em formação de mão-de-obra especializada em práticas de manejo, a criação de linhas de crédito específicas para o setor, mais recursos para o desenvolvimento de tecnologias adequadas, a regulamentação da concessão de terras públicas para manejo e fiscalização mais intensa e dirigida, com foco na Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga.

O Brasil, com cerca de 550 milhões de hectares, tem a segunda maior área florestal do planeta, atrás apenas da Rússia. As florestas brasileiras ocupam cerca de 50% do território e as cadeias de produção ligadas diretamente aos recursos florestais respondem por 4% do PIB nacional e por 8% das exportações. O setor florestal recolhe mais de R$ 3 bilhões em impostos a cada ano, gerando dois milhões de empregos diretos e indiretos.

As florestas brasileiras apresentam os maiores índices de biodiversidade e de ecossistemas, além da variedade de povos e de culturas indígenas. As matas garantem ainda a circulação da quinta parte de toda a água doce disponível no mundo. O Brasil possui uma das tecnologias mais avançadas do mundo para o desenvolvimento de florestas plantadas e recuperação de áreas degradadas. A Amazônia tem 70% das florestas, o Cerrados 17% e a Caatinga 6%. As florestas plantadas representam apenas 1% da área florestal do país.

Como se fabrica um pistoleiro

Agência Brasil – “A história da pistolagem no País se confunde com a história da “elite” brasileira – afirma a socióloga Peregrina Cavalcante, autora do livro Como se Fabrica um Pistoleiro, da editora A Girafa (SP), 254 páginas. A obra é resultado de dois anos e meio de pesquisas no interior do Maranhão, Piauí e Ceará. A professora do Departamento de Ciências Sociais da  Universidade Federal do Ceará precisou morar junto às comunidades onde existem pistoleiros para “sentir como as pessoas convivem com o fato e como se dão os crimes”. E foi com muito custo que ela ganhou a confiança para realizar o trabalho.

No livro, ela relata as “confissões” feitas por um padre e um juiz, ameaçados de morte, conta histórias de pistoleiros em ação e até de um delegado de polícia que conseguiu a façanha de levar um desses assassinos de aluguel a ser condenado. O delegado, que não quis identificar-se, classifica o “matador de gente” como uma pessoa “perigosa, traiçoeira, astuta e covarde”. O pistoleiro Miranda confirma no livro a frieza dos profissionais do ramo: “A gente vai é prá matar, não é prá brigar”, diz ele.

Ela explicou que a “exportação” e o intercâmbio de pistoleiros são prática comum, até por uma “questão de segurança para os envolvidos no processo”, a socióloga Peregrina Cavalcante conta que a profissão de “matador de gente” começa cedo. “Garotos, moradores das fazendas, desde muito jovens, aos 15 anos de idade, começam a treinar para se tornarem pistoleiros”.

O matador de gente 

Para a professora a imagem do pistoleiro, foi sendo construído historicamente, desde quando o Brasil foi colonizado, por exemplo, por meio do extermínio brutal dos índios. Ao falar dos tempos em que conviveu com os assassinos para escrever os livros e a tese, no Vale do Jaguaribe, Ceará , região famosa por ser uma “grande exportadora de pistoleiros”. Peregrina lembra que no local existe o chamado Riacho do Sangue, trágica lembrança de uma carnificina de indígenas.

Segundo ela, as comunidades que convivem com a “incômoda permanência” dos pistoleiros adaptaram-se à esta realidade. “Mesmo que os pistoleiros incomodem, que a convivência com eles seja uma coisa assustadora, a comunidade, na verdade, convive com a cultura da pistolagem. A cultura desses lugares é a de que todas as pessoas andem armadas. Um menino de 15 anos, por exemplo, geralmente passa pelo ritual em que o pai o presenteia com uma arma. De modo que, desde criança, ela é motivada ao uso da arma”, relata a socióloga.

Peregrina Cavalcante explica ainda que entender o papel da mulher na continuação da cultura da pistolagem foi muito importante para ela chegar a uma conclusão nos seus dois livros – “Matadores de Gente” e “Como se fabrica um Pistoleiro”. “A mulher é uma formadora de gente, ainda mais no caso da mãe que fala ao filho, por exemplo, que não volte para casa desonrado, depois de uma briga. Ela cria, assim, uma mentalidade errônea de honra e de família que não pode ser maculada e, se for, tem que ser respondida à altura”.

No livro, a socióloga faz um traço dos três tipos diferentes de pistoleiros – o tradicional, ligado a um dono; o bandido, com “práticas marginais múltiplas”, e o avulso, que é nômade e necessita do intermediário. Entre os três tipos, a autora diz que encontra um traço em comum, que é o fato deles todos “matarem por dinheiro e por vingança”. Peregrina cita as conclusões de um velho delegado de polícia que já conseguiu prender alguns pistoleiros na cadeia, que acabaram condenados, fato considerado raro. O delegado resume: “ A impunidade é a responsável pela permanência da pistolagem no país”.

Para o delegado, a impunidade ainda existe no Brasil do interior porque, geralmente, “o patrão do pistoleiro é influente na política regional , tanto que, logo após o assassinato, o pistoleiro é transferido por ele para outro Estado, de onde lhe é enviado, em troca, um pistoleiro novo, numa verdadeira rede do crime”.

Peregrina identificou, ainda, outro ponto em comum entre os pistoleiros. Em geral, o matador de gente é religioso, usa uma medalha milagrosa, geralmente de São Francisco das Chagas do Canindé, para manter o corpo “fechado”. Um pistoleiro famoso dá, no livro de Pelgrina, uma receita para manter o corpo fechado: começa por enterrar um gato vivo, com certos ingredientes para, dias depois, já apodrecidos, serem comidos acompanhados de uma oração.

No seu livro, a socióloga colhe o depoimento de um Juiz do interior, que lhe diz: “a pistolagem está entranhada na vida cotidiana das pessoas, das famílias e dos que ocupam os espaços do Poder, tanto que é comum , na minha frente, apresentarem seus empregados como sendo seguranças, de total confiança, quando destacam, com orgulho e abertamente, o detalhe do se eu mandar matar, ele mata.”

Outro personagem importante ouvido no “Como se fabrica um pistoleiro” é um padre do interior. Peregrina Cavalcante o chama de “pára-raio de todos os acontecimentos, embora não tome partido, até porque na hora da morte ele é o primeiro a ser chamado”. Padre José, 30 anos no Vale do Jaguaribe, Ceará, diz que “ hoje, não são apenas os fazendeiros os principais articuladores da pistolagem . Outros articuladores entraram em cena : empresários, prefeitos, deputados, secretários de Estado, etc”

O pistoleiro Miranda, ouvido no livro, resume o perfil psicológico do matador de aluguel: “olha, se o patrão chegar para mim e mandar matar o Papa, não me interessa o que o Papa fez, mas o Papa ia morrer”. O mesmo Miranda conta: “antes de atirar, sempre me benzo com a arma para tudo dar certo. Depois do serviço realizado, vou a uma igreja pedir perdão.”

O pistoleiro não é o único criminoso

“A presença de pistoleiros em fazendas com trabalho escravo infelizmente ainda é um fato e são eles que garantem a permanência dos trabalhadores nessas regiões distantes, na condição de presos, sem receber remuneração”. A afirmação é do Coordenador da Pastoral da Terra em Xinguara, no Sul do Pará, Frei Henry des Roziers, advogado de líderes sindicais rurais ameaçados de morte e também frei dominicano.

Ele já foi “condenado à morte”, mas agora diz que “graças a Deus, não estou mais recebendo ameaças de morte”. Frei Henry falou ao programa “Revista Amazônia”, da Rádio Nacional da Amazônia, sobre a questão da pistolagem no País. O Frei adverte que ainda existem, na região, “muitos líderes sindicais e agentes pastorais que continuam ameaçados de morte por conta do trabalho que desenvolvem a favor do ser humano menos favorecido”.Frei Henry lembra, no entanto, que não só o pistoleiro é o criminoso.

Para ele, “não é só a presença do pistoleiro que caracteriza e permite a permanência do trabalho escravo no Sul do Pará. Existem os fazendeiros reincidentes no trabalho escravo. Eles são infratores e criminosos”. Frei Henry comenta que a reincidência tem sido muito grande, apesar do trabalho que está sendo feito pela fiscalização do Ministério do trabalho. “Tudo bem que já conseguimos ver fazendeiro preso, devido à fiscalização, mas eles ficam presos por pouco tempo,” desabafa Roziers.

Ele já teve sua atuação elogiada em nota assinada por várias instituições, entre elas a Associação dos Juizes Federais do Brasil, a Organização Internacional do Trabalho e o Movimento dos Direitos Humanos. O frei consegue ter uma explicação, embora lamente, até para o fato de, muitas vezes, os fiscais do Trabalho encontrarem as mesmas pessoas que, pouco tempo antes, tinham sido libertadas de trabalho escravo, em outras fazendas.

Explica que “eles vieram de regiões muito pobres do Maranhão, Piauí e Tocantins, onde perderam suas terras, agora não têm para onde voltar e ainda enfrentam a falta de um emprego onde possam apenas sobreviver” . Por isso, ele acha que o caminho para o fim da violência, no caso do Sul do Pará, onde ele vive há mais de 20 anos, “tem que passar primeiro pelo emprego e depois pela reforma agrária, esta com o acompanhamento técnico e também do crédito para que possam produzir”.

Eduardo Mamcasz

PL da Biossegurança

ISA – O substitutivo do deputado Renildo Calheiros (PC do B/PE), atual relator do projeto de lei, deve ser apreciado e votado pela Comissão Especial de Biossegurança hoje e pelo plenário amanhã. Na semana passada, Calheiros discutiu o projeto com parlamentares durante três dias. Também esteve reunido com a ministra Marina Silva, para quem declarou que a negociação do PL “ainda estava aberta”.

Durante as reuniões da última semana, o deputado Renildo Calheiros recebeu manifestos de parlamentares e de ONGs ambientalistas em defesa do texto orginal do Projeto de Lei da Biossegurança, contrárias ao substitutivo apresentado pelo ex-relator Aldo Rebelo (PC do B/SP). Reuniu-se com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a quem teria declarado que a “negociações do PL estariam abertas”, de acordo com reportagem do jornal Folha de S.Paulo.

Na sexta-feira (30/1), Marina Silva manifestou-se a respeito do projeto de lei. “O esforço feito pelo governo – referindo-se ao texto orginal do PL de Biossegurança – é um esforço que viabiliza os interesses do país. Qualquer tentativa de remoção da legislação ambiental, no meu entendimento, levará para o que aconteceu anteriormente, que é a idéia da moratória branca. Anteriormente, tentou se passar por cima da legislação ambiental e foi tudo paralisado por ações na Justiça. Eu temo que ações semelhantes possam levar ao mesmo problema.”

Na mesma data, a ministra reuniu-se com o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ennio Candoti, e defendeu a participação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Secretaria Especial de Pesca, Anvisa e Ministério da Agricultura, na liberação comercial de transgênicos.

Candotti concordou que há necessidade de ajustes no substitutivo do ex-relator Aldo Rebelo em relação às atribuições da Comissão Ténica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Segundo ele, os pareceres da CTNBio devem ter caráter terminativo apenas para pesquisa científica, e a liberação comercial deve ser responsabilidade do governo.

Na última quarta-feira, o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, definiu como “aberração” o fato de a palavra final sobre a pesquisa de transgênicos ficar sob a responsabilidade da CTNBio e não dos Ministérios da Saúde, do Meio Ambiente e da Agricultura.

Um dos poucos pontos do substitutivo elogiados por Rossetto foi a criação de um fundo de financiamento de pesquisas em plantas utilizadas predominantemente por agricultores familiares e produtos e insumos usados por esses produtores e para realização de estudos de análise de risco dos organimos geneticamente modificados (OGMs) no meio ambiente e na saúde humana, com recursos de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE-OGM), a ser cobrada sobre o comércio e a importação de sementes e mudas transgênicas. Essa é justamente a proposta que a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag) pretende derrubar, de acordo com reportagem da Agência Carta Maior. A Fetag foi uma das instituições que reivindicou a prorrogação do prazo de comercialização da soja transgênica safra 2002/2003, medida atendida pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, na última quinta-feira (29/01). Os produtores ganharam quase mais um ano – até janeiro de 2005 – para comercializar o grão geneticamente modificado.

De acordo com o presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Biossegurança, deputado João Alfredo (PT/CE), Renildo Calheiros teria apenas afirmado que seu parecer agradará a todos os lados. “Se o que ele está dizendo, refere-se à flexibilização do projeto em relação à pesquisa – palavra final à CTNBio -, mantendo o que o texto original diz a respeito do licenciamento ambiental, estaremos satisfeitos”, afirmou João Alfredo.

Cristiane Fontes