Raposa Serra do Sol: um lugar de direito

Texto originalmente publicado no site Terra Magazine.terra.com.br

Como ministra do Meio Ambiente enfrentei, ao lado dos ministérios da Justiça e do Desenvolvimento Agrário, uma situação no Pará em que um grande grileiro apossou-se de 5 milhões de hectares na Terra do Meio. Conseguimos criar nessa área a maior estação ecológica do país, com 3 milhões e 800 mil hectares.

Vi a Polícia Federal implodir 86 pistas clandestinas usadas para tráfico de drogas e roubo de madeira. E nunca ninguém disse que aquele grileiro era ameaça à soberania nacional.

Mas os 18 mil índios de Roraima são assim considerados por alguns e muitas vezes tratados como se fossem mais estrangeiros do que os estrangeiros, porque sequer são reconhecidos como seres humanos em pé de igualdade com os demais.

Também é especial por acontecer num momento novo, no Brasil e no mundo, que exige conhecimento, sensibilidade e intuição para identificar, na massa impressionante de informações que nos chega, a profundidade dos fatos e processos, a conexão entre passado e futuro, enfim, o nosso espaço de escolhas reais, sejam individuais ou coletivas.

Faz parte desse espaço uma interpelação ética da qual não podem fugir nem os países desenvolvidos nem os em desenvolvimento, entre eles o Brasil. A Amazônia, com sua incomparável floresta tropical, sua biodiversidade e sua diversidade social, talvez seja o maior símbolo dessa interpelação.

Para os países desenvolvidos, a pergunta que se faz é sobre seu passado. Destruíram sua biodiversidade, arrasaram os povos originários dos lugares conquistados e provocaram, a partir da revolução industrial, alterações ambientais tão extensas que levaram à atual crise ambiental global, em cujo centro estão as mudanças climáticas.

Embora pareça paradoxal, nossa situação é bem melhor porque somos questionados sobre o futuro. Quando somos perguntados sobre o passado, estamos diante do quase irremediável.

Sobre o futuro, temos a chance de projetá-lo. Isso implica dizer o que vamos fazer com nossa biodiversidade, porque temos 20% das espécies vivas do planeta; com nossos recursos hídricos, porque temos 11% da água doce disponível, 80% dos quais na Amazônia; com a maior floresta tropical e com a maior diversidade cultural do mundo. O Brasil ainda tem cerca de 220 povos indígenas que falam mais de 200 línguas.

Essa é uma poderosa interpelação porque permite escolhas e, portanto, exige que estejamos à altura da oportunidade de optar. A discussão é de caráter civilizatório, não se esgota em circunstâncias ou polêmicas pontuais.

O Brasil é uma potência ambiental e humana e não pode se conformar em querer, séculos depois, a mesma trajetória que fez dos países desenvolvidos, ricos, porém com graves desequilíbrios ambientais. Nossa meta deve ser: desenvolvidos, porém por meio de caminhos diferentes.

A diferença está, em primeiro lugar, em aceitar a interpelação ética a que me referi, sem tentar lhe dar respostas banais e evasivas. A falsa polêmica em torno da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, resume a radicalidade exigida por essa interpelação.

Um exemplo: o mundo ocidental tem em Jerusalém um ponto de referência do sagrado para inúmeras religiões de matriz judaico-cristã. Ficaríamos chocados se alguém quisesse destruí-la e a defenderíamos como algo que é constituinte essencial de nossa cosmovisão. No entanto, em relação à cosmovisão dos índios, acha-se pouco relevante considerarem o Monte Roraima o lugar da origem do mundo.

Pode parecer, para quem acompanha o caso de Raposa Serra do Sol, que a criação da reserva indígena foi um procedimento autoritário e injusto, que desconsiderou direitos dos não-índios. Não é verdade.

A legislação brasileira define detalhadamente critérios para demarcação. O contraditório é garantido por decreto, exigindo que sejam anexados, ouvidos e examinados os argumentos contrários.

Manifestam-se proprietários de terra, grileiros, associações, sindicatos de trabalhadores ou patronais, prefeituras, órgãos públicos estaduais e federais, apresentando tudo o que considerem relevante. Por isso, a demarcação física das áreas leva, em geral, muitos anos, o que elimina quaisquer possibilidades de açodamento.

Roraima tem cerca de 400 mil habitantes num território de cerca de 225 mil quilômetros quadrados. A população rural não chega a 90 mil pessoas, das quais 46 mil são indígenas, ou seja, 52% do total, ocupando 47% das terras. Raposa Serra do Sol ocupa 7,7% da área do Estado e abriga 18 mil índios.

Por outro lado, seis rizicultores ocupam 14 mil hectares em terras da União. Em maio último, o Ibama autuou a fazenda Depósito, do prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, por ter aterrado duas lagoas e nascentes, além de margens de rios, e por ter desmatado áreas destinadas à preservação permanente e à reserva natural legal.

Em 1992, quando foi homologada a reserva Ianomami, seis vezes maior do que a Raposa Serra do Sol, houve muito estardalhaço, alimentado pela acusação de que isso representaria ameaça à soberania nacional e grave risco de internacionalização da Amazônia.

Passados 16 anos, a reserva abriga 15 mil índios em área de fronteira e não se tem notícia de que tenham causado qualquer dano à nossa soberania e muito menos que pretendam ser uma "nação indígena" separada do território brasileiro, como diziam à época os opositores da homologação.

Estamos perto da decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a demarcação contínua de Raposa Serra do Sol. Será um grande desafio para a instituição e para todo o País, num momento que o mestre Boaventura de Souza Santos chama de bifurcação histórica. Diz ele que as decisões do STF condicionarão decisivamente o futuro do país, para o bem ou para o mal. Que esta decisão seja parte da resposta que devemos dar à interpelação ética sobre nosso futuro.

Marina Silva é professora secundária de História, senadora pelo PT do Acre e ex-ministra do Meio Ambiente.

Demarcação de terras indígenas não é incompatível com soberania, afirma Jobim

A demarcação de terras indígenas não é incompatível com a soberania nacional. Foi o que afirmou hoje (4) o ministro da Defesa, Nelson Jobim, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados.

“Evidentemente que terra indígena não está imune à penetração dos militares. Isso está em decreto do presidente Fernando Henrique Cardoso.”

Segundo o ministro, uma reserva indígena “não é uma zona de exclusão de brasileiros, é uma zona de integração”.

Em referência à Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR), Jobim afirmou que um dos pontos que devem ser decididos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do caso é o regime jurídico das reservas indígenas. O Supremo analisa várias ações que questionam a demarcação da reserva em área contínua, conforme prevê o decreto de homologação, de 2005.

“É fundamental que [o STF] defina o regime jurídico sobre essas terras [indígenas], está na Constituição, são terras da União afetadas ao usufruto indígena.”

Ainda sobre a demarcação da Raposa Serra do Sol, o ministro disse que “o que nos resta é aguardar a manifestação do Supremo”.

ONG usa Google para mostrar área a ser inundada pela hidrelétrica de Pai Querê

A área de vegetação nativa que será alagada pela construção
da Usina Hidrelétrica de Pai Querê está na internet. Trata-se de uma mídia
disponibilizada pela ONG catarinense Apremavi no Google Earth e que pode
ser acessada por qualquer pessoa que tiver acesso à internet. O mapa indica
também a área do reservatório e o lago projetado pela usina, na verdade uma
camada (layer) que pode ser desativada ou ativada pelo internauta. “Agora é
possível visualizar, por meio de imagens de satélite, as florestas às margens
do Rio Pelotas que serão inundadas, caso a hidrelétrica seja construída”,
explica Philipp Stumpe, consultor da Sociedade de Proteção a Vida Selvagem
(SPVS) e colaborador da Apremavi.

Navegando na internet, explica ele, o internauta pode aproximar ou afastar a
imagem, visualizar a exata localização geográfica da barragem que se pretende
construir e o lago que será formado. “Até fotos e outras informações
específicas podem ser acessadas numa mesma imagem”, comenta Philipp. Também é
possível ver as principais cidades, rios e estradas e ganhar um melhor
entendimento do que se irá perder. Aproximando a imagem é possível visualizar
até as copas das araucárias e outras árvores. “As últimas que restaram, de um
importante ecossistema, afluente do Rio Uruguai, hoje quase todo represado”,
lamenta.

Sobre a usina

A usina prevista para o Rio Pelotas é uma das prioridades do Plano de
Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal e está em processo de
licenciamento pelo Ibama. Contrariando a decisão do governo federal, o
Ministério do Meio Ambiente, no entanto, tem outros planos
para a região onde
já funciona a polêmica hidrelétrica de Barra Grande, de criar uma Unidade de
Conservação Refúgio da Vida Silvestre, contemplando quase 300 mil hectares em
11 municípios catarinenses e três do Rio Grande do Sul. Com a medida, de
difícil implantação porque sofre resistência dos prefeitos e lideranças
políticas e empresariais locais
, é de minimizar os impactos de Barra Grande.

SOS Pelotas

O ambientalista Philipp Stumpe ressalta que somente a criação da UC poderá
impedir a construção da UHE Pai Querê. Para saber mais sobre a campanha
desenvolvida pela Apremavi para a criação da UC, a ONG disponibiliza um abaixo-assinado.

 

Bird aponta que licenciamento ambiental no Brasil é eficaz mas demorado

São Paulo – Estudo do Banco Mundial (Bird) que será divulgado na noite de hoje (3) mostra que os licenciamentos ambientais realizados no país são eficazes, ou seja, cumprem o papel de evitar impactos ambientais ou sociais negativos de grande proporção. No entanto, o documento aponta que o processo para a obtenção dos licenciamentos é excessivamente demorado.

De acordo com Garo Batmanian, um dos autores da pesquisa, o estudo Licenciamento Ambiental de Empreendimentos Hidrelétricos no Brasil: Uma contribuição para o Debate foi realizado com dados colhidos até o ano de 2005. A pesquisa indica que entre as razões da demora estão a falta de clareza da Constituição em definir o papel dos municípios, estados e da federação no licenciamento o que gera entraves judiciais e paralisação do processo.

A falta de agilidade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em fornecer aos empreendedores o termo de referência – documento que elenca os dados sobre impacto ambiental necessários para liberação da obra – também é apontado como problema.

A pesquisa mostra ainda que as análises e discussões com a sociedade dos impactos ambientais e sociais das construções são feitas de forma específica para cada uma das obras, desconsiderando o impacto do conjunto de várias construções nas bacias.

O Bird ainda afirma que os empreendedores apresentam relatórios deficitários sobre os impactos das construções, o que aumenta o tempo para a execução do processo de licenciamento.

Marina Silva reassume no Senado e defende combate ao desmatamento na Amazônia

Brasília – Afastada do Senado desde 2003, quando assumiu o Ministério do Meio Ambiente no primeiro mandato do presidente do Lula, Marina Silva (PT-AC) reassumiu hoje (3) sua vaga. Na sua primeira entrevista coletiva como senadora, ela defendeu as políticas ambientais implementadas durante sua gestão no Ministério do Meio Ambiente.

"Desde setembro do ano passado que nós identificamos que estava tendo uma tendência do desmatamento", revelou a senadora. Ela destacou algumas das medidas adotadas desde o ano passado pelo governo federal, como o embargo das áreas desmatadas e a divulgação da lista dos principais contraventores.

Ontem (2), o novo ministro da pasta, Carlos Minc, divulgou o último relatório do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que mostra o aumento da área desmatada na Amazônia. "O que aconteceu ontem só reafima o quanto as medidas estão corretas e acertadas", disse a senadora.

De acordo com Marina, o Executivo deve dar, agora, andamento a implementação dessas providências para fazer frente a três questões preocupantes: o aumento dos preços das commodities,  a estiagem, que foi prolongada na região, e a falta de comprometimento com a preservação da Amazônia durante o período eleitoral..

Segundo a senadora do PT, no período eleitoral "há uma dificuldade da parte de alguns estados em fazer parceria com a Polícia Federal e o Ibama (Instituto Brasileiro e Meio Ambiente e Recursos Renováveis)". Ela citou, especialmente, o Mato Grosso e Rondônia.

Ainda de acordo com Marina, esses estados não teriam dado "a devida proteção", pela Polícia Militar, às equipes de fiscalização do Ibama. "No lugar de ficar questionando as medidas, como tem feito o governo do estado do Mato Grosso, há que se somar força para dois movimentos: a implementação das ações ao desmatamento e o apoio as medidas a Operação Arco Verde."

Essa operação reúne uma série de ações de desenvolvimento sustentável e disponibiliza R$ 1 bilhão para recuperação de áreas degradadas. 

Mato Grosso foi responsável por 70% do desmatamento da Amazônia em abril, diz Inpe

Brasília – O Instituto Nacional de Pesquisas Espacias (Inpe) informou hoje (2) que 1.123 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica sofreram corte raso ou degradação progressiva durante o último mês de abril.

Desse total, 794 quilômetros quadrados foram devastados somente no estado do Mato Grosso. Os dados foram colhidos pelo sistema Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter).

Em março, o mesmo sistema havia registrado destruição de 112 quilômetros quadrados de floresta no estado do Centro-Oeste, mas naquele mês 69% do Mato Grosso não pôde ser observado pelos satélites, por causa da presença de nuvens. Em abril, a visibilidade aumentou, pois apenas 14% do estado permaneceu encoberto.  

O segundo estado em área desmatada no mês de abril foi Roraima, com 284,8 quilômetros quadrados com corte raso ou degradação, seguido por Rondônia, com 34,6 quilômetros quadrados devastados no último mês.

Neste último, a cobertura de nuvens que cobria 96% da área do estado em março, quando ele sequer apareceu entre os cinco com a maior área desmatada, caiu para 5% em abril.

O Deter apura apenas desmatamentos com área maior que 25 hectares, por conta da resolução dos sensores espaciais. Entretanto, devido à cobertura de nuvens, nem todos os desmatamentos maiores que 25 hectares são identificados pelo sistema. 

Santa Catarina bate recorde de desmatamento

Esta é a semana da Mata Atlântica. O Bioma Mata Atlântica é considerado Patrimônio Nacional pela Constituição Federal. É um dos Biomas mais ricos em biodiversidade e ao mesmo tempo, o segundo mais ameaçado de extinção do mundo, perdendo apenas para as quase extintas florestas da ilha de Madagascar na costa da África.

O Bioma Mata Atlântica abrange 17 Estados brasileiros e cerca de 120 milhões de pessoas vivem na sua área de domínio. A qualidade de vida dessa população depende da preservação dos remanescentes, que regulam o fluxo dos mananciais de água, ajudando a regular o clima, a temperatura, a umidade e as chuvas. Atualmente, a Mata Atlântica está reduzida a 7,84% de sua área, com cerca de 102.000 Km2 preservados. Mesmo reduzida ainda abriga mais de 20 mil espécies de plantas. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), o índice ideal para a manutenção da qualidade de vida humana, é 30 a 35%.

A Mata Atlântica abriga várias bacias hidrográficas formadas por grandes rios como o Paraná, Tietê, São Francisco, Paraíba do Sul, Paranapanema e o Ribeira de Iguape. Estima-se que mais de 100 milhões de brasileiros se beneficiam das águas que nascem na Mata Atlântica e que irão formar diversos rios que abastecem as cidades e metrópoles brasileiras.

Mais especificamente no Estado de Santa Catarina, onde originalmente tínhamos 85% do território coberto pela Mata Atlântica, hoje temos apenas 17,4% dessa área original. O Estado de Santa Catarina ocupa apenas 1% do território brasileiro.

Mesmo diante deste cenário alarmante, no dia da Mata Atlântica, 27 de maio, a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgaram dados ainda mais críticos. Além de ser o Estado que mais desmatou entre 2000 e 2005, SC tem os três líderes na contagem de municípios que perderam a sua cobertura florestal: Mafra, Itaiópolis e Santa Cecília.

Em Mafra foram derrubados 1,7 mil hectares, Itaiópolis 1,1 mil e Santa Cecília mil hectares. Só em Santa Catarina, foram derrubados 45,5 mil hectares de Mata Atlântica. Além desses dados, Santa Catarina, foi um dos Estados que contrariou a tendência nacional de diminuição no desmatamento.

Desde o início, a Mata Atlântica tem fascinado cientistas que com suas pesquisas ajudam a divulgar não só a sua importância, mas também sua beleza. É esse fascínio que faz com que felizmente existam muitas pessoas lutando por este Bioma tão ameaçado.

A luta pela preservação da Mata Atlântica sempre incluiu a busca de uma legislação eficiente para sua proteção, desde o capítulo do meio ambiente da Constituição em 1988, o advento do Decreto 750 de 1993, até a aprovação da Lei em 2006, passando também por muitas resoluções do CONAMA.

É consenso mundial que a forma mais efetiva de conservar a biodiversidade é a criação de Unidades de Conservação. Isto indica a importância de um esforço imediato de proteção à áreas bem conservadas que ainda existem no Bioma. Atualmente, apenas cerca de 3% da área do Bioma estão protegidos em Unidades de Conservação de proteção integral. Essa realidade, é uma das principais necessidades para a conservação da Mata Atlântica, a longo prazo.

O futuro da Mata Atlântica depende da preservação de seus remanescentes e de ações de recuperação de áreas degradadas, principalmente para interligar os fragmentos e permitir o fluxo gênico de fauna e flora.

Por mais que a população esteja informada sobre a existência do Bioma, sua biodiversidade e beleza cênica, ainda falta clareza sobre a importância desta floresta para a manutenção da qualidade de vida das pessoas e a sobrevivência das cidades onde vivem.

Todos somos beneficiados pela Mata Atlântica, portanto, cada um de nós tem a responsabilidade de ajudar a preservar este Bioma, para garantir a qualidade de vida da atual e das futuras gerações.

Tradições indígenas sustentam demarcação em área contínua, defende AGU

Estudos realizados durante o processo de demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol mostram que os hábitos culturais das etnias da região – como o ritual de casamento entre aldeias e a movimentação nômade para o plantio de alimentos – sustentam a necessidade de a terra ser demarcada em área contínua. É o que afirma o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli.

“Eles [os índios] plantam em determinada área, ficam com suas aldeias em determinada área e depois migram para áreas vizinhas. Não tem como se estabelecer uma forma de demarcação em ilhas porque esses índios têm uma mobilidade do ponto de vista da sua agricultura.”

Ao participar de entrevista a emissoras de rádio no estúdio da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em Brasília, Toffoli ressaltou que a Constituição brasileira não prevê “nações indígenas” ou “territórios indígenas” mas “áreas indígenas”, de propriedade da União. "Não se está dando propriedade aos índios. O que se está dando é o usufruto dessas áreas pela demarcação.”

Quanto à possibilidade de a demarcação em área contínua comprometer as atividades do Exército na região, o magistrado considerou “contra-senso” que um órgão do Estado brasileiro não possa entrar numa uma área de propriedade da União. “É preciso disciplinar essa ação e isso já é feito.”

Segundo o ministro, diversas áreas indígenas no Brasil já abrigam quartéis e brigadas das Forças Armadas e, na Amazônia, quase 80% dos soldados são descendentes de índios.

“O fato de os índios estarem integrados à sociedade não tira deles o direito do usufruto das áreas historicamente ocupadas. Temos que acabar com essa história de que existem brasileiros e existem índios. Todos somos brasileiros. A presença dos índios é uma das causas de nossas fronteiras terem o tamanho que têm hoje.”

Toffoli lembrou ainda que dos 300 fazendeiros com propriedades na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, 294 foram indenizados e retirados da área e que a exceção de seis fazendeiros – todos produtores de arroz – não pode ser suficiente para modificar ou anular a demarcação.

“O Estado brasileiro não pode ficar em uma posição de ceder a seis pessoas por questões particulares de investimento e de interesse, até porque esses investimentos estão sendo indenizados e pagos pelo Estado para que eles deixem aquela área.”

Participantes de encontro rejeitam hidrelétricas e apresentam plano para Bacia do Xingu

Em carta divulgada hoje (26), os participantes do Encontro Xingu Vivo para Sempre se dizem contrários à construção de hidrelétricas ao longo do Rio Xingu e exigem a implementação de um projeto de desenvolvimento composto de 12 tópicos.

O encontro realizado entre os dias 19 a 23 de maio, em Altamira (PA), reuniu índios, ribeirinhos e organizações da sociedade civil para discutir os empreendimentos hidrelétricos previstos para o Rio Xingu. Durante o evento, o engenheiro da Eletrobrás Paulo Fernando Rezende foi esfaqueado por índios Caiapó após palestrar sobre o projeto da hidrelétrica de Belo Monte.

No documento apresentado hoje (26), os participantes do encontro se manifestam contra qualquer tipo de barragem ao longo do Rio Xingu. “Não admitiremos a construção de barragens no Xingu e seus afluentes, grandes ou pequenas”, declaram.

Sobre a usina de Belo Monte, um dos principais projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o documento afirma que “interromper o Xingu em sua Volta Grande causará enchentes permanentes acima da usina, deslocando milhares de famílias ribeirinhas e moradores e moradoras da cidade de Altamira, afetando a agricultura, o extrativismo e a biodiversidade, e encobrindo nossas praias”.

Já a respeito das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) os responsáveis pela carta alegam que “algumas já foram construídas, outras já estão autorizadas e até hoje não houve qualquer tipo de avaliação dos impactos que esse conjunto de obras causará aos 14 povos indígenas do Parque Indígena do Xingu”.

Os participantes do encontro se declaram "conhecedores do Rio Xingu" e exigem a implementação de 12 propostas descritas ao longo do texto. Segundo eles, as sugestões fazem parte do modelo de desenvolvimento ideal para a Bacia do Xingu.

Entre os que assinam a carta estão a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Instituto Sócio-Ambiental (ISA), a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), além de vários índios das etnias Caiapó e Xikrin.

As propostas apresentadas pela carta são:

1. A criação de um fórum de articulação dos povos da bacia que permita uma conversa permanente sobre o futuro do rio e que possa caminhar para a criação de um Comitê de Gestão de Bacia do Xingu;

2. A consolidação e proteção efetiva das Unidades de Conservação e Terras Indígenas bem como o ordenamento fundiário de todas as terras públicas da região da Bacia do Xingu;

3. A imediata criação da Reserva Extrativista do Médio Xingu;

4. A imediata demarcação da Terra Indígena (TI) Cachoeira Seca, com o assentamento digno dos ocupantes não-indígenas, bem como a retiradas dos invasores da TI Parakanã;

5. A implementação de medidas que efetivamente acabem com o desmatamento, com a retirada de madeira ilegal e com a grilagem de terras;

6. O incremento de políticas públicas que incentivem o extrativismo e a consolidação da agricultura familiar feita em bases agroecológicas e que valorizem e estimulem a comercialização dos produtos da floresta;

7. Efetivação de políticas públicas capazes de promover a melhoria e instalação de sistemas de tratamento de água e esgoto nos municípios;

8. O incremento de políticas públicas que atendam as demandas de saúde, educação, transporte, segurança adequadas às nossas realidades;

9. Desenvolvimento de políticas públicas que ampliem e democratizem os meios de comunicação social;

10. O incremento de políticas públicas para a ampliação das experiências de recuperação de matas ciliares e de áreas degradadas pela agropecuária, extração de madeira e mineração;

11. Que nenhum outro dos formadores do Xingu venha a ser barrado, como já aconteceu ao Rio Culuene com a implantação da PCH Paranatinga 2;

12. Proteção efetiva do grande corredor de sócio-biodiversidade formado pelas terras indígenas e unidades de conservação do Xingu.

Liderado por Mato Grosso, desmatamento volta a subir na Amazônia, afirma Minc

Rio de Janeiro – Um novo estudo que será divulgado na próxima segunda-feira (26) pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) constata que o desmatamento voltou a subir na Amazônia – liderado pelo estado de Mato Grosso, responsável por mais de 60% do desmatamento na região.

A informação foi dada hoje (21) pelo novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, ao participar da solenidade na qual apresentou a nova secretária do Ambiente do Rio, Marilene Ramos.

Minc antecipou que o estudo irá apontar a continuidade do aumento da derrubada de árvores na região.

“Segunda-feira agora o Inpe vai divulgar uma nova estatística de desmatamento de terra na Amazônia – aquele que detecta o desmatamento em tempo real – e serão dados ruins que indicam aumento do desmatamento e, para variar, mais de 60% ocorreu em qual estado, quem sabe? No Mato Grosso”, afirmou o ex-secretário do Ambiente do Rio.

Sobre a posição do governador do estado, Blairo Maggi, de que não cederá soldados da Polícia Militar para a Guarda Nacional Ambiental , Minc afirmou que as pessoas, principalmente as que ocupam cargos públicos, têm que assumir suas responsabilidades. A Guarda Nacional Ambiental, nos moldes da Força Nacional de Segurança, é uma das propostas de Minc apresentadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva na última segunda-feira (19).

“O governador Blairo Maggi é um homem público e como tal tem que assumir responsabilidades. Eu não quero impor nada a ninguém, estou chegando agora, ainda nem tomei posse. Agora eu acho curiosa essa posição, porque o Blairo, na entrevista dele, até se disse favorável à idéia.”

O novo ministro do Meio Ambiente garantiu que a sua gestão adotará algumas estratégias para dialogar com o setor do agronegócio: uma delas será o zoneamento econômico ecológico.

“Nós estamos concluindo [este zoneamento] até o final do ano no Rio de Janeiro e vamos estendê-lo ao resto do país. Há pessoas do setor mais avançado do agronegócio que concordam com esse zoneamento. Ele estabelece regras claras: aqui pode, aqui não. E isto já é meio canal de diálogo com o setor.”

“Mas tem também um setor que é atrasadíssimo. Que está convertendo a Amazônia em pasto: primeiro tira a árvore, depois põem o gado e em seguida vão pondo a sua ‘sojinha’ por aqui e por ali”, criticou.

Para Carlos Minc desenvolver a pecuária extensiva na Amazônia não é opor a ecologia ao desenvolvimento, “é opor a tecnologia do futuro, da biogenética e da biotecnologia ao atraso e à regressão que é transformar a Amazônia em pasto".

"Então se você trata todo o setor como um só, você acaba jogando o avançado nos braços do setor atrasado. Nós vamos procurar dialogar com o setor avançado do agronegócio”, garantiu.