Bispo diz que transposição do São Francisco é "golpe fatal" à vida e ao povo que vive do rio

O bispo da cidade de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, disse hoje (16) que o projeto de transposição do Rio São Francisco é um “golpe fatal à vida do rio” e, como tal, acaba sendo um golpe mortal ao povo que depende do rio.

A afirmação foi feita durante coletiva à imprensa, no encerramento do Acampamento pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste contra a Transposição. No início da semana, representantes de movimentos sociais contrários ao programa de integração montaram acampamento em Brasília, em protesto contra o projeto.

Dom Cappio classificou a obra de “insana, louca e desvairada”. Segundo ele, o objetivo do acampamento era mostrar que, mesmo não sendo a favor da obra, as diversas entidades que participam do movimento estão dispostas a dialogar com o governo.

“Nós, como povo do velho Chico [como o rio é tradicionalmente conhecido na cultura regional], como conhecedores que somos da nossa realidade, gostaríamos de dar nossa sugestão, nossas idéias”, declarou. “E gostaríamos de vê-las aceitas, porque ninguém mais do que nós, que dependemos do rio para viver, queremos que o rio viva”.

Ele diz que, por estar aberto ao diálogo, não aceita a forma como o projeto vem sendo tratado. “De maneira autoritária, sem consultar diretamente aqueles que estão ligados ao rio”, afirmou, ao acrescentar que as decisões não devem ser tomadas “dentro de quatro paredes de um palácio; através da cabeça de meia dúzia de burocratas”.

Indagado se voltaria a fazer outra greve de fome para protestar contra as obras, ele respondeu que, por enquanto, não pensa em repetir ação. Em 2005, ele ficou sem comer em protesto contra o proejto.

“Uma greve de fome só se utiliza em ultimo caso, e acreditamos que ainda temos muitas alternativas para lançarmos mão antes de um grito desesperado, como o de uma greve de fome”.

Durante a semana, representantes de movimentos sociais em defesa do São Francisco participaram de audiências públicas na Câmara dos Deputados e no Supremo Tribunal Federal (STF).

Eles se reuniram com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, do Senado Federal, Renan Calheiros, e com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

No final do mês passado, o bispo esteve em Brasília para entregar um projeto alternativo para amenizar a falta de água no semi-árido nordestino. Ele protocolou uma carta no Palácio do Planalto na qual sugere que, em lugar da transposição, sejam construídos canais para desviar a água do Rio São Francisco.

Além disso, pede a revitalização do rio, a construção de cisternas para armazenar a água da chuva e a execução de 530 projetos da Agência Nacional de Águas (ANA) que, segundo ele, resolveriam os problemas de abastecimento hídrico na região até 2015.

Transposição do São Francisco recebe críticas em audiência pública na Câmara

A transposição do Rio São Francisco foi criticada hoje (15) durante audiência pública na Comissão de Meio Ambiente e de Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados.

O pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco João Suassuna afirmou em seu depoimento que o projeto é desnecessário porque no Nordeste tem muita água. O que falta, segundo ele, são políticas efetivas para fazer essa água chegar à população.

“Entendemos que não há escassez (de água) no Nordeste, o problema não é de escassez, é de distribuição”, afirmou.

Para Suassuna, a solução passa por interligar as bacias já existentes no Nordeste e utilizar a águas dos poços, que segundo ele são cerca de 60 mil na região. O uso das cisternas também é defendido pelo especialista, que calcula que uma cisterna de 15 mil litros abasteça uma família de cinco pessoas durante oito meses de estiagem.

O doutor em recursos hídricos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte João Abner Guimarães considerou que o projeto de transposição pouco tem a ver com o que é mostrado pelo governo e a mídia. Para ele, a transposição irá abastecer grandes açudes e não os que sofrem com a seca. “É o momento de acabarmos com a indústria da seca no Nordeste, alertou.

Para a promotora Luciana Khoury, da Bahia, o projeto não está de acordo com as leis brasileiras. “O projeto não atende as leis do país. Há necessidade de aprimoramento, de mudanças”, defendeu. E argumenta que o Congresso Nacional não foi ouvido e que os estudos de impacto ambiental são falhos.

A realização das audiências pública é outro ponto fraco em defesa da transposição apontado pela promotora. Segundo ela, as audiências foram realizadas nas capitais e as comunidades ribeirinhas foram avisadas com poucos dias de antecedência. Essas condições, segundo a promotora, dificultaram o acesso dos ribeirinhos (aos locais das audiências).

Com uma camiseta com a frase “Revitalização sim, transposição não”, o morador de Penedo, em Alagoas, Antônio Gomes dos Santos, defendeu que a revitalização não deve ser feita ao mesmo tempo, mas sim antes da transposição, porque “o rio está fraco”. “O rio se enchia onde se criava o camarão, se plantava o arroz, hoje estão plantando cana o que é um crime ecológico”, denunciou.

A voz dissonante na audiência foi a do ex-presidente do Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) Cássio Aguiar Braga. Favorável à transposição, Braga contestou os argumentos contrários apresentados pelos especialistas e pela promotora.

O ministro da Integração nacional, Pedro Brito, foi convidado para a audiência, mas não compareceu. Parlamentares da comissão lamentaram a ausência de representantes do ministério.

Estudo revela sinais de intoxicação causada por milho transgênico da Monsanto

Ratos de laboratório, alimentados com milho transgênico produzido pela Monsanto, mostraram sinais de intoxicação nos rins e no fígado, de acordo com um novo estudo lançado esta semana pela publicação norte-americana Archives of Environmental Contamination and Toxicology (Arquivos de Contaminação Ambiental e Toxicologia). É a primeira vez que um produto geneticamente modificado, liberado para o consumo humano e de animais, apresenta sinais de ter provocado efeitos tóxicos em órgãos internos de seres vivos.

O estudo analisou os resultados de testes de segurança enviados pela Monsanto para a Comissão Européia quando a empresa buscava autorização para comercializar a variedade MON863 de milho transgênico na União Européia, em 2005. Os dados dos testes mostram que o milho MON863 traz significativos riscos à saúde. Mesmo assim, a Comissão Européia licenciou a comercialização do produto para consumo humano e de animais.

“Esse é o golpe final na credibilidade do sistema de autorização para produtos transgênicos. Se o sistema desenhado para proteger a saúde das pessoas e dos animais autoriza um produto de alto risco, mesmo com todas as evidências sobre seus perigos, precisamos suspender imediatamente esse procedimento de aprovação e rever todos os demais produtos autorizados”, afirmou Christoph Then, representante da campanha de engenharia genética do Greenpeace Internacional.

A evidência sobre os efeitos nas cobaias foi obtida pelo Greenpeace após uma batalha judicial e foi passada a uma equipe de especialistas para ser analisada. A equipe foi liderada pelo professor Gilles Eric Séralini, especialista em tecnologia de engenharia genética da Universidade de Caen, na França.

“As análises da Monsanto não resistem a escrutínios rigorosos. Para começar, os protocolos estatísticos deles são altamente questionáveis. Pior, a empresa fracassou em fazer análises suficientes das diferenças no peso animal. Dados cruciais dos testes de urina, indicando intoxicação do rim, ficaram escondidos em publicações internas da empresa”, disse o professor Séralini numa coletiva de imprensa conjunta com o Greenpeace, realizada hoje em Berlim.

Os dados em questão vêm sendo objeto de grande debate desde 2003, quando foram identificadas mudanças significativas no sangue de animais alimentados com o milho MON863. Esse milho foi aprovado pela Comissão Européia apesar da oposição da maioria dos países-membros da União Européia, que levantaram preocupações sobre a segurança do produto.

A análise do professor Séralini confirma cientificamente essas preocupações. "Com os dados existentes, não se pode concluir que o milho MON863 é um produto seguro”, diz ele. Apesar disso, o milho geneticamente modificado da Monsanto foi autorizado para venda e consumo na Austrália, Canadá, China, Japão, México, Filipinas e Estados Unidos, além da União Européia.

“O mais preocupante é que, assim como esta, outras evidências importantes sobre os impactos das variedades transgênicas também podem estar sendo negligenciadas pelas empresas e pelos órgãos responsáveis por avaliar a segurança dessas variedades”, disse Gabriela Vuolo, coordenadora da campanha de engenharia genética do Greenpeace Brasil.

No momento em que a CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) está justamente discutindo a liberação de outras variedades de milho transgênico, o estudo da publicação norte-americana coloca em dúvida todo o sistema de aprovação comercial de novos transgênicos. Isso porque, atualmente, a CTNBio não exige uma lista mínima de documentos que as empresas de biotecnologia sejam obrigadas a apresentar para pedir a liberação de novos transgênicos; também não há a necessidade de confrontar os estudos feitos pelas empresas com análises externas e independentes.

“Com isso, as empresas podem apresentar apenas o que lhes for conveniente, sem ter que prestar contas sobre os impactos dos seus produtos para a população e o meio ambiente”, alertou Gabriela.

Protesto em SP critica falta de ação de Bush e Lula contra aquecimento global

O presidente americano George W. Bush chega ao Brasil nesta quinta-feira cheio de planos para uma parceria com o Brasil na produção do álcool combustível – ou etanol, como é mais conhecido em terras americanas.

No encontro que terá com o presidente Lula, Bush discutirá acordos comerciais e o know-how brasileiro na produção do biocombustível, mas não há previsão para uma agenda mais ambientalmente responsável. Por isso ativistas do Greenpeace foram ao Monumento das Bandeiras, em frente ao Parque do Ibirapuera, caracterizados como refugiados climáticos, para passar a mensagem: Lula & Bush: etanol é pouco. Salvem o clima!

O Greenpeace acredita que os biocombustíveis são apenas uma parte de uma ampla gama de ações necessárias para minimizar as mudanças climáticas.

“Obviamente, os Estados Unidos e o Brasil têm níveis diferentes de responsabilidade sobre a questão do aquecimento global. No entanto, os presidentes dos dois grandes poluidres da atualidade deveriam aplicar soluções definitivas e contundentes para a redução imediata das emissões de gás carbônico (CO2) de seus países, em vez de apenas discutir acordos comerciais de etanol”, afirmou Rebeca Lerer, coordenadora da campanha de clima e energia do Greenpeace Brasil.

No Brasil, 75% das emissões de gases do efeito estufa vêm do desmatamento, principalmente na Amazônia. Apesar de ter ratificado o Protocolo de Kyoto, o Brasil ainda não se comprometeu com metas concretas de redução de suas emissões.

Num momento em que o Brasil vem tomando medidas para acelerar seu crescimento, o Greenpeace alerta para a necessidade de regulamentação para que a indústria de biocombustivel garanta a sustentabilidade sócio-ambiental.

“É inaceitável a conversão de florestas ou ecossistemas intactos para a produção de etanol, bem como colocar em risco a produção de alimentos para a geração de biocombustíveis”, afirmou Rebeca Lerer.

Já no caso dos EUA, maior poluidor global, as emissões são provenientes em sua maior parte da queima de combustíveis fósseis em setores como eletricidade e transporte. Os Estados Unidos não ratificaram Kyoto e tampouco adotaram metas de redução das emissões ou medidas concretas como a maior eficiência energética de sua frota veicular.

“Os Estados Unidos é o principal emissor de gases estufa do mundo e precisa dar um passo gigante. Priorizar apenas a produção de etanol, sem adotar metas para a redução das emissões, é sair pela tangente” afirmou John Coequyt, coordenador da campanha de energia do Greenpeace EUA.

Washington Novaes volta à Terra Mágica e em nova série de documentários revela: hoje ela é uma Terra Ameaçada

Vinte e dois anos após descortinar para o Brasil e o mundo a beleza, mistérios e encantamentos dos povos indígenas do Xingu, o documentarista Washington Novaes faz um retorno a esse universo mágico e o reencontra transformado.  Ilhado entre pastagens, estradas, e extensas áreas desmatadas para o plantio de soja,  o  Parque Indígena do Xingu e seus habitantes sofrem os efeitos da devastação ambiental ao seu redor e da proximidade, cada vez maior, com a chamada sociedade envolvente. As aldeias estão invadidas por antenas parabólicas. Os pajés vão desaparecendo, porque os jovens não querem mais saber da missão sacrificante. Hoje, assistem televisão, querem usar roupas de fábrica, tênis, óculos escuros e – suprema ambição – passear de moto pela aldeia.

Porém, mesmo transformado,  o  Xingu  preserva sua magia e penetrar nesse universo, segundo Washington Novaes, ainda exige “uma mudança radical de perspectiva”. Em 1984, ele mesmo experimentou essa mudança,  durante um mergulho de dois meses no cotidiano dos grupos indígenas Waurá, Kuikuro, Txukarramãe (atual Mentuktire) e Kren-Akarore (hoje Panará). Dessa experiência resultou uma das mais belas séries de não-ficção já exibidas pela tv brasileira: “Xingu, a Terra Mágica”, projeto executado pela Intevídeo Comunicação, para a extinta Rede Manchete. A série, de 10 programas, foi aplaudida pelo público e pela crítica, chegando ao último capítulo consagrada por 20 pontos no Ibope em todo o país.

Com a série de Washington Novaes, pela primeira vez, o Brasil conseguia enxergar sem preconceitos o  mundo e a cultura do índio. Descobria encantado as crenças, os mitos, a organização social, o jeito de viver dos povos do Xingu. O cacique Raoni se lançava para o mundo como porta-voz das nações indígenas. O próprio documentarista se transformou e ensinava:  “O encontro com o índio é um mergulho em outro espaço, em outro tempo, Um espaço aberto, de céu e terra, amplo, água e fogo. Um espaço colorido e pródigo, povoado por animais, vegetais, minerais e espíritos”. 

Em seu novo mergulho no Xingu, em 2006,  Washington Novaes  reviveu as mesmas sensações. Como ele diz: “Este ainda é um momento de coexistência das duas culturas, a do índio e a do branco”. Graças a isso,  pode registrar não só as mudanças negativas ocorridas ao longo das duas últimas décadas, mas também belos e comoventes flagrantes de manifestações culturais mantidas bem vivas pelos quatro grupos indígenas novamente documentados. A Festa do Pequi, a Festa do Espírito do Beija Flor, a Dança do Papagaio, o Kuarup,  um ritual para agradar o espírito que roubou a alma de um rapaz,  a iniciação dos jovens com a bateção de marimbondos e uma  emocionante e espontânea reconstituição feita pelos Metuktire do momento histórico do primeiro contato com os irmãos Villas-Boas. Todos esses acontecimentos serão mostrados na nova série.

Para esse reencontro com o Xingu, Washington conseguiu reunir companheiros que partilharam com ele as emoções da primeira aventura: Lula Araújo como diretor de fotografia e João Paulo Carvalho, como diretor de edição. Antônio Gomes, o Painho, técnico de som, não pode acompanhar a turma desta vez. Entre os integrantes da equipe da nova série estão Siron Franco,  diretor de arte; Pedro Novaes, diretor de produção; Marcelo Novaes, fotógrafo de still; Pedro Moreira, técnico de som; João Novaes e Cláudio Pereira, produtores executivos. A equipe incorporou ainda, como assistentes de fotografia, dois jovens cineastas das aldeias Kuikuro e Panará: Marica Kuikuro e Paturi Panará, ambos treinados pelo projeto “Vídeo nas Aldeias” e com filmes já exibidos em festivais.

Batizada como “Xingu, a Terra Ameaçada”, a nova série de Washington Novaes será lançada em abril, sob o patrocínio da Petrobrás, da Natura e da Ancine. Dividida em cinco programas, de 50 minutos cada,  formará  um conjunto com os dez capítulos da série anterior,  que serão exibidos novamente.  Washington também pretende relançar o livro “Xingu, Uma Flecha do Coração” e ainda publicar  o diário da nova experiência. Com mais de 50 anos de atuação profissional, Washington Novaes,  foi editor-chefe do Globo Repórter na época de ouro do programa, de 1977 a 1981. Desde então  iniciou sua bem sucedida trajetória como documentarista, ligado sobretudo às questões ambientais. Tem vários trabalhos premiados no Brasil e no exterior, como o próprio “Xingu”,  o documentário “Amazônia, a Pátria da Água” e as séries “O Desafio do Lixo” e “Os Caminhos da Sobrevivência”.

Governo publica edital de supervisão de obras de transposição do São Francisco

Foi publicado hoje (6), no Diário Oficial da União, o edital de supervisão das obras de transposição do Rio São Francisco. O Ministério da Integração Nacional irá contratar serviços de consultoria para acompanhamento técnico e supervisão do fornecimento dos equipamentos da primeira etapa de implementação do projeto.

O edital foi lançado inicialmente em maio de 2005, mas foi suspenso por causa de liminares da Justiça que impediam o licenciamento e as licitações da obra. Em dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou as liminares.

Em fevereiro deste ano, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu novamente ao STF a suspensão do processo de licenciamento ambiental da obra. O pedido ainda não foi julgado.

Em 12 de janeiro, o Ministério da Integração lançou o edital de projetos executivos para implementação do projeto de transposição do São Francisco. O edital de obras deve ser publicado nas próximas semanas.

O edital de supervisão pode ser adquirido a partir de hoje no Ministério da Integração. A entrega das propostas será feita no dia 25 de abril.

Visão Rota Brasil Oeste

A transposição do São Francisco é criticada por muitos especialistas como mais uma obra faraônica sem tanta repercussão social. O formato da transposição é apontado como centralizador e de pouco alcance social.

Segundo o secretário executivo do Movimento Organização Comunitária, organização não-governamental que trabalha no semi-árido, Nadilson Quintela, a transposição é um mito. "É um projeto velho, cheio de politicagem que não promove o uso difuso da água, reproduz uma idéia de crescimento, mas não de desenvolvimento social. Está centrada na grande irrigação e não na agricultura familiar, alimenta a concentração de riquezas", afirma.

Um proposta mais interessante e barata, por exemplo, seria a construção de cisternas de capitação de água da chuva. Uma cisterna, ao custo de R$1.470,00, garante o abastecimento de uma família de cinco pessoas durante 11 meses. Além de estimular a indústria de construção local, esta solução tem alcance maior no sertão e descentraliza a propriedade da água.

Secretário do Acre e secretária do WWF apontam dificuldades de integração na Amazônia

A natureza aproxima, mas as questões institucionais e políticas podem afastar. Essa é a opinião do secretário de Planejamento do Acre, Gilberto Siqueira, especialista em projetos de cooperação, sobre a necessidade da integração e aproximação entre os países amazônicos. Ele comentou a declaração da secretária-geral da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), Rosália Arteaga Serrano, de que as questões ambientais não têm fronteiras e, portanto, a integração dos países da região é "um imperativo geográfico".

"O Brasil sempre andou de costas para os vizinhos sul-americanos, principalmente para os da Amazônia", opina Siqueira. "A região sempre foi periferia. Nunca cuidamos do potencial de contribuição econômica, social e científica."

"A Amazônia nunca foi nossa prioridade", concorda a secretária-geral da organização não-governamental (ONG) WWF no Brasil, Denise Hamu. A entidade também tem escritórios próprios na Bolívia, Colômbia e Peru. Um escritório divide as atribuições na Guiana e no Suriname. Na Venezuela e no Equador a representação é feita com outra entidade associada.

Para Hamu, todos os países da Amazônia Continental padecem com problemas de desmatamento, extração ilegal de madeiras, mineração, ocupação desordenada e má-gestão dos recursos hídricos.

Gilberto Siqueira aponta para "problemas parecidos" entre os países, mas vê "diferenças na resolução e na capacidade de controlá-los". Segundo ele, há diferenças na maturidade institucional e na legislação, em alguns países (caso do Brasil) mais rígida.

A questão da "maturidade institucional" é reconhecida por Rosália Arteaga Serrano, da OTCA, que ressalta a dificuldades para os países produzirem dados agregados sobre a região e para fazer monitoramento de seus territórios. O Brasil é o único que conta com sistemas de satélite que acompanham a evolução do desmatamento.

Para o secretário de planejamento do Acre, ainda há dissonâncias e conflitos, como acontece na fronteira do estado com o Peru por causa das diferenças nas políticas de concessão de terra e para extração de madeira. "Mas temos isso aqui dentro do Brasil, entre os estados, como acontece entre o Acre e Rondônia", pondera.

Denise Hamu lembra que as obras de infra-estrutura como a pavimentação de estradas, ligações de gasoduto e a construção de hidrelétricas – a exemplo dos projetos de duas usinas no Rio Madeira (em fase de licenciamento ambiental) -, também são foco de divergência. Recentemente, a Bolívia solicitou que a construção das hidrelétricas no Rio Madeira venha a ser intermediada pela OTCA, diz sua secretária-geral, Rosália Arteaga Serrano.

Além da possibilidade de resolver conflitos e de ser "um instrumento poderoso de integração", a OTCA é reconhecida pela "boa vontade de ouvir a sociedade civil e permitir que ela participem das suas políticas", elogia Denise Hamu, do WWF.

Um novo desfile e a mesma fantasia

Haja fôlego, paciência, persistência. Há uns 15 anos vem o autor destas linhas transcrevendo periodicamente graves questões levantadas por cientistas, administradores públicos, Tribunais de Contas, a respeito do famigerado projeto de transposição das águas do Rio São Francisco. A todas responde a administração federal – quando responde – com argumentos do tipo “não se pode negar uma caneca de água a 12 milhões de vítimas da seca”. E vai em frente, até que surja uma nova barreira – como foi a greve de fome do bispo dom Luiz Flávio Cappio.

Agora, esquecido o bispo e derrubadas na Justiça medidas liminares, anuncia o Ministério da Integração Nacional que fará imediatamente licitações (no valor aproximado de R$ 100 milhões) para contratar empresas que façam os projetos executivos da obra, orçada em R$ 6,6 bilhões nesta etapa. E o bispo manda nova carta ao presidente, lembrando que o Tribunal de Contas da União diz que o projeto não beneficiará o número de pessoas que se alardeia, que a Agência Nacional de Águas propõe obras em 530 municípios para solucionar os mesmos problemas com metade dos recursos previstos para a transposição e que populações a 500 metros do rio continuarão, apesar da transposição, a sofrer com a falta de água. Já o Comitê de Gestão da bacia (que por 44 votos a 2 foi contra a transposição) diz que esta atende a menos de 20% do semi-árido, que 44% da população do meio rural continuará sem acesso a água – “exatamente os que mais precisam” – e que a revitalização do rio prometida pelo Ministério da Integração Nacional precisa “sair do campo da retórica”. E o Ministério Público volta a recorrer à Justiça, lembrando que nos termos da Constituição, por atingir terras indígenas, a obra precisa de autorização do Congresso Nacional, o que ainda não aconteceu.

Como já foi dito aqui, parece uma assombração que some e reaparece de tempos em tempos. Sem falar no governo imperial, foi no começo da década de 1980, ainda nos tempos do “Brasil Grande” da ditadura militar, que o projeto ressuscitou, para uma vida muito breve. Pouco mais de uma década depois, embora o então ministro do Meio Ambiente Rubens Ricupero dissesse que o São Francisco já era “um rio ameaçado de extinção”, por causa do desmatamento nas regiões onde nascem e por onde passam seus formadores, o Ministério do Interior voltou à carga, com um projeto de transpor 150 metros cúbicos por segundo, a um custo de US$ 1,5 bilhão. Mas ele foi fulminado por um parecer do Tribunal de Contas da União, que mostrava ser um fantasma esdrúxulo, pois o Ministério do Planejamento dele não sabia, assim como os Ministérios da Agricultura (que cuida de irrigação), da Reforma Agrária e da Fazenda (que libera recursos). Além disso, o projeto implicava prejuízos de US$ 1 bilhão anuais na geração de energia, inviabilizava mais áreas para irrigação a montante do que beneficiava a jusante e concentrava os benefícios num pequeno número de grandes produtores rurais.

Foi para o limbo até 1998, quando ressurgiu em nova versão de túneis que levariam água para o abastecimento de cidades, ao custo de US$ 700 milhões. Durou pouco a reaparição. Mas já estava de volta no final de 2000, numa versão em que 127 metros por segundo transpostos beneficiariam 8 milhões de pessoas e o abastecimento de água de 268 cidades, além de irrigar 260 mil hectares. O professor Aziz Ab’Saber, da USP, lembrou na época que os beneficiados seriam menos de um terço das vítimas da seca (27 milhões). A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) observou que pelo menos 30% da água se perderia por evaporação. E a Cáritas mostrou que a solução para comunidades isoladas está na implantação de cisternas de placa (das quais já há 160 mil), não na transposição, que não chegaria a esses lugares.

Levou algum tempo para recuperar-se o combalido. Mas retornou em 2003. Dessa vez, teve a oposição do Comitê de Gestão da bacia, da CNBB, da OAB, das arquidioceses à beira-rio. Custaria R$ 4,2 bilhões para uma transposição de 53 metros cúbicos por segundo. Vários especialistas (professor Aldo Rebouças, da USP, professor Abner Curado, da UFRN, professor João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, entre muitos) mostraram a desnecessidade: o problema no semi-árido é de gestão, não de escassez.

Mesmo levantando mais de 40 questões, o Ibama concedeu em 2005 licença prévia. Sabendo que 70% da água seria para irrigação e 26% para o abastecimento de cidades, e não para proporcionar “uma caneca de água para as vítimas da seca”. Que não estava equacionada a questão dos subsídios necessários para uma água que poderia custar até cinco vezes mais que a então disponível. Que a maior parte da água transposta iria para açudes onde se perde até 75% por evaporação. Que havia enormes discrepâncias a cada citação do número de beneficiados (12 milhões? 7,24 milhões? 9,02 milhões? 7,21 milhões?) e dos hectares irrigados (161 mil? 186 mil?). Mais grave que tudo: o próprio estudo de impacto ambiental dizia que 20% dos solos que se pretendia irrigar “têm limitações para uso agrícola”; e “somados aos solos líticos, notadamente impróprios, respondem por mais de 50% do total” das terras que seriam irrigadas. Não bastasse, “62% dos solos precisam de controle, por causa da forte tendência à erosão”. Ainda assim, concedeu licença prévia ao projeto, pois as objeções do Comitê de Gestão haviam sido ignoradas pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, onde o governo federal, sozinho, tem a maioria dos votos.

Agora, o velho abantesma retorna à avenida, sem responder a nenhuma das muitas questões levantadas principalmente por cientistas.

E retorna com a mesma fantasia.

Washington Novaes é jornalista
Texto originalmente publicado em "Espaço Aberto" no jornal "O Estado de São Paulo"

Para pesquisador, Antártida deve ter a mesma relevância que Amazônia para o Brasil

Brasília – O pesquisador do Programa Antártico Brasileiro (Proantar), Jefferson Cárdia Simões, disse que estudos sobre a Antártida deveriam ser tão relevantes quanto pesquisas sobre a Amazônia. Simões foi o primeiro brasileiro a atravessar o continente antártico, trajeto feito entre outubro de 2004 e janeiro de  2005. Ele, que também é o primeiro glaciologista brasileiro, participou hoje (1º) do lançamento do 4º Ano Polar Internacional (API).

O programa, que vai até março de 2008, tem o objetivo de realizar pesquisas cientificas interdisciplinares no Ártico e na Antártida. “Hoje, nós sabemos e temos fortes evidências e conhecimento científico de que para entender o clima brasileiro, a Antártica [como o continente também é chamado] é tão importante como a Amazônia. E nós nos esquecemos muitas vezes que nós somos um país continental. O Chuí está mais perto da Antártica do que Roraima”, explicou ele.

Ele destacou que a participação do país nessa quarta edição do evento é fundamental para a ciência brasileira. “É essencial para as grandes questões que vieram à tona nas últimas semanas sobre o impacto do homem nas mudanças climáticas. É na Antártica que nós vamos ver os primeiros sinais das mudanças climáticas globais”. O pesquisador lembrou que “também foi na Antártica que nós comprovamos que é o homem que está modificando a composição da atmosfera do planeta Terra”.

O Ano Polar Internacional é desenvolvido pela Organização Meteorológica Mundial e conta com a participação de 63 países que realizarão 227 projetos até 2011. O Brasil, que participará pela primeira vez ativamente do programa, desenvolverá 28 estudos  e contará com R$ 9,2 milhões do  Ministério da Ciência e Tecnologia. “Temos projetos envolvidos com a questão da circulação oceânica e também sobre como essa circulação está relacionada com toda a cadeia alimentar  do Atlântico sul”, disse.

Simões coordena um grupo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que estuda os reflexos do gelo da Antártida no meio ambiente sul americano. “O que nós queremos saber é como a circulação atmosférica oceânica dessa região do planeta é controlada pela Antártica.”

O pesquisador destacou ainda a importância de entender o papel do aquecimento global no derretimento do gelo do planeta  para saber como  ele afetará o  nível  médio dos mares e as cidades costeiras. “O que nós podemos falar é que o norte da península Antártica apresenta, ao longo dos últimos 50 anos, o maior aquecimento da atmosfera em todo o planeta”.

Segundo ele, no local onde as pesquisas brasileiras serão realizadas (na Península Antártica) o aquecimento nos últimos 50 anos foi de 3 graus, enquanto que a média mundial, em 150 anos, foi de apenas 0,7 grau. “É uma região extremamente sensível às variações climáticas e conforme foi visto recentemente, é lá que nós presenciamos processos muito rápidos, respostas muito rápidas do ambiente a essas variações climáticas. Então, nós temos que manter o monitoramento para inclusive servir de alerta”.

A Antártida, segundo dados da UFGRS, tem uma área de 13,6 milhões de quilômetros quadrados, o que equivale a 1,6 vez a área do Brasil, que é de 8,5 milhões de quilômetros quadrados. 

Universidade pública do Paraná tem 45 índios aprovados no vestibular

Curitiba – No Paraná, o ano letivo tem início com 45 índios aprovados num vestibular específico realizado em dezembro na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Foram 164 candidatos inscritos, oriundos de diversas tribos brasileiras. As inscrições foram gratuitas e a Fundação Nacional do Índio (Funai) viabilizou o transporte. Alimentação e despesas de acomodação  foram pagas com recursos da Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação e do Ministério da Cultura.

Segundo o  professor Eduardo Harder, da Comissão Universidade para os Índios (CUIA), durante todo o período de estudos os alunos das universidades estaduais receberão uma bolsa da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior no valor de R$ 350.

Na UFPR, a bolsa é de R$ 210,00 complementados pela Funai, totalizando R$ 840,00.  Dos sete indígenas da universidade, apenas dois são do Paraná, outros dois vieram de tribos de Santa Catarina, um de Roraima, um do Rio Grande do Sul e o outro de São Paulo. Nas universidades estaduais todos são paranaenses, pois conforme explicou o professor, apenas a UFPR pode, de acordo com o regulamento, admitir povos de outros estados.

Atualmente, as universidades do Paraná têm 78 acadêmicos indígenas matriculados. O vestibular específico para os povos indígenas no Paraná é realizado desde 2002, numa iniciativa do governo estadual, através da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti).