Conama pede explicações a governador do Mato Grosso sobre índices de desmatamento

O Conselho Nacional do Meio Ambiente convidou Blairo Maggi a esclarecer porque seu Estado – que teoricamente possui o sistema de licenciamento e controle ambiental mais sofisticado do País – é o campeão do corte de árvores, sendo responsável por quase 50% do desmatamento ocorrido em toda a Amazônia.

Um requerimento de urgência apresentado pelo ISA e aprovado, na manhã de hoje (19/5), pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), em Campos do Jordão (SP), convida o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi (PPS) a explicar os índices de desmatamento no Estado divulgados ontem, dia 18 de maio, pelo governo federal. Momentos depois, outro requerimento de urgência, apresentado pelo presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente do Mato Grosso (FEMA-MT), Moacir Pires de Miranda, em nome do governador, e aprovado, convidou o Conama a fazer a próxima reunião, nos dias 14 e 15 de junho, em Cuiabá, com a presença de Maggi. O Conselho está realizando sua 44ª reunião, desde ontem no município paulista de Campos do Jordão,em virtude das comemorações da Semana da Mata Atlântica, que acontece de 18 a 22 de maio.

Segundo os dados apresentados ontem pelo govenro federal, o Mato Grosso foi responsável por 48,1% do desmatamento total ocorrido entre 2003 e 2004 em toda a Amazônia. Foram 26.130 quilômetros quadrados. Depois de registrar 10,4 mil quilômetros quadrados de florestas derrubados, no biênio 2002-2003, o Estado desmatou, nos anos de 2003 e 2004, 12,5 mil quilômetros quadrados – um aumento de 20%. Desse total, apenas 4,1 mil quilômetros quadrados foram derrubados legalmente. Depois do Mato Grosso, os Estados que mais destruíram florestas em 2003-2004 são o Pará (6,7 mil quilômetros quadrados) e Rondônia (4,1 quilômetros quadrados).

“Queremos saber por que o Estado que tem, supostamente, o sistema de licenciamento ambiental mais eficiente e sofisticado é o campeão dos desmatamentos”, conta o advogado do ISA, André Lima, conselheiro responsável pelo requerimento. Ele explica que, no Mato Grosso, os desmatamentos são controlados com informações georreferenciadas, isto é, a partir de imagens colhidas por satélites.

O que significa mais de 26 mil km2 devastados na Amazônia

O governo divulgou anteontem mais um índice anual de desmatamento na Amazônia produzido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe): entre agosto de 2002 e julho de 2003, 24,6 mil km2 de florestas foram suprimidos, mais do que os 23,7 mil km2 que haviam sido estimados no ano passado. Divulgou, ainda, a estimativa oficial de que outros 26,1 mil km2 teriam sido desmatados entre agosto de 2003 e julho de 2004, a ser confirmada até o final deste ano. O índice de 2003 só é inferior ao pico histórico de 29 mil km2 ocorrido em 1995, ano de implantação do Plano Real, mas, caso se confirmem as estimativas, o índice de 2004 ocupará o seu lugar, representando um aumento de cerca de 6% em relação ao índice anterior.

A média do desmatamento durante os anos 90 havia sido de 16,8 mil km2 anuais. Aquele patamar já havia sido considerado mundialmente extravagante e colocado o Brasil como foco principal das preocupações sobre o futuro das florestas tropicais do planeta. Já o destacava como recordista entre outras graves situações, como a do sudeste asiático – Indonésia e Malásia, principalmente – fortemente impactado pela gula japonesa em consumo de madeiras tropicais. O país assumia, então, um papel destacado entre os maiores emissores atuais de gases estufa, sendo que apenas o desmatamento na Amazônia representou a liberação de cerca de 200 milhões de toneladas (líquidas) de carbono por ano na atmosfera terrestre. Em 1994, o desmatamento na Amazônia já respondia por mais de 70% das emissões brasileiras destes gases, segundo o inventário nacional de emissões divulgado pelo governo brasileiro no ano passado. Um perfil de emissões invertido em relação à composição das emissões globais, já que ¾ destas estão associados à queima de combustíveis fósseis – petróleo, carvão e gás natural – e apenas o quarto restante decorre dos desmatamentos e usos inadequados do solo.

No entanto, o início do novo século vem dando lugar à exacerbação da extravagância. Entre agosto de 2000 e julho de 2001 o índice já passava dos 18 mil km2 desmatados, subindo nos anos seguintes para 23,1 km2 e 24,6 km2, seguidos agora da estimativa de 26,1 km2 anunciada para 2004, numa tendência contínua de aumento de cerca de 6% a cada ano. No ano passado, quando os dados anteriores do Inpe haviam sido divulgados (os 23,1 km2 referentes a 2002 e a estimativa, agora revista, de 23,7 km2 para 2003), generalizou-se a impressão de que se havia alcançado um novo patamar histórico, mas os dados anunciados anteontem mostram que o que há é uma curva ascendente, indicando uma situação fora de qualquer controle. Significa dizer que, a cada ano, nos últimos três anos, o Brasil vem acrescentando umas 18 milhões de toneladas de carbono a mais à atmosfera, em relação ao nível já escandaloso do ano anterior. Com isto, o país poderá alcançar rapidamente a condição de terceiro maior emissor mundial atual de gases estufa, superando a Rússia, a Alemanha e a Índia, para ficar atrás somente dos EUA e da China.

Expansão Geográfica

Outro aspecto importante dos dados divulgados refere-se ao aumento da participação do Mato Grosso na composição do índice geral da Amazônia. Este estado, que já lidera há anos o avanço do desmatamento, passa a responder por mais de 48% do desmatamento havido, aumentando a sua extensão desmatada em 20% em relação ao ano anterior, quando respondia por 43% da composição do índice geral. O expressivo crescimento do PIB agropecuário do estado nos últimos anos é, sem dúvida, um indicativo importante para explicar o seu lugar de líder do desmatamento. Mas, enquanto o crescimento deste PIB vem ocorrendo há uma década, o estado, que já havia conseguido reduzir o ritmo de aumento do desmatamento através da implantação de um sistema de licenciamento ambiental de grandes propriedades rurais, voltou a apresentar índices alarmantes a partir de 2002, o que demonstra que, além da contínua expansão agrícola, fragilizou os seus instrumentos de controle.

Vários estados amazônicos conseguiram reduzir significativamente os seus índices: Amazonas, Tocantins, Maranhão e Acre. Enquanto o índice do Pará permaneceu estável, Rondônia e Mato Grosso empurraram o índice geral da Amazônia pra cima. Significa dizer que se a responsabilidade política pela extravagância é do Brasil e da Amazônia como um todo, são estes últimos os principais responsáveis pela sua atual exacerbação. Os mais de 12 mil km2 desmatados em 2004 só no Mato Grosso, indicam claramente que a expansão do agronegócio ocupa um papel crescente na conversão direta de áreas de floresta em plantações, além da influência indireta que exerce, dada a sua maior rentabilidade, empurrando outras atividades potencialmente predatórias, como a pecuária, para dentro da floresta amazônica.

Significa dizer que o combate ao desmatamento não pode ser concebido linearmente, pois há estados e atividades econômicas que têm maior responsabilidade que outros no incremento do desmatamento. Portanto, os esforços do governo federal para tentar reduzir o desmatamento precisam incorporar a fixação de metas de redução por estado, de modo a estabelecer incentivos para aqueles que cumpram essas metas, e penalidades para os que as descumpram, em relação ao volume de investimentos e de repasses de recursos federais para os estados. Da mesma forma, instrumentos de política econômica precisam incorporar fortemente a variável do desmatamento, cerceando a expansão da fronteira agrícola em regiões de florestas, priorizando a ocupação de áreas já desmatadas e que estão improdutivas e, sobretudo, valorizando economicamente os recursos florestais e, portanto, a floresta em pé. E, ainda, deveriam ser estabelecidos critérios mais rigorosos para a abertura de novas estradas na região amazônica, ou mesmo a mudança da matriz de transportes para priorizar as ferrovias, já que a maior extensão desmatada se situa nos cem quilômetros às margens das rodovias.

Fragmentação Florestal

Outro aspecto extremamente preocupante quanto à expansão geográfica diz respeito ao chamado “arco do desmatamento”, historicamente formado pelas frentes de ocupação que tornaram o sudeste do Pará, o norte do Mato Grosso e a região central de Rondônia num contínuo de áreas críticas que perfaz este “arco”. Os dados agora divulgados reforçam a constatação que já vinha sendo feita de que novas frentes de desmatamento tendem a se desgarrar do “arco” histórico. É o caso do eixo da BR-163 – Rodovia Cuiabá – Santarém, cuja pavimentação, anunciada mas ainda não iniciada pelo atual governo, desencadeou um processo caótico de grilagem de terras e de especulação imobiliária antes mesmo da execução da obra, transformando o antigo arco numa espécie demoníaca de tridente.

Este quadro está se agravando ainda mais diante de novas frentes de grilagem na chamada “Terra do Meio” (centro-sul do Pará) e na região de Humaitá (sul do Amazonas), que tendem a ligar transversalmente os dentes do tridente. Além disso, o Ministério dos Transportes vem anunciando, irresponsavelmente, o início da pavimentação da BR-319, Rodovia Porto Velho – Manaus, para o que foram alocados cerca de 100 milhões de reais no orçamento da União para este ano. Significa que, antes mesmo de iniciar a pavimentação anteriormente anunciada da BR-163, onde os danos ambientais já progridem geometricamente, fomenta-se a expansão de um novo eixo de ocupação desordenada e de expansão do desmatamento, agora cortando a região central da floresta amazônica. Rumo ao quarto dente.

Essa multiplicação das frentes de desmatamento, por sua vez, aponta para a fragmentação definitiva da floresta amazônica – a maior massa contígua de florestas tropicais existente no mundo – em blocos estanques de remanescentes florestais. É previsível que este processo crie obstáculos crescentes às trocas genéticas entre as diversas regiõ

es amazônicas, com impacto sobre a sua biodiversidade. E não se sabe se impacto também haverá sobre o complexo regime de chuvas da região, que vão se alimentando e realimentando da costa atlântica para o interior do continente. Pode ocorrer uma redução da umidade em áreas diversas da Amazônia, para o que já contribui o aumento da intensidade e da freqüência da ocorrência do chamado “El Nino”, fenômeno climático, associado ao efeito estufa, que provoca alterações no clima de várias regiões da Terra em decorrência do aquecimento das águas do Oceano Pacífico.

Lula, Campeão do Desmatamento

Se o que os últimos três índices anuais divulgados pelo Inpe indicam é uma curva ascendente de desmatamento da ordem de 6% ao ano, a partir do patamar escandaloso de 23 mil km2/ano, o período de mandato do Presidente Lula poderá vir a ser o recordista histórico neste ramo.

Os índices anuais do Inpe são medidos de agosto a julho porque se fundamentam na interpretação de fotos de satélite obtidas na estação seca, em que há menor ocorrência de nuvens. No entanto, sabe-se o desmatamento costuma ser mais intenso no primeiro semestre – até agosto – quando se prepara a abertura de áreas que serão ocupadas naquele ano, sendo que a massa florestal derrubada será parcialmente queimada no auge da seca, permitindo o plantio no início das chuvas.

Sendo assim, poder-se-ia atribuir os 24,6 mil km2 apurados entre agosto de 2002 e julho de 2003 a desmatamentos ocorridos, na sua maior parte, no período de mandato do Presidente Lula. Mesmo que se debite ao primeiro semestre de 2003 apenas a metade dessa extensão, e se se confirmar a estimativa dos 26,1 mil km2 para os doze meses seguintes, projeta-se um desmatamento médio anual superior a 25 mil km2 para o primeiro ano e meio de mandato presidencial cobertos por levantamentos do Inpe.

O pico histórico do desmatamento ocorreu entre agosto de 1994 e julho de 1995. Pode-se atribuí-lo, pela mesma lógica, ao mandato do Presidente Fernando Henrique e à euforia criada pelo Plano Real (que já vinha sendo implementado no decorrer de 1994). Assim, a média anual de desmatamento na Amazônia durante o seu primeiro mandato chegou a 19,4 km2/ano, já bem acima da média dos anos 1990 e um pouco acima dos primeiros dados colhidos pelo Inpe ainda nos anos 1980. A média anual do seu segundo mandato é de 19,2 mil km2/ano, mas terminou descrevendo uma tendência de crescimento expressiva entre 2001 e 2002 (de 18,1 mil para 23,2 mil km2).

No entanto, os números agora divulgados mostram que essa herança maldita está superada pelo incremento de 6% ao ano, nos últimos dois anos. O governo Lula terá que fazer um grande esforço político no ano e meio de mandato restante para evitar o vexame de ser recordista histórico em desmatamento. Para tanto, terá que haver uma redução expressiva no ritmo do desmatamento, de modo a transformar a média projetada de 25 mil km2/ano para algo inferior aos 20 mil km2/ano. Ademais, a tendência de fragmentação da floresta contínua, que também já se esboçava antes, tenderá a se consolidar durante o atual mandato presidencial, especialmente em função da maneira rocambolesca como se anunciam obras de pavimentação de extensas rodovias em regiões sensíveis de floresta.

Ao anunciar os novos dados do Inpe, a Ministra Marina Silva ressaltou que no período coberto pelos novos números (até julho de 2004), ainda não vinha sendo plenamente implementado o Plano de Combate ao Desmatamento na Amazônia do governo federal. Ela mencionou um conjunto de medidas – combate à grilagem de terras, aumento das operações e autuações da fiscalização do IBAMA, implantação de bases em áreas com notória ausência do estado, criação de áreas protegidas, funcionamento pleno do novo sistema para monitoramento em tempo real do desmatamento e outras – que só teriam se intensificado a partir do segundo semestre do ano passado. Assim, ela espera uma redução expressiva na estimativa para 2005, que deverá ser anunciada até o início do próximo ano, expectativa esta que parece corroborada pela provável redução da expansão da fronteira agrícola em função da queda nos preços internacionais da soja e de outras comodities agrícolas.

Que Deus lhe ouça! Porém, os indícios que vêm do chão ainda seguem sendo preocupantes. De agosto passado a esta data não parece que o ritmo do desmatamento tenha se arrefecido. Os ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário intensificaram – de fato – a sua atuação em regiões críticas da Amazônia, mas outros, poderosos indutores de desmatamento, como Agricultura e Transportes, seguem se comportando como se nada tivessem a ver com o problema. Há indicações de que novas técnicas, já dominadas pelo setor mais dinâmico do agronegócio, estão permitindo desmates extensos em meses de chuva, o que teria ocorrido com mais intensidade em fevereiro deste ano, no Mato Grosso. Também se fala estar se esboçando um novo arco do desmatamento acima da calha do Rio Amazonas, entre o sul do Amapá, norte do Pará e sul de Roraima. Não há dados a respeito, mas são informações preocupantes. A expectativa da Ministra dependerá, fundamentalmente, do que vai acontecer daqui até o final de julho.

O Brasil e o Mundo

Mais preocupante que o placar do governo Lula em relação aos seus antecessores, é a situação do Brasil frente à comunidade internacional. Da assinatura do Protocolo de Quioto (que estabeleceu uma meta de redução de emissões para os países desenvolvidos correspondente a 5,2% em relação aos níveis de 1990), em 1997, até 2004, o Brasil já acrescentou umas 300 milhões de toneladas de carbono à atmosfera a mais em relação aos volumes que emitiria caso mantivesse a já elevada média de desmatamento dos anos 90. A prosseguir nesta escalada, o desmatamento na Amazônia poderá, por si só, comprometer boa parte dos esforços internacionais para redução de emissões mesmo sendo cumpridas as metas de Quioto. As emissões brasileiras evoluem de 3 para 4% do total das emissões mundiais atuais. Não se pode comparar a responsabilidade do Brasil com a dos países desenvolvidos, que vêm poluindo a atmosfera há mais de 150 anos, na produção do efeito estufa. Mas não se pode mais negar a sua absoluta responsabilidade em relação aos esforços atuais e futuros para se tentar mitigar as conseqüências do efeito estufa.

Significa dizer que, para além dos efeitos nocivos que provoca para o país e para os brasileiros, desperdiçando recursos florestais, reduzindo sua biodiversidade e os recursos hídricos, afetando as condições climáticas locais, aumentando as doenças respiratórias e gerando passivos crescentes para as futuras gerações, o desmatamento na Amazônia tem impacto crescente sobre a situação do clima mundial.

A diplomacia brasileira teve um papel importante nos avanços até agora conseguidos internacionalmente no combate ao efeito estufa. A Convenção sobre a Mudança Climática da ONU foi assinada no Rio de Janeiro, em 1992. O Brasil esteve ativo na formulação do Protocolo de Quioto e uma sua proposta levou à instituição do MDL – Mecanismo de Desenvolvimento Limpo. Estivemos entre os primeiros países a ratificar Quioto e a realizar o seu inventário nacional de emissões. Porém, a opção política de excluir o tratamento das emissões oriundas de desmatamento do escopo dos acordos internacionais (e do MDL, em particular), deixou o país sem instrumentos para trabalhar, neste âmbito, o seu principal fator de emissões.

O crescimento no ritmo do desmatamento significa, portanto, que estamos contribuindo como nunca para a deterioração do clima mundial, e que estaremos expostos, inevitavelmente, a crescentes e justificadas pressões internacionais. Além de incrementar as providências internas de combate ao desmatamento, o governo Lula deveria rever a postura de retranca da diplomacia no tratamento do tema no plano internacional, buscando apoio concr

eto da comunidade internacional para compensá-las. Afinal, fatores mundiais de mercado e o próprio efeito estufa contribuem para o desmatamento na Amazônia, e a sua eventual redução seria muito relevante para mitigar a crise climática mundial. Muito pior será sofrer pressões sem dispor de instrumentos para compartilhar e compensar os esforços em busca das soluções.

Estudo de geógrafo aponta novo perfil da violência no campo

O crime na área rural brasileira mudou de perfil. Em vez de matar de forma indiscriminada, os assassinos agora escolhem suas vítimas, praticam tortura e intimidação para expulsar os pequenos agricultores da terra. A nova forma de agir foi verificada pelo geógrafo Francisco José Avelino Júnior.

Professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), ele acaba de finalizar uma tese de doutorado na Universidade de São Paulo (USP). O estudo traz um panorama histórico sobre a violência no campo em Mato Grosso do Sul, mas também destaca os dados mais recentes sobre o tema em todo o Brasil.

"Não só aqui no estado, mas em quase todo o Brasil, o número de assassinatos tem diminuído. Em compensação, tem aumentado o número de ações terroristas, ameaças de despejo, queima de terras, invasão de casas, seqüestro de pertences e intimidação do trabalhador. O assassinato passa a ser seletivo", diz Avelino.

As principais vítimas fatais agora são líderes camponeses, advogados, políticos e agentes sociais que agem em defesa dos direitos de trabalhadores rurais. Eles fazem parte de organização que, a partir da década 80, passaram a atuar no campo. Entre elas, Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

O estudo do pesquisador do Mato Grosso do Sul confirma a tendência apontada no último relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de aumento e profissionalização dos assassinos da área rural. Em 2003, 73 pessoas morreram em conflitos no campo. Esse número caiu para 39 em 2004. Mas, em compensação, o número de pessoas envolvidas nos conflitos agrários subiu de 1,6 mil para 1,8 mil.

Desmatamento na Amazônia destrói área que corresponde ao estado do Alagoas, segundo Inpe

Brasília – Na Amazônia, o número de áreas desmatadas cresceu 6% em um ano, de 2003 a 2004. A floresta perdeu 26.130 quilômetros quadrados de mata: um território que praticamente corresponde ao tamanho do estado do Alagoas. Com isso, 17,3% da floresta já foi destruída.

Esse índice é uma projeção do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), feito a partir de 103 imagens de satélites. O número, contudo, tem margem de erro de 5%. O último índice será apresentado até o fim do ano.

Essa é a segunda maior taxa de desflorestamento desde 1995, quando foi registrado um recorde de 29 mil quilômetros quadrados destruídos.

"O desmatamento dialoga fortemente com a dinâmica do desenvolvimento. Se não incorporarmos o critério de sustentabilidade para todos os aspectos da economia na Amazônia, será impossível combater o desmatamento apenas com ações de fiscalização e controle – e é isso que o governo está fazendo no âmbito do Plano de Combate ao Desmatamento", acredita a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

O desmatamento foi maior nos estados do Mato Grosso e Rondônia, como indica o caso do município de Aripuanã (MT). Por outro lado, São Félix do Xingu (Pará) – uma cidade com índices críticos – conseguiu reduzir em quase 40% o problema.

Semana da Mata Atlântica

A 44ª Reunião Extraordinária do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) abre nesta quarta-feira (18) as comemorações da Semana da Mata Atlântica, que se estende até o próximo domingo(22) na cidade de Campos do Jordão (SP). O Ministério do Meio Ambiente escolheu a Araucária, o pinheiro brasileiro, como tema desse ano.

O objetivo é chamar a atenção da sociedade para a necessidade de proteger o que resta das florestas com araucárias, vegetação típica do bioma (veja box). As araucárias ocupavam uma área de 200 mil quilômetros quadrados,  localizada principalmente nos estados do sul do País. Atualmente restam menos de 3% da área original.

Durante a reunião, serão anunciadas medidas do governo federal e do governo do estado de São Paulo para proteção das florestas com araucárias. A secretaria do Conama vai discutir e avaliar as 29 resoluções que  definem  vegetação e orientam procedimentos de licenciamentos para as atividades florestais no bioma Mata Atlântica.

O Conselho Deliberativo do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) poderá aprovar três novos editais. Com pelo menos R$ 23 milhões, o Fundo apoiará o fortalecimento da gestão ambiental nos municípios da área de influência da rodovia BR-163, a recuperação de matas em margens de rios, de nascentes e outros mananciais, e ainda financiar pequenos. Também estão previstas reuniões e seminários para debater e propor ações para preservação do bioma e para afastar o risco de extinção das araucárias.

O bioma Mata Atlântica está reduzido atualmente a 7,84% de sua cobertura original que já se estendeu por 1,3 milhão quilômetros quadrados do território brasileiro. Apesar da devastação, ainda abrange 17 estados brasileiros e ainda abriga uma das mais altas taxas de biodiversidade do planeta, somando cerca de 20 mil espécies de plantas e  1650 de animais(veja quadro). A Mata Atlântica é considerada patrimônio nacional pela Constituição Federal e pelo decreto 750/93. Em 1999, outro decreto presidencial instituiu o dia 27 de maio como Dia da Mata Atlântica.

Nos seminários e reuniões, em Campos do Jordão, técnicos do Ministério do Meio Ambiente, do Ibama, representantes de organizações não governamentais e cientistas discutirão estratégias de conservação e recuperação do bioma, apresentarão experiências de gestão nas unidades de conservação, experiências dos trabalhos realizados por ONGs e debaterão as propostas de monitoramento e fiscalização do bioma implantado pelo Ibama.

Com a Semana da Mata Atlântica, Além de apresentar e divulgar as medidas governamentais que estão sendo adotadas, o Ministério do Meio Ambiente quer mobilizar a sociedade brasileira para apoiar iniciativas que visem preservar o que resta da floresta com araucárias e atingir a meta do desmatamento zero no bioma Mata Atlântica. 

Araucária, o pinheiro brasileiro – Árvore de tronco cilíndrico e reto de copas com bem características, dando um destaque especial à paisagem. A araucaria angustifolia chega a viver 700 anos, alcançando diâmetro de dois metros e altura de 50 metros. No sub-bosque da floresta ocorre uma complexa e grande variedade de espécies, como a canela,  sassafrás, a imbuia, a erva-mate e o xaxim.

Originalmente ocupava 200 mil quilômetros quadrados do território brasileiro, abrangendo, principalmente os estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, mas também aparecia nas partes elevadas das serras do Mar, Paranapiacaba, Bocaina e Mantiqueira, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. 

Políticas contraditórias conduzem ao desmatamento na Amazônia

O desmatamento na Amazônia chegou a 26.130 quilômetros quadrados entre agosto de 2003 e agosto de 2004, segunda maior taxa desde 1995, quando foi registrado o recorde de 29.059 quilômetros quadrados. Os dados foram anunciados hoje pelo Ministério do Meio Ambiente. Eles foram obtidos a partir de análises feitas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. A área é pouco menor que à do estado de Alagoas. Com isso, 17,3% da cobertura florestal da Amazônia brasileira já foi destruída. Parte do potencial florestal brasileiro corre portanto o risco de desaparecer antes mesmo de se tornar conhecido.

A elevação da taxa anual de desmatamento demonstra que o Grupo de Trabalho Interministerial coordenado pela Casa Civil e criado em julho de 2003 para reduzir os índices de desmatamento na Amazônia Legal não conseguiu, no primeiro ano de existência, cumprir seu principal objetivo. Apesar de medidas positivas como a criação de novas unidades de conservação como as viabilizadas pelo Programa Áreas Protegidas da Amazônia[1] (Arpa, apoiado entre outros parceiros pelo WWF-Brasil) e o aumento da fiscalização em algumas áreas, outras iniciativas levam ao descontrole e à degradação social e ambiental. O Arpa já apoiou a criação de quase 16 milhões de hectares, mas ainda há muito por fazer.

Para o WWF-Brasil, o desenvolvimento sustentável ainda não foi adotado como política para a Amazônia pelo governo federal e por grande parte dos governos estaduais, apesar de constar de documentos, projetos e discursos oficiais. Enquanto poucos setores no governo federal seguem as diretrizes da sustentabilidade, a maioria promove ações que induzem a projetos de impacto negativo, por meio de incentivos ao avanço da especulação imobiliária rumo a áreas florestais, com o argumento de que é necessário expandir a agricultura. No entanto, grilagem, crimes, trabalho escravo e devastação ambiental estão entre as conseqüências dessas ações.

"O Ministério do Meio Ambiente tenta fazer sua parte ao criar áreas protegidas, um mecanismo comprovadamente eficaz, mas não suficiente, para frear o avanço do desmatamento, e ao propor e defender o projeto de lei de gestão de florestas públicas que está em discussão no Congresso Nacional. É preciso ainda convencer empresas e governos a dar uso social e econômico às florestas de modo efetivo", diz Denise Hamú, Secretária Geral do WWF-Brasil. “Falta aos governos federal e estaduais empenho na aprovação do projeto de concessão de florestas públicas e na implementação do plano de combate ao desmatamento”, enfatizou.

Emissão de CO2

A destruição de florestas também tem impacto direto sobre a emissão de gás carbônico e as mudanças climáticas. O Brasil é responsável por 2,51% das emissões de gás carbônico, sem incluir o percentual de queimadas. Quando incluído, o número sobe para 5,38% (segundo dados de 2000 do World Resources Institute), o que eleva a posição do Brasil de oitavo para quinto país emissor. Só as queimadas geram 370 milhões de toneladas de carbono a cada ano.

O risco é claro: se o ritmo atual de desmatamento for mantido, o Brasil poderá jamais se beneficiar do potencial da Amazônia, que desaparece num ritmo contínuo. Esse potencial é comprovado por números: hoje, os produtos de base florestal constituem o segundo maior setor do agronegócio. São opções de desenvolvimento mais adequadas aos recursos naturais brasileiros, e que podem beneficiar diferentes setores sociais. Quando adequadamente conduzida, mesmo a exploração industrial da floresta e o uso de áreas protegidas podem resultar em desenvolvimento, com fortes vínculos locais. Uma situação muito diferente da atual atividade predatória ilegal.

[1] O Arpa é um programa do Governo Federal, com duração prevista de dez anos, destinado a proteger uma amostra representativa da diversidade biológica no bioma Amazônia, criando e consolidando ao menos 50 milhões de hectares por meio de unidades de conservação e promovendo o desenvolvimento sustentável na região. Coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA) e pelo Ibama, é implementado em parceria com governos estaduais e municipais, com o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF), o Banco Mundial, o KfW (banco de cooperação do governo da Alemanha), a GTZ (agência de cooperação técnica do governo da Alemanha) e o WWF-Brasil.

Duas florestas nacionais do Amazonas com 567 mil hectares terão plano de manejo

Duas Florestas Nacionais (Flonas) de Boca do Acre, no sudoeste do Amazonas, criadas na década de 80, terão enfim o Plano de Manejo: a Flona Purus e a Mapiá-Inauini. A primeira tem 256 mil hectares e foi criada pelo decreto 96.190/88; a segunda tem 311 mil hectares e foi estabelecida pelo decreto 98.501/89.

"Os técnicos do Ibama e da Universidade Federal de Viçosa (UFV) há uma semana percorrem a área para fazer o laudo biológico e sócio-econômico", informou Virgílio Ferraz, chefe de fiscalização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no Amazonas. Segundo ele, o instituto não sabe hoje quantas famílias moram nas duas reservas nem tem clareza ainda do potencial extrativista dessas áreas. "Por isso esse levantamento é etapa fundamental para a elaboração do Plano de Manejo, que deve contar com a participação dos moradores das Flonas", esclareceu Ferraz.

Flonas são unidades de conservação de uso sustentável – ou seja, áreas de proteção ambiental que permitem a existência de moradores. O objetivo principal delas é o de promover a exploração regulada dos recursos madereiros. Desde a publicação da Lei nº 9.985, de 2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), toda unidade de conservação foi obrigada a ter um Plano de Manejo – documento que estabelece como e por quem as riquezas naturais podem ser economicamente aproveitadas, com baixo impacto ambiental.

Segundo Ferraz, outro ponto importante do levantamento é que ele possibilitará que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) reconheça as famílias que moram nas duas Flonas como beneficiárias da Reforma Agrária. De acordo com Miguel Abi Abib, chefe da administração do Incra no Amazonas, a visita às Flonas Purus e Mapiá-Inauini está na programação dos técnicos da unidade avançada do Incra em Boca do Acre. "Eles já deveriam estar em campo para fazer o cadastramento dessas famílias, mas o trabalho foi adiado porque o escritório local do Incra foi ocupado há uma semana", informou.

BR-163 integra eixo Mato Grosso-Pará ao resto do país

A BR-163 é um desafio do governo de integração do eixo Mato Grosso-Pará ao resto do país, afirmou Fábio Duarte, diretor do Departamento de Outorgas do Ministério dos Transportes, na audiência pública sobre o projeto de pavimentação e restauração da estrada. Ele destacou que, com a obra ligando Cuiabá (MT) a Santarém (PA) o Estado estará mais presente na região "trazendo desenvolvimento regional, dando atendimento às populações marginais, impulsionando a produção agrícola, viabilizando uma exportação mais econômica para países europeus, asiáticos e para a América do Norte", destacou.

Segundo ele, a região é "inóspita", localizada no "coração da Amazônia", e precisa da integração de diversos órgãos do Governo Federal. Uma região que carece de desenvolvimento e emprego, segundo o coronel Paulo Roberto Dias Morales, chefe da Divisão de Ensino e Pesquisa do Instituto Militar de Engenharia (IME).

O coronel apresentou, na audiência pública, realizada hoje no Ministério dos Transportes, Estudos de Viabilidade Técnica e Econômica, o Plano de Exploração Rodoviária e o Plano Básico Ambiental da BR-163. Na sua opinião, a rodovia levará emprego para a região. "A vantagem é trazer para uma região que carece de desenvolvimento soluções que possam reverter essa situação da falta de um emprego, de uma condição de trabalho, de implantação de indústrias", considerou.

Morales afirmou ainda que, nos primeiros três anos, com a realização da obra, haverá maior integração e oferta de empregos para a construção. "Depois, com os programas ambientais, haverá a absorção natural das pessoas nos trabalhos que devem ser desenvolvidos, integrando o empreendimento com os municípios, as universidades".

Gerente do Ibama acompanha no Pará situação de colonos ameaçados por madeireiros

O gerente-executivo do Ibama em Marabá, Ademir Martins, viajará nesta terça-feira para Conceição do Araguaia (PA) a fim de acompanhar a situação dos colonos do assentamento Padre Josimo Tavares, que invadiram as sedes do Ibama e do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Eles alegam que a invasão foi para se protegerem de ameaças feitas por exploradores ilegais de madeira do município de Redenção (PA).

O gerente-executivo do Ibama no Pará, Marcílio Monteiro, disse que 25 agentes de Belém, Tucuruí e Marabá chegarão na quarta-feira (18) a Conceição do Araguaia "para dar apoio aos assentados".

O assentamento Padre Josimo Tavares foi criado em 1997 junto com uma reserva legal federal de 30 mil hectares. No local estão assentadas 863 famílias. Em setembro do ano passado, a reserva foi invadida para exploração ilegal de madeira. Segundo Monteiro, na época, agentes do Ibama permaneceram na região por um mês, quando fizeram um levantamento da situação. "Foram realizados autos de infração e conseguimos retirar as pessoas da reserva", acrescentou.

Mas no dia 14 de fevereiro a invasão foi retomada e o gerente do Ibama disse ter encaminhado relatório ao Incra informando que a situação "estava muito mais grave que no ano passado". Monteiro contou que os barracos montados pelos invasores são próprios para exploração de madeira. Um relatório pormenorizado da situação já foi feito pelo Ibama apontando não só o crime de retirada ilegal de madeira, como lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

De acordo com Marcílio Monteiro, "gente humilde" está sendo explorada por pessoas do município de Redenção já devidamente identificadas: são cerca de 100 e aemaçam a vida dos colonos. O Ibama aguarda, agora, que a Polícia Federal cumpra o mandado de reintegração de posse expedido pela Justiça Federal em 23 de fevereiro.

José Eurípedes Pinto Aguiar, um dos trabalhadores rurais do assentamento Padre Josimo que deixou sua casa para refugiar-se com a família na sede do Incra, não esconde o medo de ser assassinado ou de ver alguém da família morto pelos exploradores ilegais de madeira. Em entrevista por telefone, ele pediu a presença de tropas federais na região por pelo menos seis meses, até que seja criado um batalhão para defender a reserva.

"Eu queria conclamar toda sociedade, o Ministério da Defesa, o Ministério do Meio Ambiente, para que se sensibilizem e mandem o Exército para cá como fizeram em Anapu. Eu queria pedir para esse pessoal não deixar acontecer o que aconteceu em Anapu. Quer dizer, mataram a freira primeiro e depois mandaram a segurança. Depois que morrer já morreu mesmo e aí deixa ver o que vai acontecer por aqui", desabafou o trabalhador rural.

No dia 12, os assentados de Padre Josimo reuniram-se com o Ouvidor Agrário Nacional, Gercino José da Silva Filho, para relatar os problemas da região. Eurípedes contou que durante a reunião recebeu bilhete de um dos invasores da reserva. No bilhete, acrescentou, estava escrito que "pessoas estavam na minha casa dizendo que queriam me encontrar para me matar". Dessa reunião participaram ainda quatro coronéis, policiais civis do Pará e representantes da Polícia Federal, informou Eurípedes.

Audiência na Câmara dos Deputados serve como palanque contra homologação em área contínua da TI Raposa-Serra do Sol (RR)

Em meio a uma enxurrada de críticas ao processo de demarcação da área, deputados e governador de Roraima aumentam a pressão pela transferência ao patrimônio estadual de terras de domínio da União. Gabeira considera argumentos apresentados contra a homologação “papo furado”.

O que era para ser uma audiência pública com o fim de discutir e avaliar as conseqüências do processo demarcatório da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol (RR) transformou-se em palanque contra a sua homologação em área contínua. O debate foi realizado ontem, dia 11 de maio, durante reunião da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados, convocada pelo deputado Fernando Gabeira (PV-RJ).

A composição da mesa deixou margem à suspeita de que a audiência seria na verdade um espaço aberto para que políticos contrários à homologação se manifestassem livremente. De um lado, o governador de Roraima, Ottomar Pinto (PTB), o presidente da Associação dos Produtores de Arroz de Roraima, Luiz Fernando Faccio, o presidente da Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima (Sodiur), José Novaes, e o ex-prefeito de Boa Vista (RR) e perito da Justiça Federal, Hamilton Gondim. De outro, o diretor de Assuntos Fundiários da Fundação Nacional do Índio (Funai), Artur Nobre Mendes, e o coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Marinaldo Justino Trajano. Quatro contra dois. O mediador da discussão foi o presidente da CMADS, Deputado Luciano Castro (PL-RR), que já ingressou em juízo para contestar a demarcação da Terra Indígena.

Além disso, os expositores escolhidos para defender a homologação foram colocados para falar em primeiro lugar, cabendo o restante de tempo à “acusação”, o que contraria as regras elementares de qualquer debate. Passaram pela audiência 14 parlamentares, grande parte da bancada de Roraima. Todos os deputados que se manifestaram condenaram a homologação em área contínua, com exceção de Babá (PT-PA) e Gabeira.

Por sugestão do deputado do PV do Rio de Janeiro será nomeada uma comissão externa de parlamentares para acompanhar o trabalho do grupo interinstitucional criado pelo presidente Lula com representantes dos governos federal e estadual para discutir e implementar as medidas compensatórias à homologação anunciadas pelo governo federal. São elas: destinar 150 mil hectares de terras da União para implantação de pólos agropecuários no Estado; o Incra vai cadastrar e assentar famílias não-indígenas que estão na TI e regularizar 10 mil propriedades, que assim terão acesso a crédito rural; concluir a avaliação das benfeitorias construídas na região; nenhum ocupante de boa fé será retirado da área sem indenização e sem um local para seu reassentamento.

A classe política de Roraima considera que a garantia dos direitos territoriais dos índios da região vai implicar atraso no desenvolvimento econômico do Estado e vem exigindo uma “compensação” maior que as medidas anunciadas pelo governo pela demarcação da área.

Homologação é irreversível

“A homologação foi amadurecida durante dois anos e não há disposição do governo em rever a decisão,” sentenciou Mendes. Ele apontou que as medidas compensatórias propostas pelo Palácio do Planalto já estão em curso e que elas serão capazes de “reconciliar” as facções políticas existentes no seio das comunidades indígenas e apoiar o desenvolvimento econômico de Roraima. “Já disponibilizamos R$ 1 milhão para as indenizações. Até o final deste mês, 28 proprietários que já haviam concordado com a retirada serão indenizados. A partir de junho, vamos concluir o levantamento das ocupações restantes.”

“A reserva Raposa-Serra do Sol é um fato irreversível. O que se discute é a possibilidade de atenuar a dureza da medida, como por exemplo, deixando as quatro comunidades [não indígenas] que vivem lá há muitos anos e também preservando o polígono dos arrozais,” insistiu Ottomar Pinto. Ele voltou a afirmar que a homologação em área contínua não tem “suporte antropológico” e também reivindicou a transferência para o seu Estado de uma área equivalente à da TI – 1,7 milhão de hectares – para ser destinada à produção agropecuária. O decreto homologatório assinado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva, em 15 de abril, incluiu no território da TI todas as ocupações não indígenas, com exceção da sede urbana do município de Uiramutã, e deixou de fora o leito das rodovias que cortam a região, aparelhos públicos (escolas e linhas de transmissão) e a base do Exército localizada na área. (Saiba mais).

“Ao contrário do que se diz, a homologação não vai prejudicar o desenvolvimento do Estado. O que prejudica o desenvolvimento são os desvios de dinheiro público que lá ocorrem. Somos brasileiros também, respeitamos as leis e o Estado Democrático e também queremos o desenvolvimento com respeito ao meio ambiente”, defendeu Marinaldo Trajano. Ele citou os problemas de contaminação de rios e desmatamento descontrolado existentes nas áreas ocupadas pelos rizicultores. Trajano também lembrou que os índios favoráveis à homologação em área contínua são a imensa maioria na região e que eles vêm defendendo isso de forma pacífica há mais de 30 anos.

Em resumo, contra a homologação da TI Raposa-Serra Sol em área contínua foram repisados os mesmos velhos argumentos de que ela prejudicaria o desenvolvimento econômico de Roraima, de que parte considerável dos índios seria contrária à medida e de que ela ameaçaria a segurança nacional ao esvaziar a região e impedir a presença do Poder Público. Em relação a este último ponto, as ONGs com atuação local voltaram a ser acusadas de defender uma suposta “internacionalização” da Amazônia e os interesses de grandes potências sobre os recursos naturais do País.

Luiz Fernando Faccio classificou de “forjado” o laudo antropológico que baseou o processo de demarcação da TI. “Estamos entregando mais de 1,7 milhão de hectares para uma população ‘mínima’ de indígenas, que não deve passar de 9 mil pessoas, porque os dados da Funai extrapolam”, atacou. As estimativas mais recentes apontam a existência de mais de 16 mil índios na área. Faccio sugeriu que haveria um plano arquitetado por organizações indígenas e indigenistas de criar um “novo país” em Roraima com a aglutinação de várias TIs.

O próprio deputado Fernando Gabeira qualificou de “papo furado” o discurso da “internacionalização” e as acusações contra as ONGs. Segundo o parlamentar, sua intenção ao pedir o debate foi de tentar resolver o conflito político em Roraima da maneira mais pacífica possível. “Não estou satisfeito com a situação. Precisamos negociar, avaliar as medidas compensatórias propostas pelo governo federal e as reivindicações de Roraima para chegarmos a um consenso”, afirmou. Questionado sobre a composição da mesa do evento ele respondeu que ela havia sido alvo de “negociações políticas” conduzidas pelo presidente da CMADS, Luciano Castro. ”É um espaço para se espernear," disse Gabeira.