Indígenas denunciam desnutrição crônica infantil em aldeias brasileiras

"A gente ouve muito os políticos falarem sobre a diversidade do Brasil, mas muito pouco é feito para preservar isso", afirmou Marcos Xukuru, da Associação dos Povos Indígenas do Nordeste e Minas Gerais (Apoinme), durante o lançamento de um manifesto contra a atuação do governo na questão indígena.

"A desnutrição de crianças é o problema mais grave que enfrentamos, e a política não tem respondido à altura", disse Xukuru. Em Dourados (MS), Léia Aquino Pedro, da aldeia Nhanderu-Marangatu, vive de perto esse problema. "As crianças estão morrendo mesmo. O atendimento médico não está bem, encaminhamos para um posto uma criança e tínhamos esperança de que ela voltasse bem, mas quando voltou para a aldeia, morreu no dia seguinte", contou.

Léia atribuiu o problema à falta de terra, de espaço. "Em 26 hectares, tem mais de 600 pessoas. Além desses, tem outro grupo, de 200 pessoas que vivem em oito hectares", disse. Sem espaço para plantar, ela contou que as crianças são atingidas pela desnutrição e as mães ficam doentes de preocupação. "Não sabem se vai ter despejo a qualquer hora, qualquer barulho elas saem correndo com as crianças".

No Mato Grosso do Sul, segundo Egon Heck, do Conselho Indigenista Missionário regional, de cada mil crianças que nascem, 64 morrem. "A média nacional está em torno de 15 por mil", informou. De acordo com Heck, existe uma situação bastante generalizada de deterioração das economias dos povos e a grande maioria dos índios não tem mais plantações dentro de suas terras. "Então eles dependem de programas de renda básica, etc. Isso faz com que o nível alimentar caia muito", disse.

Ibama considera válida e legal audiência pública sobre integração do São Francisco

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) conseguiu cassar a liminar impetrada pelo governo do estado de Minas Gerais e o Ministério Público estadual e realizou a quinta audiência pública sobre o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do Projeto de Integração do Rio São Francisco a Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional, em Belo Horizonte. O encontro, no entanto, foi aberto e encerrado oficialmente ontem sem debates.

Na noite de ontem, pelo menos 350 manifestantes fizeram o enterro simbólico da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e do ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes. A principal reivindicação é que o estudo aborde as conseqüências da integração para o estado de Minas. Pelo Ibama, a audiência foi considerada válida e legal e só com a conclusão da rodada, o processo será avaliado e apresentados novos rumos, como a possibilidade de mais uma audiência no estado.

"Como o governo não aceitou as nossas reivindicações, inviabilizamos a audiência", disse Maria Dalci Ricas, superintendente executiva da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda). Segundo ela, a Resolução 0186 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), que regulamentou o artigo da Constituição Federal que prevê as audiências públicas, determina a realização de estudos abrangendo toda a baía.

"No caso do São Francisco, isso ainda é mais verdadeiro porque a maior parte da bacia está em Minas Gerais e o estado é responsável por 73,5% da água na calha do rio, enquanto a Bahia joga 20% na calha. Por incrível que parece, o estudo não tem uma vírgula sequer sobre Minas Gerais, sobre impactos negativos ou positivos", afirmou.

Dalci defendeu maior participação da sociedade nas audiências. De acordo com ela, pescadores de Pirapora, Paracatu e Januária, a mais de 800 quilômetros de Belo Horizonte, não se deslocariam até o local. A superintendente da Amda disse que sugeriu ao Ibama a realização de pelo menos seis encontros, mas recebeu como resposta a informação de que já haveria um em Belo Horizonte.

"Não temos nenhum motivo para aceitar uma audiência pública como essa, que apenas daria um caráter de legalidade ao processo de licenciamento. Queremos, no mínimo, três audiências que permitam participação maior dos mineiros neste processo de discussão", disse.

Caixa expõe diamantes dos Cinta Larga que vão a leilão em fevereiro

Seiscentos e sessenta e cinco quilates de diamantes em estado bruto, extraídos da reserva Rossevelt, no município de Espigão D’Oeste, em Rondônia, onde vivem os índios Cinta-Larga, vão ser leiloados pela Caixa Econômica Federal (CEF). A partir de hoje (24), as pedras ficarão expostas na sede da CEF, no centro da cidade, até o próximo dia 28.

Para o leilão, que será realizado no dia 2 de fevereiro, a Caixa Econômica separou os diamantes em 57 lotes. A avaliação inicial de cada lote varia de R$100 a R$ 80 mil.

Segundo o vice-presidente de Crédito da Caixa, Francisco Egídio, a disputa pelas pedras foi o motivo do confronto entre garimpeiros e índios em abril de 2004, que deixou um saldo de 29 garimpeiros mortos. Para evitar novos conflitos, o governo federal determinou, na época, o fechamento da reserva e autorizou à Caixa Econômica que abrisse uma agência dentro da reserva em caráter emergencial para que os diamantes entregues pelos índios fossem avaliados. As pedras foram trazidas para o Rio por agentes da Polícia Federal.

Ainda de acordo com Francisco Egídio, o dinheiro arrecadado com o leilão vai para as contas bancárias abertas pela CEF para os índios. A medida, de acordo com o vice-presidente de Crédito, é uma forma de promover a inclusão social dos Cinta-Larga.

ndios não deixam sede da Funai em Manaus mesmo com nomeação de interventor

Os índios que ocupam o prédio da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Manaus (AM) não deixaram o local mesmo depois que a instituição nomeou interventor para a sua representação. Esta era uma das principais reivindicações dos índios.

De acordo com Isabela Brant, procuradora do Ministério Público Federal (MPF) no estado, diante da situação o seu parecer sobre o processo de reintegração de posse do prédio à Funai é para que se mantenha a audiência marcada para hoje às 14 horas, com a presença da juíza federal da 1ª Vara, Jaiza Fraxe, de representantes do MPF, da Advocacia Geral da União (AGU) e de lideranças indígenas. "Soube que a situação está tensa e que os índios ameaçam atear fogo no prédio, caso a polícia chegue", disse a procuradora.

Cerca de 100 índios de diferentes etnias, incluindo mulheres e crianças, ocupam há 21 dias o prédio da fundação em Manaus. Segundo Roberto Lustosa, vice-presidente da Funai, uma comissão de sindicância será formada para apurar as denúncias feitas pelos índios. A idéia é criar um grupo de trabalho com representantes da fundação, do governo do estado e de lideranças indígenas para estabelecer uma agenda positiva para 2005.

A principal reclamação dos índios é quanto à demora na demarcação de terras dos Mura na região de Altazes, a 113 quilômetros de Manaus. Em entrevista à Agência Brasil, Jecinaldo Sateré-Mawé disse que as lideranças indígenas não admitem o retorno do atual administrador Benedito Rangel de Moraes ao comando da Funai no Amazonas. Rangel de Moraes está de férias e os indígenas reivindicam sua substituição.

Além da demarcação da reserva em Altazes, Jecinaldo Sateré-Mawé afirmou que os índios amazonenses têm problemas também em Barueri, Novo Airão e Barcelos. No município de Novo Airão, por exemplo, ele informou que é constante a invasão de terras indígenas por madeireiros.

União Indígena pede investigação sobre provável morte de índios e madeireiros no Amazonas

A União das Nações Indígenas de Tefé, no Amazonas, prepara documento, a ser entregue à Fundação Nacional do Índio (Funai), em que informa sobre a provável morte de cinco índios da etnia Tucano e dois madeireiros no rio Curuena, afluente do Jutaí, que fica a dois dias de barco de Tefé. Segundo Jean Robson Pinheiro, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no texto é feito pedido à fundação para que solicite à Polícia Federal a investigação do caso e a verificação sobre a existência de feridos.

De acordo com Jean, este é o segundo conflito entre tucanos e madeireiros ocorrido no mês de janeiro. "Este último aconteceu por volta do dia 16 deste mês. Moradores da Aldeia Boa Vista, próxima ao rio Jutaí, estão nos passando algumas informações", afirmou.

A representação da Funai responsável pela região é localizada em Manaus e está sendo ocupada por índios há 21 dias. O vice-presidente da fundação, Roberto Lustosa, disse estar aguardando o documento por fax. Ele acrescentou que, diante dos problemas por que passa a sede do Amazonas, a situação é dramática. "Não temos condições de operar em Manaus. Os índios ocupam o prédio da Funai e agrediram um funcionário na última sexta-feira. Não temos segurança para trabalhar", concluiu.

Codevasf estuda concessão de terras para reforma agrária no São Francisco

Além dos 350 mil hectares desapropriados pelo governo na região do Rio São Francisco, dos quais pelo menos 50 mil serão utilizados para assentamentos, outros 100 mil hectares de terras da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e o Parnaíba (Codevasf) também serão disponibilizados para o projeto de reforma agrária do governo federal. O formato jurídico para a utilização das terras da Codevasf ainda está em estudo pelo Executivo, mas a idéia da Companhia é que as terras sejam disponibilizadas por meio de concessão.

Segundo o presidente da Codevasf, Luiz Carlos Everton de Faria, as terras que serão disponibilizadas pela empresa estão situadas em localidades próximas a projetos de irrigação – o que facilita o plantio de diversas culturas para os futuros assentados. "Eles poderão se utilizar da tecnologia que a Codevasf possui em irrigação. A tecnologia da Codevasf é irrigação, e nós podemos dar essa contribuição em projetos de assentamentos a exemplo do que já estamos fazendo no Piauí", ressaltou.

Luiz Carlos Faria disse que está previsto no projeto de integração do rio São Francisco um levantamento de todas as propriedades adequadas para a criação de assentamentos, assim como as que são consideradas ideais para irrigação e fruticultura. "Ao passar os canais da integração de bacias, tanto o Norte como o Leste, vamos ter um levantamento de todas a propriedades adequadas à irrigação, áreas que são adequadas à reforma agrária", revelou.

Na avaliação do presidente da Codevasf, a concepção de desenvolvimento social prevista no projeto de integração das águas do Velho Chico pode efetivamente melhorar o potencial econômico da região – assim como reduzir as desigualdades no Nordeste brasileiro. "Não se trata simplesmente de água para o consumo humano. É todo o conjunto de ações que podem ser desenvolvidas nessas regiões. A água é um elemento fundamental para alavancar o desenvolvimento. São ações que com certeza vão propiciar auto-sustentabilidade das populações das margens dessa região", enfatizou.

Com a transposição do rio, Luiz Carlos Faria acredita que as águas atualmente perdidas com a evaporação dos açudes poderá garantir aumento da produção. "A integração de bacias nada mais é do que uma segurança hídrica para esses reservatórios de água e para as populações serem beneficiadas", defendeu.

Idéia de integração do São Francisco com a reforma agrária nasceu com Celso Furtado

A idéia de reservar terras para a reforma agrária dentro do projeto de transposição do Rio São Francisco é antiga, e surgiu na década de 60 com a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O economista Celso Furtado, que presidiu o órgão entre 1959 e 1964, defendia publicamente a idéia, mas não conseguiu colocá-la em prática.

O ex-presidente Juscelino Kubistchek também tentou vincular a reforma agrária ao projeto de transposição do rio. Ele enviou ao Congresso Nacional em 1959 projeto de lei, conhecido como a "Lei da Irrigação", que determinava a desapropriação de terras para assentamentos antes da implantação de qualquer projeto de irrigação nas margens dos São Francisco. O projeto foi derrotado pelo Congresso Nacional e, com o golpe militar de 1964, acabou sem ser reformulado para nova tentativa de votação pelo Legislativo.

Em entrevista à Agência Brasil em julho de 2003, o economista Celso Furtado criticou o que chamou de "bloqueio das forças reacionárias" à idéia inicial de vincular a reforma agrária à irrigação no Nordeste. Segundo o economista, que morreu em novembro do ano passado, o plano original da Sudene era baseado na "ilusão" de que havia um governo popular chefiado por Juscelino que, com forte apoio popular, conseguiria garantir um processo de transformações da estrutura agrária.

"Por isso, quando nós começamos, a primeira coisa que fizemos na Sudene foi um projeto de lei de reforma agrária disfarçado de uma lei de irrigação. Era preciso aproveitar melhor as terras irrigadas, e nós começamos a reforma agrária por aí. Isso foi levado a sério. Só que as forças reacionárias bloquearam tudo isso. Não foi possível tocar no problema agrário, que é o mais grave no Nordeste, sem dúvida nenhuma", ressaltou.

Na entrevista, realizada no primeiro ano de governo do presidente Lula, Celso Furtado disse estar otimista diante da nova proposta de transposição do São Francisco então em estudo pelo Grupo de Trabalho Interministerial criado em junho de 2003. "Hoje em dia, se há mais recursos para abordar o problema, como eu estou vendo que há muito mais recursos – e mais coragem dos políticos, que já não são mais tão subordinados aos interesses dos latifundiários – isso é um avanço", disse.

O projeto de integração que está em discussão pelo Executivo prevê não apenas a utilização das águas do São Francisco para perenizar os rios e açudes do Nordeste brasileiro no período de estiagem. A prioridade, segundo o governo federal, é melhorar as condições de vida da população que vive às margens do rio ou tem no São Francisco o seu meio de sobrevivência. O Orçamento aprovado no Congresso prevê R$ 600 milhões para a execução do projeto neste ano.

Os estados mais beneficiados seriam a Paraíba, o Rio Grande do Norte e o Ceará. O rio São Francisco possui 2,8 mil km de extensão, nasce em Minas Gerais, na Serra da Canastra, e desemboca no Oceano Atlântico, entre Sergipe e Alagoas.