Sancionada a lei de gestão das florestas públicas

Pouco mais de um ano depois de ser enviado ao Congresso Nacional, o projeto de lei nº 4.776/05, que vai regulamentar a gestão de florestas públicas no Brasil, foi sancionado na tarde da última quinta-feira, dia 2 de março, em Brasília, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A nova Lei (nº 11.284/06) foi publicada no Diário Oficial desta sexta-feira. Alguns dispositivos já estão valendo e outros ainda precisam ser regulamentados. A norma prevê a concessão de florestas públicas para exploração sustentável, a criação do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF) e de um Cadastro Nacional de Florestas Públicas, entre outros pontos.

Lula vetou quatro itens do texto aprovado definitivamente pela Câmara, no dia 6 de fevereiro, depois de ter passado uma primeira vez pela própria Câmara (leia mais) e pelo Senado, dias antes. O primeiro parágrafo vetado determinava que as concessões de florestas com mais de 2.500 hectares precisariam ser aprovadas pelo Congresso Nacional. O segundo ponto rejeitado previa a instituição de um conselho gestor para o SFB e o FNDF com participação de representantes de oito ministérios. O terceiro veto retirou da lei uma restrição que impedia modificações na dotação orçamentária dos recursos gerados pelas concessões que serão destinados ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O último tópico cortado da redação original definia que a indicação dos diretores do SFB deveria ser referendada pelo Senado.

Com exceção do item relacionado à questão orçamentária, os outros pontos vetados foram inseridos no texto do PL no Senado pelo relator da matéria, senador Agripino Maia (PFL-RN). O Ministério do Meio Ambiente (MMA) afirma que as alterações quebraram o acordo firmado entre o governo e a oposição, ainda na Câmara, para que a proposta fosse aprovada no Senado rapidamente e sem modificações. Segundo os técnicos do governo, os novos dispositivos acrescentados por Maia são todos inconstitucionais.

A aprovação do projeto no Senado chegou a ficar ameaçada por obstáculos colocados por parlamentares de oposição. Alguns deles tentaram usar as negociações em torno da proposta para conseguir do governo o atendimento de reivindicações que nada tinham a ver com a matéria, como a liberação de verbas e concessões nas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) que estão em andamento no Congresso. Um novo acordo com a oposição definiu que as alterações propostas pelo PFL deveriam ser aprovadas imediatamente pela Câmara, o que acabou ocorrendo no dia 6/2.

"Reforma florestal"

Em seu discurso durante a solenidade de assinatura da nova lei, no Palácio do Planalto, o presidente Lula qualificou-a como uma “revolução na ocupação das florestas” e uma “reforma florestal”. Lula voltou a dizer que a política ambiental de seu governo vem sendo executada por todos os setores da administração federal. “O PL de gestão é a coroação de uma série da ações integradas que apontam para uma novo tipo de desenvolvimento na Amazônia”, afirmou. O presidente citou a redução em 31% do desmatamento na região, entre os períodos 2004-2005 e 2003-2004, a criação de 15 milhões de hectares em Unidades de Conservação e o Plano BR-163 Sustentável, que prevê uma série de ações socioambientais para a rodovia que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA), como conquistas da política ambiental adotada em seu mandato.

Apesar de várias ressalvas, a nova lei também está sendo saudada por grande parte do movimento socioambientalista como um marco nas políticas ambientais, especialmente para o combate à grilagem de terras e ao desmatamento. “Quem ganha com o novo sistema de gestão das florestas são os Estados, os municípios e o setor florestal brasileiro, que, até então, não tinha um marco legal definido. O principal objetivo do projeto é combater a grilagem de terras”, comentou Mauro Armelin, coordenador de Políticas Públicas do WWF-Brasil.

O comércio madeireiro no País, em grande parte, hoje, é alimentado com extrações ilegais – há estimativas apontando que mais de 70% da madeira comercializada em território nacional teria origem ilegal. De acordo com o governo, a intenção da lei seria justamente tentar proteger e estimular as empresas que operam na legalidade sustentavelmente o mais rápido possível e, assim, diminuir o espaço para o mercado negro e as madeireiras que trabalham de forma predatória. Além disso, ao obrigar a identificação e o cadastramento das terras onde estão localizadas as florestas, a norma também seria eficaz no combate à grilagem, considerada uma das principais causas dos conflitos hoje existentes na Amazônia. Mais de 60% das florestas da região estão em terras públicas.

“Esta lei não é uma panacéia, mas mais um instrumento para tentar manter as florestas de pé por meio do casamento entre a exploração econômica sustentável e a conservação”, afirmou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Ela fez questão de dizer que o governo Lula nunca “satanizou” nenhum setor econômico e que a nova legislação é fruto de negociações realizadas inclusive com a indústria madeireira.

“Esta é uma das ações mais importantes já adotadas no Brasil para tentar responder ao desafio de se conservar a floresta e, ao mesmo tempo, explorá-la de forma racional. Acho que estamos tirando um atraso de mais de cem anos com esta lei”, avaliou Jorge Viana (PT), governador do Acre. Ele esteve presente ao Palácio do Planalto e foi um dos maiores entusiastas do projeto de lei desde o seu envio ao Congresso, no ano passado. “A partir deste novo marco legal, poderemos garantir uma economia sustentável para a população de toda a Amazônia”.

O PL causou polêmica durante o ano passado entre alguns ambientalistas, pesquisadores, parlamentares e servidores públicos, que consideram a concessão de florestas mediante licitação pública por até 40 anos – conforme determina a nova legislação – uma forma de privatização e até de internacionalização de grandes porções de terra na Amazônia. Em carta que circulou pela Internet, o renomado geógrafo Aziz Ab´Saber, por exemplo, citou os modelos florestais de países do Sudeste Asiático e da África como causadores de “gigantesco desastre ecológico-ambiental, com perdas irreparáveis nos domínios da flora e da fauna”. No caso da Austrália, o professor Aziz apontou a “perda de controle na gerência e fiscalização das atividades” (saiba mais).

Caráter experimental

Em seus primeiros dez anos, o novo sistema será operado em caráter experimental e, segundo estimativa do MMA, deverá dispor aproximadamente 13 milhões de hectares de florestas na Amazônia para exploração comercial, o que equivale a 3% do território amazônico. De acordo com o diretor de Florestas do MMA, Tasso Azevedo, é possível que, até o início do ano que vem, as primeiras concessões comecem a ser licitadas. Azevedo diz ainda que as primeiras áreas concedidas estarão localizadas no Sul do Pará, na área de influência da rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém), dentro do Distrito Florestal Sustentável (DFS) criado pelo governo no dia 13 de fevereiro. Também devem começar a ser exploradas nessa primeira leva de concessões as Florestas Nacionais do Jamari (RO) e do Carajás (PA), além das Florestas Estaduais de Maués (AM) e de Antimari (AC).

A nova legislação prevê a concessão de unidades de manejo pequenas, médias e grandes, para garantir o acesso de pequenos e médios produtores ao novo sistema. Além disso, também determina que, antes da destinação de uma área para concessões comerciais, deverão ser feitos estudos para criação de Unidades de Conservação de uso sustentável (Florestas Nacionais, Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável) e assentamentos florestais, que configuram as outras duas
formas de gestão das florestas públicas delineadas pela lei.

As concessões autorizam a exploração de serviços (turismo ecológico, por exemplo) e produtos, mas não significarão qualquer tipo de posse ou domínio sobre a área explorada. Os contratos terão prazos de até 40 anos e serão alvo de auditorias independentes de três em três anos. Além disso, ao final de cinco anos de aplicação da lei, será realizada uma avaliação geral do sistema. O Ibama vai fiscalizar os planos de manejo florestal e o SFB será responsável pelo cumprimento dos contratos de concessão, pela gestão do FNDF e pelo fomento à atividade florestal.

Até 20% da receita gerada pelas concessões servirá para custear todo o modelo, incluindo verbas para o SFB e o Ibama. Os 80% restantes serão divididos da seguinte forma: 30% para os Estados onde estiver localizada a floresta, 30% para os municípios e 40% para o FNDF. No caso das Flonas, 40% daquele total irão para o Ibama e o restante será igualmente dividido entre Estados, municípios e o FNDF.

Leia editorial do Instituto Socioambiental, publicado em junho de 2005, sobre o o projeto de lei que agora virou lei.

Confira os principais pontos da lei

Formas de gestão – Hoje existem duas formas de manejo em terras públicas: a produção florestal comunitária (populações tradicionais e locais, Projetos de Desenvolvimento Sustentável-PDS, assentamentos agroflorestais, Reservas Extrativistas) e, por gestão direta do Estado, em Unidades de Conservação específicas (Florestas Nacionais e Estaduais). O projeto acrescenta a essas duas uma terceira, que são as concessões para manejo florestal para empresas privadas mediante licitação pública com critérios ambientais e sociais.

Exigência de licenciamento e EIA/Rima – Os procedimentos necessários às concessões deverão ser acompanhados de licenciamento ambiental. As obras de infra-estrutura associadas às atividades desenvolvidas (estradas, construções, portos etc.) e, nos casos onde for constatado risco ambiental, as próprias atividades também precisarão de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/Rima).

Limites e prazos das concessões – O prazo máximo da concessão será de 40 anos. Todo o sistema de concessões será reavaliado depois dos cinco anos iniciais. Em cada lote de concessões, o concessionário (individualmente ou em consórcio) poderá deter no máximo dois contratos e sua concessão ficará limitada a 10% da área total disponível para concessões num prazo de dez anos.

Concessões para empresas e organizações nacionais – Apenas empresas ou pessoas jurídicas nacionais poderão concorrer às licitações.

Regras de transição – Os órgãos ambientais e fundiários competentes vão averiguar o andamento dos planos de manejo em operação legalizados até a data em que a lei entrar em vigor e o tipo de ocupação da área onde eles estão ocorrendo. Caso não sejam identificadas irregularidades técnicas ou em relação à posse da área (grilagem), os planos poderão ser mantidos até que seja realizado processo licitatório na área.

BR-163 – Foi criada uma regra de transição especial para a área de influência da rodovia BR-163: até a primeira licitação, o Poder Público poderá realizar concessões florestais na região numa faixa de cem quilômetros ao longo da estrada (unidades de manejo em áreas públicas não ultrapassando, somadas, os 750 mil hectares) e em florestas nacionais.

Garantia dos direitos territoriais das populações tradicionais e locais – O Plano Anual de Outorga Florestal (PAOF) de uma área deverá prever zonas de uso restrito destinadas às comunidades locais; antes de dar a concessão, o Poder Público terá de identificar e regularizar a posse das comunidades locais e tradicionais que eventualmente vivam na área apta à concessão. O conceito de comunidade local utilizado é o definido pela Convenção de Diversidade Biológica (CDB): “populações tradicionais e outros grupos humanos, organizados por gerações sucessivas, com estilo de vida relevante à conservação e à utilização sustentável da diversidade biológica”.

Serviço Florestal Brasileiro (SFB) – Deverá atuar como gestor do sistema e fomentar o desenvolvimento florestal. A idéia é restringir a atuação do órgão à gestão das florestas de domínio público federal e deixar as atividades relativas às florestas plantadas (silvicultura) em áreas privadas sob responsabilidade do Ministério da Agricultura (MAPA). Também deverá gerir o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF).

Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF) – Os recursos do Fundo deverão ser investidos prioritariamente em: pesquisa e desenvolvimento tecnológico em manejo florestal; assistência técnica; recuperação de áreas degradadas com espécies nativas; aproveitamento econômico racional e sustentável dos recursos florestais; controle e monitoramento das atividades florestais e desmatamentos; capacitação em manejo florestal e formação de agentes multiplicadores; proteção e conservação. Os recursos do fundo somente poderão ser destinados a órgãos e entidades públicas – principalmente de pesquisa – ou de entidades privadas sem fins lucrativos. Não há definição específica sobre percentuais a serem aplicados em cada área.

Estímulo à criação de novas Unidades de Conservação – A proposta determina que, antes de fazer as concessões florestais, o Poder Público deverá definir as áreas prioritárias para as concessões, para o manejo comunitário e para a criação de novas UCs. O projeto, portanto, impõe a necessidade de se estudar e criar novas áreas protegidas.

Recursos e competência do Ibama – O Ibama será responsável pela autorização, fiscalização e controle das atividades florestais desenvolvidas em áreas federais. Também deverá expedir licenças e estudos de impacto ambiental para obras associadas à produção florestal. O percentual de 30% da parcela fixa anual destinada ao SFB ou 9% do preço total pago pela concessão deverá ser destinado ao órgão. A Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental (TCFA), que hoje, muitas vezes, não tem destinação certa, será vinculada ao orçamento da área de fiscalização do Ibama.

Transferência de competências para Estados e Municípios – Descentralização das atribuições do Ibama. Órgãos ambientais estaduais poderão autorizar e fiscalizar a exploração florestal em áreas sob sua jurisdição. As esferas de governo estadual e municipal também deverão criar órgãos gestores das concessões florestais em áreas de domínio não federal. Os órgãos ambientais municipais terão esfera de atuação sobre florestas públicas e UCs municipais ou quando forem firmados convênios com o órgão ambiental competente.

Estudo deve pedir fechamento de porto da Cargill na Amazônia

O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) deve concluir pelo fechamento do porto construído pela empresa norte-americana Cargill, acredita André Muggiati, militante da organização ambientalista Greenpeace. De acordo com ele, o estudo deverá mostrar os impactos sofridos desde a instalação do porto, em 2003, na cidade de Santarém, às margens do rio Tapajós, no norte paraense.

A Justiça determinou a realização de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) na área em que a empresa nortea-americana Cargill construiu um porto para grãos. Após três anos de funcionamento o Tribunal Regional Federal da 1º Região derrubou os recursos da Cargill, especializada na produção de grãos, contra ação movida pelo Ministério Público Federal que pediu a realização do EIA. O estudo não foi exigido pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Pará (Sectam) quando autorizou o funcionamento do porto.

"Não existe compensação, como você vai compensar milhares de hectares de floresta que vem sendo desmatado ano a ano", questiona Muggiati. Dados do Greenpeace apontam que entre 2003 e 2004 foram desmatados 53 mil hectares de florestas em Santarém como conseqüência do aumento do cultivo de soja na região. Outro problema é que a área do porto é um sítio arqueológico ainda não estudado onde foram encontrados vestígios de cerâmica de civilizações pré-colombianas.

Os impactos são também sociais, de acordo com Muggiati. Ele conta que o porto atraiu produtores de soja de outras regiões que passaram a comprar e grilar terras, acabando assim com a agricultura familiar que antes ocupava Santarém. Esse movimento, segundo ele, empurrou os agricultores para as periferias da cidade. "Essas pessoas hoje vivem na periferia, não têm formação para obter um emprego e a maioria dos empregos que a Cargill criou são ocupados por pessoas vindas de fora", afirma.

A Cargill informou, por meio da assessoria de imprensa, que não vai comentar a decisão do Tribunal Regional Federal que foi publicada no Diário de Justiça do dia 03 de fevereiro. Com sede nos Estados Unidos, a Cargill é uma empresa fornecedora de alimentos, produtos agrícolas e de gerenciamento de risco.

Redução do desmatamento é essencial para conter mudanças climáticas

Um ano após a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, o WWF-Brasil faz um alerta à sociedade sobre a urgência do tema mudanças climáticas e sua relação direta com o desmatamento. As emissões de carbono resultantes dessa prática no país evidenciam a urgência de uma postura mais firme do governo brasileiro para manter de pé a floresta. No Brasil, o desmatamento é responsável por cerca de 80% das emissões de carbono porque depois de derrubada, a floresta é queimada.

“O Protocolo de Quioto é até hoje a única ferramenta internacional na luta contra um dos maiores desafios para a humanidade, o aquecimento global. Por isso, é essencial o cumprimento de suas metas", diz Denise Hamú, Secretária-Geral do WWF-Brasil. "Infelizmente, ainda estamos longe de implementar reduções significativas e duradouras que reduzam as emissões causadas pelo desmatamento”, complementa.

O ano de 2006 é crucial para a luta contra as mudanças climáticas no Brasil. “Tanto a construção de centrais termelétricas no Sul quanto o desmatamento na Amazônia devem ser combatidos urgentemente para  proteger a população brasileira e a biodiversidade dos possíveis efeitos catastróficos do aquecimento global”, alerta Giulio Volpi, coordenador do Programa de Mudanças Climáticas para a América Latina da Rede WWF.

A partir de agora, uma nova oportunidade se apresenta ao governo brasileiro para combater o desmatamento respeitando os acordos internacionais sobre mudanças climáticas. O plano de ação estabelecido na conferência da ONU sobre mudanças climáticas em Montreal, em dezembro, prevê a criação de mecanismos de compensação financeira aos países em desenvolvimento que diminuírem suas emissões por meio da redução de suas taxas de desmatamento. De acordo com esse plano, em março de 2006, o Brasil deverá apresentar uma estratégia de combate ao desmatamento no âmbito das mudanças climáticas.

Para o WWF-Brasil, existe um leque variado de opções para os tipos de compromissos que poderiam ser adotados. Uma delas seria o país se comprometer a adotar uma meta nacional para reduzir as emissões provenientes do desmatamento, acompanhada de verbas específicas para sua implementação. Se for estabelecido um compromisso internacional, ele poderia ser financiado por intermédio do mercado de carbono ou de outros mecanismos financeiros como empréstimos ou doações dos fundos multilaterais e bilaterais.

Em 2005, em todo o mundo, houve a maior quantidade de tempestades (26), a maior quantidade de furacões (14 – tempestades com ventos acima de 119 km/h) e a maior quantidade de furacões de categoria 5 (com ventos acima de 249 km/h). Para evitar o impacto ainda maior do aquecimento global, será preciso começar a reduzir as emissões globais entre 2015 e 2020. Os países industrializados terão que diminuir suas emissões em 30% até 2020. Segundo um documento que está sendo produzido pelo WWF, isso requer reduções significativas e rápidas das emissões provenientes de todas as fontes, incluindo o desmatamento.

“Se o Brasil quer realmente salvar suas florestas e contribuir com os esforços para diminuir as causas do aquecimento do planeta de modo mais incisivo, é importante  estar disposto a estabelecer um plano de metas nacionais quantitativas de redução do desmatamento na Amazônia”, diz Volpi.

Governo cria UCs e distrito florestal no entorno da BR-163 (Cuiabá-Santarém)

Exatamente um ano depois do assassinato da freira Dorothy Stang cometido por grileiros de terra, em Anapu (PA), e do agravamento de conflitos fundiários na região, o sudoeste do Pará é contemplado pelo governo federal com medidas de ordenamento territorial e proteção ambiental. Nesta segunda-feira, 13 de fevereiro, o presidente Lula assinou decretos criando sete novas Unidades de Conservação (UCs) e ampliando a área do Parque Nacional da Amazônia, agregando no total 6,4 milhões de hectares em áreas protegidas no entorno da BR-163, a rodovia que liga Cuiabá (MT) a Santarém (PA) e é um dos maiores eixos de desmatamento em toda a Amazônia.

Com os decretos assinados ontem, o Governo Lula amplia para quase 45,8 milhões de hectares a área de UCs na Amazônia. Desse total, 15 milhões foram criados pelo atual governo. A principal novidade é que estas UCs compõem o primeiro Distrito Florestal Sustentável do país, também criado pelo Presidente da República na tarde de ontem, com área total de 16 milhões de hectares, sendo 5 milhões destinados ao manejo florestal. A criação do distrito é a primeira ação fundamentada no novo marco regulatório do setor florestal, a lei de Gestão de Florestas Públicas, aprovada pelo Congresso na semana passada e que agora aguarda a sanção presidencial.

As novas UCs são de proteção integral e uso sustentável. Na primeira categoria estão incluídos dois parque nacionais e a ampliação do Parque Nacional da Amazônia. As unidades de uso sustentável, por sua vez, são quatro florestas nacionais, além de uma área de proteção ambiental. (Veja quadro abaixo).

O processo de criação destas áreas protegidas no Pará começou dias depois da morte da missionária americana, ocorrida em 12 de fevereiro de 2005, quando a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, anunciou o maior “pacote ambiental” da história do País, com a criação de mais de 5,2 milhões de hectares em UCs em toda a Amazônia e a interdição de 8,2 milhões de hectares, para estudos e possível criação de novas áreas protegidas no sudoeste do Pará, especialmente ao longo da BR-163. Em setembro do ano passado, o governo realizou uma série de consultas públicas nos municípios envolvidos a respeito da criação das áreas. Depois do processo terminado, algumas UCs sofreram alterações em suas extensões.

Unidade de conservação                            Área (em hectares)
Área de Proteção Ambiental do Tapajós           2.059.496
Parque Nacional Jamanxim                             859.722
Parque Nacional Rio Novo                               537.757
Parque Nacional da Amazônia (ampliação)       167.863
Floresta Nacional do Trairão                            257.482
Floresta Nacional Crepori                                740.661
Floresta Nacional Jamanxim                            1.301.120    
Floresta Nacional do Amaná                            540.417
Total                                                             6.464.518

Avaliação do Plano de Combate ao Desmatamento

Antes de anunciar as novas UCs no Pará, o governo federal promoveu uma reunião entre a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef e representantes do Grupo de Trabalho de Florestas do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS), para avaliação do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia. A reunião havia sido solicitada pelo Fórum em julho de 2005. Na audiência de duas horas, os representantes da sociedade civil cobraram uma atuação mais efetiva dos ministérios da Agricultura, dos Transportes e de Minas e Energia na execução do plano.

A cobrança se deve a constatação de que, apesar de a queda de 31% na taxa de desmatamento na Amazônia ser atribuída, em parte, às ações de controle colocadas em prática pelo Ibama e Polícia Federal, há evidências de que o plano de combate não tem recebido o investimento necessário de pastas importantes, que muitas vezes são indutoras de desmatamento. O GT Florestas afirmou que estes ministérios, além de não executarem as ações que lhe foram atribuídas, trabalham em sentido contrário ao combate e prevenção dos desmatamentos.

Esse fator é fundamental, de acordo com a avaliação das ONGs, para que a gestão do presidente Lula corra o risco iminente de se tornar a recordista em desmatamentos na Amazônia. Essa foi a premissa das cobranças feitas pelos ambientalistas na audiência de ontem, onde estiveram presentes representantes do ISA, Greenpeace, Amigos da Terra – Amazônia, WWF, GTA, ICV, Cebrac, Rede Mata Atlântica e Ipam.

O Ministério da Agricultura, por exemplo, não possui um programa para incentivar o uso de áreas já convertidas e abandonadas que poderiam ser melhor aproveitadas, reduzindo assim a pressão pela abertura de novas frentes. Além disso não há regulamentação para o crédito agrícola, de forma a evitar o incentivo à abertura de novas áreas de florestas, o que foi consenso entre todos incluindo a ministra Dilma Roussef. O MMA estima que haja, hoje, na Amazõnia Legal Brasileira, 165 000 km2 de áreas desmatadas abandonadas.

Em relação aos grandes projetos de infra-estrutura, os ambientalistas relacionaram algumas obras que os preocupam, caso do asfaltamento da BR-319 (Porto Velho-Manaus), da hidrovia e das hidrelétricas do rio Madeira, em Rondônia, da hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, e da BR-163. O GT Florestas propôs que a ministra abra um debate sobre cada uma dessas obras para que sejam discutidos seus impactos e que medidas preventivas sejam adotadas antes de anunciar obras futuras, porque isso tem o efeito de induzir novas ocupações e frentes de grilagem.

O GT Florestas ainda cobrou medidas efetivas ao combate à impunidade generalizada na Amazônia brasileira, já que a grande maioria das multas aplicadas pelos órgãos ambientais não são pagas, enquanto os infratores da legislação ambiental continuam explorando (ilegalmente) recursos naturais sem qualquer ônus. Propostas concretas foram feitas ao Ministério do Meio Ambiente no estudo que o ISA coordenou sobre o Sistema de Licenciamento Ambiental em Propriedades Rurais implantado no Mato Grosso.

O GT Florestas solicitou também a implantação de uma agenda de avaliação permanente da eficácia do Plano de Combate ao Desmatamento e do empenho dos ministério em sua execução. O secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Capobianco, presente à reunião, afirmou que um sistema de monitoramento da execução de cada uma das ações do plano será colocado na internet para o público e será desenvolvida uma agenda de reuniões para a avaliação. A ministra-chefe da Casa Civil, por sua vez, comprometeu-se a dar resposta sobre as demandas apresentadas tão logo possa discutí-las com os ministros responsáveis pela execução do plano, em especial àqueles aos quais o GT Florestas solicitou maior envolvimento.

Os representantes das ONGs aproveitaram para reforçar junto ao presidente Lula várias das questões apresentadas à ministra Dilma, além de outras relativas à posição do governo federal na Terceira Conferência das Partes sobre o Protocolo de Cartagena de Biossegurança (MOP-3), em especial à rotulagem da carga transgênica de produtos.

Governo e sociedade discutem finalização do programa Amazônia Sustentável

Representantes do governo e da sociedade discutem, até quarta-feira (15), a finalização do Programa Amazônia Sustentável, que vai substituir o Programa Piloto para as Florestas Tropicais Brasileiras (PPG-7). O PPG-7 já trabalha na região de forma experimental desde 1995.

O programa fomenta o desenvolvimento sustentável, o uso e a proteção dos recursos naturais, a relação com as comunidades tradicionais – sejam elas moradoras da região, indígenas, quilombolas ou ribeirinhas – e o conhecimento que essas comunidades têm da região. O desafio é trocar ações destrutivas, como o desmatamento para dar lugar à agricultura, por atividades que possibilitem o sustento sem prejudicar a mata.

O PPG-7 "gerou uma base de conhecimento e experiências tão ricas que transbordam os seus objetivos iniciais", diz o texto divulgado sobre o programa que está sendo discutido. Segundo o texto, os três planos atualmente em vigor na Amazônia "bebem na fonte" do Programa Piloto: o Plano Amazônia Sustentável, Plano de ação para Prevenção e controle do Desmatamento e o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável da Área de Influência da BR-163, além da própria Lei de Gestão de Florestas Públicas.

O Programa Amazônia vai aumentar a abrangência do PPG-7, cobrindo toda a Amazônia. "Muda de escala e trabalha com o apoio ao desenvolvimento sustentável com as mesmas parcerias entre estados, municípios, ONGs [organizações não-governamentais], entidades sociais e vários ministérios e agora estamos incluindo também o setor privado", explicou a secretária de Coordenação da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente, Muriel Saragusse.

Muriel disse que, antes da lei, essas terras "estavam sujeitas a invasão, a grilagem e a processos degradatórios. As florestas públicas devem permanecer florestas e públicas, mas gerando benefícios para a sociedade, sociais e econômicos", afirmou o diretor do Programa de Florestas do ministério, Tasso de Azevedo.

De acordo com a Lei de Florestas Públicas, aprovada no início do mês pelo Congresso Nacional, há três formas de gestão das florestas públicas e de gerar tais benefícios: criação de unidades de conservação que permitem a produção florestal sustentável; destinação para uso comunitário, como assentamentos florestais, reservas extrativistas, áreas quilombolas e outros; e a concessão por meio de licitação pública, que permite contratos de até 40 anos. "A terceira opção só pode ser aplicada quando as duas primeiras já foram feitas", explicou Azevedo.

Greenpeace e comunidades locais relembram luta de Dorothy Stang em Anapu

Um ano depois da morte da missionária Dorothy Stang, o Greenpeace e as comunidades locais de Anapu cobraram, neste sábado, do governo brasileiro a criação e implementação de áreas protegidas na região. Exigiram também a presença constante do Estado na Amazônia para acabar com as causas motivadoras da violência e crimes ambientais, garantindo um futuro sustentável e pacífico para a floresta e seus habitantes.

Ativistas, comunitários e representantes de outras ONGs ambientalistas e de defesa dos direitos humanos colocaram 772 cruzes de madeira pintadas de branco e outras 48 cruzes vermelhas, próximo ao túmulo de Irmã Dorothy, no Centro São Rafael. As cruzes brancas representam os trabalhadores rurais assassinados em conflitos de terra nos últimos 33 anos somente no Pará, enquanto as vermelhas simbolizam os líderes comunitários atualmente ameaçados de morte no Estado. Junto às cruzes foram colocadas faixas com a mensagem: “Nem mais uma morte. Nem mais um hectare”. Em seguida, os manifestantes acenderam 100 velas e deixaram junto às cruzes.

“A criação e implementação de unidades de conservação é uma medida importante para frear o avanço da grilagem, do desmatamento e, conseqüentemente, da violência associada à ocupação ilegal de terras e à destruição ambiental na Amazônia”, disse André Muggiati, campaigner do Greenpeace na Amazônia. Segundo levantamento das ONGs CPT, Justiça Global e Terra de Direitos, dos 772 crimes ocorridos, apenas nove foram julgados. Após a morte de Dorothy, 18 líderes de trabalhadores rurais já foram assassinados no Pará.

Cinco dias após a morte de Dorothy, o governo federal anunciou um pacote de medidas para conter a escalada da violência e resolver os conflitos socioambientais na região. Entre essas medidas constava a criação de um mosaico de unidades de conservação (UCs) entre os rios Xingu, Tapajós e a rodovia Transamazônica, na região da Terra do Meio, e a interdição de 8 milhões de hectares para a criação de áreas protegidas às margens da BR-163 (Cuiabá-Santarém). Até agora, apenas parte dessas UCs foi criada, sem que qualquer medida para sua implementação tenha sido tomada.

Com relação à presença do Estado, houve alguns avanços, como a implantação de uma delegacia da Polícia Federal em Altamira, a convocação de sete novos agentes do Ibama para a região e a presença temporária de soldados do Exército no Pará. No entanto, o Greenpeace avalia que tais medidas não são suficientes diante da magnitude dos problemas existentes e são fundamentais investimentos significativos em infraestrutura e recursos humanos para fortalecer o Ibama, Incra, Polícia Federal e outros órgãos federais e estaduais.

As organizações que integram o Comitê Dorothy realizam amanhã (12/02) uma série de atividades em Anapu e em Belém para relembrar a vida e a luta de Irmã Dorothy por um modelo de desenvolvimento mais justo e pacífico para a Amazônia.

Pela internet

O Greenpeace também iniciou uma campanha pela internet pedindo a criação das áreas protegidas, implementação dos PDS (Projetos de Desenvolvimento Sustentável) de Anapu e governança na Amazônia. O protesto virtual é destinado ao presidente Lula, à ministra da Casa Civil Dilma Roussef, à ministra do Meio Ambiente Marina Silva e ao ministro do Desenvolvimento Agrário Miguel Rosseto.

Convivência entre militares e indígenas na fronteira nem sempre é harmoniosa

Na fronteira do Brasil e outros países amazônicos convivem militares e povos indígenas em uma relação nem sempre harmônica. "Temos questionado a forma como o Exército tem se imposto, desrespeitando nossos territórios milenares", disse o coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Jecinaldo Sateré-Mawé.

Além das críticas ao uso do território indígena, há relatos de discriminação. Maria Gonçalves, da etnia Tariano, moradora distrito de Iauaretê, em São Gabriel da Cachoeira (AM), no Alto Rio Negro, na fronteira com a Colômbia, diz que "há muita humilhação dos oficiais indígenas. Mesmo tendo o segundo grau completo, dificilmente conseguem virar cabos", afirmou.

Maria Gonçalves e Enerstina Alves (que é da etnia Dessano e também mora em Iauaretê) contaram que antigamente parte dos soldados se envolvia com muitas jovens e depois desapareciam quando elas engravidavam. Hoje já é diferente, conta. "Os militares quase todos vivem lá com suas famílias. Quando um soldado faz arruaça, os indígenas reclamam e ele é transferido", ressaltou Gonçalves.

De acordo com o chefe de Estado Maior do Comando Militar da Amazônia (CMA), general Villas Boas, o Exército é "bastante rígido com normas, mas não podemos retroceder à Idade Média e impedir que dois jovens namorem". Ele disse que quase todos os 27 pelotões de fronteira amazônicos estão sediados em áreas indígenas. "Se você pegar a foto de um pelotão, você não consegue distinguir quem é indígena e quem é soldado. Porque os índios também são brasileiros, também entram para o Exército e formam a maior parte dos cabos e soldados que atuam na região", ponderou o general.

O general também defendeu a presença militar em reservas étnicas, já que, segundo ele, contribui para impedir as invasões do território e, conseqüentemente, proteger a cultura dos povos indígenas.

"Na terra Yanomami há três pelotões de fronteira: Auari, Surucucu e Maturacá. Nessas áreas você não tem garimpo ilegal, extração ilegal de madeira, biopirataria ou contrabando", exemplificou o general. "Além disso, a presença do índio facilita a atuação do Exército, pela vinculação dele com o território, seu conhecimento da região".

De acordo com dados do Conselho Indígena de Roraima (CIR) e do Coiab, cerca de 430 mil índios vivem na Amazônia Brasileira e representam 60% da população indígena do país.

População era paga para ser cobaia, diz senador

O senador Cristóvam Buarque (PDT-DF), que preside a Comissão de Direitos Humanos do Senado, disse ter ficado "horrorizado" com os relatos dos moradores das comunidades ribeirinhas de São Raimundo do Pirativa e São João do Matapim, no Amapá. Ele visitou a região para verificar as denúncias de Haroldo Franco, promotor do Ministério Público Estadual, de que os ribeirinhos estariam sendo utilizados como cobaias em pesquisas sobre malária.

Em entrevista à Agência Brasil, o senador disse que cerca de 40 pessoas, todos homens, disseram ter aceito participar dos estudos, recebendo, em troca, de R$ 12 a R$ 20 por dia. De acordo com Cristóvam, os ribeirinhos contaram que eram submetidos, diariamente, a picada de 100 mosquitos. O senador disse que alguns ribeirinhos ainda querem participar da pesquisa porque sentem falta do dinheiro que recebiam. "Confesso que não sei o que foi mais triste: ouvir as pessoas que disseram que foram submetidas a pegar a doença, ou aquele que diz que estava sentindo falta do dinheiro e estava descontente comigo porque tive um papel na suspensão da pesquisa", completou.

Cristóvam explicou que as pessoas tinham que capturar 25 mosquitos por vez e aprisioná-los em um copo. "Depois, eles colocavam o copo na perna para que os mosquitos ficassem chupando o sangue durante uma, duas, três horas, o tempo que fosse necessário para que os mosquitos ficassem tão saciados de sangue que caíssem", contou. "Não era receber uma picada, mas receber tantas picadas quanto fossem necessárias para que o mosquito se sentisse plenamente alimentado e aí, gordo de sangue, caísse", destacou Cristovam, acrescentando que os participantes passavam por esse processo até totalizar 100 mosquitos. Depois de saciados, os insetos eram entregues aos pesquisadores.

O senador contou que um dos ribeirinhos disse se sentir "torturado durante horas e horas enquanto os mosquitos ficavam picando. "Um deles não consegue mais trabalhar. Ele sofre de uma doença permanente fruto da malária que contraiu ao ser picado por mosquito durante as pesquisas", disse.

Cristovam afirmou ainda que, em uma das comunidades, cerca de 50% das pessoas contraíram malária. "A gente não pode garantir que contraíram desses mosquitos, mas eles disseram que há meses não tinham casos de malária na comunidade", destacou.

Pesquisa com cobaias humanas podem não estar restritas só ao Amapá

O senador Cristovam Buarque (PDT-DF), que preside a Comissão de Direitos Humanos do Senado, acredita que as pesquisas sobre malária que supostamente envolveram cobaias humanas não tenham ocorrido apenas nas comunidades ribeirinhas São Raimundo do Pirativa e São João do Matapim, no Amapá. "Nada justificaria que só acontecesse no Amapá".

O projeto de pesquisa foi elaborado pela Universidade da Flórida, com financiamento de US$ 1 milhão do Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos. No Brasil, estava sendo coordenado pela Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Universidade de São Paulo (USP) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Cristovam destacou que o documento foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) porque não estava previsto, no projeto, o uso de cobaias humanas. "Ele previa apenas a captura, que é quando o mosquito encosta na perna, mas é capturado antes de picar. É isso que estava no documento", disse. O lembrou destacou que, nesse caso, o ribeirinho seria usado como "isca". "Quando você usa a pessoa para atrair o mosquito e prendê-lo, a pessoa é uma isca. Mas quando você usa a pessoa para ser picada, ela vira cobaia".

O senador afirmou que não quer criar um "pânico" com relação a pesquisas de modo geral, já que elas são importantes para o desenvolvimento da ciência. "Se a gente descobrir uma vacina contra a malária é um serviço imenso. Não queremos criar uma fobia contra as pesquisas", disse, acrescentando que elas devem ser feitas de acordo com a lei.

Cristovam informou que vai convocar uma audiência pública no Congresso para discutir o assunto. "Se não tomarmos providências imediatas, corremos o risco de que outros grupos brasileiros continuem submetendo sua saúde em troca de R$ 10 a R$ 20", destacou. A audiência deve ocorrer na segunda quinzena de fevereiro ou na primeira semana de março.

Sobre a punição dos responsáveis pelas pesquisas envolvendo os ribeirinhos no Amapá, o senador afirmou que não existe, na legislação brasileira, um crime específico para enquadrá-los. "Não tem a ver diretamente com o fato dramático, ético, de usar pessoas como cobaias. Mas simplesmente como se fosse um ferimento leve a uma pessoa, induzir a pessoas ao erro, serão penalidades muito pequenas", informou.

Omissão de frase em projeto permitiu o uso de cobaias humanas, diz pesquisadora da Fiocruz

Um erro na versão em português de um projeto de pesquisa sobre a malária teria permitido que populações ribeirinhas do Amapá fossem usadas, em 2003, como cobaias para serem picadas por mosquitos transmissores da doença.

O estudo foi financiado pelo Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos ao custo de US$ 1 milhão e estava sendo coordenado pela Universidade da Flórida, em parceria com a Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Universidade de São Paulo (USP) e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Segundo a pesquisadora da Fiocruz, Mércia Arruda, foi subtraída, na versão em português, uma frase que fazia menção exatamente ao uso de cobaias humanas em determinada fase da pesquisa, prática proibida no Brasil. "A pessoa que traduziu o documento de alguma forma omitiu a frase que falava sobre esse experimento e isso foi uma forma de o projeto ser aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep)", informou.

O documento também foi autorizado pelos conselhos de ética da Fiocruz e da USP. "Os órgãos dos comitês de ética só lêem a versão em português e a versão em inglês só foi submetida à universidade norte-americana", acrescentou Mércia.

Mércia diz que a Fiocruz defende a investigação sobre possíveis manipulações. "Vamos estar sempre do lado das pessoas e dos órgãos que vão investigar essas denúncias para colocar o documento na maior transparência possível".

De acordo com a pesquisadora, o projeto teve início em maio de 2003 e terminaria em abril de 2006, se não tivesse sido interrompido por determinação da Conep. Ela explica que, quando começou, a experiência com cobaia humana foi realizada porque, naquele momento, participou dos trabalhos de campo o americano Robert Zimermman, que conhecia apenas a versão inglesa do projeto.

Junto com ele estava o pesquisador ligado ao governo do Amapá, Alan Kardec, que entrou substituindo o pesquisador holandês, Jacó Voorhano, responsável pela tradução. Mércia informa que foi Kardec quem alertou para o uso de cobaias humanas. "Alertada pelo pesquisador Kardec por telefone, a USP determinou que essa parte da experiência fosse suspensa imediatamente", afirmou.

Para denunciar rota da madeira ilegal da Amazônia, Greenpeace entrega carregamento para PF em SP

São Paulo – Um carregamento de 29 metros cúbicos de madeira amazônica ilegal foi entregue hoje por ativistas do Greenpeace na sede da Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. A madeira, transportada em uma carreta, foi comprada pela organização ambientalista em uma operação cujo objetivo foi provar e mostrar como o comércio clandestino de madeira da Amazônia abastece o mercado interno brasileiro.

O Greenpeace também entregou à Polícia Federal documentos utilizados na legalização da madeira – notas fiscais e Autorizações de Transporte de Produto Florestal (ATPFs) -, além de um dossiê com locais e nomes de pessoas e empresas envolvidas da extração e venda do produto.

Segundo a coordenadora do programa Cidade Amiga da Amazônia, do Greenpeace, Rebeca Lerer, a operação durou quatro meses e foi a única maneira encontrada pelo Greenpeace para mostrar qual é o caminho percorrido pela madeira ilegal extraída da Amazônia. "Entramos em contato com as pessoas que extraem as toras, com as serrarias, com pessoas que fazem tráfico de documentos públicos e contratamos um frete nos mesmos padrões comerciais e de fraude que são praticados hoje em dia na Amazônia brasileira".

Além de encaminhar a denúncia à Polícia Federal e ao Ministério Público, o Greenpeace comunicou também o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

O Greenpeace pretende ainda mostrar para o governo que o atual sistema de monitoramento e controle da madeira tem falhas que permitem a comercialização da madeira ilegal como se fosse legal. "Nosso principal objetivo foi expor essas falhas, pedir que o governo corrija essas falhas e pedir que os órgãos de controle sejam capacitados e fortalecidos para cumprir seu papel para que a lei seja respeitada", diz Lerer.

Entre as falhas apontadas pelo Greenpeace, Rebeca destaca o sistema de controle, que é descentralizado, ou seja, a informação que é gerada na origem da madeira, como Rondônia e Mato Grosso, não se cruza com informação da madeira que chega a São Paulo, por exemplo. "Não há como checar se o que saiu de lá é exatamente a mesma coisa que chegou aqui".

Além disso, Rebeca afirma que o sistema é muito burocrático, baseado em papéis. "Então depende de o papel vir e voltar para que o cruzamento de dados seja feito. Diante da falta de pessoal e a demora desse tipo de trabalho burocrático, isso nunca é feito. Os criminosos se aproveitam dessas falhas de controle para continuar escoando madeira ilegal como se ela fosse legal."

De acordo com o coordenador da campanha Amazônia, do Greenpeace, Paulo Adário, a Polícia Federal informou que receberia a carga e que a encaminharia para um depósito. Logo depois, um inquérito seria aberto para apurar a denúncia e investigar os fatos.