Manaus e leste do Amazonas sofrem a seca mais severa dos últimos 103 anos, diz pesquisador do Inpe

Brasília – Manaus, capital do Amazonas, e todo leste do estado sofrem a estiagem mais severa dos últimos 103 anos. Esse é o cálculo do pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Carlos Nobre. De acordo com ele, a região oeste também apresenta os menores índices pluviométricos dos últimos 60 anos.

"No que concerne ao Rio Negro, em Manaus, esta é uma seca que só tem paralelo nos últimos 103 anos. Ou seja, desde 1902, quando iniciamos registros de nível do Rio Negro. Já no oeste da Amazônia, esta é a estiagem mais severa dos últimos 50, 60 anos", estima.

Nobre explica que a seca ocorre por três fatores: aquecimento do Oceano Atlântico, redução da transpiração das árvores e a fumaça produzida pelas queimadas.

"A principal razão é o aquecimento do Oceano Tropical Norte, que está mais quente que a média em até dois graus. Essa água induz muitas chuvas na região e também um movimento ascendente – comum em locais com muita chuva. E tudo o que sobe tem que descer. Esse ar, que desce sobre a Amazônia, dificulta a formação de chuvas. Isso explica a grande extensão, severidade e duração desta seca bastante atípica", explica.

Os dois outros fatores são menos importantes para determinar a intensidade da seca, segundo o pesquisador. Ele afirma que estiagens prolongadas reduzem a transpiração das plantas, o que diminui a reciclagem da água. Carlos Nobre relata ainda que o desmatamento existe em 17% da Amazônia brasileira "de forma bem distribuída".

No entanto, ele ressalta que há estudos que mostram que a fumaça das queimadas "pode, também, dificultar a formação das chuvas no fim do período seco".

Seminário em Sinop vai discutir políticas para saneamento na Bacia do Xingu

No dia 21 de outubro, em Sinop (MT), 500 quilômetros ao norte de Cuiabá, acontece um seminário para apresentar e discutir o diagnóstico promovido pelo Ministério das Cidades que constatou que é bastante precária a situação do saneamento básico em 14 municípios da Bacia do Xingu no Mato Grosso. O evento vai apresentar as conclusões do estudo e debater propostas e possíveis estratégias comuns para resolver o problema. Estarão presentes representantes do Ministério das Cidades, do Ministério do Meio Ambiente, da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), da Agência Nacional de Águas (ANA) e do governo estadual, além de prefeitos, técnicos e integrantes de entidades da sociedade civil.

A pesquisa foi articulada por organizações que participam da campanha ‘Y Ikatu Xingu, que tem o objetivo principal de proteger e recuperar as nascentes e as matas ciliares do rio Xingu no Mato Grosso, e pode ser considerada um dos primeiros resultados concretos da mobilização. Na região, sobretudo no Parque Indígena do Xingu, já foram registrados casos de intoxicação e mortandade de peixes por contaminação da água dos rios. Daí a preocupação da campanha com o problema do saneamento.

Iniciado em junho, o estudo abarcou, além de Sinop, mais treze municípios com sede urbana dentro da Bacia, abrangendo uma população de cerca de 207 mil pessoas: Canarana, Querência, Feliz Natal, São José do Xingu, Santa Cruz do Xingu, Marcelândia, Cláudia, Santa Carmem, Santo Antônio do Leste, União do Sul, Gaúcha do Norte, Nova Ubiratã e Ribeirão Cascalheira.

Entre outras conclusões, a pesquisa revela que só uma cidade, Sinop, possui aterro controlado para lixo, e mesmo assim ele é deficiente. Os outros municípios fazem a coleta, mas depositam seus detritos a céu aberto e sem nenhum procedimento especial. Além disso, em apenas três localidades – Gaúcha do Norte, Nova Ubiratã e Ribeirão Cascalheira – está sendo implantado sistema de tratamento de água. Somente em Cláudia existe rede de esgoto, mas a sua manutenção foi considerada inadequada. Para todos os municípios, foi indicada a necessidade de melhorias físicas e capacitação do corpo técnico dos servidores responsáveis pelo sistema de saneamento básico.

Norte do Mato Grosso ganha sua primeira Unidade de Conservação particular

Proprietários privados começam a fazer parte do esforço para proteger a região das nascentes do rio Xingu no Mato Grosso. O norte do Estado vai ganhar, em breve, a sua primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) estadual: a Terra Verde. Com cerca de 7 mil hectares, a área fica localizada na divisa dos municípios de Feliz Natal, Santa Carmen e União do Sul, quase 600 quilômetros ao norte de Cuiabá, e é atravessada pelo rio Arraias, um dos formadores do Xingu.

A idéia de criar a reserva partiu dos fazendeiros José Peixoto de Oliveira e Rosely Quissini, que resolveram ceder parte de suas propriedades. No dia 9 de setembro, os dois assinaram um protocolo de intenções com o secretário estadual do Meio Ambiente, Marcos Machado. O governo mato-grossense tem 180 dias para finalizar o processo de criação da UC. Segundo Oliveira e Quissini, o local abriga inúmeros animais silvestres e espécies raras de árvores que precisam ser preservadas, como o cedrinho, a itaúba, a peroba e a sucupira. O Mato Grosso possui apenas uma RPPN estadual, a Vale do Sepotuba, no município de Tangará da Serra. Existem outras 14 RPPNs federais no Estado, totalizando 172 mil hectares protegidos (a maior área em termos absolutos entre todas as unidades da Federação).

Amazonas decreta calamidade em todo o interior

O coordenador do Plano Emergencial S.O.S Interior, José Melo, secretário de Governo do Amazonas, afirmou que foi decretado estado de calamidade pública em todos os 61 municípios do interior do estado.

"O governador fez isso porque nossos rios começam a secar nas cabeceiras, nos altos rios, depois vão secando nos médio, até chegar ao baixo. Então o que é problema sério hoje nos altos rios, vai ser problema sério daqui a dois ou três dias nos médios rios e será problema muito sério daqui a uma semana no baixo rio", disse Melo.

Até quinata-feira (13), informações da Defesa Civil Estadual apontavam apenas seis municípios em estado de calamidade pública – e outros 15 em estado de alerta – por causa da seca forte e prolongada que atinge o estado.

"Na verdade todos os municípios do Amazonas têm algum tipo de problema. Mas nas comunidades que ficam na beira dos lagos e dos pequenos afluentes, que estão secos, a situação é mais grave. São mais de 1.200 comunidades com falta de água potável e alimentos", afirmou Melo.

Segundo levantamento da Defesa Civil Estadual, concluído na última quarta-feira, 32 mil famílias receberiam a ajuda emergencial do governo. Mas Melo ponderou que o número "é dinâmico" e que hoje pelos menos o dobro de pessoas já necessitam de assistência.

Amazonas começa a distribuir cestas básicas aos atingidos pela seca

O governo do Amazonas, com apoio do Comando Militar da Amazônia, iniciará nesta sexta-feira (14) a distribuição de cestas básicas, kits de medicamentos e galões de combustível a cinco dos 20 municípios castigados pela seca. "Já dispomos de 72 mil cestas básicas estocadas. Os primeiros atendidos serão Anori, Anamã, Manaquiri e Caapiranga, no Médio Solimões, e Humaitá, no rio Madeira", declarou Hiel Levy, da Agecom – Agência de Comunicação do governo do Amazonas.

Esses cinco municípios, além de Atalaia do Norte, no Alto Solimões, estão em estado de calamidade pública. Outros 15, localizados ao longo dos rios Solimões, Madeira, Purus e Juruá, estão em estado de alerta. De acordo com levantamento da Defesa Civil estadual, 32 mil famílias deverão receber assistência do Plano Emergencial S.O.S Interior, coordenado pela Segov – Secretaria de Governo.

O secretário estadual de Saúde, Wilson Alecrim, voltou a afirmar, por meio de sua assessoria, que o agravamento de doenças, principalmente casos de diarréia aguda, costuma ocorrer apenas durante a época em que os rios estão enchendo. Como prevenção, acrescentou, a Secretaria está intensificando a distribuição de soros para hidratação oral da população.

O ministro das Cidades, Márcio Fortes, prometeu somar esforços no atendimento às comunidades isoladas. Ele foi à Manaus para a abertura da 2ª Conferência Estadual das Cidades e pela manhã participou, ao lado do governador Eduardo Braga, de um sobrevôo a alguns dos municípios atingidos.

Fogo ameaça Floresta Nacional do Jatuarana, no sul do Amazonas

Entre os dias 1º e 26 de setembro foram detectados 1.686 focos de calor no Amazonas. Ano passado, no mesmo período, foram registrados 641 registrados – 13 ocorreram em unidades de conservação. O levantamento é da analista ambiental do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam), Mariza Macedo.

Apesar do aumento expressivo dos focos de calor identificados pelo satélite NOAA-12, o chefe da Divisão Técnica do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Virgílio Ferraz, afirmou que a única unidade de preservação do Amazonas ameaçada pelo fogo é a Floresta Nacional (Flona) do Jatuarana, em Apuí, no sul do estado.

"Ela é uma das mais recentes florestas nacionais criadas no Amazonas e, por conta disso, ainda não tem uma estrutura de apoio necessária, não conta com técnicos nela lotados. Por ser o município de Apuí um dos grandes alvos do processo de ocupação de terras públicas no estado, a Flona Jatuarana tem sofrido um intenso processo de ocupação diária", explicou Virgílio. A Floresta Nacional do Jatuarana foi criada em 2002 e tem 811 mil hectares.

"Por conta da estiagem prolongada, desde o início de junho nosso sistema já começou a identificar grandes focos de calor no interior da Flona. Isso coincidiu com nossas ações de fiscalização no sul e sudeste do estado. Tínhamos uma equipe próxima que se deslocou para a reserva. Os técnicos encontraram grandes áreas derrubadas e queimadas", contou ele.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) estima que a área atingida pelas queimadas na Flona do Jatuarana seja de 800 alqueires, mas o Ibama não quantificou os estragos.

Virgílio informou ainda que em outubro, quando os novos analistas ambientais concursados do Ibama tomarem posse, dois deles serão destinados à Floresta Nacional do Jatuarana. "Nós conseguimos autuar os grandes responsáveis pelas queimadas, mas é preciso haver uma presença constante no interior da unidade", concluiu.

O levantamento da analista ambiental do Sipam Mariza Macedo se baseia nos dados do Programa de Prevenção e Controle de Queimadas e Incêndios Florestais na Amazônia Legal (ProArco), do Ibama.

Seca na Amazônia é causada por dois pontos de aquecimento no Oceano Atlântico

A explicação para a seca que tem atingido a região Norte está no Oceano Atlântico, segundo Everaldo Souza, meteorologista do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam). "Há duas áreas de aquecimento. Na região da Bacia Norte, onde tem havido episódios de furacões, e na região subtropical, próxima à costa sul e sudeste do Brasil, há muita água quente. Isso provoca a formação de chuvas sobre o oceano. Como a atmosfera na região tropical é dinâmica, acontece um movimento de compensação: o ar mais frio desce, mas sobre a Amazônia. E isso inibe a formação de nuvens e a ocorrência de chuvas na região" explicou.

O fenômeno, segundo ele, tem sido observado nos últimos três meses e tende a se manter em outubro. Na última sexta-feira (23), os meteorologistas do Centro Técnico Operacional do Sipam em Manaus realizaram a reunião trimestral de análise climática. "O prognóstico é feito com base no conhecimento científico e em alguns modelos numéricos e estatísticos. Então, a tendência é que em outubro permaneça a condição de pouca chuva na parte sul da Amazônia, nos estados do Acre, Rondônia e no sul do Amazonas. Já em novembro e dezembro, as condições vão se normalizar. A tendência é que a estação chuvosa, então, ocorra normalmente", acrescentou.

Rio Negro registra nível mais baixo dos últimos 42 anos

O nível do rio Negro no Porto de Manaus está hoje em 16,97 metros, 53 centímetros abaixo da maior vazante (menor volume de água) já registrada pelo Serviço Geológico do Brasil (antiga Companhia de Pesquisa e Recursos Minerais, ainda conhecido pela sigla CPRM), ocorrida em 1963.

No dia 27 de setembro do ano passado, a altura das águas do rio Negro era de 21,74 metros. "As chuvas também diminuíram. Em agosto, elas foram quase metade da média registrada para o período entre 1961 e 1990", explicou Daniel Oliveria, supervisor de Hidrologia da CPRM. O índice de chuvas no mês passado foi de 29 milímetros, bem abaixo dos 139 milímetros medidos em agosto de 2004.

A Divisão de Atendimento aos Usuários do Centro Técnico Operacional (CTO) do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) em Manaus tem recebido relatos de problemas causados pela seca. São 171 usuários no interior do Amazonas, Roraima e Acre que se comunicam e falam com Manaus por meio de textos e voz enviados via satélite. "Com relação à grande vazante dos rios, nós registramos reclamações de usuários das cidades de Benjamin Constant, Ipiranga, Manacapuru, Boca do Acre e do posto indígena do Laranjal. Eles informaram que a seca prejudica inclusive a locomoção e traz muitas doenças", relatou Liliane de Araújo, chefe da Divisão de Atendimento aos Usuários da Coordenação de Atendimentos ao Usuário do CTO-Manaus.

Incêndio isola mais de 3 mil em terra indígena

Cerca de 3,5 mil pessoas estão isoladas na reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, porque a ponte que dá acesso ao local foi parcialmente queimada por volta das 3 horas da madrugada de hoje (22). A ponte Urucuri, localizada a 290 km de Boa vista, leva à aldeia Maturuca, onde acontece a festa em comemoração à homologação da reserva, razão pela qual milhares de pessoas foram ao local.

Até que a ponte seja reconstruída, apenas as autoridades presentes ao evento poderão deixar o local, utilizando avião. Participam da comemoração o assessor especial da Presidência, Cezar Alvarez, os presidentes da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, e a procuradora da 6ª Câmara (Comunidades Indígenas e Minorias) do Ministério Público Federal, Déborah Duprat.

O secretário estadual dos Direitos Indígenas Adriano Nascimento, que entrou em contato com o governo do estado para informar o incêndio, acredita que os responsáveis por queimar o Centro de Formação e Cultura Raposa Serra do Sul (antiga missão Surumu), no último sábado (17), estão envolvidos no atentado à ponte. "Acho que foram as mesmas pessoas que atearam fogo contra a missão. Mas o governo do estado não aceita isso".

Segundo o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, o Batalhão de Engenharia do Exército já foi acionado para reconstruir a ponte. "Acredito que os ônibus que trouxeram as pessoas para a região poderão sair amanhã".

Raposa Serra do Sol foi homologada em área contínua em abril. Nos 1,74 milhão de hectares de área vivem cerca de 15 mil indígenas. O decreto prevê que os não-indígenas têm um prazo de doze meses para desocupar a reserva. "Os funcionários da Funai e do Incra estão trabalhando no reordenamento agrário. Muitas das famílias não-indígenas já assinaram os laudos e nas pequenas vilas diversas pessoas se apresentaram espontaneamente para receber a indenização", afirma o presidente da Funai. Ele afirma, entretanto, que nenhum dos sete grandes produtores de arroz deixou a região até o momento.

Apesar do clima tenso, o presidente do Incra afirma que a festa não será interrompida. "Os povos indígenas contam com a autoridade do governo do estado. O Estado tem a responsabilidade de apurar e punir os responsáveis". Ele e o assessor da presidência pretendem deixar hoje a reserva.

Governo pretende criar quase 7,4 milhões de hectares em Unidades de Conservação no Pará

O sudoeste do Pará deverá ganhar mais oito Unidades de Conservação (UCs) nas próximas semanas, totalizando cerca de 7,4 milhões de hectares protegidos na região, segundo proposta do governo federal anunciada na quarta-feira, dia 14 de setembro. Estão previstas sete UCs na área de influência da rodovia BR-163 (Cuiabá-Santarém) que está sob regime de “limitação administrativa provisória”, desde fevereiro deste ano. Deverá ser implantada também a Floresta Estadual do Iriri, na região da Terra do Meio, na altura do município de Altamira (veja abaixo a lista completa das UCs). O Parque Nacional da Amazônia, na divisa do Pará com o Amazonas, deverá ainda ser ampliado em mais 173 mil hectares.

As medidas são conseqüência direta das ações lançadas pelo governo federal em resposta à seqüência de assassinatos de lideranças sindicais e trabalhadores rurais ocorridos no Pará, em fevereiro, em especial à morte da freira missionária Doroty Stang. No dia 17 de fevereiro, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, anunciou o maior “pacote ambiental” da história do País, com a criação de mais de 5,2 milhões de UCs em toda a Amazônia e a interdição de 8,2 milhões de hectares, para estudos e possível criação de novas áreas protegidas, no sudoeste do Pará, ao longo da BR-163 (confira). A maior parte das UCs anunciadas agora são resultado desta última medida.

Nesta sexta-feira, dia 16 de setembro, às 16h, em Belém, começa uma série de consultas públicas no Estado sobre a criação das áreas. As outras consultas ocorrem no dia 20, em Novo Progresso, às 9 h, na Igreja Matriz Santa Luzia; no dia 22, em Itaituba, às 9 h, na Área de Lazer dos Cabos e Soldados; e no dia 23, ás 14 h, no auditório da prefeitura de Jacareacanga.

O governo resolveu deixar de fora deste novo pacote de medidas a criação da Área de Proteção Ambiental (APA) da BR-163, que se estenderia numa faixa ao longo da rodovia, desde a Reserva Biológica da Serra do Cachimbo, ao sul, na divisa com o Mato Grosso, até o Parque Nacional (ou Estadual) do Jamanxim, ao norte. “Segundo o acordo feito entre o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e o governo paraense, esta discussão será encaminhada futuramente”, conta Maurício Mercadante, diretor do Programa Nacional de Áreas Protegidas do MMA. Ele explica que a insistência em criar a APA, neste momento, poderia dificultar as negociações que resultaram na criação das UCs. A região comporta uma intensa atividade econômica, centralizada no município de Novo Progresso, local onde ocorreram, no início deste ano, uma série de protestos de produtores rurais e madeireiros motivados por medidas de regularização fundiária do governo federal e que interromperam o tráfego de veículos na BR-163 por vários dias (saiba mais).

Mercadante explica também que as únicas áreas de proteção integral que deverão ser criadas nas próximas semanas pelo governo federal – os parques do Jamanxim e do Rio Novo – terão a função de corredores ecológicos. O primeiro, ao norte, vai estabelecer uma ligação do conjunto de áreas protegidas da Terra do Meio com as UCs propostas agora e o segundo, ao sul, fecha o polígono destas UCs, criando um mosaico próprio de áreas protegidas na margem oeste da rodovia BR-163. Todas as outras UCs anunciadas, a APA do Tapajós e as Florestas Nacionais (ou Estaduais), são de uso sustentável, ou seja, nelas são permitidas o manejo florestal e o extrativismo, por exemplo. Mercadante avisa que a proposta do governo federal, prevendo, inclusive, a existência de uma Reserva Garimpeira, respeita as atividades econômicas legalizadas já em curso na região.

Segundo estimativas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), pelo menos no ano passado, a criação de áreas protegidas e a interdição da região da BR-163 teriam contribuído para a diminuição do desmatamento na Amazônia. De acordo com os dados do Sistema de Detecção em Tempo Real (Deter) do Inpe divulgados no final de agosto, nas áreas abrangidas por UCs federais, os índices de desmates teriam caído 84%, para o período que vai do final de agosto de 2004 ao final de julho de 2005. O corte indiscriminado de árvores teria diminuído 90% na região da Estação Ecológica (Esec) da Terra do Meio e 91% na área interditada ao longo da rodovia Cuiabá-Santarém, para aquele mesmo período (para saber mais, clique aqui).

O governo Lula criou até agora mais de 8,913 milhões de hectares em UCs federais em todo o País, o equivalente a 21,6% do total. Em oito anos, segundo informações do MMA, a administração Fernando Henrique Cardoso teria criado mais de 9,455 milhões de hectares (24,1%). O ministério e o governo paraense ainda estão discutindo sob qual jurisdição, se federal ou estadual, ficará cada uma das novas áreas, fora a Floresta Estadual do Iriri. Após esta definição, o governo Lula pode chegar ao fim ostentando o título de campeão da criação de hectares protegidos por UCs.

Mosaico da Terra do Meio continua incompleto

A criação de novas UCs na Terra do Meio, localizada bem no centro do Pará, vem sendo aguardada com ansiedade pelo movimento socioambientalista. A região abriga áreas ainda bem conservadas e de grande biodiversidade. Apesar disso, lá também está localizada uma das frentes mais dinâmicas de desmatamento e de grilagem de terras da Amazônia. A região é palco de um intenso conflito fundiário que opõe grandes fazendeiros, grileiros e madeireiras irregulares, de um lado, e famílias de ribeirinhos e extrativistas, de outro (leia mais). Recentemente, a Justiça Federal interditou na região aquela que pode ser a maior área grilada do País, segundo denúncia do Ministério Público Federal(veja também). A intenção do governo ao criar UCs é justamente tentar impedir a ação dos comerciantes ilegais de terras e regularizar a situação das comunidades tradicionais locais.

No pacote de fevereiro, foram criados a Esec da Terra do Meio, a maior do planeta, com 3,3 milhões de hectares, e, contígua a ela, ao sul, o Parque Nacional da Serra do Pardo, com 445 mil hectares. Em novembro de 2004, já havia sido criada a Reserva Extrativista (Resex) Riozinho do Anfrísio, com cerca de 736 mil hectares (confira). As UCs formam um mosaico de áreas protegidas que foi proposto em um estudo realizado, em 2002, pelo ISA, sob encomenda do MMA. O trabalho revelou que a região, além de ser uma das menos conhecidas do País, é também uma das menos povoadas e apresenta cerca de 98% de seu território bem preservado. No total, até agora, foram criados na Terra do Meio cerca de 4,4 milhões de hectares em UCs.

O governo está finalizando o processo de criação de mais duas Resex no local: do Xingu, com 301 mil hectares, e do Iriri, com aproximadamente 396 mil hectares, ambas na altura do município de Altamira. Em junho, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o MMA, o governo paraense, o Ministério Público Estadual, a prefeitura de Altamira, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Fundação Viver Produzir e Preservar (FVPP) realizaram uma expedição ao longo do rio Iriri para cadastrar as famílias da região, emitir documentos civis para os moradores e realizar atendimentos de saúde. Em outubro, deve começar uma expedição semelhante na região da futura Resex do Xingu. Restaria ainda ser criada uma APA estadual, com 1,7 milhão de hectares, ao sul do Parque Nacional da Serra do Pardo.

“O fato de o governo ter criado essas áreas contribuiu imensamente para coibir ações de grilagem de terras e a exploração madeireira ilegal, mas ainda há muito a fazer no que se refere à consolidação das UCs já criadas e em fase de criação”, avalia Cristina Velásquez, assessora do Programa de Política e Direito Socioambiental (PPDS), do ISA. Ela lembra que é fundamental, além da instituição formal das UCs, um conjunto de políticas locais e regionais que possam garantir a sua efetiva

implantação e que incluam ações de esclarecimento da população local e operações de fiscalização. “Alguns fazendeiros têm se valido da demora na efetivação dessas ações para amedrontar e expulsar famílias, causando um clima de tensão e revolta”.

"O preço da terra já baixou e a ação de grileiros e madeireiros está diminuindo. Isto é cosequência da criação das UCs", concorda Tarcísio Feitosa, coordenador do projeto Terra do Meio, da CPT. Ele adverte, no entanto, que o governo precisa ouvir as comunidades locais antes de propôr qualquer coisa. "Não dá para criar novas áreas com base apenas em imagens de satélites. No caso da Floresta Estadual do Iriri, as famílias que moram lá são de agricultores. Eles queriam que fosse criado ali um tipo de UC mais adequado a esta realidade, como as Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS)". As Florestas Nacionais ou Estaduais formam uma categoria de UC que autoriza o manejo florestal, mas não a agricultura. Feitosa diz que as famílias que moram na região não têm nenhuma informação sobre a criação da Floresta do Iriri ou sobre as consultas públicas.

O grande mosaico do Xingu

Cristina Velásquez lembra ainda que a complementação do mosaico da Terra do Meio com os trechos de território restantes que ainda devem ser protegidos poderá significar a constituição de um outro grande mosaico contínuo de áreas protegidas, estendendo-se por quase toda a Bacia do rio Xingu, desde o Parque Indígena do Xingu, no norte do Mato Grosso, passando pelas Terras Indígenas (TIs) Capoto-Jarina, Menkragnoti e Kayapó, no sul do Pará, até o arco de TIs ao norte da Terra do Meio (Arara, Kararô, Koatinerno, Trincheira/Bacajá etc). “Estamos falando daquilo que pode vir a ser o maior mosaico de áreas protegidas do Brasil e talvez do mundo, com cerca de 26 milhões de hectares, identificados como de altíssima prioridade para conservação da biodiversidade”. O que significa um grande desafio para o governo em relação à gestão integrada de TIs e UCs. “Será preciso conciliar mecanismos de participação social e estratégias de proteção dessas áreas. Além disso, esse grande mosaico fortalece a idéia de que as TIs desempenham um papel fundamental na conservação da biodiversidade amazônica”.

O governo diz que está investindo na implantação das UCs. Em julho, o Ibama iniciou uma série de operações de fiscalização na Terra do Meio com o apoio da Polícia Federal e do Exército que devem estender-se até meados de outubro. Como resultado da ofensiva, já teriam sido lavrados R$ 50 milhões em multas por desmatamentos ilegais. Além disso, o fazendeiro José Dias Pereira foi preso acusado de desmatar uma área de mais de 6,8 mil hectares dentro da Esec e derrubar e queimar cerca de 2 milhões de árvores. Pereira, que continua detido em Santarém, a 710 quilômetros de Belém, foi multado em R$ 20 milhões. No ano passado, ele já havia sido autuado em R$ 3 milhões por desmatar e queimar 2 mil hectares de floresta. No total, em um ano, o produtor rural foi responsável pela destruição de uma área equivalente a 10 mil campos de futebol.

No último dia 12 de julho, foi criado na Assembléia Legislativa paraense um Grupo de Trabalho (GT) para combater a grilagem de terras com participação do governo estadual, do Ministério Público Estadual, da Seção do Pará da Ordem dos Advogados do Brasil, da Polícia Federal, da CPT, da Federação dos Trabalhadores da Indústria da Construção (Fetracompa) e de representantes das comunidades do interior paraense. O grupo deverá elaborar indicadores sobre a situação fundiária no Estado.

Madeireiras certificadas no Amazonas têm prejuízo

As duas empresas madeireiras que realizam manejo florestal certificado pelo Conselho Mundial de Manejo Florestal (FSC) no Amazonas estão deficitárias.

A Precious Wood Amazon (antiga Mil Madereira) pertence a um grupo suíço e atua no município de Itacoatiara. A Gethal Amazonas possui sede em São Paulo e retira madeira em Manicoré, mas a processa em Itacoatiara. Ambas pertencem à Associação de Produtores Florestais Certificados na Amazônia (PFCA) e seus dirigentes apontam a desvalorização do dólar em relação ao real como principal responsável pelas dificuldades financeiras.

"A gente fez um planejamento com o dólar valendo R$ 2,90 e agora está exportando madeira com o dólar a R$ 2,00", explicou Carlos Guerreiro, diretor operacional da Gethal e presidente da PFCA. Ele contou que, no dia 1º, representantes da PFCA se reuniram com a ministra Marina Silva, em Brasília, para expor a situação do setor, classificada por ele como "dramática".

"Temos dificuldades operacionais e financeiras. O mercado comprador europeu é hipócrita, não admite pagar mais pela madeira certificada. Sofremos a concorrência da madeira chinesa, inclusive certificada, que é mais barata. E precisamos rever nossos planos de manejo, sem que o Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] tenha condições de executar essa revisão com agilidade. Estamos praticamente parados", afirmou Guerreiro.

"A quantidade de exigências e de requerimentos na aprovação e revisão dos planos de manejo é extensa, principalmente quando eles têm escala comercial. Em média, um plano desses demora um ano para ser aprovado", contou o gerente-executivo do Ibama no Amazonas, Henrique dos Santos Pereira.

O engenheiro floresta Renato Scop, que trabalha na Precious Wood, afirmou que apenas em 2002 a empresa obteve uma "pequena margem de lucro operacional". Já Carlos Guerreiro disse que só no ano passado a Gethal conseguiu equilibrar as contas, mas que desde o começo do ano está tendo um prejuízo da ordem de R$ 300 mil por mês (20% do faturamento médio mensal de R$ 1,5 milhão).

Segundo o engenheiro florestal Marcos da Silva, a produção da Gethal Amazonas é de 60 mil metros cúbicos de madeira em tora ao ano, extraída de uma área particular de 40.800 hectares. A madeira processada é vendida principalmente para o mercado externo – 60% da produção, com destaque para a Alemanha – e para o mercado interno, sobretudo o Rio Grande do Sul.

A empresa emprega 600 funcionários no Amazonas: 100 na extração da madeira e 500 na sua industrialização (fabricação de compensados, lâminas e plataformas).

"A certificação é um processo transparente, então a empresa fica muito visada, muita gente questiona o bom manejo. As outras madeireiras, enquanto isso, trabalham de forma predatória, sem sofrer tanta pressão", avaliou Marcos da Silva.

Silva afirma que o Projeto de Lei (PL) 4.776, que trata da gestão de florestas públicas no país e regulamenta a concessão de florestas a particulares, além de criar o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, pode ajudar a diminuir os obstáculos ao manejo florestal sustentável comercial: "A legislação ambiental hoje é muito pesada e muda a toda hora".

A esperança no projeto também é apontada por Carlos Guerreiro, da Gethal: "As ações previstas são muito positivas. Nossa dúvida é se o Ministério do Meio Ambiente de fato conseguirá implementá-las, já que a área ambiental no governo Lula carece de orçamento".

Em Tapajós, comunidades farão manejo madeireiro em grande escala

Ela será a primeira floresta nacional (Flona) do país onde as populações residentes farão manejo madeireiro em grande escala. Em Santarém (Pará), as comunidades da Flona Tapajós devem iniciar o trabalho em outubro. A iniciativa ocorrerá por meio do projeto Ambé, apoiado pelo PróManejo/Ibama.

"O manejo acontecerá em uma área não-populacional de até 200 mil hectares [a área total da Flona é de 551.498 mil hectares]", contou Viviane Gonçalves, coordenadora das ações do PróManejo na Flona Tapajós. Essa iniciativa vai acontecer por meio do projeto Ambé, apoiado pelo PróManejo/Ibama.

As associações e cooperativas locais executarão a atividade em caráter piloto – na Flona existem quatro associações intercomunitárias, nove associações comunitárias e uma cooperativa. "O dinheiro da venda da madeira vai para elas e para os fundos gerais que elas mesmas criaram", explicou Gonçalves.

O PróManejo é um subprograma do Programa Piloto de Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras (PPG7), criado a partir da Eco-92 e mantido com verba da cooperação internacional, majoritariamente alemã, e sob a coordenação-geral do Ministério do Meio Ambiente.

As ações do PróManejo na Flona Tapajós se iniciaram oficialmente em 1999. Hoje, estão envolvidas 400 das 1.100 famílias residentes na unidade de conservação. "O que nós temos desenvolvido são iniciativas de manejo madeireiro e não-madeireiro em pequena escala. O objetivo é melhorar a qualidade de vida dos moradores e também gerar referências para outras Flonas da Amazônia", pontuou a coordenadora.

Entre essas atividades, está a produção de óleos essenciais (de copaíba e andiroba), destinada para a indústria de cosméticos do Rio de Janeiro; itens feitos com o chamado couro ecológico produzido a partir da seringa, vendidos para o mercado nacional e para turistas locais; e a confecção de móveis rústicos a partir de madeiras caídas, que é comercializada principalmente na região Sudeste.

"O projeto de financiamento dessas três atividades termina no ano que vem, mas acredito que elas já conquistaram a autonomia", comentou Gonçalves.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) afirma que está estudando uma série de 15 indicadores para avaliar o manejo das florestas. "Esse indicadores foram criados no âmbito do Tratado de Cooperação Amazônica. Até o final do ano, teremos os indicadores validados", contou o diretor de Florestas do MMA, Tasso Azevedo. "Um dos indicadores interessantes é o numero de projetos de manejo florestal certificados segundo padrões sociais, ambientais e econômicos, reconhecidos internacionalmente."