STF suspende retirada de vegetação de áreas de preservação permanente

Uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a norma que possibilita a retirada de vegetação de Áreas de Preservação Permanente (APPs). A decisão foi tomada pelo presidente do STF, ministro Nelson Jobim, na última segunda (26), atendendo pedido da Procuradoria Geral da República (PGR).

A liminar invalida o artigo segundo da Medida Provisória 2166/01, que altera o Código Florestal Brasileiro e que trata das áreas de preservação permanente. São consideradas APPs topos de morros, nascentes, margens de rios e riachos. Elas são protegidas pela legislação ambiental por sua importância ecológica. Com a decisão, fica estabelecido que, para retirar vegetação dessas áreas, é necessária uma legislação específica, aprovada pelo Congresso Nacional.

Até então, os órgãos ambientais seguiam o texto da medida provisória que prevê que, em casos excepcionais, é permitida a intervenção em APPs, desde que feita uma análise por órgãos técnicos ambientais – o Ibama ou órgão estaduais e municipais, que estabelecem ações compensatórias para essas situações. Segundo o secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Cláudio Langone, a medida vai dificultar e tornar mais demorados os licenciamentos ambientais em situações que já eram corriqueiramente autorizadas como a retirada de vegetação da margem de rios para que animais tomem água.

Langone afirma que o ministério vai recorrer junto ao STF. "Vamos recorrer da decisão por que defendemos a constitucionalidade da MP. Desde a edição, em 2001, nós nunca tínhamos tido questionamentos formais e também vamos recorrer por que defendemos a prerrogativa do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) de disciplinar esse assunto", argumentou. O secretário executivo informa também que foram suspensas as emissões de qualquer autorização de intervenção em APPs no país até que o recurso seja julgado pelo STF. Segundo a assessoria do STF, a liminar só deve ser julgada a partir de agosto, quando os ministros retornam do recesso.

No pedido, a Procuradoria argumentou ao Supremo que "de acordo com a Constituição Federal, somente lei formal pode autorizar a alteração dos espaços territoriais especialmente protegidos". E também que o Conama estaria prestes a autorizar, por meio de resolução, o gestor ambiental local a suprimir a vegetação de APPs para fins de empreendimentos de mineração.

O secretário executivo no MMA afirma que a ministra Marina Silva havia garantido ao Ministério Público que a resolução sobre APPs seria apenas discutida pelo Conama na reunião ordinária do conselho nos dias 27 e 28, sem que fossem tomadas decisões sobre o tema. Ele informa que a mineração seria apenas um dos pontos a serem abordados pela norma que disciplina intervenção em APPs.

O plenário do Conselho Nacional do Meio Ambiente aprovou hoje a realização de novas reuniões públicas para debater sobre a retirada de vegetação em áreas de preservação permanente.

Organizações da sociedade civil entram com representação contra Belo Monte

O ISA, a Coiab (Coordenação Das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), o Greenpeace e o Fórum Carajás entraram ontem (21/7) com representação junto à Procuradoria Geral da República contra Decreto Legislativo nº 788 de 2005, que autoriza a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na chamada Volta Grande do rio Xingu. A autorização foi dada em tempo recorde, pois foi aprovada em 6 de julho pela Câmara e uma semana depois pelo Senado, sem que no entanto tenham sido ouvidas as comunidades indígenas afetadas, como determina a Constituição Federal.

Belo Monte faz parte de um antigo projeto de construção de usinas hidrelétricas no rio Xingu, as quais alagariam áreas imensas e modificariam completamente o rio. Por essa razão há mais de 17 anos o projeto vem sendo contestado pelas populações que vivem na região, como indígenas e ribeirinhos, que serão diretamente afetados pela construção da usina, mesmo com a mudança efetuada no projeto de engenharia pela Eletronorte. Leia o especial do ISA sobre o tema: A Polêmica da usina de Belo Monte.

A representação ao Procurador-Geral da República se baseia no fato de que o Congresso Nacional autorizou os estudos sem ouvir as populações que serão afetadas, entre elas nove povos indígenas, conforme determina a Constituição.

“A aprovação pelo congresso nacional foi afobada, não só por não ter ouvido anteriormente o que pensam os povos indígenas afetados, mas também porque já dá carta branca para a futura construção, sem sequer avaliar quais serão os reais impactos socioambientais da obra. Como pode autorizar algo que não conhece? Deveria haver uma nova avaliação posteriormente à elaboração do EIA/Rima, pois do contrário o Poder Legislativo estará se furtando ao seu dever constitucional de proteger as terras indígenas contra obras que venham afetar a integridade de seus recursos naturais” afirma o advogado Raul Silva Telles do Valle, assessor jurídico do ISA.

Se a Procuradoria acatar a representação, vai ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) no STF que vai decidir se é válido ou não.

Invasões garimpeiras voltam a ameaçar povo Yanomami

A Campanha Nacional de Desarmamento recolheu, desde agosto de 2004, mais de 393 mil armas em todo o País. Na contramão deste movimento, garimpeiros estão invadindo a Terra Indígena Yanomami, que abrange parte dos estados de Roraima e do Amazonas, e fornecendo espingardas e munição para os índios como salvo-conduto para permanecer na região em busca de minérios como ouro, cassiterita, urânio e nióbio. O contato com os invasores também faz com que os Yanomami contraiam malária, gripe e doenças sexualmente transmissíveis. A atividade garimpeira compromete ainda a qualidade dos rios que abastecem as comunidades indígenas. Em carta de 30 de junho, o Conselho do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI) Yanomami e Ye`kuana relata estes problemas e afirma que a invasão do território Yanomami está fora de controle.

A carta do Conselho é destinada ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, à ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, aos presidentes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O Ministério Público Federal também recebeu uma cópia do documento. A carta, assinada por 14 lideranças indígenas e outros membros do Conselho, lista cinco pistas clandestinas no território indígena, demarcado e homologado há 13 anos. Outros oito pontos de garimpo estão identificados. “Não é difícil prever que estamos a caminho de uma situação de caos social e sanitário, como a vivida pelos Yanomami no final dos anos 1980 e início dos anos 1990, quando, pelo menos, um quinto da população Yanomami morreu devido às doenças introduzidas pelos garimpeiros”, afirma o texto do Conselho do DSEI. Leia aqui a carta na íntegra.

Davi Kopenawa, uma das mais importantes lideranças Yanomami, afirma que as ações dos órgãos do governo federal não estão sendo suficientes para expulsar os garimpeiros, nem ao menos para intimidá-los. “Eles estão tão à vontade na região que chegam a pedir carona nos aviões da Fundação Nacional de Saúde para buscar mantimentos nas cidades e utilizam os rádios dos postos da Funai para pedir novas cargas de munição”. Procurada pela reportagem do ISA, a assessoria de imprensa da Funai admite que a invasão da TI está deflagrada e que a principal medida proposta pelo órgão para combatê-la é regulamentar o poder de polícia de seus funcionários.

Espiral de violência

Uma das mais graves conseqüências da invasão garimpeira é o constante armamento dos Yanomami, o que nos últimos anos tem resultado no aumento da letalidade dos conflitos entre as comunidades indígenas. Hoje os ferimentos por arma de fogo estão entre as principais causas de mortalidade entre os Yanomami, muito acima da malária, por exemplo. Em relatório do ano passado, intitulado Armas de fogo, violência e assistência à saúde entre os Yanomami, os antropólogos Moisés Ramalho e Marcos Pelegrini, consultores da Funasa, afirmam que “as armas de fogo fazem com que os conflitos entre as aldeias tornem-se cada vez mais sangrentos, produzindo muito mais vítimas do que no passado, o que, por sua vez, prolonga as hostilidades, já que cada morte é vingada; o ciclo então se perpetua ao mesmo tempo em que se amplia quando outras aldeias acabam sendo envolvidas no conflito”.

Os conflitos intercomunitários são parte integrante do universo sociocultural dos Yanomami, caracterizando-se por um conjunto de regras e um universo ritual que condicionam a prática de ações violentas. O antropólogo Rogério Duarte do Pateo, do ISA, explica que os enfrentamentos, marcados quase exclusivamente por emboscadas nas áreas de roça ou no entorno das aldeias, se inserem em um complexo sistema de relações intercomunitárias que se articula a uma extensa rede de aliança e inimizade entre os grupos. “As relações de antagonismo podem ser deflagradas por motivos banais e cotidianos”, diz Rogério. “E são fruto da degeneração progressiva das relações de aliança e amizade entre dois ou mais grupos durante um determinado período de tempo, articulando ataques efetivos, feitiçaria guerreira e xamanismo agressivo”.

Balas no lugar de flechas

O problema é que as armas de fogo, ao contrário das flechas, bordunas e zarabatanas, causam ferimentos muito mais fatais e aumentam o número de mortos. Com isso, potencializam os ciclos de vingança entre os grupos, num espiral de violência sem precedentes entre os Yanomami. “Antigamente nossas disputas eram com flecha, agora muitos têm bala e ficam mais fortes”, diz Davi Kopenawa. Os consultores da Funasa recomendam a realização de uma campanha de desarmamento entre os Yanomami, com a troca de espingardas por ferramentas e outros utensílios. A resistência dos índios, porém, é grande. Davi Kopenawa conta que as armas são objetos muito valorizados e não utilizadas para caça. “Servem apenas para matar os parentes”, relata. “Eu já tentei duas vezes recuperar armas mas é difícil dos índios se desfazerem delas”. Ao tentar desarmar as aldeias da região do Surucucu, Davi recuperou 3 espingardas. “Mas sei que enquanto não tirarem os garimpeiros de lá outras armas vão chegar”.

No relatório sobre a escalada bélica na Terra Indígena, Ramalho e Pellegrini relatam que, entre 1995 e 2003, o DSEI Yanomami registrou a morte de 47 índios por arma de fogo, e a de 17 por meio de pauladas, flechadas ou zarabatana. Outros 15 homicídios não tiveram a causa esclarecida. “Vale a pena lembrar que, apesar de impressionantes, esses números registram apenas as mortes, mas a quantidade de feridos, principalmente à bala nos conflitos, é também igualmente significativa”, escrevem os consultores. Eles destacam ainda que entre janeiro de 2000 e dezembro de 2003, 25 das 42 mortes violentas foram provocadas por armas de fogo.

Saúde na mira

O acirramento dos conflitos armados entre as comunidades indígenas atinge também os funcionários da saúde que atuam na TI. Um dos episódios mais traumáticos relacionados ao uso das armas fornecidas pelos garimpeiros aos Yanomami ocorreu em 11 de dezembro de 2003, quando o auxiliar de enfermagem Orisvam Araújo da Silva, da ONG Urihi – Saúde Yanomami, que prestava serviço na região, foi morto com um tiro nas costas enquanto se banhava em um rio nas proximidades da aldeia Kahusiki. Silva teria sido confundido com um Yanomami por membros de uma aldeia inimiga, que estavam de tocaia na área com a intenção de matar um rival. Entre 2001 e 2003, outros seis casos de ataques de Yanomami na presença de agentes de saúde ou educadores foram registrados.

Estes episódios, o recrudescimento das invasões garimpeiras e dos conflitos entre as comunidades indígenas prejudicam diretamente o atendimento à saúde na TI. O assessor técnico do Departamento de Saúde Indígena da Funasa em Brasília, Edgar Dias Magalhães, afirma que muitos garimpeiros incitam os Yanomami contra os agentes de saúde. “Nossa preocupação maior é com a segurança das equipes de saúde e a ação de cooptação dos índios por parte dos garimpeiros, que em algumas situações já chegaram a vetar, a pedido dos garimpeiros, o acesso das equipes de saúde a certas regiões”, afirma. O assessor, que estima em 3 mil o número atual de garimpeiros na TI, diz que o fornecimento de bebidas alcoólicas para os índios também compromete o desenvolvimento de trabalhos de saúde na região.

Risco de malária

Edgar Magalhães garante que a Funasa está atenta à deterioração sanitária relacionada ao garimpo, mas que por enquanto não há indícios que demandem ações emergenciais. “A malária encontra-se controlada na TI, havendo vigilância epidemiológica dos casos e ações de controle. Estamos levantando junto ao DSEI uma tabela atualizada dos dados de malária para checagem da situação”, afirma. O assessor técnico lembra ainda que o garimpo traz o risco da volta da doença em nível endêmico e epidêmico, pois os garimpeir

os não se tratam adequadamente. “Eles funcionam como reservatórios de malária”. Isso porque, ao picar um indívíduo doente, o mosquito vetor da malária se contamina e, ao picar outros indíviduos posteriormente, lhes transmite o parasita causador da doença.

Outros problemas decorrentes da presença dos intrusos na TI, segundo o técnico da Funasa, é a poluição dos rios, que provoca o aumento de casos de diarréia entre os índios, e a escassez de caça, que some das beiras de rios assustada com o barulho das máquinas de garimpo. O missionário Carlo Zacquini, da Diocese de Roraima, trabalha com os Yanomami desde 1975 e afirma que as doenças levadas às comunidades pelo contato dos índios com os garimpeiros podem causar novos surtos da doença. “Foram muitos anos para a malária ser controlada na região e todo este trabalho está sendo jogado no lixo”, alerta Zacquini. O missionário denuncia a falta de atuação dos órgãos responsáveis pela fiscalização do território indígena.

O fantasma de Haximu

Cerca de 15 mil Yanomami vivem no território de 9.6 milhões de hectares organizados em aproximadamente 200 comunidades. A presença de garimpeiros e o interesse minerário na Terra Indígena Yanomami não são novos. De acordo com a publicação Mineração em Terras Indígenas na Amazônia Brasileira, lançada pelo ISA este ano, há 640 requerimentos de empresas para pesquisa e lavra dentro da TI – a grande maioria deles feita antes da Constituição Federal de 1988. Tampouco são novas as trágicas conseqüências da presença dos garimpeiros. Entre 1987 e 1990, uma invasão sem precedentes ocorreu na região, quando cerca de 40 mil homens realizaram uma verdadeira corrida do ouro no território indígena, levando à morte um quinto da poulação Yanomami da época. O episódio mais conhecido desta trágica história ocorreu em 1993, quando um bando de garimpeiros chacinou 16 Yanomami, principalmente mulheres e crianças, no chamado “massacre de Haximu”. Até hoje, os índios temem sua repetição.

Projeto que autoriza implantação de usina de Belo Monte (PA) é aprovado pela Câmara

O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 6 de julho, o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) nº 1.785/05, que autoriza a implantação da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, na chamada Volta Grande do rio Xingu, na altura dos municípios de Altamira e Anapu, no Pará. O projeto segue agora para apreciação do Senado. A obra, uma das mais polêmicas já projetadas no País, pode afetar diretamente a vida de nove povos indígenas que vivem na região e vem suscitando mobilizações e intensos protestos do movimento social da Amazônia nos últimos dezessete anos (veja o especial A Polêmica de Belo Monte).

Desde o final dos anos 1970, sucessivos governos tentaram implantar a UHE, originalmente denominada Kararaô. Em 2001, o Supremo Tribunal Federal (STF) paralisou a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) sobre o projeto atendendo um pedido do Ministério Público Federal (MPF), que então argumentava a inexistência de autorização do Congresso Nacional para o empreendimento. O governo Lula assumiu seu mandato com a promessa de rediscutir e reavaliar a implementação da usina.

A resistência das populações locais à obra mantém-se firme mesmo com as várias alterações incluídas nos planos originais: o reservatório da usina passou de 1.225 para 400 quilômetros quadrados e a estimativa de energia que poderá ser produzida, segundo o governo, passou de 11 mil para 5 mil megawatts. Além dos povos indígenas da região, a Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP), o Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e Xingu (MDTX), o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri/Regional) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), entre várias outras organizações, são contrários à construção. A principal reclamação desses setores é de que nunca foram ouvidos em relação ao problema durante todo este tempo. A Constituição Federal afirma que o aproveitamento dos recursos hídricos em Terras Indígenas só pode ser efetivado com “autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas”.

Comunidades querem ser ouvidas

“Os governos anteriores sempre quiseram enfiar o projeto goela abaixo. As comunidades nunca foram ouvidas ou foram ouvidas de forma tendenciosa. Isso continua do mesmo jeito”, critica Antônia Melo da Silva, coordenadora regional do GTA. Ela conta que muitas das empresas interessadas no empreendimento já estão divulgando que ele foi autorizado. “O que sempre reivindicamos é a elaboração de um estudo para o desenvolvimento econômico sustentável de toda a Bacia do Xingu, que apontasse alternativas como a pesca e o turismo ecológico.” Antônia diz que o grande movimento que lutou contra Belo Monte durante os anos 1990 irá retomar suas ações a partir de agora. De 13 a 15 de julho, em Altamira, um seminário com a presença de vários especialistas irá discutir com a comunidade todas as implicações da construção da usina. No dia 14, também será lançado o livro Tenotã-Mõ, Alertas sobre as consequências dos projetos hidrelétricos no Rio Xingu, que tem a participação do ISA (confira serviço abaixo).

“Os estudos não foram concluídos. Então como o Congresso pode autorizar alguma coisa que não conhece? Além disso, a Constituição deixa claro que as comunidades afetadas devem ser ouvidas antes da autorização”, defende o advogado do ISA Raul Silva Telles do Valle. Ele lembra ainda que a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, também fala em “anuência prévia” das comunidades interessadas sobre projetos semelhantes. “Esta autorização é ilegal e inconstitucional.”

O deputado Fernando Ferro (PT-PE), autor do PDC 1.785/05, acredita que ele se refere apenas à permissão para o reinício e a revalidação de estudos preliminares e que as comunidades locais serão consultadas a partir de agora. Apesar disso, o texto aprovado pela Câmara afirma que “é autorizado o Poder Executivo a implantar o Aproveitamento Hidrelétrico Belo Monte (…) após estudos de viabilidade técnica, econômica, ambiental e outros que julgar necessário.” Por outro lado, o deputado também não esconde sua posição favorável à usina. “No curto prazo, o País só tem duas alternativas para sua necessidade de energia: ou aproveitamos o potencial hidrelétrico da região Norte ou investimos em usinas nucleares. Em relação a estas últimas sou contra.” O parlamentar considera que os impactos ambientais e sociais de Belo Monte podem ser mitigados.

Falso dilema

"Optar entre a construção de hidrelétricas ou de usinas nucleares é um falso dilema. Se não discutirmos seriamente o destino da energia gerada e quais são os limites socioambientais para a expansão das usinas, em médio prazo teremos que aceitar a construção de hidrelétricas e também de usinas nucleares”, avalia Raul Silva Telles do Valle. Ele defende que é preciso rediscutir não só formas de melhor aproveitamento da energia elétrica mas, principalmente, a opção de continuar direcionando 27% de toda a energia gerada apenas para as indústrias eletrointensivas, como a de alumínio, de siderurgia e de celulose. “Só para citar um exemplo, a quantidade de energia utilizada para produzir alumínio para exportação, no ano de 2000, seria suficiente para abastecer mais de 870 mil famílias durante oito anos. Temos, portanto, que avaliar se realmente é necessário expandir dessa forma, a um custo social e ambiental altíssimo, a geração de energia."

Para o deputado Fernando Ferro o que existe é um certo preconceito em relação às hidrelétricas. “Este tipo de opinião é motivado por interesses de alguns setores industriais que querem investir em outras alternativas energéticas, como as termoelétricas”. O parlamentar insiste que o PDC apenas pretende regularizar o andamento de estudos que já têm mais de 20 anos. “Em sua ação, o MPF deixa claro a necessidade de autorização do Congresso Nacional. A partir de agora, essas pesquisas poderão ser aprofundadas.”

O passo que faltava

O deputado Zé Geraldo (PT-PA), que tem sua base eleitoral na região e conhece os movimentos sociais locais, também considera que o prosseguimento dos estudos sobre a usina atende uma expectativa legítima e que a posição contrária à obra não é majoritária entra as organizações da sociedade civil. “De qualquer forma, as cidades da região precisam saber se vai haver ou não hidrelétrica. Depois dos estudos podemos sentar e discutir melhor com todos os interessados.” Apesar de repetir que o PDC 1.785/05 apenas autoriza pesquisas preliminares, Zé Geraldo também não esconde sua opinião sobre a usina: “Existe em todo o País medo de hidrelétrica. Isso ocorre pela maneira autoritária com que elas sempre foram feitas. Agora é diferente. Quanto à posição contrária de alguns setores, temos de discutir se ela é a mais correta.”

Zé Geraldo nega ainda que o governo esteja impedindo qualquer tipo de discussão sobre o problema. Questionado sobre a necessidade de o Congresso ouvir as populações atingidas, o deputado também acha que o momento propício ocorrerá a partir de agora. “O governo Lula já está indo para o segundo semestre de seu terceiro ano. Se tivermos de ouvir as comunidades antes disso… Acho que tem de ser assim, mesmo porque não há questionamento sobre a legalidade dos estudos em si.” O parlamentar não deixa dúvida sobre a intenção da administração Lula em relação à obra: “O governo tem toda a vontade de começar a construção da usina”.

Em virtude da pressão exercida por vários setores econômicos e da disposição da administração Lula em levar adiante empreendimentos desse tipo, a aprovação definitiva do PDC pelo Senado poderá ser considerado, na prática, o passo que faltava para o início efetivo da obra. A ascensão da antiga ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff,

ao cargo de chefe da Casa Civil da Presidência da República acrescenta mais um componente a uma conjuntura já favorável à construção de novas hidrelétricas no País. A pretensão do governo federal em implantar projetos semelhantes (sem discutí-los com a sociedade e apesar dos protestos de vários segmentos organizados) pode ser exemplificada também pela concessão da Licença de Operação, no último dia 5 de julho, à usina de Barra Grande, na divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul. A obra foi feita com base em um EIA reconhecidamente fraudulento e é apontada como o maior escândalo ambiental dos últimos anos (confira).

Um dos vários pontos polêmicos sobre Belo Monte continua dizendo respeito ao real potencial energético da usina – mesmo depois da redução da estimativa originalmente prevista. Por simulações feitas para o período de 1931 a 1996, a usina só seria capaz de garantir uma potência de 1.356 MW ao longo do ano, com picos de 5 mil MW durante apenas três meses, aponta o professor Oswaldo Sevá, da Unicamp, em artigo do livro Tenotã-Mõ. Isto é, a potência máxima de 5 mil MW apregoada pelo governo só seria possível durante uma pequena parte do ano.

Projeto aprovado na Câmara prevê exploração sustentável de florestas públicas

Combater o desmatamento da Amazônia sem deixar de aproveitar o potencial econômico da região. Em síntese, esse é o objetivo do projeto de lei 4776/05, aprovado anteontem (6), às 23h45, pela Câmara dos Deputados. De autoria do poder Executivo, o projeto prevê a concessão de florestas públicas para exploração sustentável da iniciativa privada.

"Esse projeto foi concebido no âmbito do plano de prevenção e controle ao desmatamento, pois é consenso entre os especialistas e as instituições que trabalham com a Amazônia que somente a valorização da floresta em pé é que poderá mudar o modelo de desenvolvimento econômico hoje implementado na região, que se baseia na substituição da floresta", explica o secretário de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA), João Paulo Capobianco.

A concessão será feita por meio de licitação, com o objetivo de privilegiar as empresas que oferecerem o melhor preço e cujos projetos tenham o menor impacto ambiental e o maior benefício socioeconômico. Capobianco afirma ainda que os vencedores não terão direito à posse da terra, apenas receberão o direito de uso das florestas, que continuam a ser patrimônio da União.

"O projeto não é um projeto de concessão, é um projeto de gestão de florestas públicas sendo que a possibilidade de concessão só é analisada após a identificação se aquela área deve ser transformada em reserva ambiental ou se ela deve ser destinada ao uso de uma população tradicional. Somente depois de esgotadas essas duas alternativas é que ela pode ser objeto de concessão", informa o secretário.

As florestas poderão ser utilizadas tanto para fins extrativistas, como a retirada de madeira, quanto para atividades não-extrativistas, como o ecoturismo. A concessão será limitada ao prazo máximo de 40 anos e apenas para empresas brasileiras. Segundo Capobianco, com exceção das áreas protegidas, que compreendem as terras indígenas e as unidades de conservação, cerca de 45% da Amazônia é de terras da União. Dentro desse percentual, a projeto de lei estabelece que, nos primeiros dez anos, apenas 20% das terras da União poderá se licitada.

No projeto aprovado também consta uma emenda que protege os pequenos empreendedores e garante o direito de continuidade por cinco anos das atividades que já são desenvolvidas em terras de até 2,5 mil hectares.

O controle das concessões e gestão das florestas ficará a cargo do recém-criado Serviço Florestal Brasileiro (SFB), e os recursos advindos das concessões irão compor o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF). O projeto será agora analisado pelo Senado Federal e, se aprovado, segue para a sanção presidencial. Segundo o secretário, o objetivo é aplicar alguns dos dispositivos previstos na lei ainda neste ano.

Projeto de gestão de floresta deve aumentar fiscalizações do Ibama, diz presidente do instituto

O presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Marcus Barros, diz acreditar que o projeto de lei de gestão de florestas públicas, se aprovado pelo Senado e sancionado pelo presidente da República, aumentará as fiscalizações exercidas pelo órgão. Com mais trabalho, Barros afirma que novos concursos públicos para o Ibama poderão ser realizados.

"O Ibama é fiscalizador do meio ambiente, e isso vai se ampliar porque parte dos recursos vindos da concessão de florestas virá para o Ibama para essa atividade de fiscalização", disse Marcos Barros. "Mais possibilidades se abrem e, além do concurso que fizemos no último domingo, até março devemos fazer novo concurso, no qual chamaremos mais 600 pessoas, para ampliar esse papel do Ibama na preservação da Amazônia a partir da lei de florestas públicas", completou.

Hoje (8), em entrevista à Agência Brasil , Barros afirmou que a essência do projeto será a de "dar ordem" à Amazônia, racionalizando a exploração de madeiras pelas indústrias que possuem certificação e, conseqüentemente, diminuindo o desmatamento ilegal.

Barros previne, no entanto, que a concessão deverá estar "sob os olhos do Estado", sob a fiscalização do Ibama. "Essa concessão tem que estar sob os olhos do Estado. Para aquele que recebe a concessão, existem condicionantes fortes a serem cumpridos, como a questão do manejo e do relacionamento com as populações tradicionais. Há que se buscar, e o próprio projeto traz esse reforço, melhorar a fiscalização do Ibama nessa área específica de concessão de florestas."

Lei de gestão de florestas é aprovada

A aprovação ontem (6/7), pelo plenário da Câmara Federal do projeto de lei 4776 do executivo, que estabelece a gestão de florestas públicas para a produção sustentável, cria o Serviço Florestal Brasileiro – SBF e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal – FNDF é comemorada pelo WWF-Brasil como um passo importante para o combate ao desmatamento ilegal e o incentivo à modernização do setor florestal brasileiro.  

“É preciso, agora, que o Ministério do Meio Ambiente divulgue quais as áreas públicas disponíveis, pois só 20% delas poderão ser licitadas nos primeiros 10 anos para a exploração privada e sustentável, e os empresários precisam se preparar para isso”, diz Denise Hamú, secretária geral (CEO) do WWF-Brasil . Ela lembra ainda que aumentará a demanda de fiscalização pelo IBAMA e que é preciso que o governo invista mais recursos em suas ações de fomento ao setor florestal, aumentando os recursos destinados ao Centro Nacional de Apoio ao Manejo Florestal – Cenaflor, um centro especializado do Ibama. 

“É fundamental que o Cenaflor possa cumprir com sua missão de treinar os engenheiros florestais para elaborarem os planos de manejo das florestas a serem exploradas e capacitar os funcionários do Ibama para que façam análises criteriosas dos planos de manejo”, diz Mauro Armelin, coordenador de políticas florestais do WWF-Brasil.  O projeto de lei prevê recursos somente para o FNDF, que receberá 70% dos recursos arrecadados, e os 30% restantes irão para o Ibama para as ações de fiscalização.  O dado positivo é que a sociedade civil estará representada no FNDF para decidir, juntamente com os representantes do governo, sobre o uso dos recursos desse órgão de fomento. 

Pelo projeto de lei aprovado, caberá ao SBF o estabelecimento de um plano anual de outorga decidido no seu Conselho Consultivo, o Conaflor e só poderão ser usadas terras com floresta natural.  As concessões serão feitas por um prazo a ser definido conforme o ciclo de colheita. No texto aprovado na Câmara Federal o prazo máximo da concessão florestal foi reduzido de 60 para 40 anos, sendo submetidas a auditoria independente ao final deste prazo. Será também exigido o EIA Rima para essas áreas.

O projeto de lei deve ainda ser aprovado no Senado e a nova lei regulamentada.  Se tudo correr dentro do previsto, os primeiros contratos de concessão poderão ser assinados no segundo semestre de 2006.

Sipam indica que alta tecnologia é usada para desmatar sul do Amazonas

Os responsáveis pelo desmatamento no sul do Amazonas estão utilizando tecnologia avançada para destruir a floresta. "É visível nos nossos levantamentos que o pessoal que está grilando terra dispõe de equipamentos sofisticados. Não se pode abrir na floresta uma clareira com formato perfeito de um retângulo cujos lados medem 30 e 20 quilômetros sem usar sensoriamento remoto", afirma Samuel Wainer Cavalcante e Silva, chefe da Divisão de Análise Ambiental do Centro Técnico Operacional de Manaus (CTO-Manaus) do Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam). O órgão divulgou hoje (1) pesquisa inédita sobre o desmatamento em 12 municípios da região.

Outra evidência apontada por ele é a existência de grandes áreas desmatadas em locais distantes dos eixos rodoviários. "A fronteira agropecuária não se movimenta mais de forma linear. E isso só acontece graças ao avanço da tecnologia", diz.

O estudo realizado pelo Sipam indica que, em 2004, houve um aumento médio de quase 16% na área desmatada no sul do Amazonas, que saltou de 6.926 para 8.238 quilômetros quadrados.

A pesquisa utilizou: imagens do satélite Landsat 5, que têm resolução de 30 metros, tiradas em 2001, 2003 e 2004; imagens de 2004 do satélite CCD/CBRS, com resolução de 20 metros; imagens captadas também no ano passado por um sensor SAR, com resolução de seis metros, instalado em uma aeronave.

Maior peixe de água doce do mundo é pescado na Tailândia

Pescadores da cidade tailandesa de Chiang Khong capturaram o que é, provavelmente, um dos maiores peixes de água doce já vistos. Com 292kg e conhecido como bagre gigante do rio Mekong, o animal é estudado pelo WWF em parceria com a National Geographic Society que atuam na região para evitar a extinção da espécie.

 

WWF / SuthepKritsanavarin
 

 

Pesando o mesmo que um urso pardo, o bagre do rio Mekong é uma das várias espécies de peixes de água doce gigantes ameaçados de extinção. (Foto: © WWF/Suthep Kritsanavarin).

“Ficamos felizes com o recorde que estabelecemos, ao mesmo tempo fico preocupado porque este tipo de peixe gigante é pouco estudado e está muito ameaçado. Alguns deles, como o próprio bagre de Mekong, têm alto risco de desaparecerem”, afirmou o pesquisador do WWF, Zeb Hogan.

Os peixes de água doce gigantes estão em extinção no mundo todo, inclusive no Brasil. A maior espécie encontrada nos rios brasileiros é a piraíba que atinge até 2,8m e tem ampla distribuição na bacia amazônica.

Pesca de uma Piraíba de 2,30m no rio Araguaia

Por sua característica migratória, os bagres – como a piraíba – sofrem especialmente o impacto de grandes obras de infra-estrutura, especialmente represas e reservatórios que impedem a mobilidade da espécie. A construção de usinas como Belo Monte e Jirau ameaçam a pesca e segurança alimentar de dezenas de comunidades ribeirinhas, indígenas e o turismo da região.

A dourada e a piramutaba, por exemplo, são bagres nacionais conhecidos por realizarem as mais longas migrações de peixes em qualquer bacia hidrográfica do mundo.

Países da Bacia Amazônica buscam integrar gestão dos recursos hídricos

Brasília – Um projeto internacional vai promover a integração de oito diferentes países da região da Bacia Amazônica na busca por uma gestão conjunta dos recursos hídricos. A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) será a responsável regional pelo projeto "Manejo Integrado e Sustentável dos Recursos Hídricos Transfronteiriços na Bacia do Rio Amazonas".

O projeto receberá inicialmente o apoio financeiro de US$ 700 mil do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF – Global Environment Facility), aprovado em maio deste ano. Os fundos serão administrados pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e a iniciativa terá o apoio técnico do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a cooperação das instituições nacionais da área.

De acordo com a secretária-geral da OTCA, Rosalía Arteaga Serrano, o objetivo da iniciativa é elaborar uma proposta de um modelo de gestão da água na Amazônia. Ela explica que é preciso estabelecer um marco para ações preventivas conjuntas que identifiquem os principais problemas que afetam a bacia Amazônica. Além disso, lembra, o projeto é importante para que se busquem soluções conjuntas que favoreçam o processo de desenvolvimento econômico, social e ambientalmente sustentável da região. A preparação do projeto será iniciada em breve e deverá durar dois anos.

Na opinião de Rosalía Serrano, a assinatura do acordo é histórica porque, pela primeira vez, os oito países da Bacia Amazônica (Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela) vão trabalhar em conjunto sobre a gestão dos recursos hídricos da região. "Na primeira etapa, se prevê o repasse de US$ 700 mil e numa segunda U$S 10 milhões. Temos a aspiração de que essa segunda parte dos recursos para o projeto totalize US$ 30 milhões com o aporte de outras instâncias", assinala. Segundo ela, o projeto deverá alcançar um valor total de US$ 60 milhões, uma vez que a contrapartida dos países da Bacia Amazônica, em termos de recursos humanos e infra-estrutura, será proporcional aos recursos aportados.

Para o secretário-executivo da OTCA, Francisco Ruiz, a gestão dos recursos hídricos é a questão mais importante dos países amazônicos. "O principal produto natural de oferta da Amazônia é a água e a bacia como um todo contribui com aproximadamente 20% da água doce do mundo", observa. Ele lembra ainda que outras bacias no mundo já têm mecanismos de gestão de uma bacia compartilhada. Ruiz destaca os exemplos das bacias do Congo, do Nilo e do Prata: "Chegamos com 40 anos de atraso no propósito de discutirmos e criarmos mecanismos de gestão dessa bacia compartilhada".

Ruiz enumera as cinco grandes áreas em que os oito países da Bacia Amazônica vão começar a trabalhar a partir de agora. Primeiro, avaliar a situação da bacia como um todo e a interdependência entre os países fronteiriços para desenhar programas de intervenção; segundo, unificar os vários institutos que tratam do tema nos países; terceiro, analisar a participação da Bacia Amazônica nos processos de mudanças climáticas global; quarto, promover a gestão do uso sustentável dos sistemas hidrobiológicos; quinto, a produção de água potável e o estudo sobre as descargas das concentrações urbanas da região. "O programa que queremos montar na região é muito abrangente e terá desdobramento nas próximas décadas para a preservação de um recurso absolutamente estratégico como a água", explica.