Entrevista Orlando Villas Bôas

Em 1944, Orlando, Cláudio e Leonardo já haviam deixado São Paulo e integravam o quadro da "Marcha para o Oeste" se passando por sertanejos analfabetos. Pouco tempo depois, quando foram desmascarados, passaram a comandar certas atividades nas bases de apoio. Com a descoberta dos índios no caminho e a desistência do chefe oficial, coronel Vanique, de acompanhar a vanguarda da expedição, os três irmãos assumiram o comando da equipe que iria desbravar o oeste brasileiro.

Rota:Como você vê, hoje, a expedição?

Orlando: A expedição foi um movimento de interiorização criado pelo Getúlio. O Brasil Central era uma área vazia. Você vê, por exemplo, a Serra do Roncador, hoje, deve ter umas quinze cidades. Tudo isso foi idéia do Getúlio, ele queria provocar o processo de interiorização.

Rota: E a região central brasileira era totalmente desconhecida?

Orlando: Nós fizemos avançada no rio Maritsauá e não tinha nada, só índio. Que nos deram sustos prá daná. Hoje está cheio de cidades, e era isso que o Getúlio queria. Porque quando ele saiu de vôo e foi até o Araguaia, ele voltou escandalizado. Ele disse: “É o branco do Brasil Central.” Quer dizer, nós estamos em um país vazio. E naquela época, o mundo estava em guerra. Na Europa levataram essa perspectiva do espaço vital. A Europa estava superpovoada, e falava-se de ocupar esses vazios do Brasil Central com as populações excedentes européias. Um cidadão, grande político europeu, não sei se era francês, declarou que já estava na hora de ocupar os vazios do Brasil Central com as populações excedentes da Europa. Aí ele veio aqui e foi muito mal recebido, o presidente do estado não quis recebê-lo. Ele não quis receber a figura do governo francês, por causa das declarações que ele deu lá. E então essa idéia começou a ceder devagarinho, porque não estávamos disposto a ceder terras para a população européia, o Brasil estava demograficamente explodindo. Isso que eu estou falando é 1943, 44, tínhamos 40 milhões de habitantes. Agora, veja você, hoje nós temos 200 milhões! Um salto canalha! Pra você ver uma coisa, em 50, 60 anos, triplicou a população! Daí veio o plano da "Marcha para o Oeste".

Chegando na margem do Rio das Mortes, a expedição tinha de caminhar com Coronel Vanique (primeiro chefe da expedição), mas ele tirou o corpo fora por causa dos índios xavantes. Foi quando o (ministro) João Alberto chegou e disse assim: "Coronel, porque que tu não fazes o seguinte, tchê. Ponha a vanguarda da expedição com estes três rapazes, os três irmãos Villas Bôas, eles são dispostos". Aí, o Vanique ficou no Rio das mortes e nós entramos com a expedição. Quer dizer, o Cláudio e o Leonardo. Fiquei porque o grupo, eram oito sertanejos, teria que ter o abastecimento e eu cuidava da tropa. Toda semana eu, Vergílio e mais outro sertanejo, nós saímos com quatro ou cinco mulas levando a carga pro pessoal da expedição. Nisso nós levamos um ano atravessando a Serra do Roncador até que chegamos nas matas do Rio Kuluene. Pelo caminho nós íamos fazendo ranchos e os índios iam queimando os ranchos. Tinha que ter um cuidado danado, a gente chegava com a tropa amarrava os burros e eles cortavam a corda durante a noite e chegava de manhã e a burrada tinha fugido toda. Aí você precisava procurar burro… putz… era um perigo desgraçado porque tinha índio pra daná naquele tempo mas eles não atacaram a gente nenhuma vez. Só uma vez que eles fizeram uma tocaia muito grande.

Foi uma sorte nossa, os trabalhadores estavam caminhando, eram mais ou menos uns 15 trabalhadores, e o encarregado do rumo era o Cláudio, ele estava com a bússola. Chegou uma hora lá que começou uma gritaria de índio do lado direito da picada, era mulher, criança e homem fazendo barulho e avançando. O Cláudio reuniu todos num lugar só e ficou ali e aquela coisa se aproximando, se aproximando. Por uma sorte danada, tinha um cupim enorme na picada e o Cláudio resolveu subir nele – era um cerrado baixo – para ver se enxergava alguma coisa da gritaria que estava chegando. Só que o Cláudio subiu olhando para cá e a gritaria vinha do outro lado, quando ele subiu foi exatamente na hora que um grupo de uns 40 ou 50 índios xavantes com uma folha de palmeira na frente levantou e saiu correndo, eles iam chegando camuflados. Aí o Cláudio gritou pro pessoal, nossos homens eram todos armados, mandando apontar os mosquetões pra cima e deu uma descarga de tiro pro ar. A gritaria parou e os índios de cá fugiram, eles ficaram com medo daquele tiroteio danado, mas não foi nenhum tiro pro lado deles. Aí os índios passaram a nos vigiar e nos seguir. Há uns 500m, 1km na picada a gente percebia eles nos acompanhando. Até que nós chegamos na mata, lá os índios voltaram. Os xavantes não gostam de mata, eles são índios do cerrado. Ali nós fizemos um campo que hoje é uma cidade chama-se Garapu e no rastro nosso, esses acampamentos todos que fomos fazendo, foram se transformando em cidades: Canarana, Água Boa, Garapu… Hoje tem mais ou menos 18 cidades na Serra do Roncador.

Veja Também:

O fascínio de uma das regiões mais inexploradas do mundo e as visitas ilustres à expedição.

Os momentos de tensão durante os anos da Marcha para o Oeste.

Orlando e sua esposa, Marina Villas Bôas, contam um pouco sobre a família do índio brasileiro, a situação da mulher e da criança na tribo.

Documentário

Ouça o documentário produzido para o Rota Brasil Oeste sobre o trabalho dos irmãos Villas Bôas e a Marcha para o Oeste.

Centro de Biotecnologia da Amazônia

O Centro de Biotecnologia da Amazônia, que será inaugurado amanhã em Manaus, terá como atividade principal o estudo e aproveitamento da biodiversidade da Região Amazônica. O centro irá comandar uma rede nacional de laboratórios e de grupos de pesquisadores que atuam em diversos campos da biotecnologia. Iniciativa conjunta da comunidade científica, do setor privado e dos governos federal e estaduais da região amazônica, o Centro recebeu investimentos de R$ 10 milhões provenientes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e da Superitendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e mais R$ 4 milhões do Ministério da Ciência e Tecnologia. A realização do projeto faz parte do Programa de Energia Molecular do Uso Sustentável da Biodiversidade (Probem) do Avança Brasil.

O CBA atuará no seu setor produtivo na fabricação de extratos para as indústrias de bebidas, comésticos e farmacêuticos. Várias empresas de grande porte já firmaram convênios para pesquisas e produção de componentes de suas linhas de produção. A Pepsi do Brasil investirá R$ 4,4 milhões nos próximos cinco anos para o desenvolvimento de extratos concentrados para bebidas não-alcóolicas. Outros convênios foram firmados entre o centro e o setor de bebidas, como os fabricantes de Coca-Cola, Schincariol e ainda a Ambev. No setor de cosméticos, a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC) assinou em setembro último, convênio para pesquisas na sua área de interesse e a empresa Natura já manifestou particular interesse sobre a produção de óleos e corantes.

O ministro do Desenvolvimento, Sérgio Amaral, em entrevista à imprensa para divulgar o início das atividades do centro, disse que a iniciativa irá proporcionar o desenvolvimento "racional e eficiente" da biodiversidade da região e enfatizou que "a grande mudança com o funcionamento do centro, o que há muitos anos se sonha, é o melhor aproveitamento desta riqueza".

Sérgio Amaral afirmou que o CBA representará fonte de emprego para a comunidade indígena da região. De acordo com ele, tais comunidades irão trabalhar na prospecção e sobretudo na coleta de frutos, seiva, raízes e cascas de árvore. "Vamos gerar emprego em toda a região amazônica, mesmo em município mais distantes", comemorou o ministro. Ele ressaltou também que o centro facilitará o desenvolvimento da produção de bens de valor agregado mais alto com o conhecimento e treinamento de recursos técnicos e científicos da região.

O ministro da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, informou que entregará ao futuro governo Lula um relatório com as possibilidades de aproveitamento da iniciativa com várias alternativas de gestão. O centro, disse Sardenberg, foi programado para o desenvolvimento de tecnologia e inovação da produção de componentes vegetais, animais e de microorganismos, levando-se em conta a biodiversidade da Amazônia. "Ele não será apenas um executor, mas também um promotor regional de ações em parceria com outras instituições de pesquisa e ensino. Nele, haverá um mundo de possibilidades", salientou o ministro.

O centro com 12 mil metros quadrados será inaugurado todo equipado. Durante a Feira Internacional da Amazônia, realizada em setembro deste ano, em Manaus, Sérgio Amaral liberou R$ 3,5 milhões para esse fim. A Suframa está aplicando R$ 5,9 milhões na formação de capital intelectual local, com o apoio de várias instituições de pesquisa e ensino federais. Sérgio Amaral disse que R$ 17 milhões do orçamento do próximo ano já foram destinados para o centro a fim de garantir a estruturação da primeira etapa.

Governo acerta detalhes para implantar Centro de Biotecnologia da Amazônia

Os ministros do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Sergio Amaral, da Ciência e Tecnologia, Ronaldo Sardenberg, e do Meio Ambiente, José Carlos de Carvalho, reuniram-se hoje, no Ministério do Desenvolvimento, para acertar os
detalhes da implantação do Centro de Biotecnologia da Amazônia (CBA), em Manaus. Segundo Sardenberg, o Executivo pretende nomear uma equipe de pesquisadores para apresentar propostas de projetos que serão desenvolvidos no CBA.

O instituto de pesquisa, que está em fase final de construção, funcionará como um complexo de laboratórios voltados para a biodiversidade da região. A expectativa do governo federal é que o centro de estudos crie condições para que novas empresas passem a investir nos setores farmacêutico, cosmético, alimentício, de bioinseticidas, de óleos essenciais e de corantes naturais. "Esperamos que o CBA comece a operar já a partir do fim deste ano", afirmou o ministro de Ciência e Tecnologia. Inicialmente, foram investidos R$ 14 milhões na construção do complexo.