A chuva era fraca, mas insistente. Quando as pesadas nuvens davam uma trégua, era a vez do sol forte incomodar. Mas os trabalhadores rurais e integrantes de ONGs ambientalistas e da sociedade civil não arredaram pé e mantiveram a vigília em frente à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), em Brasília. A manifestação, iniciada na manhã desta quarta-feira, foi organizada para protestar contra uma possível aprovação de dois pedidos de liberação comercial de milho geneticamente modificado feitos pelas empresas Bayer e Monsanto.
O pedido feito pela Bayer é para comercializar um milho resistente ao agrotóxico gluofosinato de amônio (Liberty Link). Já o pedido da Monsanto é para a comercialização de um milho com propriedade inseticida (Guardian Bt).
Gritando palavras de ordem a favor das sementes crioulas e contra os transgênicos, os manifestantes abriram faixas lembrando aos integrantes da Comissão, que chegavam para a última reunião do órgão no ano, sobre a importância de se manter o Brasil livre do milho geneticamente modificado. A vigília é organizada pela Via Campesina e pela Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos. A reunião da CTNBio termina na quinta-feira à tarde (14/12).
O deputado João Alfredo (PSOL-CE) compareceu à vigília e conversou com os manifestantes. O parlamentar, que é relator do Grupo de Trabalho da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias, alertou aos presentes que a biossegurança do país corre um sério risco no atual momento.
"O que está em jogo aqui agora não é apenas a liberação dessas duas variedades de milho transgênico mas também a proteção de toda a biodiversidade brasileira. Temos uma Medida Provisória para ser votada no Congresso que pode alterar a relação de forças na CTNBio e prejudicar trabalhadores rurais, o meio ambiente e nós consumidores", afirmou o deputado, que pede um aliança forte entre movimentos sociais e instituições ambientalistas para combater as forças ruralistas e de empresas transnacionais como Bayer e Monsanto.
"Quando vejo as contradições desse atual governo, que deu mais espaço aos ruralistas, que orienta seus esforços em prol do agronegócio e das grandes empresas multinacionais, fico pessimista com o nosso futuro. Mas ao ver movimentos como esta vigília, em que há uma forte aliança entre movimentos sociais, organizações ambientalistas e órgãos de defesa do consumidor, retomo meu otimismo."
Uma carta pedindo que o governo proteja a agro-biodiversidade brasileira e impeça a introdução do milho transgênico no país foi entregue pelos trabalhadores aos membos da CTNBio. Mário Barbarioli, agricultor paranaense de 50 anos, exibia com orgulho sua coleção de mais de 100 variedades de sementes de milho, e outras de feijão, arroz e leguminosas. Representante da rede EcoVida de AgroEcologia de Curitiba, Barbarioli trouxe o mostruário de sementes crioulas de sua região para mostrar o perigo que o Brasil corre se liberar variedades transgênicas.
"Se eles (integrantes da CTNBio) liberarem os transgênicos, acredito que em 10 anos não teremos mais quase nenhuma semente crioula. A contaminação é muito veloz porque o milho tem polinização cruzada, acelerando o processo", alertou o agricultor.
Para Ventura Barbeiro, engenheiro agrônomo do Greenpeace Brasil, também presente à vigília, é preciso aprender com a experiência de outros países para não sofrermos os mesmos problemas.
"A contaminação do milho por transgênicos já é uma realidade no México, Espanha e Estados Unidos, entre outros. Por isso estamos aqui,
para proteger o patrimônio genético brasileiro", disse ele.
Darci Frigo, coordenador da ONG Terra de Direitos, também integrante da Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos, existe hoje uma
completa falta de transparência por parte da CTNBio na aprovação de pedidos de liberação comercial de produtos geneticamente modificados.
"As regras são bem definidas, mas elas não têm sido observadas pelos integrantes da CTNBio. Temos que tornar público o que eles escondem. Não há um devido cuidado com decisões que podem afetar nossa biodiversidade e até a saúde humana. Quem vai se responsabilizar no futuro caso haja uma contaminação das lavouras? Quem garante a sobrevivência das sementes crioulas?", questiona.
Recentemente, o Greenpeace protocolou diversos documentos junto à CTNBio, apontando os possíveis impactos do milho transgênico sobre o meio ambiente e a saúde humana. Os textos estão disponíveis no link:
www.greenpeace.org.br/biblioteca/transgenicos.php