O processo de colonização do Brasil é muito mais extenso do que é ensinado nas escolas. Não só as Capitanias Hereditárias, Bandeiras e a construção de Brasília, em 1960, resumem este processo. Uma importante parte da história recente da ocupação do país ainda é ignorada.
Há 58 anos atrás, a Expedição Roncador-Xingu e a Fundação Brasil Central construíram rodovias e fundaram cidades, criando novas fronteiras econômicas no Centro-Oeste brasileiro. No final da década de 1960, projetos do Governo Federal de incentivo à colonização da região, como o Proterra, chamaram a atenção de agricultores gaúchos, dando início a uma segunda onda de ocupação.
Logo, trabalhadores rurais e pequenos proprietários do Rio Grande do Sul se organizaram em torno de cooperativas a fim de obter terras e maquinários financiados em 10 anos e a juros fixos no Mato Grosso. Segundo Elcides Salamoni (na foto ao lado), um dos colonos e fundador da extinta Cooperativa 31 de Março, “a colonização aconteceu devido ao alto preço da terra no sul. Não viemos por amor ao país, e sim para ficar rico.”
Nessa época, o tamanho médio da pequena propriedade no Rio Grande do Sul era de apenas 2,5 hectares, enquanto que o colono associado à 31 de Março que vinha para o Vale do Araguaia recebia um lote rural de 400 hectares e 3 lotes urbanos com 800 m2 cada. Segundo Salamoni, cidades como Água Boa e Canarana foram planejadas em Tenente Portela (RS), antes mesmo da vinda dos colonos. “Fizemos que nem Brasília, com ruas largas e espaço de sobra”, afirma o pioneiro.
Apesar de todos os incentivos, as dificuldades encontradas foram grandes. A área era completamente desabitada e sem infraestrutura. “Aqui não tinha nada, nem posto de gasolina. Tínhamos que trazer o diesel para as máquinas de Barra do Garças”, explica Salamoni. E completa: “Tivemos que construir toda a infraestrutura das cidades, desde a escola, igreja até as pontes”.
De 1974 a 1980, duas mil famílias gaúchas vieram para região de Água Boa (MT). Destas, 35 % tiveram sucesso e permaneceram, o que é considerada uma excelente média, bem acima dos 20% a 25% previstos para esse tipo de empreendimento. “Não trouxemos empresários, mas sim agricultores. Houve muitas frustrações e mesmo assim fomos bem sucedidos”, conta Salamoni.
Mesmo com todo o planejamento prévio, o processo de ocupação do Mato Grosso é muito criticado. O Projeto Proterra, por exemplo, não exigia qualquer estudo de impacto ambiental, o que gerou uma grande destruição da fauna e da flora local. Hoje Salamoni lamenta a ocupação desenfreada: “não tivemos a menor preocupação com o cerrado, queríamos fazer lavouras. Hoje estamos vendo rios assoreados e as terras virando areia.”