Doença de índio, por Ligia Bahia

Por Ligia Bahia, originalmente publicado no Blog do Noblat

Recursos assistenciais modernos, financiados com verbas públicas para atender exclusivamente ricos, acirram desigualdades na saúde. A falta de posto, hospital, equipamento, médico, remédio e qualidade no atendimento para quem mais precisa corresponde à exuberante disparidade social, regional, étnica e racial nos indicadores de saúde.

O desacerto entre as necessidades e as chances de obter cuidados é o resultado da concentração de dinheiro do governo para a parcela da população mais saudável, com a insuficiência de assistência aos grupos vulneráveis. Logo, as carências não são generalizáveis.

Em 2010, o gasto per capita com saúde foi de R$ 726. Cada brasileiro teve direito em média a R$ 2 por dia, quando recorreu ao SUS. Para a população indígena, cerca de 300 povos que constituem uma das maiores diversidades étnicas e linguísticas do mundo, o valor foi bem menor, R$ 411.

Entre indígenas e não indígenas as desigualdades na saúde são flagrantes. Apesar do recente crescimento demográfico dos povos indígenas, os diferenciais entre a expectativa de vida, taxa de mortalidade de crianças e acesso ao sistema de saúde persistem.

A incidência de doenças infecciosas e parasitárias (malária, tuberculose, diarreia e pneumonia) é maior na população indígena. Além disso, o envolvimento de indígenas com a sociedade nacional e global, e as mudanças em seus sistemas de agricultura e extração em função da aquisição ou oferta de alimentos industrializados, causam obesidade, hipertensão e diabetes.

A Constituição de 1988, que reconheceu a organização social, línguas, costumes, tradições e os direitos originários sobre as terras que os índios ocupam, atribuiu ao SUS a responsabilidade pela saúde indígena.

Os distritos especiais de saúde indígena foram criados com o propósito de respeitar as diferenças socioculturais e, portanto, romper com a imposição dos referenciais e práticas terapêuticas ocidentais.

Consequentemente, a construção de espaços de interação entre as equipes do SUS e os povos indígenas é duplamente desafiante. As rotinas de atendimento aos povos indígenas requerem, frequentemente, adaptações a condições geográficas e demográficas e compreensão mútua das diferenças sobre os referenciais de causa das doenças.

A atividade de vacinação de povos indígenas, por exemplo, que pode exigir a subida e a descida de rios, depende do tempo da conservação de imunobiológicos no gelo. A doença, na perspectiva indígena, é entendida como uma ameaça coletiva, extensiva ao grupo de parentes e desencadeia estratégias de cuidados igualmente compartilhadas.

Para restabelecer a saúde é necessário re-harmonizar a ordem social e cosmológica. As “doenças de branco” são apenas como uma expressão sintomática de fenômenos muito mais complexos. A introdução de substâncias químicas no corpo tem um grau de importância relativamente menor do que uma viagem xamânica em busca da resolução dos problemas coletivos que propiciaram a eclosão da doença.

Com poucos recursos e sem a constituição de equipes do SUS com formação adequada, as desigualdades na saúde entre indígenas e não indígenas se acentuarão. Os persistentes problemas relacionados às terras, a educação e saúde ameaçam objetivamente a sobrevivência dos povos indígenas.

Constatam-se duas formas para abordar a saúde indígena no Brasil. A primeira entende que existem índios tão somente situados no território brasileiro, sem manter relação de pertencimento parcial ou integral para com o país, e a segunda considera que esses povos constituem o Brasil. São modos opostos de encarar o problema e sua solução.

Caso se considere que os índios moram em solo “nacional” por acaso, em função de processos sociopolíticos que não foram de sua própria escolha, as providências para atender seus problemas de saúde tenderão a contingentes. Se, ao contrário, concebermos que o brasileiro é índio, a saúde indígena constituirá um componente necessário e prioritário das políticas de saúde.

Em 2013, o Brasil vai realizar uma Conferencia Nacional de Saúde Indígena. As reivindicações dos povos indígenas incluem o aumento de recursos financeiros para saúde e participação nas decisões. A ocasião é propícia, em função da visibilidade das inúmeras manifestações públicas dos indígenas e não indígenas e dos avanços internacionais em relação aos direitos da saúde dos povos indígenas.

Como a comparação com outros países virou mania entre os atuais dirigentes da saúde, nada melhor do que pegar jacaré nessa onda.

O governo australiano acaba de anunciar seu plano de saúde para aborígines nacionais. A característica fundamental do plano é investir mais na saúde indígena e abordar o racismo que por muitos anos tem dificultado o acesso de indígenas australianos aos cuidados e aos serviços de saúde pública.

O compromisso estabelecido pelo Ministério da Saúde australiano é o de propiciar condições para que os indígenas tenham o mesmo status de saúde do restante da população e permitir que a compreensão holística sobre saúde dos indígenas seja praticada e investigada, com finalidades científicas mediante a cooperação entre iguais.

O Brasil precisa rever as concepções e as práticas que organizam a atuação do SUS na saúde indígena, a começar pelos investimentos e ruptura com a apresentação e representação do trabalho que envolve os cuidados aos povos indígenas como algo exótico. A retórica pró-diversidade ancorada no silêncio a respeito das desigualdades e etnocídio puxa o país para trás. Se os índios não tiverem saúde, não teremos saúde.

Ligia Bahia é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Belo Monte: respeito à Constituição já!

Avaaz.org

As obras de Belo Monte foram paralisadas na semana passada, mas agora a Advocacia-Geral da União quer ir direto ao Supremo Tribunal Federal para continuar as obras sem que se respeite a Constituição, que determina que os índios devem ser consultados. Não podemos permitir isso!

Na semana passada, uma decisão histórica do TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) decidiu pela suspensão imediata das obras de Belo Monte porque até agora os índios, que serão diretamente afetados pela obra, não puderam emitir sua opinião sobre a mega-usina. Nesse exato momento, a nossa única chance de manter Belo Monte paralisada está nas mãos do Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal, e isso pode acontecer a qualquer momento nas próximas horas!

Uma Amazônia sustentável, com respeito aos povos indígenas e ao equilíbrio da vida natural do planeta, está em risco iminente —Vamos inundar a caixa de mensagens do Presidente do STF com e-mails pedindo que a Constituição seja respeitada. Envie uma mensagem para o Ministro Ayres Britto clicando abaixo, e divulgue para todos urgentemente:

http://www.avaaz.org/po/stf_pare_belo_monte_a/?bOMXLab&v=17381

Belo Monte é um Golias no coração da Amazônia e vem dividindo a opinião dos brasileiros. Mas todos concordam que uma obra de tamanho impacto não pode ser feita sem o cumprimento da Constituição, que afirma que este tipo de obra só pode acontecer se os índios forem ouvidos. Pela lei, os índios não terão a última palavra, mas continuar a obra sem conhecer a posição dos povos indígenas é uma atitude incompatível com uma democracia pluralista como o Brasil.

O licenciamento de Belo Monte pelo IBAMA estabeleceu uma série de condicionalidades que não vêm sendo cumpridas na execução da obra. Uma decisão do STF mantendo a interrompção dos trabalhos é a melhor oportunidade que nós temos para que o processo de destruição da Amazônia passando por cima da lei seja interrompido.

Envie uma mensagem agora para o Ministro Ayres Britto e, em seguida, divulgue para todos:

http://www.avaaz.org/po/stf_pare_belo_monte_a/?bOMXLab&v=17381

No passado, ajudamos o maior movimento de combate à corrupção eleitoral do Brasil dando apoio na mobilização da Lei da Ficha Limpa e até que ela virasse realidade. E em todo o mundo, membros da Avaaz têm ajudado a soar o alarme para as injustiças, salvar vidas e fazer a diferença. Vamos nos unir mais uma vez, e mostrar nossas vozes e coragem para salvar a Amazônia de uma vez por todas.

Acusados de assassinato de líder indígena na Raposa Serra do Sol são absolvidos

Alex Rodrigues – Agência Brasil

Após dois dias de um julgamento que mobilizou índios e produtores rurais e teve seu início adiado por seis vezes, o Tribunal Regional Federal (TRF) de Roraima absolveu, por falta de provas, os três acusados pelo assassinato do líder macuxi Aldo da Silva Mota, 52 anos, morto a tiros em janeiro de 2003. A sentença foi anunciada no início da manhã de sábado (19).

Para organizações indigenistas e ambientalistas, o assassinato de Mota é um dos vários crimes cometidos em função da disputa por terras durante o processo de demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Seu corpo foi encontrado por parentes, dias após ter desaparecido. Estava enterrado em uma fazenda de Uiramutã, cidade criada em 1995. À época, a Fundação Nacional do Índio (Funai) já havia identificado a área como terra tradicional indígena.

Na época do crime, a fazenda onde o corpo de Mota foi encontrado era ocupada pelo ex-vereador Francisco das Chagas Oliveira da Silva, conhecido como Chico Tripa, inicialmente acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de ter contratado Elisel Samuel Martin e Robson Belo Gomes para matar o índio macuxi.

Segundo a assessoria do Ministério Público Federal (MPF) no estado, o procurador Ângelo Goulart Villela tem até esta sexta-feira (25) para analisar a possibilidade de recorrer contra a sentença do juri.

Já o Conselho Indígena de Roraima (CIR) promete recorrer da decisão. Dizendo-se surpreso com a decisão, o coordenador geral do CIR, Mário Nicácio, disse que o conselho e a família de Mota vão tentar evitar que o processo volte a ser julgado no estado.

“Não aceitamos a decisão. A família vai recorrer, com assistência jurídica do CIR, e nós vamos manter nossa mobilização por justiça”, disse Nicácio, por telefone, à Agência Brasil. O coordenador questionou a composição do juri, composto por duas mulheres e cinco homens e presidido pelo juiz federal Helder Girão Barreto, e a postura do próprio MPF.

“Desde o início, notamos, no juri, um pré-julgamento pelo fato de Aldo ser um índio e viver na reserva e uma sede de vingança pela demarcação da Raposa Serra do Sol. E questionamos também a postura do MPF, que, no papel de advogado de acusação, em vez de defender os interesses indígenas, pediu a absolvição do Chico Tripa por falta de provas”, disse Nicácio.

A assessoria do Ministério Público Federal confirmou que o procurador Ângelo Goulart Villela não viu indícios da participação do fazendeiro Chico Tripa no crime, razão pela qual pediu sua absolvição e confirmou que o procurador pediu a condenação de Elisel Samuel Martin e Robson Belo Gomes. Martin e Gomes também foram absolvidos pelo juri por falta de provas.

A assessoria do MPF não quis comentar as declarações do coordenador geral do CIR.

Edição: Fábio Massalli

Sinal vermelho para o Xingu: sob protestos, governo inicia obra de Belo Monte

Por João Alberto Ferreira – originalmente publicado na revista Brasileiros de Raiz.

Mapa do desmatamento na região do rio Xingu até 2007
Mapa do desmatamento na região do rio Xingu até 2007 (fonte: Yikatuxingu.org.br)

Visto do alto, por imagem de satélite, o Rio Xingu, de sua nascente, em Mato Grosso, até desaguar no Amazonas, mais de dois mil quilômetros depois, é um paraíso intocado. Toda essa imensa região, habitada por mais de 25 mil indígenas de 24 etnias, milhares de ribeirinhos, populações extrativistas, agricultores familiares e quilombolas destacam-se de seu entorno por um fato muito simples: continua verde enquanto tudo a sua volta é vermelho.

Nas legendas para as cores apontadas pela imagem do satélite, segue a tradução: verde significa flora e fauna abundantes; vermelho, desmatamento.

São os índios e as populações que ali vivem quem protege esta rica região que abriga o maior mosaico de áreas protegidas do Brasil, combinando terras indígenas e áreas de conservação, parques nacionais e reservas extrativistas.

Na área em vermelho vive o não-índio.

A região é de tal forma preservada que só recentemente foram localizadas duas áreas, onde índios ainda vivem isolados. Tão rica do ponto de vista cultural que guarda em seus limites três dos quatro troncos macrolinguísticos de onde se originam as mais de 180 línguas indígenas faladas no Brasil.

De Altamira até desaguar no Amazonas, abriga várias comunidades quilombolas. “É uma terra indígena por excelência, perfeitamente combinada com comunidades tradicionais e unidades de conservação, uma imensa biodiversidade, patrimônio de todos brasileiros e do mundo”, descreve a professora Sônia Magalhães, da Universidade Federal do Pará (UFPA), integrante da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e profunda conhecedora da região.

Por água abaixo

Overview of the dam complex.
Área de construção de Belo Monte (Image via Wikipedia)

Justamente neste local privilegiado, o governo federal planeja fazer uma das maiores intervenções já produzidas pelo homem em terra indígena. Construirá, na Volta Grande do Xingu, bem no coração da terra de índios Araras e Jurunas, a terceira maior hidrelétrica do mundo – Belo Monte.

O local foi escolhido porque o regime de águas do Xingu complementa as bacias do Paraná e do São Francisco, onde estão localizadas Furnas, Chesf e Cemig. Assim, quando os reservatórios da região sudeste começarem a baixar, como costuma acontecer nos meses de março, a vazão de Belo Monte virá em seu socorro. A Eletrobrás calcula que a usina será capaz de garantir em torno de 4.500 MW médios.

Belo Monte é um dos projetos mais ambiciosos do PAC 2, a segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento. O governo espera concluí-lo até 2015.

Belo Monte também fará submergir sob um reservatório de 548 km², parte da floresta, onde vivem índios Jurunas, na Terra Indígena (TI) Paquiçamba, de 4.348 hectares, e secará a Volta Grande onde vivem índios Araras, na TI Arara da Volta Grande do Xingu, de 25.500 hectares.

Em ambas as áreas, separadas pelo rio Xingu, Jurunas e Araras convivem harmoniosamente com populações ribeirinhas e extrativistas. Praticamente todo o fluxo das águas em direção à Volta Grande, no Baixo Xingu, será desviado, aproveitando a queda de 96m entre o município de Altamira e a Volta Grande.

Belo Monte Dam
Ilustração de como será a barragem de Belo Monte quando finalizada (image via Wikipedia

Serão três barramentos. O principal, localizado em Pimental, terá o maior vertedouro. Formará um reservatório cujas águas serão reguladas pela barragem de Bela Vista. Daí correrão outros até a barragem de Belo Monte, onde será construída a principal casa de força, responsável por 11.000 MW dos 11.233 MW que o governo calcula produzir com a usina. A média estará em torno de 4.500 MW.

Há um agravante. Conforme aponta o Instituto Socioambiental (ISA) em seu Atlas de Pressões e Ameaças às Terras Indígenas na Amazônia Brasileira, de dezembro de 2009. Este “importante conjunto de áreas protegidas conectadas (situado ao longo do Vale do Rio Xingu, do nordeste do Mato Grosso ao centro do Pará, perfazendo 264,7 mil km², 73% formados por terras indígenas e quase 25% por unidades de conservação) tem papel estratégico para a conservação por ser uma ligação entre os dois maiores biomas nacionais: a Amazônia e o Cerrado”.

Quando hospedou na Universidade de Brasília (UnB) o seminário A Hidrelétrica de Belo Monte e a Questão Indígena, promovido pela ABA, em 7/2, em parceria com o Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos) e a Fundação Darcy Ribeiro, o reitor José Geraldo de Sousa Junior fez uma descrição precisa da situação. “Nitidamente, temos de um lado quem defende o modelo da matriz energética adotado pelo governo brasileiro e de outro quem acredita que este modelo é desumanizante. Seria possível construir outro modelo energético?”, questionou.

 

De um lado, o Governo aposta sua força em Belo Monte.

“Sem ela o País não teria outra fonte de energia capaz de garantir 4.500 MW médios, além de térmicas a óleo combustível. Poderia mesmo entrar na conta um pouco de energia eólica, solar e biomassa, mas jamais chegaríamos aos 4.500 MW necessários”, afirmou então o presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz Lopes, no início de fevereiro.

Cada ponto percentual de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, que vem se acentuando nos últimos dois anos, representa um aumento de 1,7% no consumo de energia. A atividade econômica brasileira deve entrar em uma trajetória de expansão mais branda a partir dos próximos meses e registrar uma taxa de expansão em torno de 4,5% a 5% nos próximos anos.

Do outro lado, o cacique kayapó Raoni Metuktire.

Français : Raoni place des droits de l'homme a...
Cacique kayapó Raoni Metuktire (Image via Wikipedia)

Um dos líderes indígenas mais respeitados no Brasil e no exterior, apoiado pelas mais expressivas lideranças indígenas do país, ambientalistas, universidades e movimentos sociais, Raoni foi mais longe e mais claro que Lopes. Mais longe quando afirmou aos secretários executivo da Secretaria Geral da Presidência da República, Rogério Sotili, e de Ativação Social da mesma Secretaria, Paulo Maldus, em reunião no Palácio do Planalto, em 8/2, que haverá uma guerra se as obras forem iniciadas. Mais claro, quando garantiu:“Se a obra começar, eu vou morrer, empreendedor vai morrer. Vai ter morte lá”.

No centro de tudo está a questão: o crescimento econômico – reconhecidamente responsável pela geração de emprego e distribuição de renda, que reduzem desigualdades sociais – necessariamente deve vir acompanhado por um pesado custo ambiental e social ou há meios sustentáveis para atingí-lo?

No encontro com Raoni e outras nove lideranças indígenas, que originalmente fora solicitado para ser com a presidente Dilma Roussef, Sotilli recebeu as 604 mil assinaturas com o resultado final das petições contra Belo Monte organizadas pela Avaaz (comunidade global de mobilização online) e Movimento Xingu Vivo para Sempre. Também foi entregue o documento de denúncias e reivindicações do Xingu Vivo, que, além de exigir o cancelamento da obra, exige participação efetiva da sociedade civil nos processos de definição da política energética nacional.

Sotilli disse que se “sente muito triste” com as críticas ao governo; reafirmou que a presidente Dilma Roussef aprofundará a interlocução com os movimentos sociais, mas não deixou dúvidas sobre a firmeza da decisão governamental de construir Belo Monte: “Dilma fará o que tem que ser feito. A presidente tem que pensar o Brasil como um todo”.

Uma demonstração cabal de que o governo federal não teme a ameaça de Raoni, as obras de acesso ao local onde será instalado o primeiro de dois canteiros de obras para a construção de Belo Monte tiveram início em plena segunda-feira de Carnaval, 7/3. O engenheiro José Biagioni, da Norte Energia, consórcio responsável pela obra, disse à Agência Brasil que esta fase se refere aos trabalhos autorizados na licença de instalação concedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Uma semana depois, em 14/2, no Dia Internacional de Luta contra as Barragens, veio uma primeira resposta: mais de 200 pescadores de Altamira, Vitória do Xingu, Belo Monte, Senador José Porfírio e Porto de Moz, no Pará, manifestaram-se contra a construção da usina. Fizeram uma romaria fluvial até Altamira. Em frente à sede da Eletronorte, foram recebidos por suas mulheres e filhos que teciam, redes de pesca para simbolizar a unidade das populações ameaçadas pela hidrelétrica.

A guerra de Raoni

Estas são apenas as primeiras escaramuças da guerra declarada unilateralmente por Raoni. Seu principal campo de batalha terá lugar no sítio Pimental, a 40 quilômetros de Altamira, sede deste primeiro canteiro de obras. A data para acontecer é até o final de abril. Segundo o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, este é o prazo máximo para o governo não perder a janela hidrológica necessária ao início da obra sem atrasos.

A vontade de Lobão não será suficiente. A vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, informou que “o BNDES (que banca o financiamento da maior parte da obra) trabalha com uma condicionante: o licenciamento ambiental definitivo. Por quê? Do contrário seria um risco”. O que existe hoje é uma licença parcial, concedida pelo Ibama, autorizando o início das obras do canteiro.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) concedeu um empréstimo-ponte de R$ 1,1 bilhão à Norte Energia exigindo, no entanto, que ela não faça qualquer intervenção no “sítio”. Só que as árvores do “sítio”, na previsão de Lobão, começarão a ser derrubadas a partir da licença parcial concedida pelo Ibama. Texto do documento do BNDES ao Ministério Público Federal informou que na minuta do contrato “figura a obrigação explícita para a beneficiária de não efetuar qualquer intervenção no sítio em que está prevista a construção da usina sem que tenha sido emitida a licença de instalação do empreendimento como um todo”.

Ainda assim, Pirakuman Yawlapiti, irmão de Aritana, cacique geral do Xingu e da comunidade Yawalapiti, situada ao sul do Parque Indígena do Xingu, disse que Araras e Jurunas, as etnias mais prejudicadas, mantém sob observação o local escolhido para o canteiro. Ao menor sinal do início do desmatamento dos 450 hectares necessários para abrigá-lo, convocarão todas as grandes lideranças e etnias do Xingu. Pirakumã, que esteve na reunião do Planalto, advertiu que a guerra anunciada por Raoni se estenderá por quantas batalhas forem necessárias, durante o tempo que durar a obra (quatro anos, segundo o governo).

Planejamento energético sem planejamento humano

Quando planeja geração de energia, tradicionalmente o governo brasileiro coloca o mapa hidrográfico do país sobre a mesa, estuda a abundância das bacias hidrográficas, seus milhares de rios e não tem dúvida: escolhe as hidrelétricas como caminho mais viável. 73% de toda energia produzida no Brasil em 2007 se originou nestas usinas. Um mapeamento da energia produzida no país feito pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2007 dimensionou esta preferência. O PAC 2 confirma.

O PAC 2 prevê a construção de 54 hidrelétricas – 44 usinas convencionais, que vão gerar 32.865 MW e dez das chamadas usinas plataformas, que vão gerar outros 14.991 MW e prevêem seu isolamento logo após a construção, de modo a evitar o crescimento populacional desordenado em seus arredores. Prevê ainda a construção de 71 centrais de energia eólica, localizadas principalmente no nordeste e no sul do país. Somadas terão capacidade para gerar 1.803 MW. Também estão incluídas três usinas termoelétricas movidas à biomassa para gerar 224 MW.

A vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, acusou Belo Monte de não contemplar um estudo de impacto ambiental que trate do componente humano. Ela explicou que a resolução 001 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), de 1986, portanto, bem anterior a Belo Monte, foi visionária ao estabelecer a forma como deveria se dar o processo de licenciamento ambiental, principalmente o estudo de impacto ambiental, contemplando os meios físico, biótico e antrópico.

A ordem estabelecida não é aleatória. “Exatamente porque o homem é o centro das preocupações é que se vai analisar primeiro qual é o impacto no meio físico, como isso vai repercutir entre os animais, entre a vegetação e depois qual é a soma de todas essas repercussões na vida dos homens”, disse.

Rio Xingu
Rio Xingu (Blog do Mílton Jung via Flickr)

Duprat taxou de farsa o processo de licenciamento de Belo Monte. “Se as pessoas não sabem como vão ser atingidas, como vão fazer a crítica?”, questionou. Para ela, os índios foram mal estudados, enquanto os outros grupos não foram sequer analisados. “Nas audiências públicas, não havia um estudo de impacto ambiental porque não havia um estudo sério e consistente sobre o meio antrópico”, completou.

Ela explicou que, apesar de não ter estudo de impacto ambiental que trate do componente humano, passou-se para outro momento, como se fosse possível pular em um empreendimento o estudo de impacto ambiental e passar a colocar questões humanas como condicionantes para as próximas licenças. Conforme lembrou, isso foi sendo arrastado para um momento posterior até chegar, agora, à construção de um canteiro central, trabalhando basicamente com a teoria do fato consumado, sem minimamente saber qual vai ser o impacto na vida de todos.

Duprat também criticou a afirmação de que as hidrelétricas representam a energia limpa. “Como é que pode ser limpo um empreendimento que provoca degradação [ambiental], fim de relações de compadrio, fim de relações de amizade e desestrutura culturalmente um grupo? Considerar isso uma energia limpa é considerar o meio ambiente absolutamente dissociado das pessoas”, declarou. De acordo com ela, isso está em contrariedade à Constituição, que é antropocêntrica e tem como grande princípio norteador o da dignidade da pessoa humana.

O lado sujo das hidrelétricas

De fato, a construção de hidrelétricas causa um estrago e tanto. Na área que recebe o grande lago que serve de reservatório da usina, a natureza se transforma: o clima muda, espécies de peixes desaparecem, animais (os que conseguem) fogem para refúgios secos, árvores viram madeira podre debaixo da inundação, entre outros impactos.

O homem, como observou Duprat, vive bem no meio de toda essa transformação e é o maior atingido por ela. Milhares de pessoas deixam suas habitações e têm que recomeçar sua vida do zero em outro lugar.

“Em casos como esse, já testemunhei trabalhadores que viviam tradicionalmente do cultivo de sua terra perambulando e dependendo de cestas básicas doadas por empresas”, denunciou o deputado petista maranhense Domingos Dutra, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

Dutra se referia à hidrelétrica de Estreito, inaugurada no início deste ano na divisa do Tocantins e Maranhão. Sua construção deslocou, forçadamente, cerca de duas mil famílias da região. Estreito é a sétima hidrelétrica no Rio Tocantins. Ainda estão previstas outras três usinas ao longo do rio – a barragem de Marabá, prevendo o deslocamento de 40 mil pessoas, entre elas do povo indígena Gavião, e a de Serra Quebrada, que inundará parte da terra dos Apinajé.

A Usina de Itaipu, marco do Brasil Grande pregado pelos militares nos anos 1970, desapropriou 42.444 pessoas, 38.440 delas trabalhadores e trabalhadoras do campo, que só em 1993 viram um primeiro acordo de indenização. Mas aí já era tarde. Muitas famílias migraram, outras se perderam pelo caminho, outras se separaram. Enfim, famílias que perderam não somente suas terras, mas, senão toda, ao menos parte de sua história no fundo do reservatório da segunda maior usina hidrelétrica do mundo.

Principais impactos do desalojamento de populações atingidas por barragens

  • Interfere em bens de valor afetivo, cultural e religioso
  • Inunda sítios arqueológicos
  • Desaloja populações nativas e aldeias indígenas
  • Inundação das terras agrícolas torna as pequenas propriedades inviáveis economicamente
  • Cria dificuldades de circulação e comunicação entre cidades vizinhas
  • Desestrutura as famílias de origem rural que, às vezes, são transferidas para áreas muito distantes
  • Condiciona a concentração fundiária onde predominam as pequenas e médias propriedades rurais
  • Cria um falso pico de desenvolvimento local que tende a esgotar-se com o término da construção e entrada em operação

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Brasileiros de Raiz

Única revista nacional especializada em questão indígena, Brasileiros de Raiz tem como objetivo recolocar a história em seu trilho, dar voz e informações atualizadas e verdadeiras sobre povos indígenas. Para saber mais, visite: http://brasileirosderaiz.com.br [/box]

A tarefa de levar aos brasileiros a realidade indígena

Cid Furtado, carta de abertura da 1ª edição da revista Brasileiros de Raiz

Em pleno século 21, o Brasil, tão reconhecido na aldeia global antevista pelo grande teórico da comunicação, Marshal Macluhan, tem dificuldades para reconhecer sua cultura original. Sua identidade mais pura. Permite assim, que a sociedade desconheça os habitantes da terra que existiam antes de a chamarmos Brasil. Milhões de índios tiveram suas vidas ceifadas pelo conquistador português e, ainda hoje, este País moderno permite a continuidade deste massacre, ensinando em suas escolas a história contada pelo vencedor, tratando-os com descaso e tornando-os invisíveis aos olhos da sociedade e governos.

Os indígenas só ganham visibilidade quando decidem lutar por seus direitos, enfrentando nossos preconceitos, ou quando surge um conflito com a sociedade não-índia. Essa situação, causada pela combinação de falta de informação e de iniciativa em mudá-la, foi o ponto de partida de nossa proposta de criar a revista Brasileiros de Raiz. Em suas páginas, vamos nos impor, permanentemente, a tarefa de levar ao cidadão brasileiro, informações sobre a realidade das comunidades indígenas de todo o País. Casualmente, enquanto preparávamos sua primeira edição, duas histórias nos chamaram a atenção para a importância do trabalho que pretendemos fazer.

Meu filho de 15 anos, cursando o 2º ano do ensino médio, numa das escolas consideradas de melhor nível de Brasília, explicou-me, conforme ouvira de seus professores, porque os indígenas teriam sido massacrados pelos colonizadores: “porque os portugueses presenciaram atos de antropofagia e teriam sido levados a crer que as comunidades indígenas brasileiras, de forma geral, tinham esta prática”. Esta seria a justificativa para os massacres.

O segundo relato aconteceu durante uma conversa recente com um ex-presidente da Funai. Ele me disse que seu filho, na 3ª série do ensino fundamental, também havia recebido informações, no mínimo distorcidas, estampadas em livro adotado por parte da rede de ensino da Capital Federal. Diz o livro que a chegada de escravos negros no Brasil deve-se ao fato de o índio não aceitar trabalhar.

Na verdade, na grande maioria das sociedades indígenas, homens e mulheres têm diferentes atribuições na comunidade. O indígena brasileiro não se adaptava a diversas práticas dos colonizadores, por diferenças culturais e muitos outros fatores como abrir mão de seu modo de vida, de sua liberdade e independência ou cumprir funções, tradicionalmente exercidas por mulheres nas comunidades indígenas. Detalhes culturais que fizeram e fazem toda a diferença na hora de analisar as questões indígenas.

Assim como muitos simpatizantes das causas indígenas, acreditamos que recolocar a história em seu trilho, dar voz e informações atualizadas e verdadeiras sobre os legítimos Brasileiros de Raiz, é uma importante contribuição para contarmos a verdadeira história dos povos indígenas.

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Revista Brasileiros de Raiz

A revista Brasileiros de Raiz surgiu como uma publicação dedicada exclusivamente à questão indígena com o intuito de trazer informações sem preconceitos sobre a realidade indígena brasileira. Para saber mais, entre em contato com redacao@brasileirosderaiz.com.br ou ligue para (61) 3202 30 92.
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10 anos de Rota Brasil Oeste: nos passos dos irmãos Villas Boas

Brasília ainda se espreguiçava quando pulei da cama, lavei o rosto para curar a noite mal dormida, comi algo rápido e me despedi de quem estava acordado. Era Abril de 2001, há pouco mais dez anos atrás.

Na garagem, o Santana prata – emprestado por minha avó – esperava devidamente decorado com os adesivos colados de última hora que comprovavam o apoio fundamental de empresas e indivíduos que acreditaram na ideia de revisitar os lugares e resgatar a história dos irmãos Villas Boas e da Expedição Roncador-Xingu.

A viagem que estava prestes para começar, na verdade, foi iniciada quase por acaso. Dois anos antes de iniciarmos a viagem, ao lado de três amigos (Bruno, Fábio e Pedro), todos alunos do curso de Comunicação da UnB, decidimos fazer um projeto final de curso que unisse algumas de nossas paixões: viajar, fotografar e escrever.

Como viabilizamos o projeto

Como a premissa em comum acordo, nos faltava decidir aonde ir e qual tema enfocar. Em meio a estas discussões, o acaso nos favoreceu. Ao atender o telefone na casa dos meus pais um dia, do outro lado da linha falava Orlando Villas Boas. Orlando era um antigo amigo da família e aconteceu de ligar naquele dia.

A ficha, literalmente, caiu na hora. Esta era uma oportunidade de adicionar uma dimensão histórica ao projeto. Sentamos para conversar e mudamos o rumo da ideia: passamos a trabalhar com o objetivo de revisitar a história dos irmãos Villas Boas e da Expedição Roncador-Xingu quase 60 anos depois de seu início.

Queríamos percorrer os mesmos caminhos, visitar as cidades fundadas e conversar com os pioneiros que viveram este desbravamento do Brasil central. Registrando tudo com fotos e textos sobre o que encontrávamos no caminho.

Passamos a canalizar nossos estudos nesta direção. Pesquisamos livros, artigos e arquivos fotográficos. Realizamos um amplo projeto de marketing para atrair patrocinadores. Entrevistamos pesquisadores e lideranças indígenas. Estabelecemos contatos e contamos com apoio da FUNAI, especialmente o privilégio de sermos acompanhados pelo indigenista Guilherme Carrano, que teve a paciência de nos aguentar e mostrar o quanto ainda éramos ignorantes e ingênuos.

Recebemos a ajuda de professores e empresas. Sem dinheiro para pagar hotel, em algumas cidades onde passamos fomos acolhidos por famílias, como a de seu Pedro, em Barra do Garças, e indivíduos, como Lúcia Kirsten em Nova Xavantina. Personalidades fantásticas, personagens de um Brasil autêntico e corajoso.

Acima de tudo, no entanto, nos marcou o carinho e dedicação com os quais fomos tratados pela família Villas Bôas. Não só tivemos o privilégio de ouvir os depoimentos de Orlando e Marina em primeira mão, mas fomos recebidos como filhos, com direito a bife com arroz e feijão no almoço (que Orlando comeu acompanhado de panetone!).

Quanto mais líamos, mais nos impressionávamos com a dimensão da aventura dos irmãos Villas Bôas e o quão pouco sabíamos sobre o que talvez tenha sido o maior projeto de colonização realizado no século XX e que culminou com a construção de Brasília – nossa cidade natal. Tão conhecidos nas décadas de 60 e 70, Cláudio, Orlando e Leonardo eram, na época nomes, estranhos para gerações mais novas.

Aventura digital

Além disso, para viabilizar nossa ideia de projeto “multimídia”, escolhemos publicar notícia directo da viagem via Internet, o que se tornou uma aventura à parte. Parece algo trivial, mas em 1999 a rede era um nicho que apenas começava a ser explorado. Ainda não havia, por exemplo, sistemas estabelecidos que facilitassem a administração de conteúdo. Isso para não falar da falta de estrutura para transmissão de dados.

Neste sentido, tivemos nosso lado de pioneirismo. Na época conseguimos apoio da operadora de telefonia via satélite Globalstar, que estava prestes a inaugurar a transmissão de dados para seus aparelhos. Inauguramos o serviço, que funcionava em 9600kbps (minha internet de casa hoje é mais de 100 vezes mais rápida!) e foi lançado dias antes de partirmos em abril de 2001. Assim, nos tornamos os primeiros jornalistas a realizar a atualização e publicação de um site de internet direto do Xingu e do interior do Centro-Oeste.

Meses antes de iniciar a viagem, Fabio descobriu um obscuro serviço na Internet chamado “blogger”. A ferramenta foi a solução para não termos de programar o HTML na mão e nos permitiu atualizar o site praticamente todos os dias e ainda ter algumas horas de sono. Nunca imaginávamos que alguns anos depois o termo “blog” seria associado a uma revolução na comunicação.

Foram dois anos de intensa pesquisa, mas nada podia nos preparar para a experiência de vida que iríamos ter ao acelerar o carro e deixar Brasília naquela manhã de Abril.

10 anos depois

Nos cerca de 30 dias em que percorremos cidades, estradas e rios que levaram décadas para ser explorados, descobrimos um Brasil ignorado pelas lentes da novela-das-oito, de impressionante riqueza étnica e cultural.

Também nos defrontamos com a violência, preconceito e desafios de regiões onde a lei do mais forte ainda se impõe de maneira cruel.

De dentro do Xingu, publiquei um artigo no qual citava grandes problemas que, na minha opinião, haviam se destacado: educação, preservação cultural, pressões econômicas e devastação ambiental.

Acredito que estas ainda são questões essenciais para o indigenismo nacional.

Educação e preservação da identidade cultural continuam como pauta constante de discussão e, como tudo que diz respeito ao índio, apresenta realidade extremamente heterogênea.

Nestes dez anos que se passaram e nos quais continuei acompanhando a questão indígena, mesmo que nem sempre estivesse dedicado ao assunto, nada me chocou tanto, quanto o preconceito em relação ao índio.

O maior exemplo disso é que num momento de ampla discussão sobre os direitos de minorias, como o atual, a questão sequer é citada. Aliás, o maior indício do nível deste preconceito é que muita vezes sequer é classificado como tal.

O pré-julgamento se manifesa muita vezes na forma de uma visão romântica e paternalista. o “puro e bom nativo” – conceito que sobrevive desde o século XIX.

Mas dano maior é causado por sua versão mais virulenta. É comum escutarmos frases que classificam o índio como um enxerto na sociedade nacional, algo que está aí para ser expurgado ou absorvido. Desde que desapareça.

Este problema é ainda maior nas comunidades ao redor de grandes reservas, onde o modo de vida indígena é visto como um atraso para a região. Como nos disse Valdon Varjão, primeiro político a entrevistarmos em nossa viagem: “desvirtuaram a intenção original que era colonizar toda essa região construindo estradas e novas cidades. A idéia não era catequizar índio e nem fazer Parque Indígena”.

Em 2001, quando visitamos a reserva xavante de Pimentel Barbosa, ouvimos diversos relatos dos atritos de índios e não-índios. Um cacique local nos contou – aos prantos – a situação da filha pequena que havia sido largada no corredor do hospital local, sem atendimento adequado, enquanto outros pacientes recebiam prioridade. Descobriu-se que a menina sofria de pneumonia e ela sobreviveu graças a iniciativa de uma enfermeira piedosa.

Nos quatro primeiros meses de 2011, 34 crianças da comunidade Xavante de Campinópolis morreram por falta de atendimento médico, muitas delas mortas por pneumonia.

Pressões econômicas e destruição ambiental caminham juntas a passos largos. Quando visitamos as comunidades, uma dos maiores ameaças ao seu modo de vida era o desmatamento e a poluição das cabeceiras dos afluentes do Xingu. Os rios são a principal fonte de alimentação e água para a região.

Na semana em que visitamos o Parque, o Brasil passava pelo auge da crise do apagão. Nunca íamos imaginar que a proposta de solução para o problema se tornaria na próxima grande ameaça à região.

As nascentes dos rios continuam sob a mercê da expansão agrícola desenfreada, mas hoje o grande perigo vem do norte: a construção da usina de Belo Monte. Fruto de uma concepção falida de desenvolvimento, seu impacto ambiental promete ser devastador.

Ironicamente, o debate mais avançado sobre desenvolvimento em nível internacional caminha na direção de conceitos há muito praticados e dominados pelo índio, como o efetivo equilíbrio entre exploração e preservação da natureza.

Há, por exemplo, uma forte e inovadora corrente de economistas com argumentos sólidos para não medirmos a riqueza de um país apenas pelo seu produto interno bruto. Isto já é feito com o índice de desenvolvimento humano e agora pretende-se estender o conceito para medirmos o valor econômico aos “serviços” prestados pelo meio-ambiente, como água potável, segurança alimentar, combate natural a pragas, etc.

Sob esta ótica do potencial econômico da natureza, chamada biocapacidade, o Brasil é a maior potência mundial (Relatório Planeta Vivo 2010, WWF). O grande risco é que ainda olhamos para estes recursos como se fossem bens infinitos a serem explorados inesgotavelmente. Neste sentido, ainda temos muito a aprender com quem enxerga a natureza não como dádiva divina, mas como a divindade em si.

Aragarças e Barra do Garças

Nossa primeira parada foi também a base de partida da expedição Roncardo-Xingu nos anos 40 e, mais tarde, também foi importante para o trabalho da Fundação Brasil Central.

Ouvimos uma declaração de Valdon Varjão, ex-garimpeiro, ex-senador biônico durante o governo militar, que resume a visão do “índio como atraso” para o país:

“Acho que os irmãos Villas Bôas desvirtuaram a intenção original (da expedição Roncador-Xingu) que era colonizar toda essa região construindo estradas e novas cidades. A idéia não era catequizar índio e nem fazer Parque Indígena.”

Um conceito desenvolvimentista antiquado, ligado à ideia do progresso como asfalto, fumaça e exploração desenfreada da natureza.

Nova Xavantina

Vivenciamos na pele algumas das tensões que estavam acesas na região. Próximo à cidade está o lendário garimpo de Araés, que fomos visitar. Chegando lá encontramos um grupo de garimpeiros que estavam no local ilegalmente. Desci do carro de peito aberto, com a coragem que só os ignorantes têm e fui recebido por senhor que agarrou minha camisa e logo revelou o fio do facão que ocultava nas suas costas. Felizmente, tudo acabou bem. Explicamos que não éramos na polícia e o porquê da nossa visita e eles concordaram em nos ceder uma entrevista. É claro, concordamos com absolutamente todas as opiniões deles.

Também nos levaram para ver a dimensão do estrago do garimpo na natureza local. De volta à cidade entrevistamos Sinvaldo Vieira Rodrigues, ex-garimpeiro que sofria de silicose, doença terminal causada pela respiração do pó da pedra. Ele nos contou que perdeu o irmão e mais de sessenta colegas vítimas do mesmo mal ou acidentes de trabalho nas minas. “A única coisa que o Araés já fez foi matar muita gente”, dizia.

Água Boa e Canarana

No final da década de 1960, o Governo Federal criou diversos incentivos à colonização do centro-oeste brasileiro. As oportunidades chamaram a atenção de agricultores gaúchos. Como várias outras localidades, Água Boa e Canarana foram fundadas por estes pioneiros.

Em 2001, a região era uma interessante mescla étnica, mas também palco de preconceito violento e muitos atritos. O problema é maior na região não apenas pela proximidade e choque de culturas, mas também pela incompetência do estado, que cedeu terras a agricultores dentro de áreas de ocupação indígena tradicional. Anos mais tarde, o mesmo estado que incentivou a ocupação da região expropriou vários pequenos produtores para criar reservas indígenas.

O ônus desta falta de preparo dos governos é pago até hoje, tanto por agricultores, quanto por índios.

Pimentel Barbosa, Xavantes

Passamos apenas uma tarde numa conversa rápida com os antigos sobre a chegada do não-índio à região. “O pessoal sabia que tinha outro povo por causa do jeito diferente da queimada, da fumaça. (…) Eu pensava que eles estavam todos pintados, por causa do pêlo na cara e no corpo”, nos contou Rupawe, que era adolescente quando duvidava dos boatos sobre “brancos” na região.

Menos protegidos que os xinguanos, os Xavantes conquistaram seu espaço com muita luta. Como nos contou Sereburã: “Nós mesmos tocamos os fazendeiros. Por isso que temos este espaço (reserva de Pimentel Barbosa) pequenininho hoje. Pra branco é grande, pra nós é pequeno. (…) Agora vivemos aqui, espero que vocês (não-índios) respeitem a gente e nossos direitos”.

Posto Leonardo, Xingu

Nada podia nos preparar para o que nos esperava no Xingu, um dos mosaicos étnicos mais ricos do mundo. O impacto daqueles meros dez dias é sentido até hoje. Estar lá nos levou a questionar e reavaliar diversos valores, ideais e outras tantas coisas que enxergamos como “naturais”. Era como se olhávamos a nossa realidade como algo estranho e artificial.
Finalmente entendemos o que levou três irmãos a abandonarem suas confortáveis vidas urbanas para se embrenharem por mais de 30 anos em uma luta contínua, enfrentando mata fechada, doença, violência, politicagem etc: a preservação da diversidade humana.

50 anos da "República dos Villas Bôas"

Texto originalmente publicado na Folha de São Paulo, 14/04/2011 

O Parque Indígena do Xingu foi criado depois de uma luta de quase dez anos. O primeiro anteprojeto de criação do parque foi apresentado em 1952, no governo Vargas.
Três eram seus objetivos principais: preparar as comunidades indígenas para o contato inevitável com a nossa sociedade; amenizar a pressão que a sociedade exercia sobre essas comunidades, evitando um contato brusco, com consequências desastrosas (como, mais tarde, foi confirmado em outras regiões); e preservar as condições necessárias de fauna e flora, garantindo que as comunidades xinguanas seguissem mantendo seu modo de vida, indissociável da terra.
O anteprojeto foi formalmente apresentado ao presidente Getulio Vargas pela comitiva liderada pelo vice-presidente Café Filho. Dela participaram grandes nomes, que foram fundamentais para o projeto e que meu pai, Orlando Villas Bôas, sempre fazia questão de mencionar: Noel Nutels, médico sanitarista; José Maria da Gama Malcher, presidente do Serviço de Proteção ao Índio (SPI); brigadeiro Raimundo Vasconcelos Aboim; dra. Heloísa Alberto Torres, diretora do Museu Nacional; o jornalista Jorge Ferreira e os antropólogos Eduardo Galvão e Darcy Ribeiro.
No entanto, o parque não sensibilizou Vargas. Meu pai contava assim esse episódio: "Sua excelência, de mãos às costas, cenho cerrado, ouviu a proposta e só não se tornou mais sisudo porque foi obrigado a abrir um largo sorriso diante de uma irreverência inteligente "desafogadora" do Noel Nutels".
Juscelino Kubitschek também se mostrou sensível à ideia de criação do parque, mais até do que Getulio Vargas, mas teria confessado que não teria força política para criá-lo.
Em 1961, por decreto, Jânio Quadros, em sua breve passagem pela Presidência, criou, num de seus primeiros atos, o Parque do Xingu, convencido da importância da criação de uma reserva para abrigar as populações indígenas. Por que por decreto? Porque o projeto jamais passaria pelo Congresso Nacional, já que contrariava interesses econômicos, principalmente, claro, do Estado do Mato Grosso.
A criação do parque não foi um fato isolado: a política indigenista brasileira tomou outro rumo, diferente daquele da política do marechal Rondon, "pai" do indigenismo brasileiro. Ficou claro, com a criação do parque, que, para garantir a sobrevivência dos indígenas, seria preciso garantir suas terras, de forma que o índio seguisse vivendo em sua cultura e organização social, em equilíbrio com a natureza.
Para os irmãos Villas Bôas, a política indigenista deveria se apoiar em duas máximas, simples e concretas: primeiro, o índio só sobrevive na própria cultura; segundo, não há lugar para o índio na sociedade brasileira de hoje… como também não havia meio século atrás.
No parque, a política indigenista dos Villas Bôas pode ser implantada tal como a conceberam, proporcionando ao índio a proteção necessária que o preparasse para o choque inevitável com a nossa sociedade. Cumpriu a sua função.
As ameaças que o índio, não só o xinguano, enfrenta não são novas, como provam políticas indigenistas de governos passados. O famoso Plano de Integração Nacional, do presidente Médici, por exemplo, tinha duas diretrizes em relação ao índio: integrá-los o mais rápido possível à economia de mercado e impedir que constituíssem um obstáculo ao desenvolvimento do país.
Mas o Parque Indígena do Xingu, que celebra 50 anos hoje, como dizia o imortal Antonio Callado, é criação amorosa e, portanto, dura muito, ou talvez nunca acabe; assim é "a República dos Irmãos Villas Bôas", a mais importante reserva indígena do continente americano e o mais belo mosaico linguístico-cultural do mundo de acordo com a Unesco.
NOEL VILLAS BÔAS, 35, formado em direito e filosofia, é filho do sertanista Orlando Villas Bôas, um dos idealizadores do Parque Indígena do Xingu. Foi membro do conselho indigenista da Funai por dois mandatos (de 2000 a 2004).

Impactos das mudanças climáticas na Amazônia podem inviabilizar Belo Monte

Belo Monte, um empreendimento hidrelétrico que consumirá mais de R$ 20 bilhões para sua construção, poderá no mais drástico dos cenários de alterações climáticas perder mais de 80% de sua receita anual até 2050, como resultado de uma diminuição da vazão do Rio Xingu.

É isso que apontam dados preliminares de um estudo em desenvolvimento pelo WWF-Brasil, em parceria HSBC Climate Partnership. Técnicos especialistas em hidrologia e mudanças climáticas estão analisando a vulnerabilidade climática da produção de eletricidade na região Norte do país com enfoque em alguns grandes empreendimentos como a usina hidrelétrica de Belo Monte.

"As prováveis mudanças na vazão do rio Xingu, provocadas pelas alterações climáticas, colocarão em risco a viabilidade da usina de Belo Monte", afirmou Carlos Rittl, coordenador do Programa de Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil. "Belo Monte pode gerar muito menos energia do que o previsto e muito menos receitas do que o esperado, tornando-se um fracasso financeiro", acrescentou.

"Os altos custos sociais e ambientais, aliados aos riscos financeiros, deveriam levar o Governo Brasileiro a uma ampla reflexão sobre a viabilidade da obra", concluiu Rittl.

O estudo, a ser lançado ainda este ano, considerou 4 cenários de emissões futuras estabelecidos pelo IPCC – A1, A2, B1 e B2 – cada qual descrevendo um futuro possível para a humanidade e a curva de emissões globais resultantes. A aplicação de modelos climáticos dentre os mais robustos existentes, como o HadCM3 do Hadley Centre (Reino Unido) ou o ECHam4 do Max-Planck-Institute für Meteorologie (Alemanha), aos quatro cenários permite identificar a possibilidade de uma diminuição significativa na vazão da bacia do rio Xingu até 2050.

Apesar de certa variabilidade nos resultados – alguns poucos mostram ganhos de receita que chegam a 4% até 2050, enquanto outros mostram uma queda bruta na receita chegando a quase 90% -, uma forte tendência é evidente: as perdas podem variar entre 4 e 10% da receita anual da usina até 2050.   

De acordo com Carlos Alberto de Mattos Scaramuzza, superintendente de Conservação do WWF-Brasil, as variações climáticas futuras não estão sendo incorporadas da forma devida no planejamento energético e na análise de viabilidade de projetos hidrelétricos na Amazônia Brasileira.

"Tivemos duas secas muito severas na Amazônia em menos de 10 anos, em 2005 e 2010. Temos de tirar lições destes eventos climáticos extremos e, de uma vez por todas, inserir a variável climática no planejamento da expansão da produção de energia no país. Com isso, ficaria ainda mais clara a atratividade da eficiência energética e de outras energias renováveis não-convencionais, como a energia eólica, a solar e a de biomassa. Havendo investimentos, estas alternativas podem gerar energia suficiente para atender as necessidades de crescimento econômico do Brasil, minimizando os riscos climáticos dos empreendimentos hidrelétricos", concluiu Scaramuzza.

"O governo tende a considerar os projetos hidrelétricos um a um, o que é ineficiente sob aspectos econômicos, sociais e ambientais", afirmou Denise Hamú, Secretária-Geral do WWF-Brasil.

"Para viabilizar a Usina de Belo Monte, os riscos da obra foram socializadas para atrair investidores. Os dados preliminares deste estudo indicam que os riscos financeiros podem ser ainda maiores do que aqueles originalmente previstos e isto torna evidente a necessidade de um olhar macro sobre o potencial, as vantagens e os riscos sociais e ambientais associados à expansão da produção de energia", conclui Hamú.

O WWF-Brasil considera fundamental que a expansão da produção de energia hidrelétrica seja feita a partir de um olhar sobre toda a bacia Amazônica. É necessária uma análise integrada de cada bacia hidrográfica, considerando-se os riscos sociais e ambientais em toda a extensão dos rios – que são sistemas naturais contínuos – e não apenas das áreas de entorno dos projetos hidrelétricos. 

Nota sobre os cenários climáticos do IPCC

O cenário A1 descreve um mundo de rápido crescimento econômico com uma população que atinge seu pico na metade do século e a introdução de tecnologias novas e mais eficientes. Nele, existe uma convergência substancial entre regiões evidenciada por uma crescente interação social e cultural, redução das diferenças regionais e das rendas per capita.

O cenário A2 descreve um mundo muito heterogêneo onde a renda per capita e o desenvolvimento tecnológico convergem de maneira mais fragmentada e lenta. Com identidades regionais mais fortes, as taxas de fecundidade diminuem mais lentamente, o que resulta em crescimento contínuo da população.

O cenário B1 descreve um mundo mais integrado e ambientalmente correto. O crescimento econômico é tão forte quanto no cenário A1, mas caracterizado por uma transição mais profunda em direção a uma economia baseada em serviços e informação. O foco para a estabilidade econômica, social e ambiental é global.

O cenário B2 descreve um mundo mais heterogêneo, porém mais sustentável. É um cenário intermediário com crescimento contínuo da população, crescimento econômico médio, mudanças tecnológicas menos rápidas e mais fragmentadas e foco em soluções locais para a estabilidade econômica, social e ambiental.

Jirau de hoje pode ser Belo Monte de amanhã


Esta semana, o canteiro de obras da hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, virou um campo de batalhas; depois um inferno em chamas; depois um deserto de cinzas e aço retorcido.

Jirau concentra todos os problemas possíveis: em ritmo descontrolado, trouxe à região o “desenvolvimento” da prostituição, do uso de drogas entre jovens pescadores e ribeirinhos, da especulação imobiliária, da elevação dos preços dos alimentos, das doenças sem atendimento, e de violências de todos os tipos.

Em Julho de 2010, as populações atingidas pela obra já protestavam contra o não cumprimento de condicionantes, desrespeito e irregularidades no processo de desapropriação/expulsão de suas áreas, fraudes nas indenizações, etc.

Em outubro, mais de um ano após o início das obras, os ministérios públicos Federal e Estadual de Rondônia impetraram uma ação civil pública contra o Estado, o município de Porto Velho, a União, o Ibama, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e a Energia Sustentável do Brasil (ESBR, empresa responsável pelas obras), por descumprimento de condicionantes nas áreas de saúde, educação, transporte e segurança.

Até hoje, 70% não saíram do papel.

Trabalho escravo

Sobre as condições dos trabalhadores no canteiro de obras, em 2009 trinta e oito pessoas foram libertadas de trabalho análogo à escravidão em uma prestadora de serviço da usina.

Em 2010, uma nova fiscalização em Jirau produziu 330 autos de infração por crimes trabalhistas.

Nos distúrbios ocorridos esta semana, pipocaram denúncias contra a construtora Camargo Correia: maus tratos, irregularidades no pagamento, não-pagamento de horas extra, ameaças, etc. Foi o combustível que fez a bomba explodir.

Depois, o que se viu foram milhares de trabalhadores vagando perdidos, esfomeados, desamparados e desesperados, sem dinheiro, roupas, sem ter pra onde ir ou onde dormir.

Por que?

Porque mais de 70% dos barrageiros de Jirau são de outros estados, de acordo com a Assembléia Legislativa de RO. Os empregos prometidos para a região viraram fumaça.

Desenvolvimento econômico?

Este mesmo “desenvolvimento” imposto ao rio Madeira ameaça agora as bacias do Xingu, do Tapajós e do Teles Pires no Pará e no Mato Grosso.

O projeto de Belo Monte, o mais avançado nestes rios, segue com assustadora semelhança os passos de Jirau: licença de instalação parcial ilegal, autorizações de desmatamento, descumprimento acintoso das condicionantes, ameaças a ribeirinhos e pequenos agricultores para que vendam suas terras, desrespeito absoluto aos direitos constitucionais das populações indígenas, e migração acelerada e desordenada de trabalhadores de fora.

Em fevereiro, representantes das bacias do Madeira, Xingu, Tapajós e Teles Pires, que compõem a Aliança dos Rios da Amazônia, se reuniram com o governo, que prometeu abrir o diálogo com os movimentos.

Nenhuma sinalização de que este diálogo realmente ocorrerá foi dada até agora, mais de um mês depois.

Nos solidarizamos profundamente com todos que sofreram e ainda sofrerão com as violências de Jirau.

Nos solidarizamos com os trabalhadores, com as populações atingidas, com as populações das comunidades e das cidades da região.

Mas Jirau é um sinal de alerta ao governo – principal responsável, em última instância, por tudo que acontece nas obras do PAC – e seus empresários: as violações sistemáticas de direitos das populações mais cedo ou mais tarde levam à reação.

Não há desmandos que ficam impunes, nem ameaças que permaneçam sem respostas

  • Aliança dos Rios da Amazônia
  • Movimento Xingu Vivo para Sempre
  • Aliança Tapajós Vivo
  • Movimento Rio Madeiro Vivo
  • Movimento Teles Pires Vivo