Mineração em terras indígenas tem considerar especificidade de cada povo, diz coordenador do ISA

Brasília – O coordenador do Instituto Socioambiental (ISA), André Lima, defendeu hoje (17) o aprofundamento das discussões sobre o anteprojeto de lei que regulamenta a mineração em terras indígenas, a ser enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional. Para Lima, a mineração em terras indígenas é um assunto complexo, por isso a regulamentação precisa ser discutida com mais cautela.

"A Constituição Federal brasileira permite a mineração a partir de uma regulamentação. Entretanto, esse debate nunca foi aprofundado no Congresso; então agora aparece um projeto de lei, e o governo pretende, a toque de caixa, encaminhar uma solução para esse problema", disse, em entrevista à Radiobrás.

Na avaliação dele, ao se definir as regras para exploração mineral nessas áreas, é preciso considerar as especificidades das diferentes etnias. "No Brasil, são mais de 218 povos indígenas, realidades muito distintas, o que torna muito difícil uma regulamentação única e objetiva", afirmou. "Temos discutido a necessidade de aprofundamento do debate, de ouvir mais populações, de compreender alguns estudos de casos para poder fazer uma regulamentação razoável", acrescentou Lima.

Ontem (17), as lideranças que participam da 1ª Conferência Nacional dos Povos Indígenas, em Brasília, decidiram adiar para 2007 a discussão sobre as sugestões dos índios na elaboração da proposta que o governo encaminhará ao Congresso. De acordo com o coordenador de Assuntos Externos da Fundação Nacional do Índio (Funai), Michel Blanco, as lideranças indígenas querem avaliar e discutir as propostas que desejam incluir no projeto na próxima conferência.

Segundo o procurador-geral da Funai, Luiz Fernando Villares, a proposta em elaboração, submetida aos índios na conferência, prevê que a mineração deverá ter o consentimento das comunidades da região onde a atividade será desenvolvida.

As empresas interessadas em explorar as riquezas minerais das terras indígenas teriam de participar de uma licitação. Os índios também poderiam participar do processo licitatório, por meio de parcerias com empresas ou de cooperativas e associações indígenas.

Segundo Villares, a intenção anterior era que o projeto fosse discutido na conferência e encaminhado à Casa Civil da Presidência da República em 30 dias.

Lideranças indígenas querem denunciar governo brasileiro em seminário internacional

Brasília – Líderes de comunidades indígenas pretendem denunciar a violação de seus direitos por parte do governo federal na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará. É o que afirma o coordenador geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab), Jecinaldo Barbosa Cabral. Segundo o membro do povo Saterê Mawé, índios da América Latina estarão reunidos até o início de 2006 para discutirem a conservação ambiental de áreas protegidas. O encontro acontecerá justamente na região onde deve ser construída a usina.

"Levaremos a violação de nossos direitos a organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Organização dos Estados Americanos (OEA) para que as populações indígenas deixem de sofrer em função do chamado desenvolvimento", afirma Cabral. Ele conta que também mobilizará comunidades ribeirinhas e entidades ambientalistas para lutarem em favor da causa.

A violação dos direitos indígenas vem sendo discutida principalmente após a aprovação, ontem (1°), por parte do Supremo Tribunal Federal (STF), do decreto legislativo que prevê a construção da Usina de Belo Monte. De acordo com o Ministério Público, a norma seria inconstitucional, já que o Congresso não teria ouvido as comunidades indígenas da região antes de aprovar o decreto.

"O direito à consulta prévia dos índios – estipulado desde 1988 pela Constituição Federal –foi completamente afrontado", conta o advogado do Instituto Socioambiental (ISA), Raul Silva Telles do Valle. Segundo ele, qualquer obra, ato administrativo ou legislativo que afete direta ou indiretamente um determinado povo indígena, só pode ser efetivado mediante consulta prévia. "Isso serve não só para que as comunidades conheçam o projeto, mas para que possam opinar sobre ele e negociar com relação a ele."

Ainda de acordo com Raul do Valle, o projeto de instalação afeta diretamente terras indígenas, com a inundação de uma área de 18 mil quilômetros quadrados, além de peixes (principal alimento para sobrevivência faz comunidades), da fauna e da agricultura. "A energia elétrica é sim necessária, mas temos que fazer isso de forma a preservar nossos rios e manter um equilíbrio e uma sustentabilidade, o que não vem acontecendo, pois parte dessa energia produzida vai para grandes empresas que são beneficiadas em detrimento dessas comunidades afetadas", informa ele.

Representantes da Coiab, do ISA, do Greenpeace e do Centro dos Direitos das Populações dos Carajás estudam agora a possibilidade de questionar na justiça a autorização concedida ontem.

STF extingue Ação contra Belo Monte

Por sete votos a quatro, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou inapropriado o meio utilizado, isto é, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), para questionar a constitucionalidade do Decreto Legislativo nº 788/05, que autorizou a implantação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, na região de Altamira, no Pará .

A maioria dos ministros entendeu que, por ser um ato legislativo de efeito concreto, não poderia ser questionado por meio de uma Adin, mesmo que seja inconstitucional, pois iria contra a jurisprudência do próprio tribunal. A decisão foi surpreendente porque contrariou o relator do processo, Carlos Britto, que havia julgado pela aceitação da ação. Votaram contra o relator, os ministros Eros Grau, Nelson Jobim, Carlos Velloso, Ellen Gracie, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e Gilmar Mendes.

Durante a sessão, defenderam oralmente a inconstitucionalidade do decreto o vice-procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e o advogado Sérgio Leitão, do Greenpeace, que juntamente com o ISA, o Fórum Carajás e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), apresentaram a ação. Saiba mais.

O advogado geral da União, Álvaro Ribeiro da Costa, ex-integrante do Ministério Público Federal, também fez sustentação oral durante o julgamento. Ele afirmou não ser possível analisar a ação interposta pela Procuradoria Geral da República (PGR) e que não haveria necessidade do Congresso Nacional ouvir previamente os povos indígenas afetados, pois isso poderia ser feito durante o processo de licenciamento ambiental pelo órgão ambiental ou pelo próprio interessado em instalar o empreendimento.

“Esse posicionamento, no entanto, contraria frontalmente não apenas o que a própria PGR defende, mas também uma regra explícita da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, que, em seu artigo 6º, diz expressamente que a consulta tem que ocorrer previamente à decisão do Parlamento”, diz Raul Silva Telles do Valle, advogado do ISA. Ele lembra que a decisão não entrou no mérito da demanda, ou seja, não avaliou se o decreto feriu ou não a regra estipulada na Constituição Federal de ouvir previamente as comunidades indígenas para autorizar a implantação de hidrelétricas que afetem suas terras. “Por essa razão, é possível buscar outros meios judiciais de fazer valer os direitos constitucionais dos nove povos indígenas que seriam afetados pela implantação do empreendimento”.

Greenpeace estuda entrar mais uma vez na Justiça contra construção da hidrelétrica de Belo Monte

Brasília – A organização não-governamental (Ong) Greenpeace estuda acionar novamente a Justiça contra o decreto legislativo que autoriza a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA). Ontem (1), o Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou a ação movida pelo Ministério Público Federal. De acordo com o procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza, o Congresso não ouviu as comunidades indígenas da região antes de aprovar o decreto – o que, segundo ele, viola a Constituição.

A maioria dos ministros do Supremo decidiu que a Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) não é o instrumento adequado para o Ministério Público questionar o decreto legislativo e, portanto, o STF não chegou a analisar o mérito da questão. O diretor de políticas públicas do Greenpeace, Sérgio Leitão, explica que agora o Ministério Público pretende entrar com uma nova ação na Justiça Federal em Brasília ou no Pará.

"É um empreendimento que vai alagar terras indígenas e vai prejudicar milhares de ribeirinhos no estado do Pará", disse Sérgio. Segundo ele, a construção da hidrelétrica de Belo Monte irá atender interesses de empresas multinacionais. "O empreendimento serve apenas para gerar eletricidade para empresas que, explorando nossas riquezas, mandam alumínio para fora do país", afirmou.

O diretor disse ainda que a hidrelétrica trará prejuízos à população. "É degradar o ambiente brasileiro, gerar divisas para empresas multinacionais e deixar a conta para o povo brasileiro pagar". Segundo informações da Eletronorte – concessionária de serviço público de energia elétrica ligada ao Ministério de Minas e Energia – o complexo de Belo Monte será o terceiro melhor aproveitamento hidrelétrico do mundo e irá beneficiar todo o país.

De acordo com a Eletronorte, foi elaborado um plano de desenvolvimento sustentável baseado em estudos socioeconômicos da região com o objetivo de preservar o meio ambiente e garantir eficiência econômica à hidrelétrica.

A ação do Ministério Público atendeu uma solicitação da Procuradoria da República no Pará, do Instituto Socioambiental, do Greenpeace, do Centro dos Direitos das Populações dos Carajás e da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia. O advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro da Costa, havia pedido ao STF o não reconhecimento da ação por considerar que o texto constitucional não estabelece em que momento as comunidades indígenas devem ser ouvidas no processo de criação de hidrelétrica.

Governo não vai fazer reunião com índios sobre usina, mas `estudo antropológico`, afirma ministério

Brasília – Os representantes indígenas que criticam a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, não devem ser chamados para discutir o projeto com o governo federal. "Quem trabalha com essas comunidades sabe que escutar o índio não é chamá-lo para uma reunião", diz Márcio Zimmermann, secretário de Pesquisa e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, em entrevista à Agência Brasil. Ontem (1°) o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a construção da usina.

"Vamos fazer um estudo prévio sem que haja uma manipulação política e faremos isso quando conseqüências forem surgindo", afirmou. Segundo ele, será feito um "estudo antropológico" para saber que impactos a usina de Belo Monte terá na vida das comunidades. Algumas lideranças indígenas afirmam que o projeto vai atingir o Parque Nacional do Xingu – reserva indígena localizada no Pará.

O secretário de Desenvolvimento Energético diz que o estudo antropológico será feito após o estudo ambiental da área. Zimmermann afirma que, até o momento, a usina não foi implementada, e portanto, impactos não foram gerados.

Segundo ele, a construção da usina é importante para as regiões Norte e Nordeste do país. "O Brasil é um país com características de país em desenvolvimento e tem crescido de forma que a demanda de energia seja bastante forte", conta.

De acordo com o ministério, o projeto para a implantação de Belo Monte vem sendo estudado há anos, sendo que sua última versão, compatibiliza aspectos ambientais de modo a reduzir a área alagada e não incluir populações indígenas.

Ambientalista defende ação do governo federal no Pará

A coordenadora do Programa de Política e Direito Sócio-Ambiental do ISA – Instituto Sócio-Ambiental, Adriana Ramos, acredita que qualquer medida tomada pelo governo federal para "restabelecer o uso da terra a quem é de direito" deve ser vista como medida que traz estabilidade para a região da Terra do Meio, uma das regiões de conflito de terras no Pará, entre os rios Xingu e Tapajós, no Sudoeste do Estado.

O Ministério do Meio Ambiente pretende criar, ainda no primeiro semestre de 2005, três reservas extrativistas e uma unidade de conservação e proteção integral, com estação ecológica e parque na Terra do Meio, e os recentes crimes ocorridos em outras localidades, como o assassinato da freira Dorothy Stang, em Anapu, no Centro do Estado, estão sendo encarados pelo órgão como estímulo para acelerar os processos.

"Os conflitos se acirram na medida em que interesses que não são legítimos consideram que podem ter algum tipo de ganho em cima de uma área que não está reconhecida. Represálias podem acontecer, mas cabe ao governo criar medidas para evitar que isso aconteça.", afirma Adriana Ramos.

A pesquisadora sugere que o governo acelere o processo de regularização fundiária das terras paraenses. De acordo com ela, a maior parte das áreas é reconhecidamente pública. Muitos fazendeiros e madeireiros, no entanto, utilizam documentação irregular. Um levantamento divulgado pelo Greenpeace há dois anos mostra que, em 1999, pelo menos 100 milhões de hectares tinham documentação suspeita.

O Incra – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária chegou a cancelar o registro de 70 milhões de hectares. Um terço desta área (20,8 milhões de hectares) estava no Pará, dividida em 422 fazendas. O Estado responde por mais de um terço do desmatamento total do Brasil. Imagens de satélite divulgadas pelo Inpe – Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais, em 2003, mostram que a maioria do desmatamento ilegal ocorreu nos arredores da Terra do Meio.

"É importante ressaltar que as políticas a serem implementadas para evitar os tipos de conflito evidenciados esta semana não são apenas ambientais", alerta a coordenadora do ISA., que acrescenta: "Precisamos de um envolvimento maior das áreas de desenvolvimento, agricultura, social, transporte e integração nacional. A Terra do Meio precisa de ações múltiplas para garantir a sustentabilidade sócio-ambiental da região."