A natureza como alternativa

Situada numa região de rara beleza natural, Nova Xavantina, MT, encontra-se numa posição estratégica para o turismo. Cercada pela Serra do Roncador e cortada pelo Rio das Mortes, a antiga área mineradora tem um enorme potencial não aproveitado.

Com parte de seus bens naturais relativamente bem preservados, o município luta hoje pelo aumento da arrecadação de impostos, que decaiu muito com a desativação do garimpo de Araés, em 1996. A prefeitura alega que necessita dessa verba para investir na fiscalização ambiental.

riodasmortes.jpgEntretanto, para algumas pessoas, a melhor alternativa para gerar esta renda e ainda conservar o ecossistema da região seria o ecoturismo. Segundo o ex-garimpeiro e atual proprietário do hotel-fazenda Encantos do Roncador, Valmor Berté, o maior obstáculo para isso é a falta de interesse das administrações em investir no desenvolvimento da atividade. “O que nós temos aqui, o mundo todo gostaria de ter: o misticismo da Serra do Roncador, um grande rio com água pura e aldeias indígenas”, afirma Berté. Em sua opinião seria necessário um apoio maior ao setor para organizar palestras, cursos e outros eventos.

O Rio das Mortes, como vários outros do Centro Oeste brasileiro, sofre com queimadas e mineração nos seus arredores. Foto: Fernando Zarur

Marco Piza Pimentel, Secretário Municipal de Educação e Cultura (responsável pelas áreas de Turismo e Meio Ambiente), alega que todo material sobre os pontos turísticos da cidade desapareceu na gestão anterior. “Estamos fazendo um novo levantamento destes locais, para poder estabelecer como iremos atuar”, explica Pimentel. Segundo ele, a implantação da Faculdade de Turismo, que começará a funcionar em julho na Universidade Estadual do Mato Grosso (Unemat), é uma medida que trará benefícios em médio prazo para Nova Xavantina.

Hoje os principais eventos na cidade são a Festa do Peão Boiadeiro e os festivais de praia, realizados no meio do ano. A prefeitura estima que cerca de cinco mil pessoas visitam o município no mês de julho, considerado alta temporada. Mesmo assim, o ecoturismo não ocupa lugar de destaque como geração de renda.

A controvérsia do garimpo

Marcos Pimentel admite a intenção em reabrir o garimpo de Araés, e justifica que a iniciativa trará mil empregos diretos para o município. No entanto, a posição da prefeitura está gerando polêmica. Para Lúcia Kirsten, moradora local, “o garimpo só deixa para as cidades sujeira, criminalidade, doenças e filhos sem pai”. Ela cita como exemplo o garimpo na cidade de Poxoréu, que foi um dos maiores do Mato Grosso. “Hoje essa cidade é pobre, feia e com o rio assoreado. O dinheiro do garimpo é uma ilusão, pois acaba rápido”, conta Lúcia.

Outra conseqüência da reabertura do Araés é o risco à saúde dos trabalhadores e da população vizinha. Como não há nenhum estudo sobre o impacto ambiental na área, a constatação da existência de urânio no local e a possibilidade de despejo de resíduos tóxicos, como cianureto e mercúrio, preocupam os ecologistas e alguns moradores.

Sinvaldo Vieira Rodrigues, ex-garimpeiro, afirma “a única coisa que o Araés já fez foi matar muita gente”. Doente de silicose há cinco anos, ele conta que perdeu seu irmão e mais de sessenta colegas pela mesma doença ou acidentes de trabalho nas minas. Por ter trabalhado sem carteira, ele vive à custa de sua mulher, da ajuda de vizinhos e de uma aposentadoria conseguida há apenas cinco meses no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

Conscientização

Além da ameaça do garimpo, os arredores de Nova Xavantina sofrem com outros tipos de devastação comuns na área. O principal deles é o desmatamento e os incêndios para aumentar os campos de agricultura e pecuária, o que já está causando assoreamento de alguns cursos d’água, como o Ribeirão Antárctico.

Para Lúcia Kirsten o problema é a falta de conscientização. Ela afirma que “as pessoas daqui valorizam mais o que vem de fora. A prefeitura, por exemplo, mandou retirar as árvores nativas da principal rua da cidade para plantar Fícus.” Apesar do descaso, ainda há uma infinidade de ilhas, cachoeiras e córregos bem preservados, mas a moradora, na região desde 1980, afirma que a situação “ainda não é alarmante, mas as pessoas mais antigas, principalmente quem nasceu aqui, já nota a diferença”.

O sumiço do Indiana Jones

serraroncador.jpgMistério é o que não falta na Serra do Roncador. Bandeiras como a de Pires Campos e Anhanguera procuraram durante anos as lendárias Minas dos Martírios, diversas seitas religiosas esperam aqui o surgimento da raça dourada (grosso modo, a fusão de todas a raças) e mais uma série de incontáveis histórias. Porém, o fato mais intrigante e de grande repercussão internacional foi o desaparecimento, em 1925, do Comandante da Guarda Real inglesa, o Coronel Percy Harrison Fawcett. Suas aventuras inspiraram o cineasta Steven Spielberg a criar o personagem Indiana Jones.

Uma das teorias sobre o desaparecimento de Fawcett é que ele haveria, de fato, encontrado o portal para a civilização subterrânea que procurava. Foto: Fernando Zarur

Para se entender melhor sua história é preciso esclarecer certos fatos na vida de Fawcett. Logo no início do século XX, ele serviu no Ceilão (antigo Sri Lanka) e foi vice-rei da Índia. Dizem que nesse período participou de diversos rituais tibetanos e começou a se interessar cada vez mais por esoterismo.

As primeiras andanças do coronel pela América do Sul foram em 1906/1907, quando ele esteve nos Andes e na Amazônia Boliviana. A partir daí organizou sucessivas expedições (1910, 1911, 1913…) pelo continente até o seu sumiço, na década de 1920. O que ele procurava ninguém sabe ao certo.

Segundo o historiador e morador de Nova Xavantina (MT), Archimedes Carpentieri, Fawcett ganhou de Sir H. Rider Haggard, autor do livro As minas do Rei Solomão, uma estatueta que tinha indicações para se encontrar a embocadura de uma cidade subterrânea na Serra do Roncador. “Ele estava à procura de uma civilização remanescente de Atlântida, que desapareceu 9mil anos antes de Cristo”, explica Carpentieri.

O documento 512, conservado na Biblioteca Nacional, descreve ruínas gigantescas e inscrições cuneiformes encontradas no século XVII por um grupo de tropeiros vindos da Bahia. Fawcett obteve uma cópia desse material, o que o ex-senador, Valdon Varjão, diz que “encaixou como uma luva, pois provava que a tal cidade perdida estava no maciço central brasileiro”.

São várias as versões que explicam o desaparecimento do explorador, algumas até um tanto fantásticas. Uma reportagem publicada no jornal Folha da Noite, em abril de 1937, trazia relato de um caçador suíço chamado Stephan Rattin. Ele dizia que encontrou Fawcett prisioneiro dos “índios morcegos”, no interior do Mato Grosso.

De acordo com o sertanista Orlando Villas Bôas, o coronel inglês foi morto por Kuikuros. “Os índios me contaram que mataram o sujeito que batia no peito e dizia ‘miguelesi’, ou seja, ‘mim inglês’”, conta Orlando. Segundo ele, o explorador foi morto a bordunadas (uma espécie de tacape) por pais de dois curumins que Fawcett havia maltratado. Uma suposta ossada do britânico foi encontrada pelo sertanista, porém, a família dele se recusou a fazer o exame de DNA.

Algumas comunidades místicas acreditam que Fawcett cumpriu seus objetivos, achando uma embocadura, ou entrada para a tão procurada cidade intraterrena. Para estas pessoas, isto está comprovado por meio de mensagens que o Coronel enviaria regularmente falando sobre sua vida no interior da terra.

Envolto em mistérios, o destino do militar britânico continua obscuro. Do pouco que existe de concreto sobre o assunto, sabe-se que Fawcett estava confiante no sucesso de sua expedição. Na última correspondência enviada a sua esposa, ele afirmava: “Vou me encontrar com índios selvagens em breve, mas você não deve temer nenhum tipo de fracasso”.