Retirada dos brancos da Raposa será definida por Ayres Britto e TRF

Brasília – O Supremo Tribunal Federal decidiu hoje (19) que um grupo de grandes produtores de arroz e cerca de 50 famílias de agricultores brancos da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, terá que deixar a reserva em prazo que será definido pelo ministro Carlos Ayres Britto e pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), responsáveis por supervisionar a execução da sentença.

Por 10 votos a 1, os ministros do STF mantiveram a demarcação contínua da área de 1,7 milhão de hectares, homologada em abril de 2005 pelo governo federal.

Britto disse que irá contactar ainda hoje o presidente do TRF-1, Jirair Aram Meguerian, e o ministro da Justiça, Tarso Genro, para ter mais informações sobre as pessoas que terão de deixar a área e sobre formas de se cumprir essa retirada.

Britto adiantou que pretende estabelecer um prazo, até amanhã (20), para a saída dos produtores. "Em princípio seria um prazo comum, uniforme para todos que ainda se encontram lá", afirmou. "Acho que não vai haver resistência, uma decisão do STF é para ser cumprida."

O ministro não garantiu se o prazo a ser definido levará em conta a colheita da safra dos produtores de arroz. "Quem plantou em uma área sob litígio o fez por sua conta e risco."

A advogada que representa as populações indígenas defendeu que a partir da demarcação contínua da reserva, qualquer ocupação por brancos é ilegal. “Não se justifica ampliação do prazo para que eles continuem produzindo ilegalmente dentro das terras indígenas”, apontou.

O advogado responsável pela defesa dos produtores de arroz, Luiz Albrecht, argumentou que a retirada não poderia ser imediata porque algumas lavouras já estão plantadas e em estágio de colheita. “Os investimentos foram feitos e é preciso que sejam resguardados esses direitos”, afirmou.

Ele pediu ainda que haja garantia de que os produtores não sejam retirados com truculência.

O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, afirmou no plenário que a maioria dos arrozeiros já saiu da região de forma pacífica e pediu celeridade na retirada do grupo que ainda permanece no local. “Quanto mais rapidamente a situação for resolvida, menor é a possibilidade de conflito”, disse.

STF suspende julgamento de Raposa Serra do Sol

Após apresentação do voto do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, que deu parecer pela manutenção da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) em área contínua, o ministro Carlos Alberto Menezes Direito pediu vista do processo.

O presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, disse que pretende retornar com a ação ao plenário "se possível ainda neste semestre".

Em seu voto, o ministro Ayres Britto rejeitou argumentos de suposta falsidade do laudo antropológico e proliferação estimulada de comunidades. Segundo o ministro, são nulas as titulações conferidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a não-índios, pois as terras “já eram e permanecem indígenas”.

Britto argumentou que, em Roraima, há terra em abundância para toda a população do estado. “Tudo em Roraima é grandioso. Se há, para 19 mil índios, 17 mil quilômetros quadrados, para uma população de menos de 400 mil não-índios há 121 mil quilômetros quadrados.”

Logo após o pedido de vista, Ayres Britto voltou a comentar seu voto e reforçou seu posicionamento favorável à demarcação contínua. “Só a demarcação pelo formato contínuo atende os parâmetros da Constituição, para assegurar aos índios o direito de reprodução física, de reprodução cultural, de manter seus usos, costumes e tradições. A mutilação, com demarcação tipo queijo suíço, fragmentada, inviabiliza os desígnios da Constituição.”

Relator vota por demarcação em área contínua, com saída de não-índios da reserva

O ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação que contesta no Supremo Tribunal Federal (STF) a demarcação em área contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, votou pela manutenção da reserva conforme homologada em 2005 pelo governo federal, com 1,7 milhão de hectares.

O ministro rejeitou argumentos de suposta falsidade do laudo antropológico e proliferação estimulada de comunidades. “Toda metodologia antropológica foi observadada pelos profissionais que detinham competência para fazê-lo. O estado de Roraima teve participação assegurada no grupo de trabalho da Funai [Fundação Nacional do Índio]. Não se confirma a informação de que houve expansão artificial de malocas. A extensão da área é compatível com as coordenadas constitucionais, e as características geográficas da região contra-indicam uma demarcação restritiva.”

Segundo o ministro, são nulas as titulações conferidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a não-índios, pois as terras “já eram e permanecem indígenas”. Os rizicultores que passaram a explorar as terras partir de 1992 não têm, de acordo com Britto, qualquer direito adquirido sobre a terra. “A presença dos arrozeiros subtrai dos índios extensa área de solo fértil e degrada os recursos ambientais necessários à sobrevivência dos nativos da região.”

“O ato de demarcação foi meramente declaratório de uma situação jurídica preexistente, de direito originário sobre as terras. Preexistente à própria Constituição e à transformação de um território em estado-membro”, assinalou Britto. “Para mim o modelo de demarcação é contínuo, no sentido de evitar interrupção física entre o ponto de partida e de chegada”, acrescentou.

Britto argumentou que, em Roraima, há terra em abundância para toda a população do estado. “Tudo em Roraima é grandioso. Se há, para 19 mil índios, 17 mil quilômetros quadradros, para uma população de menos de 400 mil não-índios há 121 mil quilômetros quadrados.”

Britto definiu como "falso antagonismo" a idéia de que demarcação de terras indígenas atrapalha o desenvolvimento. “O desenvolvimento que se fizer sem os índios ou contra os índios onde estiverem eles instalados à data da Constituição de 1988, será o mais profundo desrespeito”, afirmou o ministro. Ele afirmou ainda que não há impedimento jurídico para que o Exército não atue nas reservas para preservar a soberania nacional.

“Não vale o argumento de que a demarcação contínua acarreta a não-presença do Estado. Isso não pode ser imputado aos índios, que não podem pagar a fatura por algo que não contraíram. A União deve cumprir o seu dever de assistir a todas as comunidades indígenas, inclusive com atuação das Forças Armadas e da Polícia Federal em faixas de fronteira”, disse Britto.

Inicialmente, o ministro ressaltou que a Constituição Federal prevê tratamento diferenciado aos povos indígenas, como dispositivos suficientes para que os índios brasileiros não precisem recorrer a amparo jurídico estrangeiro.