Parecer da Funai reafirma que Aracruz ocupou área indígena no Espírito Santo

A disputa por 11 mil hectares de terra no norte capixaba chega hoje (28) a um momento importante. O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, receberá do procurador-geral da entidade um parecer sobre o caso. A área, no município de Aracruz, é motivo de disputa entre 2 mil indígenas e a maior empresa de celulose de eucalipto, Aracruz, responsável por um terço da produção mundial.

O parecer prévio da Funai reafirma que a área pertence aos povos indígenas Tupiniquim e Guarani. O documento teve de ser elaborado porque a Aracruz Celulose contestou judicialmente a demarcação das terras. Dos 18 mil hectares concedidos originalmente aos índios, a empresa diz ter direito a 11 mil.

Os argumentos da companhia foram considerados “muito frágeis”, segundo o procurador Luiz Fernando Villares declarou à Agência Brasil. “A Aracruz fala que não existe ocupação indígena na área porque quem ocupa é a empresa”, afirma.

Mas a ocupação de fato, segundo Villares, começou com “um vício lá atrás”.  “Foi a expulsão dos índios, o que não justifica e nem legitima a propriedade da Aracruz hoje”, afirma o procurador.

Nas décadas de 50 e 60, o governo do Espírito Santo expropriou as terras, que eram ocupadas tradicionalmente pelos povos indígenas, segundo levantamento da procuradoria da Funai. A área foi repassada à Aracruz, que começou a plantar eucaliptos, e também a outros proprietários particulares, que depois venderam terras à empresa. Dos 18 mil hectares originalmente ocupados pelos indígenas, 11 mil estariam hoje sob domínio da Aracruz.

“Na verdade a Aracruz, como particular, comprou uma terra que era indígena”, afirma. “Hoje os índios não ocupam [as terras], porque quem ocupa é a Aracruz”.

Na petição de 400 páginas que enviou à Funai, a Aracruz argumenta que tem direito às terras, por ocupá-las há cerca de 50 anos. “Mas já é uma jurisprudência do STF [Supremo Tribunal Federal], que a ocupação tradicional não pode ser interrompida por uma expulsão dos índios do lugar”, contesta Villares. “Se lá atrás, eles foram expulsos do seu território, essa ocupação ainda continua, mesmo que não seja verificada fisicamente”.

Além do parecer sobre as questões jurídicas, Villares entregou ao presidente da Funai um documento sobre os aspectos antropológicos referentes à contestação da Aracruz, feito pela Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da Funai.

Dos 18 mil hectares reivindicados pelos indígenas, Villares afirma que 7 mil hectares já foram contemplados em decretos de homologação assinados pelo então ministro da Justiça Íris Rezende. Essa área é de propriedade da União e os índios têm a posse e o usufruto da terra.

Se aprovar o parecer, Mércio Gomes tem de enviá-los ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Cabe ao ministro publicar a portaria reconhecendo a terra como indígena e determinando que a Funai demarque a área.

Villares disse que o prazo legal para o envio terminou na segunda-feira passada (21). De acordo com ele, houve atraso por causa do tamanho da contestação enviada pela Aracruz, há cerca de dois meses. Só a petição tinha 400 páginas, além de 18 volumes de documentos anexos.

STF vai julgar ações judiciais que impedem a conclusão da demarcação da TI Raposa-Serra do Sol (RR)

Foram julgadas ontem (28/06) no Supremo Tribunal Federal – STF duas ações judiciais (Reclamações nº. 3331 e nº. 3813) que pedem que todos os processos relativos à demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, sejam por ele analisados. Por dez votos a um, os ministros do tribunal decidiram ser de sua competência o processamento e julgamento de diversas ações que questionavam a validade da Portaria nº. 534, do Ministro da Justiça, que estabelece os limites da área indígena.

Desde 2004, deputados e fazendeiros da região vêm questionando o processo demarcatório da terra indígena junto ao STF, o que atrasou a conclusão do processo administrativo. O mesmo acontece, há mais tempo, na Justiça Federal de Roraima, na qual já foram ajuizadas diversas ações pedindo a nulidade da demarcação da área, sob o argumento de que isso estaria lesando o patrimônio público estadual, já que supostamente se estaria reduzindo substancialmente a área do Estado de Roraima. No começo do ano passado, no entanto, o STF julgou improcedente todas essas ações, abrindo caminho para que o processo administrativo de demarcação fosse finalizado .

Apesar disso, desde o ano passado a Justiça Federal em Roraima vem proferindo liminares em diversas ações possessórias interpostas por fazendeiros locais, que não aceitam a demarcação da TI e se recusam a sair da área, mesmo com o pagamento das benfeitorias pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Essas liminares vêm atrasando a finalização do processo de regularização fundiária da área e expulsando indígenas de aldeias que estão dentro dos limites da terra indígena. Em todas as suas decisões o juiz argumenta que o processo administrativo de demarcação é inválido, baseado exclusivamente nas conclusões de um laudo pericial que, além de haver sido apresentado em um processo já julgado extinto, ainda apresenta graves falhas de metodologia e de conteúdo, como ficou demonstrado em análise efetuada por técnicos do Ministério Público Federal.

O relator das duas ações em curso no STF, ministro Carlos Ayres Britto, entendeu ser de competência daquela corte julgar todas as ações possessórias que tenham como objeto disputa por terras inseridas dentro dos limites da TI Raposa-Serra do Sol. Esse posicionamento, aliás, havia sido exposto no julgamento de outras ações parecidas, o que apenas confirma a coerência da decisão de ontem. O único ministro a divergir dessa posição foi Marco Aurélio Mello que entende ser de competência dos juízes de primeiro grau julgar ações possessórias, mesmo que incidam dentro de terra indígena homologada.

Espera-se agora, que a decisão do STF seja respeitada, e que todas as ações sejam realmente julgadas de maneira uniforme pelo tribunal. A decisão, vai contrariar o Juiz Helder Girão Barreto, da 1ª Vara Federal de Boa Vista, que em várias ações possessórias interpostas por fazendeiros deferiu medidas liminares quase idênticas, nas quais alega ser de competência da Justiça Federal de primeira instância o julgamento de tais casos, apesar de decisão anterior do STF determinando o contrário. Segundo seu magistério, "nunca, jamais, em tempo algum da história constitucional republicana esta matéria (disputa sobre direitos indígenas) foi de competência originária do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, como penso haver demonstrado em trabalho acadêmico" (Decisão Liminar no Processo nº 2006.42.00.000098-7 e no Processo nº 2006.42.00.000737-0, ambos em curso na 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima).

O processo de desintrusão, realizado pela Funai e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), é a última etapa do procedimento demarcatório. Leia mais. No caso da Raposa-Serra do Sol, está longe de terminar, apesar do esforço concentrado de ambas as instituições. Há ainda várias liminares da Justiça Federal de Roraima que impedem a continuidade do trabalho. Com a decisão de ontem, esses processos serão julgados pelo STF, que deverá avaliar se há fundamento para mantê-las ou não.

Povo Bororo não pode viver em terra homologada

Apesar de ter seu território demarcado, os Bororo da terra Jarudóri Jarudori são obrigados a viver espalhados em outras terras de seu povo, porque sua área tradicional está invadida por posseiros. Indígenas e entidades indigenistas do Mato Grosso estão organizados e reivindicam a retirada dos não-índios que vivem em toda a extensão de Jarudori e em cerca de 40% da terra Teresa Cristina, ambas de ocupação tradicional do povo Bororo. A decisão para a retirada depende da Fundação Nacional do Índio (Funai).

A expulsão dos Bororo foi iniciada no início do século passado. Jarudori faz parte das terras demarcadas pelo Marechal Rondon, em 1912, e tinha aproximadamente de 100 mil hectares. Na década de 1930, a região foi usada para a instalação de colônias agrícolas, com incentivos que foram parte do Programa Marcha para o Oeste, e o loteamento intensificou-se a partir dos anos 1960. Outras áreas foram invadidas por garimpeiros. Em 1945, o Estado de Mato Grosso criou a Reserva Indígena JarudóriJarudori, reduzindo a área demarcada por Rondon para 6 mil hectares. A xterrax sofreu nova redução quando foi registrada, ficando com apenas 4.706 ha.

Invasões, violência e epidemias – de tuberculose e sarampo – contribuíram para saída de muitas das famílias Bororo que ali viviam.  O município de Poxoréu foi criado em 1958 e hoje existe também uma vila de 2605 habitantes que também leva o nome de JarudóriJarudori.

A terra Jarudóri Jarudori tem importância não apenas para os indígenas que poderão voltar a viver nela, mas para todo o conjunto da população Bororo, pois é um importante ponto de articulação entre os “bororo de baixo”, que vivem no Pantanal, e os “de cima”, que vivem Meruri, Garças e Rio das Mortes.

Em 28 de junho, será realizado em Cuiabá (MT) o seminário “Povo Boe-Bororo: Território Tradicional e Direitos às Terras Indígenas Tereza Cristina e Jarudori”, com a participação de representantes Bororo, da Sub-Procuradora da República e Coordenadora da 6ª. Câmara, Dra. Deborah Duprat, da antropóloga que fez o laudo de identificação da terra, Profa. Dra. Edir Pina de Barros, e da Funai, convidada através de Artur Mendes Nobres, diretor de Assuntos Fundiários. O encontro, que começa às 8h30 tem o objetivo de mobilizar e sensibilizar a sociedade civil organizada em torno das questões fundiárias dos Boe-Bororo.

PL contrário a demarcações em faixa de fronteira caminha na Câmara dos Deputados

O Projeto de Lei 5684/05, do deputado Fernando Lopes (PMDB-RJ), que determina a aprovação prévia do Conselho de Defesa Nacional para a demarcação de terras indígenas em regiões de faixa de fronteira recebeu ontem, 10 de maio, parecer favorável do relator do projeto na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, o deputado Francisco Rodrigues (PFL-RR). O projeto não foi votado porque o deputado Nilson Mourão (PT-AC) pediu vista. O Projeto de Lei (PL) foi rejeitado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias em outubro de 2005.

Para o Cimi, o PL é inconstitucional porque uma lei ordinária não pode impor restrições a algo determinado pela Constituição Federal, que é hierarquicamente superior a esse tipo de leis.

Neste caso, a restrição refere-se à demarcação de terras indígenas em faixa de fronteira, que não existe na Constituião Federal. Se fosse aprovada, a nova redação da lei nº 8.183 determinaria que só poderiam ser demarcadas terras indígenas a uma distância mínima de 75 quilômetros da fronteira, e exigiria também aprovação do Conselho de Defesa Nacional, órgão de assessoramento do presidente da República, para as demarcações. Veja aqui a íntegra do Projeto de Lei 5684/05

ndios Kayabi ainda mantêm 14 homens e uma mulher reféns em Mato Grosso

Brasília – Os índios Kayabí libertaram 19 das 34 pessoas que mantinham como reféns desde a última terça-feira (13). Ficaram 14 homens e uma mulher, enquanto um grupo de trabalho formado por representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), entre eles o administrador regional para o Parque Xingu, Paiê Kayabí, está articulando as negociações.

De acordo com a Funai, os índios exigem uma reunião com o presidente do órgão, Mércio Pereira Gomes, com representantes da Polícia Federal, e com o procurador da República no estado de Mato Grosso para negociar a liberação dos demais reféns – madeireiros e invasores da terra indígena.

A Administração Executiva Regional (AIR) da Funai em Colider (MT), responsável pela terra indígena Kayabí, tentará marcar ainda nesta semana uma audiência com os índios na Câmara Legislativa da cidade de Alta Floresta para negociar a liberação dos reféns.

Declarada por portaria do Ministério da Justiça em 2002, a terra indígena Kayabí fica no Norte de Mato Grosso, ao Sul do Pará, e ocupa mais de 1 milhão de hectares, dividos em cinco aldeias onde vivem 300 índios. A demarcação da terra foi suspensa em 2004 devido a uma liminar concedida aos fazendeiros. Na Justiça, eles alegaram que a área destinada aos índios era muito grande e que o relatório da Funai não estava correto.

Apesar de interromper o processo de demarcação, a liminar impedia a entrada dos madeireiros nos limites das terras indígens, o que foi desrespeitado.

Advogado do Cimi diz que decisão do STF pode obstruir demarcações de terras

O advogado Paulo Machado, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), disse hoje (28) que o se o Pleno do Supremo Tribunal Federal acatar a decisão tomada ontem (27) pelo ministro Nelson Jobim, presidente da Corte, de suspender o decreto presidencial que homologou a demarcação de terras em Mato Grosso do Sul, ficarão obstruídas todas as demais demarcações que estiverem nas mesmas condições. "O presidente da República só poderá homologar as terras quando os processos judiciais forem encerrados, com o trânsito julgado", acrescentou.

O ministro Nelson Jobim havia acatado mandado de segurança impetrado pelo pecuarista Pio Silva e outros 15 proprietários das terras Ñande Ru Marangatu, ocupadas pelo povo indígena Guarani-Kaiowá no município de Antonio João. Na ação, eles argumentam que o presidente da República não poderia homologar a demarcação, pois seria de competência exclusiva do Congresso Nacional. Alegam também que as terras são de domínio privado há quase 150 anos e não são ocupadas tradicionalmente por indígenas, quesito necessário para a demarcação, conforme o artigo 231, parágrafo 1º da Constituição. Outra questão levantada pelos fazendeiros é a existência de uma ação declaratória, em trâmite desde setembro de 2001, na Vara Federal de Ponta-Porã (MS), que declararia o domínio particular.

O advogado Paulo Machado disse ainda que o Cimi confia na atuação do STF: "Nós esperamos que o Supremo mantenha o seu posicionamento, que já vem sendo reiterado há muitos anos, de que não cabe mandado de segurança contra decreto de homologação de terra indígena".

Em nota divulgada hoje (28), o Cimi diz ter recebido "com preocupação" a notícia da concessão de decisão liminar e entender "que a existência de ação judicial que discute a nulidade do processo administrativo de demarcação de terra indígena não é impedimento para a prática de qualquer ato no curso do processo administrativo em discussão, já que não existe decisão judicial alguma determinando que o Presidente da República se abstenha da prática de ato no processo administrativo em questão".

Para a líder da comunidade Guarani-Kaiowá, Léia Aquino, os índios tentarão ocupar a terra que foi homologada. Ela ressalvou que seu povo ainda não tem conhecimento da decisão do ministro e não sabe qual será a reação deles. "Com certeza eles vão ocupar toda a terra, porque a terra já é nossa. Não vai adiantar a gente ficar esperando no nosso cantinho enquanto eles trabalham contra a gente. Eu acho que é melhor a gente ocupar todas as terras de uma vez", disse.

Atualmente, segundo a líder, o povo Guarani-Kaiowá ocupa um território de 26 hectares, quando a homologação garante 9,3 mil hectares.

Projeto em tramitação no Senado pode mudar demarcação de terras indígenas

A demarcação de terras indígenas brasileiras pode passar por profundas mudanças caso seja aprovado, no Senado Federal, o projeto de lei que modifica as regras em vigor desde 1996 para o reconhecimento de propriedades indígenas no país. O projeto, que está previsto para ser votado até a próxima semana pelo plenário do Senado, estabelece que as demarcações sejam aprovadas pelos senadores e impede o reconhecimento de terras indígenas em localidades onde houver conflito de terra.

Atualmente, para que uma terra indígena seja demarcada oficialmente pelo governo, ela precisa do aval do ministro da Justiça e da Fundação Nacional do Índio (Funai). O ministro é quem efetivamente autoriza a demarcação depois de analisar os relatórios e pareceres técnicos elaborados por equipes da Funai que identificam pessoalmente as áreas a serem delimitadas. Antes de o ministro dar o parecer final, a Funai também abre um prazo para que pessoas contrárias à demarcação possam impugnar o processo caso apresentem a comprovação de irregularidades.

Segundo o Decreto 1.775/96, editado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, o ministro da Justiça tem a prerrogativa de acatar as análises da Funai e demarcar a terra, assim como pode impugnar o pedido ou determinar novas diligências para analisar melhor a região a ser delimitada. A homologação final da terra é feita pelo presidente da República, por meio de decreto. Toda a responsabilidade pela demarcação de terras fica a cargo da União.

Já o projeto de lei em tramitação no Senado inclui no processo a participação do Legislativo. O projeto não determina a autoridade competente para decidir sobre a demarcação, que hoje está a cargo do ministro da Justiça, mas obriga que a decisão passe pelo crivo do Senado para depois ser homologada pelo presidente da República. "Isso é inconstitucional. Uma atividade do Poder Executivo não pode estar condicionada ao Legislativo, muito menos a apenas uma das casas, como prevê o projeto. Se fosse o caso de o Legislativo interferir, seria o Congresso Nacional e não somente o Senado", criticou o assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Paulo Guimarães.

O projeto também determina que se a área identificada para demarcação estiver localizada na faixa de 150 quilômetros de largura ao longo da fronteira brasileira, o presidente da República deve convocar o Conselho de Defesa Nacional antes de homologar a demarcação. "Temos aí mais uma inconstitucionalidade, já que, pela Constituição, o conselho é um órgão de consulta do presidente, e nenhuma lei pode tornar essa convocação obrigatória", ressaltou Guimarães.

Já o vice-presidente do Cimi, Saulo Feitosa, afirma que o projeto "tem a intenção de reprimir movimentos legítimos dos povos indígenas, que ocupam de forma pacífica seus territórios tradicionais". Na avaliação de Feitosa, as terras indígenas só tiveram o procedimento de demarcação concluído depois de os índios efetivaram a posse de suas terras.

Se o projeto for aprovado pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados, todos os processos de demarcação de terras indígenas que estão em curso serão automaticamente cancelados para que se adequem às novas regras. O objetivo do cancelamento, segundo o senador Delcídio Amaral (PT-MS), é garantir que os processos em vigor sejam enquadrados nas novas regras estabelecidas pelo projeto.

O projeto também impede que as chamadas terras retomadas, onde há briga jurídica pela posse ou invasão motivada por conflito indígena coletivo, entrem em processo de demarcação por dois anos, ou pelo dobro deste prazo, em caso de reincidência. Na avaliação do senador, a proposta vai contribuir para reduzir os conflitos no campo.

Delcídio Amaral acredita que o principal benefício do projeto é garantir aos produtores rurais indenização pelas benfeitorias instaladas em terras que posteriormente forem demarcadas como indígenas. "O objetivo é disciplinar de alguma maneira a questão da demarcação, passando pelo Senado a sua homologação, e em um segundo ponto, buscando através de uma chicana (sutileza) jurídica a indenização não só das benfeitorias, mas da terra nua, imputando à União em caso de terras vendidas há décadas em função da migração, que respeite a Constituição. Se for verificado que é área indígena, você pelo menos terá condição de ressarcir os produtores rurais por tudo aquilo que eles investiram e por aquilo tudo que eles pagaram para a aquisição dessas terras", enfatizou.

O senador é um dos autores do projeto, que foi apresentado em nome da Comissão Especial de Questões Fundiárias. Como o projeto não recebeu emendas na fase de tramitação na comissão, seguiu diretamente para votação em plenário. O Cimi e várias entidades indígenas já anunciaram que vão lutar para derrubar a votação em plenário, para que a matéria tramite em pelo menos três comissões do Senado. "Este projeto tem o claro objetivo de dificultar e protelar os procedimentos de demarcação de terras indígenas, procedimentos que o movimento indígena e as entidades que o apóiam passaram anos lutando para que fosse agilizado. O PLS cria novas instâncias de decisão e cria subterfúgios para contemplar apenas interesse dos invasores de terras indígenas", disse o vice-presidente do Cimi.

Programa etnoterritorial na terra Indígena Fulni-ô

Com o objetivo de apoiar atividades produtivas sustentáveis, reordenamento territorial, recuperação de áreas degradadas e fortalecimento da organização social na Terra Indígena Fulni-ô, a Fundação Nacional do Índio (Funai) está gerenciando o Programa-Geral de Ordenamento Etnoterritorial daquela comunidade. Para a execução dessa estratégia emergencial, a Funai deverá buscar recursos, tanto de projetos governamentais como o Fome-Zero, quanto de empreendimentos que afetaram a terra indígena e não foram licenciados pelos condicionantes indígenas (linhas de transmissão, uso de recurso hídrico-patrimonial, esgotos e lixo urbano, entre outros).

De acordo com a Coordenação-Geral do Patrimônio Indígena e Meio Ambiente da Funai (CGPIMA), com a proposta de aumento da Terra Indígena Fulni-ô, problemas como falta de sustentabilidade sócio-ambiental poderão ocorrer. A necessidade de um plano de ordenamento territorial é de extrema urgência, principalmente no momento em que ocorre um processo identificatório com proposta de aumento da área. Por isso, está sendo desenvolvido um plano de fiscalização e apoio a projetos produtivos e assistencialistas, voltados às reais necessidades da comunidade Fulni-ô.

A elaboração desses projetos tem se baseado em análises territoriais de grupos indígenas Fulni-ô, a partir de levantamentos bibliográficos e de campo, realizados por antropólogos e ambientalistas da Funai, que vêm se baseando na interface entre as abordagens etnológicas, etnográficas e ecológicas.

Por ocasião desses levantamentos etnoambientais foi percebida a necessidade de descomprimir a pressão social exercida sobre os povos Fulni-ô, redirecionando a atual ocupação desta comunidade indígena para uma nova forma organizacional, que contará com unidades comunitárias de desenvolvimento local integrado e sustentável.

Políticas de reordenamento territorial
Assim como na terra dos Fulni-ô, outros projetos de reordenamento territorial têm sido realizados pela Funai. Na estrada que liga as cidades de Cuiabá a Santarém, BR-163, está sendo realizado um programa que visa identificar as demandas etnoecológicas dos grupos indígenas afetados direta e indiretamente, pelo asfaltamento da rodovia. O caráter inovador desse trabalho está no fato de que os índios sempre sofreram com interferências causadas pelos não-índios, em prol de projetos desenvolvimentistas.

A política atual da Funai é de planejamento etnoterritorial das terras indígenas, visando a etnosustentabilidade, e tem como meta o aproveitamento de oportunidades que gerem recursos, para efetivar a realização desses projetos.

Lideranças indígenas reivindicam direito à terra

Lideranças indígenas de 16 povos de todo o Brasil estão reunidas em Brasília. Elas vão apresentar nesta quinta-feira, 16, reivindicações a autoridades federais. A principal é o direito à terra.

Segundo Cícero Geripankó, os povos estão unidos reclamando por seus direitos.“Quando se fala de terra, [a reivindicação] é universal”, disse, nesta quarta-feira,15, em Brasília, durante seminário no Ministério Público Federal. “O riso e a lágrima de um têm que ser a razão de existência de outro”, ressaltou.

O secretário-adjunto do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Sebastião Moreira, espera que as autoridades apareçam para receber as reivindicações nesta quinta-feira. Ele não está satisfeito com o rumo da política indigenista no país. “Infelizmente, esse governo está sendo um retrocesso na questão indígena”, disse. “Estou com 25 anos de trabalho no CIMI e nunca vi um período de ameaças tão grande aos direitos dos povos indígenas tanto no Congresso Nacional e sobretudo no Executivo”, completou.

Segundo o presidente em exercício da Fundação Nacional do Índio (Funai), Roberto Lustosa, o trabalho do CIMI limita-se a denúncias vazias. “Nós estamos preocupados que eles tenham perdido o objeto de ação, que é a questão do índio em situação de dificuldade étnica. Com o governo Lula, nunca se conversou tanto com os índios e suas organizações e lideranças”, afirmou. Lustosa ressaltou a importância de defender o direito de posse de terra dos indígenas. “Esperamos que o Congresso garanta a manutenção dos diplomas legais que dão aos índios a garantia para que eles permaneçam na posse de suas terras”.

Entre os convidados para receber as reivindicações, estão representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Ministério da Educação, Ministério da Justiça, Fundação Nacional da Saúde (Funasa), Procuradoria Geral da União, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas.

Além dos processos de demarcação de terras, os índios também trataram, durante o seminário no Ministério Público, da hidrovia Araguaia-Tocantins, da transposição de águas do rio Tocantins para o São Francisco, de barragens, rodovias que passam por terras indígenas, do impacto da monocultura de soja ao redor das terras indígenas, da presença de fazendeiros nas áreas e de outros temas ligados à saúde e educação.

Uma das delegações presentes é do povo Pataxó. Uruçu Pataxó é uma das cinco lideranças da tribo presentes no encontro. Ele contou que há quatro anos os índios retomaram as terras no Monte Pascoal, na Bahia, e até hoje sofrem pela falta de regularização. No local, vivem cerca de 7.600 índios em 23 aldeias. Eles dividem o espaço com 436 fazendeiros que, segundo Uruçu, pagam pistoleiros para proteger as terras e impedir o acesso dos índios. “Para nós, a terra é nossa mãe, não podemos viver sem a terra. Se não tivermos a terra, nós não temos saúde, não temos educação, não temos nada”, disse o pataxó.

Uruçu contou que mesmo com os problemas, eles lutam para manter as tradições e incentivar o jovem a não sair da aldeia. Há nas terras dois professores de português e dois de cultura indígena.

Luciana Vasconcelos e Daniel Dutra

Visão Rota Brasil Oeste

Apesar da promessa de homologar os cerca de 145 processos de reinvidicação de terras indígenas até o final do mandato, o governo Lula tem-se mostrado lento para certas decisões envolvendo a questão. Um exemplo é a homologação de Raposa Serra do Sol, terra indígena que beneficiaria 15 mil índios em Roraima. O ato, somente uma assinatura do presidente, foi uma promessa de campanha até hoje não cumprida e que tornou-se uma batalha judicial. Por outro lado, a Funai vem sendo fortalecida com a reativação do Conselho Indígena, realização de concursos públicos e outras ações. Permanece a expectativa.