Índios Xavante retornam à terra tradicional em Mato Grosso

Os índios Xavante da terra Marãiwatséde, de Mato Grosso, conseguiram, na segunda-feira (5), o direito legal de retornar à sua terra tradicional. Pelo menos 1.500 índios poderão viver na área de onde foram retirados há 40 anos, por aviões da Força Área Brasileira, por fazendeiros e padres. Durante todo esse tempo, a área ficou ocupada por fazendeiros, jagunços e moradores de assentamentos da reforma agrária.

A peregrinação dos indígenas foi longa. Eles passaram por vários territórios, sofreram com a retirada forçada e com as doenças que mataram dois terços da aldeia. Cerca de 230 índios foram retirados das terras. Segundo o coordenador do Programa Xavante e administrador da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Goiânia, Edson Beirez, eles foram persistentes e pacientes em esperar pela decisão da Justiça.

“Ficamos surpresos com a postura dos índios em esperar a decisão judicial de forma tranqüila. Os Xavantes são conhecidos como guerreiros, mas ficamos bastante satisfeitos porque a decisão foi favorável e, finalmente, a justiça foi feita. A decisão tem uma significância grande na sobrevivência cultural dos Xavantes”, destacou Beirez, em entrevista à Agência Brasil.

O processo tramitava na Justiça desde 1995. Em 2004, a ministra Ellen Gracie, atual presidente do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma liminar favorável aos Cavantes. Eles ocuparam cerca de 40 mil hectares e já têm uma aldeia formada. Faltava a decisão da Justiça sobre a devolução da terra, em sua totalidade, aos índios. A área soma 165 mil hectares e se localiza nos municípios de São Félix do Araguaia e Alto da Boa Vista, em Mato Grosso.

Na opinião do presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, a decisão mostra “que a justiça tarda, mas não falha” e que a história dos índios é quase de “genocídio”, já que vários morreram apenas 15 dias após a retirada de 1966.

“Eles foram vivendo em várias terras, mas sempre pensando em voltar para a Marãiwatséde. Lutaram muito, demos nosso apoio, e eles esperaram a sentença da Justiça. Essa decisão é importante porque reconhece de fato a terra indígena, de direito, e prevê a retirada daqueles que não são indígenas. Ficamos muito felizes. Podemos comemorar que a justiça tarda, mas não falha”, avaliou Pereira.

O sertanista da Funai na região Denivaldo da Rocha conta que a comunidade indígena está em festa e que tudo que os índios queriam na vida era ocupar suas terras tradicionais. “O cacique veio falar comigo, me cumprimentar e contar que a aldeia está em festa , e que os índios estão muito felizes com a decisão”.

A decisão da 5º Vara da Justiça Federal de Cuiabá, assinada pelo juiz José Pires da Cunha, prevê a desocupação dos fazendeiros, posseiros e qualquer outro invasor da terra de Marãiwatséde imediatamente, e que essa pessoas façam o reflorestamento da área.

O juiz determina ainda que os posseiros cadastrados no Programa de Reforma Agrária, cerca de 3 mil famílias, sejam reassentados na fazenda Guanabara, próxima à terra indígena. Elas não terão direito a nenhuma indenização, já que, na opinião do juiz, as ocupações foram de má-fé.

ndios protestam contra proibição judicial para sepultamento em terra reivindicada

 Brasília – No final da manhã de hoje (12), indígenas, estudantes e militantes dos direitos humanos reuniram-se em frente ao prédio do Ministério Público Federal (MPF), na cidade de Dourados (MS).

Eles fizeram um protesto contra a decisão da Justiça Federal de Ponta Porã (MS) de indeferir, na noite de ontem, o pedido de liminar para a realização do sepultamento da índia Kurutê Lopes, 70 anos, na Fazenda Madama, terra cuja titularidade está sendo reivindicada pelos Guarani-Kaiowá.

De acordo com a assessoria do Ministério Público Federal, o procurador da República Charles Pessoa conversou com os manifestantes em Dourados.

Pessoa deve entrar ainda hoje com um recurso junto ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, em São Paulo, para reverter a decisão da Justiça Federal de Ponta Porã. O TRF deve se pronunciar nas próximas horas ou até mesmo na manhã de sábado.

Na noite da última segunda-feira, Kurutê foi assassinada por pistoleiros que tentavam expulsavar famílias indígenas da propriedade. Os Guarani-Kaiowá realizam o velório às margens da estrada que liga as cidades de Amambaí e Coronel Sapucaia, na localidade de Taquaperi.

“O corpo está em processo de decomposição e sendo velado pela comunidade. A Justiça não pode negar esse direito ao povo indígena”, disse o coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) do Mato Grosso do Sul, missionário Egon Heck. “Apesar das mortes constantes de indígenas na região, eles não vão esmorecer na luta.”

O local escolhido para o sepultamento é considerado um tekoha (terra de ocupação tradicional dos Kaiowá), chamado pelos índios de Kurusu Amba. No último sábado (6), 50 famílias guarani-kaiowá ocuparam a Fazenda Madama. Dois dias depois, pistoleiros atacaram a tiros o grupo, quando ocorreu a morte de Kurutê.

O índio Valdeci Gimenez, 28 anos, também foi ferido com três tiros nas pernas. Quatro índios também foram presos pela Polícia Civil, sob a alegação de roubo de uma carreta – entre eles, Francisco Fernandes, 38 anos, líder dos Kaiowá.

Kurutê, segundo o Cimi, era “rezadeira”. Ela teria nascido na área onde hoje é a Fazenda Madama. No local, também foram enterrados seus antepassados.

A Polícia Federal abriu inquérito para investigar o assassinato e descobrir os autores da expulsão dos indígenas da terra ocupada. Três pessoas foram intimadas a depor nesta sexta-feira. Há fortes suspeitas de que os criminosos faziam a segurança da sede da fazenda.

Polícia Federal investiga morte de índia guarani-kaiowá em desocupação forçada

A Polícia Federal de Ponta Porã instaurou inquérito policial nesta quarta-feira (10) para investigar o assassinato da índia guarani-kaiowá Zulita Lopes, também conhecida como Kurutê. Ela foi morta na última segunda-feira, entre Amambai e Coronel Sapucaia (MS), durante confronto pela desocupação da fazenda Madama, denominada pelos índios como tekoha (terra tradicional) Kurusu Amba.

Durante a desocupação, pistoleiros também teriam ferido com três tiros nas pernas o índio Valdeci Gimenez, 28 anos. Não havia mandato de reintegração de posse. A suspeita do Ministério Público Federal, segundo informou ontem o procurador  Charles Pessoa, é a de que o grupo armado que atacou os índios estaria a serviço dos fazendeiros da região e teria relação com outras duas mortes recentes de indígenas.

Segundo nota divulgada hoje pela manhã pela Polícia Federal, "as primeiras análises indicam que os disparos ocorreram durante confronto entre índios e funcionários da fazenda Madama para desocupação desta". "Uma das vias de acesso à fazenda estava interditada, mesmo assim foram realizadas perícias no local, sendo encontrado alguns rojões usados, cápsulas de munições deflagradas, arcos, flechas e um galpão incendiado ."

A assessoria da PF informa que já foram ouvidos funcionários da empresa de segurança, que declararam ter ouvido o barulho gerado pelo conflito, sem ter participado de nada. Segundo o procurador Charles Pessoa, foi comprovada a participação de funcionários da mesma empresa em outros dois crimes recentes.

A PF diz já ter ouvido também representantes dos índios que ocupavam a fazenda. Segundo o Conselho Indigenista Missionário, 50 famílias guarani-kaiowá ocupavam a Madama desde o sábado (8). Outras 11 pessoas ainda devem ser ouvidas pela PF nos próximos sete dias.

Os índios que ocuparam a Madama, segundo a PF, procediam da área indígena Taquaperi, no município de Amambai. A Taquaperi é uma das oito áreas indígenas criadas pelo antigo Serviço de Proteção ao Índio, entre os anos 20 e 30, próximas às nascentes cidades do sul de Mato Grosso do Sul. Com a expansão do agronegócio, nos anos 60 e 70, milhares de índios Guarani-Kaiowá foram expulsos das áreas que ocupavam à beira de córregos da região, nos "fundos de fazendas", sendo levados para essas áreas, que ficaram superlotadas.

Desde os anos 80, os Guarani-Kaiowá tentam retomar as áreas de ocupação tradicional na região. Com a falta de terras, pobreza e violência dominaram as comunidades indígenas. Hoje, os cerca de 35 mil a 40 mil Guarani-Kaiowá de MS, vivendo em cerca de 50 mil hectares de terra, sofrem com um índice de assassinatos que é praticamente o dobro da média brasileira e taxas de suicídios, principalmente entre os jovens, que estão entre as mais altas do mundo.

Milícias armadas por fazendeiros estão assassinando índios Guarani-Kaiowá, denunciam MPF e Cimi

Milícias armadas estariam agindo nos municípios da região sul de Mato Grosso do Sul, a mando de fazendeiros, para intimidar e expulsar índios Guarani-Kaiowá de terras reivindicadas por eles. A denúncia é do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e do Ministério Público Federal de Dourados (MS).

Nos últimos anos, os pistoleiros teriam assassinado vários índios Guarani-Kaiowá. Os matadores também seriam responsáveis pelo assassinato  da índia Kurutê Lopes, de 70 anos, com um tiro no peito, na Fazenda Madama, na noite da última segunda-feira (8).

Segundo o coordenador regional do Cimi em Mato Grosso do Sul, Egon Heck, as milícias se identificam como seguranças a serviço dos fazendeiros. “Os pistoleiros têm agido com violência e assassinatos, inclusive mataram o índio Dorvalino, em dezembro de 2005. Eles são o braço armado dos fazendeiros", diz ele.

"É importante que o Ministério da Justiça e a Polícia Federal averigúem a fundo essa realidade, para que atos como a morte de Kurutê não continuem se repetindo”, afirma o indigenista.

O procurador do MPF de Dourados Charles Pessoa confirma as suspeitas. “Existe. sim, uma desconfiança de que possa haver grupos que prestam esse tipo de serviço, e eu acredito firmemente nessa possibilidade”, diz o procurador.

Ele explica que essa suspeita se deve aos assassinatos freqüentes de indígenas na região. “O MPF abriu inquéritos, mas ainda não deu para amarrar os vários casos, que comprovariam a ação de milícias armadas. Mas, estamos aprofundando as diligências”, completa ele.

O delegado da Polícia Civil Marcelo Batistela Damasceno, da região entre Amambai e Coronel Sapucaia, onde foi morta Kurutê, disse não ter informação a respeito da suposta atuação de milícias. “Nunca ouvi dizer”, resumiu.

A Recovê, entidade não governamental formada por grandes produtores rurais da região, foi procurada para falar sobre a denúncia, mas não foi possível um contato telefônico. Também foram procurados pela reportagem o Sindicato dos Proprietários Rurais de Amambai, cujo presidente está em viagem a São Paulo, e a Federação da Agricultura e Pecuária do MS, onde a assessoria alegou que, devido a recesso coletivo na entidade, não é possível fazer contato com a diretoria.

Empregados de empresa de segurança são suspeitos de matar índia, afirma procurador

Brasília – Para o procurador do Ministério Público Federal (MPF) em Dourados (MS) Charles Pessoa, existe “forte suspeita” de que o assassinato da índia guarani-kaiowá Kurutê Lopes, 70 anos, na noite de segunda-feira (8), tenha sido cometido por funcionários de uma empresa de segurança que trabalha para os proprietários da Fazenda Madama, onde ocorreu o crime.
“É forte a suspeita. Na noite do crime, havia cinco funcionários da empresa no local, que cuida da segurança da fazenda. É o terceiro caso de assassinato envolvendo essa empresa com conflitos indígenas", diz ele. "Nos dois primeiros, foi comprovada a participação dos seguranças. É possível, então, que tenham participado do crime, pois tomavam conta da sede da fazenda nesse dia.”

Os seguranças da empresa são acusados também das mortes dos índios Dorvalino Rocha, ocorrida em Nhanderu Marangatu, em dezembro de 2005, e de Dorival Benitez, em junho de 2006.

A Polícia Federal de Ponta Porã (MS) intimou três empregados dessa empresa a prestar depoimento na próxima sexta-feira (12). O delegado Alexandre Fresneda de Almeida foi designado para acompanhar o caso. O inquérito foi aberto para apurar a morte e as lesões corporais nos indígenas que foram expulsos da fazenda “por jagunços e seguranças”. Não havia mandado judicial de reintegração de posse.

No último sábado (6), 50 famílias guarani-kaiowá invadiram a fazenda na tentativa de retomar a área, que consideram de ocupação tradicional, chamando-a de Kurusu Amba. Dois dias depois, pistoleiros atacaram a tiros o grupo. Foi quando ocorreu a morte de Kurutê e o ferimento do índio Valdeci Gimenez, com três tiros nas pernas. Na ocasião também foram presos quatro indígenas pela Polícia Civil, sob a alegação de roubo de uma carreta.

Segundo o coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Egon Heck, há um clima de tensão e indignação por parte dos índios desde a “brutalidade” da última segunda-feira. “Eles temem pela violência que os fazendeiros e seus braços armados impõem à região. As milícias têm agido contra os índios, que estão buscando um direito pela posse de sua terra tradicional.”

Para Heck, três questões são fundamentais hoje para o povo indígena da região: a apuração rigorosa e a punição dos responsáveis pelo assassinato; que seja garantido aos índios o direito de sepultarem Kurutê em Kurusu Amba, onde ocorreu o assassinato; que o governo cumpra sua “obrigação constitucional” e busque agilizar o processo de reconhecimento e demarcação da terra indígena. “Só mediante essas ações começaremos a restabelecer a justiça e a tranqüilidade nessa área”, diz Heck.

Parecer da Funai reafirma que Aracruz ocupou área indígena no Espírito Santo

A disputa por 11 mil hectares de terra no norte capixaba chega hoje (28) a um momento importante. O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, receberá do procurador-geral da entidade um parecer sobre o caso. A área, no município de Aracruz, é motivo de disputa entre 2 mil indígenas e a maior empresa de celulose de eucalipto, Aracruz, responsável por um terço da produção mundial.

O parecer prévio da Funai reafirma que a área pertence aos povos indígenas Tupiniquim e Guarani. O documento teve de ser elaborado porque a Aracruz Celulose contestou judicialmente a demarcação das terras. Dos 18 mil hectares concedidos originalmente aos índios, a empresa diz ter direito a 11 mil.

Os argumentos da companhia foram considerados “muito frágeis”, segundo o procurador Luiz Fernando Villares declarou à Agência Brasil. “A Aracruz fala que não existe ocupação indígena na área porque quem ocupa é a empresa”, afirma.

Mas a ocupação de fato, segundo Villares, começou com “um vício lá atrás”.  “Foi a expulsão dos índios, o que não justifica e nem legitima a propriedade da Aracruz hoje”, afirma o procurador.

Nas décadas de 50 e 60, o governo do Espírito Santo expropriou as terras, que eram ocupadas tradicionalmente pelos povos indígenas, segundo levantamento da procuradoria da Funai. A área foi repassada à Aracruz, que começou a plantar eucaliptos, e também a outros proprietários particulares, que depois venderam terras à empresa. Dos 18 mil hectares originalmente ocupados pelos indígenas, 11 mil estariam hoje sob domínio da Aracruz.

“Na verdade a Aracruz, como particular, comprou uma terra que era indígena”, afirma. “Hoje os índios não ocupam [as terras], porque quem ocupa é a Aracruz”.

Na petição de 400 páginas que enviou à Funai, a Aracruz argumenta que tem direito às terras, por ocupá-las há cerca de 50 anos. “Mas já é uma jurisprudência do STF [Supremo Tribunal Federal], que a ocupação tradicional não pode ser interrompida por uma expulsão dos índios do lugar”, contesta Villares. “Se lá atrás, eles foram expulsos do seu território, essa ocupação ainda continua, mesmo que não seja verificada fisicamente”.

Além do parecer sobre as questões jurídicas, Villares entregou ao presidente da Funai um documento sobre os aspectos antropológicos referentes à contestação da Aracruz, feito pela Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da Funai.

Dos 18 mil hectares reivindicados pelos indígenas, Villares afirma que 7 mil hectares já foram contemplados em decretos de homologação assinados pelo então ministro da Justiça Íris Rezende. Essa área é de propriedade da União e os índios têm a posse e o usufruto da terra.

Se aprovar o parecer, Mércio Gomes tem de enviá-los ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Cabe ao ministro publicar a portaria reconhecendo a terra como indígena e determinando que a Funai demarque a área.

Villares disse que o prazo legal para o envio terminou na segunda-feira passada (21). De acordo com ele, houve atraso por causa do tamanho da contestação enviada pela Aracruz, há cerca de dois meses. Só a petição tinha 400 páginas, além de 18 volumes de documentos anexos.

Operação combate grilagem, extração de madeira e garimpo nas terras dos índios kayapó

A Polícia Federal (PF), Fundação Nacional do Índio (Funai) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) começaram uma operação para combater a grilagem de terras, a extração ilegal de madeira e o garimpo na Terra Indígena Kayapó, no sudeste do Pará. A Operação Kayapó, que teve início às 4 horas, fará a retirada de 50 pessoas, segundo estimativa da Funai.

O ex-administrador regional do órgão em Marabá, Eimar Araújo, um dos coordenadores da ação, explicou à Agência Brasil que a presença dos invasores foi identificada há cerca de um ano, após denúncia dos kayapó. E foi confirmada com o sobrevôo da área e o uso de imagens de satélite. “Constatamos a presença de 19 focos de desmatamento”, disse Araújo. Ele contou que a maioria dos locais estava em preparação para virar pastagem.

“Esperamos que a saída [dessas pessoas] seja pacífica”, comentou o chefe da equipe, o delegado da Polícia Federal Delfino de Castro Neto, que prevê uma empreitada de 12 dias. “A área é muito grande e isso dificulta a fiscalização pelos órgãos federais. Cria a necessidade de uma ação quase permanente”. São quase 3,3 milhões de hectares – cada hectare corresponde a um campo de futebol.

Castro Neto disse que o fato de a população local já estar ciente da operação pode evitar enfrentamento com os invasores. Segundo ele, estão envolvidos 24 homens da PF, o que caracterizaria uma operação de médio porte.

Também integram a comitiva dois representantes da aldeia kayapó Kikretum – um deles, o chefe de guerreiros Piydjô. Responsável por um dos papéis de liderança na organização política dos kayapó, ele resumiu como encara a presença dos estranhos: “Fazendeiro estraga o mato, madeireiro estraga o mato, e nós precisamos do mato grande para criar os bichos que a gente caça”.

Povo Bororo não pode viver em terra homologada

Apesar de ter seu território demarcado, os Bororo da terra Jarudóri Jarudori são obrigados a viver espalhados em outras terras de seu povo, porque sua área tradicional está invadida por posseiros. Indígenas e entidades indigenistas do Mato Grosso estão organizados e reivindicam a retirada dos não-índios que vivem em toda a extensão de Jarudori e em cerca de 40% da terra Teresa Cristina, ambas de ocupação tradicional do povo Bororo. A decisão para a retirada depende da Fundação Nacional do Índio (Funai).

A expulsão dos Bororo foi iniciada no início do século passado. Jarudori faz parte das terras demarcadas pelo Marechal Rondon, em 1912, e tinha aproximadamente de 100 mil hectares. Na década de 1930, a região foi usada para a instalação de colônias agrícolas, com incentivos que foram parte do Programa Marcha para o Oeste, e o loteamento intensificou-se a partir dos anos 1960. Outras áreas foram invadidas por garimpeiros. Em 1945, o Estado de Mato Grosso criou a Reserva Indígena JarudóriJarudori, reduzindo a área demarcada por Rondon para 6 mil hectares. A xterrax sofreu nova redução quando foi registrada, ficando com apenas 4.706 ha.

Invasões, violência e epidemias – de tuberculose e sarampo – contribuíram para saída de muitas das famílias Bororo que ali viviam.  O município de Poxoréu foi criado em 1958 e hoje existe também uma vila de 2605 habitantes que também leva o nome de JarudóriJarudori.

A terra Jarudóri Jarudori tem importância não apenas para os indígenas que poderão voltar a viver nela, mas para todo o conjunto da população Bororo, pois é um importante ponto de articulação entre os “bororo de baixo”, que vivem no Pantanal, e os “de cima”, que vivem Meruri, Garças e Rio das Mortes.

Em 28 de junho, será realizado em Cuiabá (MT) o seminário “Povo Boe-Bororo: Território Tradicional e Direitos às Terras Indígenas Tereza Cristina e Jarudori”, com a participação de representantes Bororo, da Sub-Procuradora da República e Coordenadora da 6ª. Câmara, Dra. Deborah Duprat, da antropóloga que fez o laudo de identificação da terra, Profa. Dra. Edir Pina de Barros, e da Funai, convidada através de Artur Mendes Nobres, diretor de Assuntos Fundiários. O encontro, que começa às 8h30 tem o objetivo de mobilizar e sensibilizar a sociedade civil organizada em torno das questões fundiárias dos Boe-Bororo.

Líderes indígenas acusam o governo Lula de traição

Mais de 500 índios de 20 estados brasileiros deram início ontem em Brasília ao Acampamento Terra Livre, mobilização que abre a agenda do Abril Indígena, série de eventos, debates e reivindicações dos povos indígenas brasileiros que ocorre ao longo deste mês. Sob uma lona de circo há poucos metros do Congresso Nacional, representantes de dezenas de etnias somaram críticas à política indigenista do governo federal. Destacaram, entre as principais falhas e omissões da gestão do presidente Lula, a falta de demarcações de terras indígenas há muito tempo reivindicadas e o descaso com a saúde indígena.

“Sempre tentamos eleger um presidente que representasse o movimento social. Nos enchemos de esperança quando Lula ganhou, pensamos que finalmente teríamos saúde, terra e educação”, lembra Jecinaldo Barbosa Cabral, coordenador da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira). “Mas tudo mudou. O governo fechou o diálogo conosco e se aliou aos inimigos dos povos indígenas, traindo todos os compromissos antes firmados”.

O loteamento da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e a concessão a deputados e governos estaduais – principalmente de Santa Catarina e Roraima – colocando os direitos indígenas como moeda de troca, para o fortalecimento da base governista no Congresso, foram apontados pelas lideranças presentes ao evento como as práticas do governo Lula que mais contrariaram os interesses indígenas. “Como o governo nunca teve maioria na Câmara Federal, precisou barganhar nossos direitos nos estados para formá-la. Isso é inaceitável”, afirmou Uiton Tuxá, do povo Tuxá, de Pernambuco. “Como é inaceitável que o Estatuto dos Povos Indígenas esteja engavetado a 12 anos no Congresso Federal e o governo não mova uma palha para votá-lo”.

"Mortos como cachorros"

A abertura dos trabalhos foi marcada por discursos revoltados e emocionantes. Muitos denunciavam o perigo de povos inteiros serem extintos. “Estamos sendo mortos como cachorros”, gritou o cacique Anastácio, do povo Guarani Kaiowá, do Mato Grosso do Sul. “Os fazendeiros atacam a gente e nada acontece com eles, nenhuma punição”. O cacique Nailton Pataxó denuncia o descaso com o atendimento sanitário de sua aldeia, no sul da Bahia. “Quando um parente fica doente, demora mais de um mês para conseguir medicamento. Quando o remédio chega, o quadro já piorou tanto que não serve mais”.

Membros do Fórum de Defesa dos Direitos Indígenas (FDDI) também tomaram a palavra ontem para analisar a atual conjuntura política nacional em relação aos interesses e lutas dos povos indígenas. O antropólogo Marco Paulo Schettino, do Ministério Público Federal, afirma que o governo federal confunde os direitos dos índios com os interesses da Fundação Nacional do Índio (Funai). “E a Funai age como se a demarcação de terras fosse um favor aos índios, como se a tutela exercida por ela fosse a melhor política indigenista”.

As críticas à Funai seguiram na voz de Gilberto Azanha, do Centro de Trabalho Indigenista. “O papel do órgão não é brecar as reivindicações dos índios, mas buscar atendê-las. Infelizmente esse governo faz menos pelos interesses indígenas do que qualquer outro governo, inclusive o dos militares”. O advogado Raul Silva Telles do Valle, do ISA, lembra também que a mobilização dos povos indígenas é fundamental para enfrentar a frente anti-indígena existente no Congresso Nacional e nos estados brasileiros. “Vivemos um momento histórico em que muitas conquistas recentes, como as da Constituição Federal, estão sendo ameaçadas. Mais do que nunca os povos indígenas precisam estar unidos e atuantes”.

A realização do Abril Indígena pelo terceiro ano consecutivo também foi valorizada ontem pelos líderes indígenas. A criação no mês passado da Comissão Nacional de Política Indigenista , pelo governo federal, atendeu a uma demanda expressa no acampamento de 2005. Os povos indígenas presentes ao acampamento querem, agora, que a comissão priorize o encaminhamento, pelo Ministério da Justiça, das terras que estão paradas no órgão à espera da publicação da portaria que define seus limites, para que o processo de demarcação possa avançar. Cinco das 13 terras que já haviam sido levantadas pelo movimento indígena como prioritárias desde o ano passado estão localizadas em Santa Catarina.

As atividades no Acampamento Terra Livre continuam hoje, quando os participantes do acampamento se dividem em grupos para debater demarcação de terras, proteção dos territórios, sustentabilidade e gestão territorial, saúde Indígena, política indígenista e gênero. Após os trabalhos em grupos, as conclusões serão compartilhadas entre os participantes. Na quinta-feira, as atividades serão finalizadas com a discussão e aprovação de um documento final do Abril Indígena/Acampamento Terra Livre 2006, que será apresentado ao Senado Federal em audiência pública no mesmo dia.

Nenhum posseiro de Raposa Serra do Sol foi indenizado no prazo de um ano

A uma semana de expirar o prazo para a retirada de todos os ocupantes não-índios da terra indígena Raposa Serra do Sol, conforme estabelecido no decreto de homologação, assinado em 15 de abril de 2005, nenhum posseiro foi indenizado, de um total estimado de 250 famílias.

O administrador da Funai em Boa Vista, Gonçalo Teixeira, informa que a Instituição tem recursos para pagar 28 processos de famílias em que o levantamento fundiário já foi concluído.

De acordo com o decreto homologatório, o Governo Federal deveria, no prazo de um ano, indenizar os ocupantes de boa-fé e reassenta-los em áreas do Incra, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

A competência do Incra é reassentar clientes da reforma agrária, em áreas de 100 ou 500 hectares, a depender do tamanho da posse. A maioria absoluta dos posseiros é considerada pequeno produtor.

Raimundo Lima, diretor de Programas para a Região Norte, do Incra Nacional, garante que o Instituto já dispõe de áreas para reassentar as famílias. “Apenas os rizicultores (grandes produtores), que se negaram a discutir uma alternativa para a desintrusão, não serão atendidos de imediato pelo Governo”, informa.

Além de receberem a indenização e os lotes de terra do Incra, os pequenos produtores poderão acessar financiamentos do Pronaf [Programa Nacional da Agricultura Familiar]. “Essa uma forma que o Governo Federal está buscando para amparar as famílias”, acrescenta Lima.

Nagib Lima, coordenador do Comitê Gestor, encarregado de cumprir as metas pós-homologação, inclusive a desintrusão da terra indígena, assegura que até o dia 15 de abril, todos os posseiros serão cadastrados. “A partir do dia 17 de abril, eles [posseiros] poderão procurar o escritório do Grupo de Trabalho formado por Funai e Incra, para receberem as indenizações”, comenta Lima.

O coordenador destaca, ainda, que até hoje, 10/4, cerca de 95% dos posseiros já foram cadastrados e que a única resistência enfrentada pelo Grupo de levantamento fundiário foi nas lavouras de arroz e na vila Surumu.  Para que o trabalho seja concluído, a Polícia Federal está fazendo a segurança dos servidores.

O Conselho Indígena de Roraima – CIR, está atuando no sentido de que o Comitê Gestor conclua o levantamento fundiário e o Governo Federal pague as indenizações imediatamente. Devido aos rumores de possíveis conflitos na região da Raposa Serra do Sol, o CIR solicitou a presença da Polícia Federal para garantir a segurança das comunidades indígenas.

Apesar de toda a tensão vivenciada na terra indígena Raposa Serra do Sol, principalmente na região de Surumu (próxima aos arrozais), nenhum incidente foi constatado até esta data.